Português: 01/12/16

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Chapecoense

            «Quem já perdeu alguém muito importante para si já sentiu o choque de ver que no dia seguinte as pessoas acordam, trabalham, divertem-se, como se nada fosse. Já sentiu a solidão do sofrimento anónimo. É esta a frieza quotidiana dos outros que nos permite a todos acordar diariamente sabendo que um dia não acordaremos. Mas há uns momentos que nos unem no sofrimento ou pelo menos nos unem ao sofrimento dos outros. Coisas que nos lembram que somos, como humanos, uma comunidade de mortais. A morte de pessoas notáveis, tragédias de grande dimensão ou coisas inusitadas, como a morte de praticamente toda uma equipa de futebol. Por o Chapecoense ser uma equipa brasileira, por o falecido treinador Caio Júnior ter passado por várias equipas portuguesas e por Marcelo Boeck ter jogado no Sporting e no Marítimo a coisa ainda nos tocou mais.
            Com bons resultados fora do Brasil, o clube de uma cidade brasileira com pouco mais do que 200 mil habitantes era um exemplo raro de saúde financeira e estava, apesar do seu modesto orçamento (quase dez vezes menos do que o Flamengo), em 9.º lugar no campeonato. Disputava, pela primeira vez, a final da Copa Sul-Americana. O Chapecoense conquistou a fama da pior forma possível. Mas é nestes momentos que todos tentam mostrar o melhor de si: vários clubes brasileiros ofereceram jogadores, o Atlético Nacional, a equipa colombiana com que se ia defrontar, propôs que o Chapecoense recebesse o título e mais de 13 mil pessoas tornaram-se sócias. Nenhuma morte serve para alguma coisa. Apenas consola saber que não se perdeu tudo. Neste caso, serviu para um daqueles momentos em que nos voltamos a lembrar como tudo é frágil, como é uma sorte cada um de nós ainda estar vivo. E os nossos gestos de solidariedade são um tributo a essa sorte.»

Daniel Oliveira, in Record
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