Português

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Crítica

          Muita da crítica que se pode observar no Memorial já se encontra exposta no «post» referente ao espaço social da obra.

          O que aqui se expõe é uma síntese da visão crítica do narrador, aplicada a três grandes sectores da vida portuguesa da época.


1. IGREJA
  • Crítica às circunstâncias que envolveram o surgimento da promessa de construção de um convento em Mafra, chegando o narrador, inclusive, a levantar algumas dúvidas acerca da eficácia dessa mesma promessa;
  • Crítica ao fanatismo religioso da rainha;
  • Crítica à vivência postiça da religião, segundo as conveniências e as necessidades de cada um;
  • Crítica à Inquisição, instalada no reino para atender o interesse da Coroa, visando o enriquecimento através dos bens subtraídos aos judeus;
  • Crítica ao poder crescente e à influência que a Igreja exerce na vida da nação e dos seus destinos, manietando o povo e o próprio rei;
  • Crítica ao facto de promover e fomentar as diferenças sociais, pois acima de tudo estão os seus próprios interesses;
  • Crítica à mundividência religiosa, caracterizada pelo obscurantismo, pelo fanatismo, pelas práticas da Inquisição, responsáveis pela morte bárbara, pela destruição do Homem, nomeadamente daqueles que, pelo seu espírito superior e pela sua visão própria do mundo, contrastavam com a mediocridade e a ignorância dos preceitos religiosos da época;
  • Crítica à devassidão, à corrupção (económica e moral) e ao desrespeito pelo celibato dos frades e das freiras, atraídos pelos prazeres mundanos, da carne, esquecidos dos votos que fizeram ao consagrarem-se;
  • Crítica ao poder, à vaidade e à hipocrisia da Igreja, que cala as explorações de que o povo é vítima, fingindo ignorar que passa fome e não tem uma habitação condigna.


2. REI
  • Crítica à prepotência, à megalomania, à vaidade excessiva e à ignorância;
  • Crítica ao poder absoluto e arbitrário do rei, que não ouve ninguém, excepto o Santo Ofício, decidindo, contra todas as razões de estado e do bom-senso, as instalações em Mafra de modo a lá caberem 300 frades;
  • crítica à má administração do país e das finanças, ao desperdício de uma oportunidade de ouro para desenvolver o reino, aproveitando as imensas riquezas provenientes dos vários pontos do império;
  • crítica ao investimento avultado na construção do convento;
  • crítica à imitação e à importação de modas do estrangeiro (por exemplo, a cama da rainha veio da Holanda e o infante D. Francisco oferece à cunhada jóias produzidas em França);
  • Crítica à exploração e à miséria do povo.


3. SOCIEDADE
  • Crítica ao povo pelo seu atraso e pela sua ignorância, pela acefalia religiosa, pela superstição, pelo fanatismo, pela forma festiva como celebra os autos-de-fé;
  • Crítica às desigualdades sociais;
  • Crítica à desumanidade da guerra, à futilidade das suas causas e ao desprezo a que são votadas as pessoas quando deixam de ter préstimo (é o caso de Baltasar);
  • Crítica aos casamentos de conveniência (por exemplo, o de D. João V e de D. Maria Ana), com resultados nefastos (adultério, falta de amor, filhos bastardos...);
  • Crítica às perseguições políticas, justificadas com razões religiosas, culminando na descrição dos autos-de-fé.

Planos da obra

          Em Memorial do Convento, existem três planos:
  • o plano da História: neste primeiro plano, o narrador apresenta-nos o Portugal do século XVIII, em pleno período barroco, uma época de excessos e de acentuadas diferenças sociais;
  • o plano da ficção da História: este plano reflecte-se, sobretudo, na importância que o narrador atribui ao povo anónimo, enquanto personagem colectiva, cujo papel sucessivamente a História ignora; mas também está presente no relato da descrição caricatural da relação entre D. João V e D. Maria Ana, ou no voo da passarola;
  • o plano do fantástico: este nível diz respeito, exclusivamente, à relação amorosa entre Baltasar e Blimunda.

Infante D. Francisco

          D. Francisco é o cunhado da rainha, cujos sonhos eróticos povoa e que lhe deixam o travo amargo do pecado.
          Aproveitando-se da doença do irmão, D. João V, insinua-se junto dela para tentar ascender ao trono.

Relação D. João V / D. Maria Ana Josefa

Fonte: Lithis

Relação Baltasar / Blimunda

Fonte Lithis

Maria Vitória

          Mariana Vitória é uma princesa castelhana, destinada a ser desposada por D. José, o herdeiro da coroa portuguesa. Sobre ela, ficamos apenas a saber que “… gosta de bonecas, adora confeitos, nem admira, está na idade…”.

          D. Mariana Vitória era filha de Filipe V de Espanha. Nasceu em 1718 e faleceu em 1781. Esteve noiva de Luís XV de França, mas o casamento não se concretizou. Em 1727, foi contratado o seu matrimónio com o futuro rei D. José I, no âmbito de uma política de alianças que incluía também a união da princesa portuguesa D. Maria Bárbara com D. Fernando, herdeiro do trono espanhol. Vivendo, de uma maneira geral, alheada dos negócios públicos, D. Mariana Vitória ocupou a regência em 1776-1777, por doença de D. José.

Velho do Restelo - Correcção

quarta-feira, 1 de junho de 2011

O meu dia... há muitos anos

Linhas de acção

          Existem, no romance, quatro linhas de acção.

          A acção principal diz respeito à construção do convento de Mafra, uma acção que entrecruza dados históricos e ficcionais e que se situa nas décadas iniciais do século XVIII. A referida edificação resulta da promessa de D. João V feita nesse sentido, caso a rainha concebesse no espaço de um ano.

          Paralelamente, encontramos a histórica de amor vivida por Baltasar e Blimunda, que constitui, frequentemente, o fio condutor da intriga.

          Existe ainda a acção respeitante à construção da passarola, produto do sonho do padre Bartolomeu de Gusmão, um homem visionário que morre, louco, em Toledo.

          A finalizar temos a acção centrada no povo que edificou o convento e que constitui o verdadeiro herói do romance, esquecido pela História oficial, por isso mesmo objecto de uma tentativa de resgate ao rio do esquecimento por parte do narrador.

terça-feira, 31 de maio de 2011

Samantha Fox: "Touch me"



1985

Ou o que D. Maria Ana Josefa deveria ter dito a D. João V

Estrutura da ação de Memorial do Convento

          A contracapa do romance, elaborada pelo próprio Saramago, define, desde logo, as suas linhas temáticas: «Era uma vez um rei que fez promessa de levantar um convento em Mafra. Era uma vez a gente que construiu esse convento. Era uma vez um soldado maneta e uma mulher que tinha poderes. Era uma vez um padre que queria voar e morreu doido. Era uma vez.»
In Memorial do Convento


          De facto, a intriga do romance gira à volta da construção do convento de Mafra - que poderemos designar como acção principal - e das personagens referenciais e/ou ficcionais ligadas a essa construção, mas dela derivam outras linhas de acção, como a relação entre Baltasar e Blimunda, a construção da passarola e a epopeia dos trabalhadores.

          De qualquer forma, costuma apontar-se a existência de três linhas de acção centrais em Memorial do Convento:
  1. A construção do Convento de Mafra, resultante da promessa feita por D. João V aos frades franciscanos, segundo a qual aquele seria edificado caso a rainha desse à luz, no prazo de um ano, um herdeiro para o trono português. Esta linha de acção, por outro lado, serve os intuitos críticos do narrador, que aproveita para denunciar o sacrifício e a morte de inúmeros trabalhadores - muitos deles fizeram-no contra a sua vontade - durante a realização das obras. E tudo isto para satisfazer a vaidade do rei.
  2. A relação de amor entre Baltasar e Blimunda, personagens que se envolveram quer nas obras do convento quer na construção da passarola, através, respectivamente, do seu esforço muscular e dos seus poderes mágicos.
  3. A construção da passarola pelo padre Bartolomeu de Gusmão, símbolo do desejo eterno do Homem de voar.

          Por outro lado, podemos considerar a existência de quatro momentos na acção do romance:

1.ª parte - Capítulos I a VIII (ano de 1711):
  • A promessa de construção do convento;
  • A gravidez da rainha, da qual resultaria a futura princesa D. Maria Francisca Bárbara;
  • A apresentação de Baltasar, Blimunda e Bartolomeu de Gusmão;
  • A menção ao projecto da passarola;
  • O nascimento do segundo filho do casal real, o infante D. Pedro, que morrerá com dois anos de idade;
  • O cumprimento da promessa real, com a escolha do local de construção do convento.

2.ª parte - Capítulos IX a XVI (anos de 1713 a 1722):
  • A construção da passarola;
  • A construção do Convento de Mafra, na qual participa a família de Baltasar Mateus;
  • A doença de Blimunda e os poderes curativos da música do cravo de Domenico Scarlatti;
  • A tentativa de destruição da passarola pelo seu criador;
  • O desaparecimento do padre Bartolomeu de Gusmão.

3.ª parte - Capítulos XVII a XXIV (anos de 1723 a 1730):
  • Baltasar participa na construção do convento;
  • Morte de Bartolomeu de Gusmão, anunciada por Domenico Scarlatti;
  • Sagração do convento (22 de Outubro de 1730, data do quadragésimo primeiro aniversário do rei);
  • Desaparecimento de Baltasar na passarola.

4.ª parte - Epílogo (Capítulo XXV):
  • Errância de Blimunda em busca de Baltasar, que acaba por encontrar, passados nove anos, num auto-de-fé.

V, 92-100 - Correcção

1. Estância 92

     1.1. O que justifica a doçura dos louvores e a justeza da glória?

          A justificação reside no esforço denodado que está na base dos feitos praticados.


     1.2. Qual o fim último do esforço dos nobres?

          Os nobres esforçam-se para que a sua memória não fique atrás da dos seus antepassados.


     1.3. Comente o significado / a importância da inveja, de acordo com os últimos quatro
            versos da estância.

          A inveja da história dos outros conduz à prática de grandes acções. De modo semelhante, o desejo de ser louvado estimula também o ser humano ao cometimento de grandes feitos ("valerosas obras").



2. Estância 93

     2.1. Refira o que apreciava Alexandre e o que despertava a inveja de Temístocles?

          Alexandre, mais do que os feitos de Aquiles, apreciava os versos de Homero que celebravam esses feitos do herói grego.
          Relativamente a Temístocles, a sua inveja era despertada pelo canto, pela exaltação, pela celebração dos feitos / das vitórias de Milcíades.



3. Estância 94

     3.1. Sintetize a mensagem dos quatro primeiros versos.

          Vasco da Gama esforça-se por mostrar que as navegações dos antigos heróis - Ulisses e Eneias -, tão celebradas no mundo, não merecem tanta glória como a sua, que é tão extraordinária que "o céu e a terra espanta".


     3.2. Refira o motivo por que Virgílio, o autor da Eneida, canta Eneias (além da grandi-
            osidade dos feitos).

          Virgílio canta Eneias porque há um herói que o estima / recompensa com presentes e favores, reconhecendo, assim,o seu talento e o valor da arte (da escrita).



4. Estância 95

     4.1. Explicite o valor da conjunção «Mas» que inicia o verso 3.

          A conjunção coordenativa adversativa destaca a contradição existente entre a quantidade de guerreiros e reis valiosos que o reino português produz e o facto de não possuírem qualidades artísticas, o que faz com que se tornem rudes e toscos. Em suma, destaca a inexistência de quem aprecie e valorize a arte, não obstante os heróis e feitos que poderiam ser celebrados por ela.



5. Estância 97

     5.1. Portugal é apresentado como excepção de algo. Explicite este raciocínio.

          Todos os grandes capitães latinos, gregos ou bárbaros, além dos grandes feitos que cometeram, eram dados às letras, algo que não sucede com os portugueses, que as desprezam. Deste modo, não há nenhum capitão português celebrado na poesia, o que revela o seu desprezo pelas letras e, consequentemente, a sua ignorância.


6. Estância 98

     6.1. Complete a paráfrase apresentada.
     Em Portugal, não há grandes poetas, não por falta de dotes naturais / talento natural, mas por os portugueses desprezarem as Artes / Letras. Se a situação não se alterar, dentro de algum tempo não haverá grandes heróis. Por outro lado, o Destino fê-los tão rudesintratáveis e insensíveis, tão desleixados de espírito, que poucos se importam com isso.


7. Estância 99

     7.1. O que justifica a fama do Gama?

          A fama de Vasco da Gama é justificada pelo amor à pátria e pelos seus «trabalhos».



8. Estância 100

     8.1. Refira o móbil da «acção» das Tágides.

          As Tágides modevm-se em razão do amor e do gosto de louvar os feitos lusitanos.


     8.2. Explicite o apelo final do poeta.

          O poeta apela a que ninguém desista de praticar grandes feitos, visto que serão recompensados de uma maneira ou de outra.



9. Síntese

     a) Camões critica, nestas estâncias, os portugueses porque:
  • os portugueses não cultivam as Letras, ao contrário do que faziam os heróis da Antiguidade;
  • os heróis portugueses são rudes;
  • a pátria é ingrata para quem a canta.
     b) Por outro lado, destaca a importância do registo futuro dos grandes feitos como meio de
         glorificação do povo português e incentivo ao surgimento de novos heróis.

     c) Além disso, o poeta faz duas advertências:
       1.ª) se Portugal persistir em ignorar o reconhecimento, por via das Letras, dos seus feitos e heróis, no futuro não terá homens ilustres e corajosos;
       2.ª) o embrutecimento dos espíritos desmotivará futuros cantores dos feitos portugueses.

Pólos estruturadores

          A acção de Memorial do Convento estrutura-se a partir da construção de três núcleos.

          O primeiro desses núcleos refere-se ao universo dos DOMINANTES, aqueles que detêm o poder e dele fazem uso em seu proveito pessoal. É constituído pela realeza e pelo clero, mais concretamente o alto clero, que, sucessivamente, nos é retratado em termos caricaturais (por exemplo, a relação sexual entre os monarcas, ou a cena em que é descrita a fuga precipitada de um frade, apanhado, em plena relação sexual, por um marido enganado).

          O segundo diz respeito ao universo dos DOMINADOS, contemplando quer os operários que trabalham na construção do convento de Mafra - cujo trabalho denodado e sacrificado o narrador não se cansa de exaltar e, em simultâneo, condenar, por resultar da vaidade e da megalomania do rei -, quer as sequências em que são denunciados a guerra, a fome, a mendicidade, a prostituição, a criminalidade, a opressão, as desigualdades sociais, etc.

          O último núcleo engloba as situações ALTERNATIVAS, isto é, a da construção do convento e a da passarola, bem como a relação amorosa vivida por Baltasar e Blimunda.

Velho do Restelo - IV, 94-104

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