Português

terça-feira, 12 de março de 2013

Um fim nunca esperado

A figuração apresentada é um cartoon e intitula-se de “Pastores de Nuvens”. É uma das obras de um cartunista brasileiro, Ubiratan Nazareno Borges Porto ou Biratan Porto, nascido em Belém do Pará a 29 de outubro de 1950. Formou-se em publicidade na Universidade Federal do Pará, sendo atualmente cartunista profissional e bandolinista nas horas vagas. Trabalha com humor gráfico há já 30 anos, tem sete livros de humor publicados e trabalhos divulgados nos EUA, Itália, França, Bélgica e Holanda. Conquistou importantes competições de humor no Brasil e noutros países. Criou o guião e dirigiu o filme de animação em 3D “Cadê o verde que estava aqui?”. No ano de 2002, conquistou o primeiro lugar no Internacional Cartoon Festival of Knokke-Heist, realizado na Bélgica, um dos mais importantes e tradicionais concursos de humor da Europa.
A imagem é formada por vários elementos, sendo um deles o solo seco e sem qualquer vegetação, o que nos remete para um deserto. Os indivíduos presentes na reprodução são pastores de nuvens uma vez que um dos sujeitos está a “bater” numa nuvem, tal como faz o pastor quando uma ovelha se afasta do rebanho. Abaixo das nuvens encontram-se potes, que aguardam que a água neles caia. Nuvens, que se encontram escuras, não por se avizinhar uma tempestade, mas sim, provavelmente, devido a poluição existente no ar.
O cartunista Biratan Porto, com a elaboração deste cartoon tinha a intenção de criticar a falta de água que o nosso planeta atravessa e que provoca, consequentemente, a desertificação dos solos, o que impede que se possa cultivar os campos, alimentar seres racionais e irracionais, e que pode mesmo vir a finalizar a espécie humana.
Tanto no cartoon, como nos poemas de Alberto Caeiro salienta-se a importância da Natureza. Para as ambas situações a Natureza, é o mais importante, a luz dos seus olhos, daí a tratarem como única e insubstituível. No cartoon estão representados pastores, que no entanto não o são, tal como Alberto Cairo é apelidado de pastor, não porque é na realidade um pastor, mas porque ama a natureza e lhe é fiel.
Os poemas de Caeiro, além do já mencionado, mostram que o poeta aceita a dor porque é natural e tudo o que é natural é justo, e também podemos ver isto no cartoon, pois os “pastores”, em vez de se levantarem e mudarem os seus hábitos, melhorarem o ambiente e acabarem com a seca, não, estão e vão continuar a estar sentados, pois aceitam o que lhes sucede sem criticar ou tentar mudar a situação, isto é, rendem-se perante o destino. Tanto nos poemas do heterónimo de Pessoa, como no cartoon, os indivíduos não pensam nem no passado nem no futuro, Caeiro apenas se centra nas suas sensações ocasionais e no presente que o situa no momento em que vive. Os “pastores” do cartoon estão sentados sem intenção de tentar mudar o futuro, ou de olhar para o passado e ver em que erraram e descobrir o que provocou a situação apresentada, para então a conseguirem alterar. Os guardadores apenas se centram na grande necessidade de obter água naquele preciso momento.
 O título do cartoon é por sua vez, “Pastores de Nuvens”, uma vez que os pastores representados não guardam as ovelhas, como é o comum, mas sim nuvens, isto porque esperam desesperadamente que caia chuva, por mais ínfima que seja.
Com a realização deste cartoon o principal objetivo do cartunista é alertar para a falta de água que provoca a desertificação dos solos e conseguir persuadir os populares a mudarem os seus hábitos diários.

MY

segunda-feira, 11 de março de 2013

O declínio da Europa

     «A Europa vai entrar num declínio sob todos os aspectos – económico, cultural, intelectual. Aliás, se se vir a evolução das universidades na Europa, é aterradora. Não na parte das ciências exactas, mas no que era o chamado “ramo das humanidades” — e que infelizmente se passou a chamar “ciências sociais” — as universidades entraram numa decadência aflitiva. A universidade pública tem desprezado esse ramo do saber. Como é que se alimenta cultura e os valores da cultura, se se nega pertinência, validade e interesse àquilo que são saberes não científicos, mas que são saberes à mesma? Então a Guerra e Paz do Tolstoi, O Vermelho e o Negro do Stendhal, o D. Quixote do Cervantes, um trio do Schubert, a Filosofia, não interessam para nada? Todo este ramo do saber está descuidado e pervertido pelos estudos culturais e pelo pós-modernismo. Daqui vem uma ameaça à sanidade cultural do pensamento do Ocidente.(...) Há uma relação entre pós-modernismo e neoliberalismo. O neoliberalismo corrói e opõe-se à social-democracia e à democracia cristã. O pós-modernismo é a outra lei da selva, é a lei da selva no campo cultural e intelectual. Não é por acaso que surgem, alastram e invadem ao mesmo tempo. Eu sou muito conservadora, mas não subscrevo, nem nunca subscreveria, a tese de que a vida em sociedade está sujeita à lei da selecção natural dos mais fortes e que os mais fracos podem rebentar contra a parede.»

Prof. Fátima Bonifácio,  in Público

Despesas sociais em % do PIB


     Dados de 2010. Lido o gráfico, facilmente se conclui que o Estado português tem dinheiro para a Educação e a Saúde, não tem é para a Segurança Social e a Caixa Geral de Aposentações.

     Tendo em conta os cortes aplicados no ministério da Educação e Ciência desde 2010, a % do PIB gasta no setor deve situar-se na casa dos 4.

sábado, 9 de março de 2013

A origem do chá

     Por Alice Vieira

     DIZEM que foi um imperador chinês que o descobriu.
     Preocupado com longas epidemias que assolavam o império, ordenou que toda a gente bebesse água sempre fervida.
     Um dia, estava ele à sombra de uma árvore e pediu água. Lá lhe trouxeram a água a ferver, e ele teve de esperar alguns minutos, pois até mesmo quem é imperador não aguenta água a escaldar pela goela abaixo.
Enquanto esperava, não reparou que umas folhas da árvore tinham caído para dentro do copo (chávena? caneca? malga?) e a água tinha ficado um bocado para o castanho.
     O natural seria – sobretudo rodeado de epidemias por todos os lados… - que deitasse fora aquela mistela e voltasse a pedir mais água fervida, e nós nunca viríamos a saber de nada.
     Mas não.
     Ou porque a vista já não estivesse lá muito apurada, ou porque a sede fosse insuportável, ou porque – e eu aposto nesta... — pensou que a um imperador nada de mal podia acontecer, o certo é que bebeu tudo. E até gostou!

Ler mais aqui.

quarta-feira, 6 de março de 2013

'A Capoeira'


            O quadro “A capoeira” foi pintado pela artista Maria Paula Figueiroa Rego, tendo como nome artístico Paula Rego, que nasceu a 26 de janeiro de 1935, em Lisboa. O nome de “capoeira” foi atribuído pela autora por significar, segundo esta, o espaço da espera, da prisão e da ausência de perspetiva.
            O mundo interno e secreto da mulher é muitas vezes retratado. Neste quadro, esse ambiente é ricamente representado numa espécie de homenagem à gravidez que sendo uma das fases da vida exclusivamente femininas. Paula Rego recria emoções, sentimentos e receios evidenciados nesta etapa, aproveitando para igualmente retratar os pensamentos e medos que pairavam na cabeça da senhora representada no quadro.
            Neste quadro, vemos quatro personagens femininas, três das quais têm as mesmas características faciais, enquanto a restante é, pela expressão facial, mais velha. Estas três figuras representam a Amélia em três momentos diferentes da gravidez. No centro do quadro e em grande plano, vemos duas dessas personagens: a primeira encontra-se sentada e ligeiramente inclinada para a frente, o que nos indica, devido a esta posição, que a gravidez ainda está no princípio, o que é reafirmado pelo ar sonhador e calmo da personagem, parecendo que sonha com o Amaro que a virá salvar daquela “jaula” e com o filho, que será o seu libertador; a segunda figura encontra-se também sentada, mas agora num cadeirão mais confortável, com apoio para os braços e sobre a qual está recostada, deixando bem visível a barriga saliente de uma gravidez já avançada, isto, conjugado com o facto de ter uma boneca excessivamente pequena no colo, indica que o nascimento do bebé está próximo. O seu rosto já apresenta sinais de preocupação, como também simboliza o receio natural de todas as futuras mães.
            Num plano mais afastado, vemos Amélia, já de cabelo solto, a ser ajudada a levantar-se da cama depois do parto por uma mulher mais velha, a parteira. A grande referência à obra está no significado dos restantes elementos que compõem o quadro e sabendo que na obra literária original Amaro mata o seu próprio filho e Amélia acaba por morrer também, podemos ver no chão do quarto, num plano próximo do observador, um livro vermelho. À sua frente podemos ver um pombo moribundo e, sabendo que este animal é usado como correio para o transporte de notícias, entende-se que a notícia esperada ou já comunicada não é boa, será antes o aviso de morte, informação confirmada pela conjugação com a galinha morta que se encontra pendurada no canto superior esquerdo, simbolizando a morte do bebé, e da própria Amélia, como no texto original. Do ventre redondo à boneca minúscula, a tela sugere a espera e a morte do filho.
            Apesar de o nascimento de uma criança ser, supostamente, um momento de alegria, neste quadro está representado exatamente o contrário, pois, apenas vemos expressões e símbolos que nos traduzem morte, dor e tristeza.

Bibliografia:
     - http://texere.blogspot.pt/2005/01/capoeira.html
     - http://www.infopedia.pt/$paula-rego
     - http://members.shaw.ca/eduardobpinto/lilian_pagina_catorze.html
     - http://pt.scribd.com/doc/74135255/Analise-Das-Imagens
     - http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/4768.pdf
     - http://opatio.com.sapo.pt/arqmpsite/tx/educacaofamiliar_naobradepaularego.pdf

segunda-feira, 4 de março de 2013

Curado bebé infetato com SIDA

EUA Médicos curam pela primeira vez bebé infectado com sida
Pela primeira vez, um bebé infectado com o vírus da sida ficou curado, anunciaram no domingo médicos norte-americanos.
Médicos curam pela primeira vez bebé infectado com sida
Lusa
MUNDO
Trata-se do primeiro caso de uma "cura funcional", de uma criança contaminada à nascença com o VIH, transmitido pela mãe seropositiva, que desconhecia estar infectada durante a gravidez.
Para os virologistas, não se trata da erradicação do vírus, mas sim do seu enfraquecimento, de tal maneira que o sistema imunitário da criança pôde controlá-lo sem anti-retrovirais.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

"Metamorfose de Narciso"



“Metamorphose de Narcisse” é um quadro de Dali, terminado em 1937, e está exposto na Tate Gallery em Londres. Salvador Dali nasceu em maio de 1904 e desde a infância demonstrou interesse pelas artes plásticas, em 1921, entrou para a Escola de Belas Artes de São Fernando, localizada na cidade de Madrid. Porém, em 1926, foi expulso desta instituição, pois afirmava que ninguém era suficientemente competente para o avaliar.O trabalho dele chama a atenção pela incrível combinação de imagens bizarras, com excelente qualidade plástica foi um dos grandes nomes  influenciado pelos mestres do Renascimento.
 "Metamorfose de Narciso" é uma obra ambígua. Ao mesmo tempo que vemos Narciso, ele aparenta ser várias rochas, uma em cima da outra. Na mão que segura o ovo, símbolo da vida, vemos algumas marcas, como se fossem formigas, note-se que Dali tinha pavor de formigas devido a episódios da sua infância. A fenda no ovo combina com a sombra do cabelo de Narciso e também com a fissura na unha do polegar, dando à mão um caráter petrificado, surreal. Pode-se fazer uma leitura corporal, na qual cada parte do corpo tem uma correspondência emocional. Segundo essa ideia, a unha corresponde à autoconfiança do indivíduo, podendo ser considerada mais forte ou mais frágil, dependendo da constituição física. Nesse caso, e por ser o polegar simbolicamente o dedo da auto-afirmação, a fenda pintada pode ser lida como a morte da vaidade.
Além disso, pode ser ainda ligada à maneira com que Dali frequentemente se referia à sua personalidade: metade uma pessoa ordinária, metade um génio, o que reforça a ideia de que o quadro poderia  ser um auto-retrato.Na representação a  flor brota de um ovo, símbolo da germinação da vida e ao mesmo tempo do seu mistério e fragilidade. A fria e pálida magreza dos dedos de pedra faz lembrar o destino de todos os corpos sujeitos à erosão do tempo. Onde se extinguiu o dourado reflexo da vida, imergiu o solitário esqueleto, na presença do qual até o céu escurece, carregando a leveza das nuvens com uma armadura de chumbo.Mais atrás erguem-se silenciosas montanhas cuja lava arrefecida dá lugar a imponderáveis rugas de basalto.  O caminho de lama simboliza os passos do Homem e termina junto à água. À direita do quadro, no primeiro plano, existe um cão que rasga uma carne, quase uma carcaça, talvez representando a morte de algo que algum dia já foi belo.
Em conclusão, o quadro retrata a morte mas uma morte que faz brotar o novo, o belo. Aconselho toda a gente que goste de arte a apreciar esta obra, pois está muito bem concebida em termos de metáforas, e também porque é uma obra que, uma vez decifrada, nos faz refletir na vida e no nosso dia-a-dia.

Bibliografia:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Salvador_Dal%C3%AD#Biografia
http://www.artgalleryabc.com/next90.html

Maus resultados nos testes intermédios

Educação Simulação de exames nacionais no básico varrida por negativas
O alerta foi dado pelo GAVE - Gabinete de Avaliação Educacional – e mostra a tendência dos últimos anos: os alunos do ensino básico continuam com dificuldades de aprendizagem que resultam em notas negativas nas disciplinas de Português e Matemática.
Simulação de exames nacionais no básico varrida por negativas
DR
PAÍS
     Num conjunto de testes elaborados pelo GAVE, que se assemelham aos exames nacionais realizados no final do ano lectivo, foi notória a falta de preparação dos alunos do ensino básico. Segundo avança o jornal Público, a maioria dos alunos que no ano passado frequentava o 9.º ano, obteve nota negativa em seis de sete testes intermédios elaborados por aquele Gabinete.


     Alguém que explique ao sr. ministro Crato que a mera realização de exames não equivale a melhores aprendizagens e mais sucesso educativo. Nem com (mais) um corte de mil milhões no setor, perdão sector. Nem com cortes nos «curricula». Nem com cortes no horário semanal das disciplinas. Nem com (pseudo)apoios, em que o professor de Português está sujeito a ir dar apoio a disciplinas de Matemática, Química... Educação Física...

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Oscar de Música

(c) Henricartoon

O Acordo Ortográfico é uma mentira

     Eis alguns exemplos colhidos aqui que mostram que o acordo ortográfico é uma mentira política, pois não unifica a ortografia, antes a desunifica:
Pré-AO90Pós-AO90
Portugal | BrasilPortugal | Brasil
Acepção | AcepçãoAceção | Acepção
Concepção | ConcepçãoConceção | Concepção
Conector | ConectorConetor | Conector
Excepcional | ExcepcionalExcecional | Excepcional
Expectorar | ExpectorarExpetorar | Expectorar
Infecção | InfecçãoInfeção | Infecção
Intercepção | IntercepçãoInterceção | Intercepção
Perceptível | PerceptívelPercetível | Perceptível
Recepção | RecepçãoReceção | Recepção

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Análise do poema "O Infante"

         Este é o primeiro poema da segunda parte de Mensagem, o que faz todo o sentido se tivermos em conta que o Infante D. Henrique foi o impulsionador dos Descobrimentos, por exemplo ao fundar a Escola de Sagres. Daí o título do texto: embora nele se refira a aventura marítima levada a cabo pelos portugueses, foi o Infante quem desempenhou um papel crucial nessa aventura, o de protagonista, de impulsionador, o de símbolo do início da construção do império. Daí que lhe caiba o papel de protagonista da «Possessio Maris» (Posse do Mar), dedicada à gesta dos Descobrimentos. Segundo António Quadros, o Infante foi o “descobridor da ideia de descoberta”.

         O Infante D. Henrique (1394 ‑ 1460) foi o quinto filho de D. João I e de D. Filipa de Lencastre e é geralmente considerado o homem que mais decisivamente contribuiu para o impulso que levou à expansão ultramarina portuguesa. Por outro lado, ele é também, frequentemente, apresentado como símbolo das vontades e dos esforços anónimos de navegadores, cosmógrafos, mercadores e aventureiros que ajudaram o homem moderno a construir novas dimensões para a perspetiva do mundo.


Estrutura interna

. 1.ª parte (1.º verso) ‑ As três etapas que presidem à construção da obra humana, traduzidas pelo mote / aforismo «Deus quer, o homem sonha, a obra nasce».
. Duas ações ‑‑‑ a vontade divina;
‑‑‑ o sonho do homem;
efeito: o nascimento / a concretização da obra.
. Os três «sujeitos» dependem mutuamente, numa relação de causa efeito: sem a vontade do primeiro, o segundo não sonharia e a obra não poderia nascer.
. O verso, constituído por três orações assindéticas justapostas (assíndeto e gradação), organiza-se em torno de formas verbais no presente do indicativo, de aspeto durativo, exprimindo realidade, atualidade, valor de lei, uma verdade universal.

. 2.ª parte (versos 2 a 8) ‑ Desenvolvimento do primeiro verso:

1) . Desejo de Deus (agente da vontade):
. a unidade da terra, através do mar, de forma a servir de elemento de união entre os continentes e os povos, daí a existência de um conjunto de palavras e expressões que sugerem a ideia de unidade: «uma», «unisse», «não separasse», «inteira»;
. o caráter navegável do mar, para que o ser humano tivesse acesso ao conhecimento da Terra.
. A colocação das formas verbais predominantemente no pretérito perfeito do indicativo sugere que o princípio em causa foi respeitado e se concretizou.

2) . A sagração do Infante: para o cumprimento dessa missão, Deus sagrou o Infante (a decisão de se aventurar no mar tem origem divina e não num qualquer capricho humano)), isto é, predestinou-o para os grandes feitos das descobertas («… em ti nos deu sinal.» ‑ v. 10). Foi, portanto, Deus (cuja vontade é impreterível) quem quis que o Infante (= os portugueses) sonhasse dominar os mares, desvendar o desconhecido e estabelecer a comunicação entre os povos e os continentes, a nível matéria e espiritual / cultural, isto é, que desse sonho nascesse a obra dos Descobrimentos.
           Assim, o Infante é o símbolo do herói, o agente por vontade divina, destinado a criar uma obra superior.
. A forma verbal «Sagrou» encerra grande expressividade:
‑contém conotações religiosas;
‑ evoca o nome próprio «Sagres», a escola de navegação fundada pelo Infante, símbolo do início da construção do império português;
‑ remete para o caráter mítico e predestinado do Infante, o escolhido por Deus para a execução da obra, daí que possamos também falar na sua divinização;
‑ traduz o caráter providencial e iniciático das Descobertas.
. O complexo verbal «foste desvendando» (v. 4) apresenta a ação como uma continuidade, como algo que se concretizou de modo progressivo; a forma verbal «desvendando» (desvendar = revelar, descobrir, mostrar), por outro lado, remete para a ideia de revelação de algo desconhecido.
. O sujeito poético dirige-se ao Infante na segunda pessoa do singular («Sagrou-te, e foste…» ‑ v. 4); «Quem te sagrou criou-te» ‑ v. 9; «Do mar e nós em ti…» ‑ v. 10), o que traduz uma relação de proximidade e de cumplicidade.

3) . A realização da obra, a sagração:
→ o início da navegação: «foste desvendando»;
→ a descoberta das ilhas da Madeira e dos Açores até à costa africana: «E a orla branca foi de ilha em continente»;
→ a passagem do Cabo das Tormentas: «até ao fim do mundo»;
→ o mar desconhecido a partir da zona do Cabo das Tormentas: «do azul profundo»;
→ a concretização:
. a união da terra: «E viu-se a terra inteira»;
. o seu caráter súbito: «de repente»;
. o aparecimento: «Surgir»;
. a ideia de origem, de profundidade; «azul profundo»;
. a presença do sinal (já na 3.ª estrofe).
. O percurso da obra:
a unificação do mundo alicerçou-se no mar (na «orla branca»);
por mar, atingiu-se uma ilha e depois um continente;
da escuridão se fez luz («clareou»), ou seja, da ignorância se passou ao conhecimento, a civilização ocidental encontrou-se com a oriental;
e assim se atingiu, «correndo», «o fim do mundo», assim se eliminaram as barreiras e os limites;
deste modo, do mar (do «azul profundo»), «de repente», irrompeu a unificação do mundo.
. A realização da obra é sugerida por Pessoa através do recurso a diversos recursos poético estilísticos:
. a gradação: começou por desvendar «ilha(s)» e «continente(s)», chegando ao «fim do mundo» e dando assim a conhecer «a terra inteira»;
. as metáforas e as sinédoques: «desvendando a espuma», «orla branca», «clareou, correndo»;
. a perifrástica «foste desvendando»;
. o gerúndio «correndo»;
. a locução adverbial «de repente»;
. as sugestões cromáticas e luminosas;
. a aliteração do /r/;
. o verbo «desvendar», que remete para a ideia de revelação;
. os adjetivos «inteira» e «redonda» aponta para a unificação da terra, concretizando-se assim o desejo expresso no verso 2. Por outro lado, «redonda» aponta para a «esfera», o símbolo da unidade e da perfeição cósmica.

3.ª parte (3.ª estrofe) – Conclusão:
. a transposição da glória do Infante para o povo português:
‑ Deus sagrou o Infante e criou-o português;
‑ enquanto tal, simboliza o povo a que pertence, o que significa que também ele foi assinalado, predestinado, escolhido por Deus para desvendar o mar desconhecido;
. o sonho cumpriu-se: o desvendar e a unificação dos mares e a criação do império (sonho simultaneamente nacionalista e universal);
. o sonho desfez-se: o império (do Oriente) desfez-se, pertence a outro tempo;
. a pátria, presentemente, não tem desígnio;
. o apelo ao cumprimento do destino mítico de Portugal: uma nova e espiritual missão («Senhor, falta cumprir-se Portugal!» ‑ v. 12). Trata-se do apelo a um novo sonho, de cariz espiritual, visto que a dimensão material do império já foi conseguida, ou seja, falta que Portugal se cumpra como pátria e entidade nacional (notar o uso do presente do indicativo para exprimir urgência). De notar que o sujeito poético se dirige agora diretamente a Deus, apontando para o desencadear de um novo ciclo que, no fundo, constitui o regresso ao início do poema: uma nova vontade divina, um novo sonho do homem e uma nova ação / obra.

         Mas, afinal, o que falhou em todo o processo? Porque se desfez o império? Deus quis, o homem sonhou e a obra nasceu, mas uma obra efémera, perecível, como tudo o que é material e humano. A culpa não é de Deus, já que ele sagrou e destinou o Infante e o povo português ao cometimento de feitos muito acima da sua condição de mortais. Mas como ser humano limitado, não houve continuidade para o império, que se desfez, daí que Pessoa aponte para a necessidade de Portugal se cumprir integralmente, de complementar com a dimensão espiritual a materialidade do império passado, novamente sob a predestinação divina.


A ação do Infante:
‑ representa o povo português («… e nós em ti nos deu sinal.» ‑ v. 10) e «foi desvendando [descobrindo, revelando] o mar», ultrapassando dificuldades;
‑ os seus esforços foram coroados de êxito («Cumpriu-se o Mar» ‑ v. 11); fisicamente, o mundo tornou-se um, a terra tornou-se una, os povos e continentes unificaram-se;
‑ o Infante é o herói que obtém a imortalidade através do cumprimento de um dever individual e pátrio;
‑ é também o herói que busca a universalidade, daí a utilização do artigo definido no título («O Infante») e em «o homem» (verso 1) com um valor universalizante;
‑ possui um caráter divino, dado que foi o eleito, o predestinado por Deus para o cumprimento desta missão; por extensão, como é português e representa o seu povo, a sua sagração significa a divinização do homem português;
‑ a sua sagração, a sua obra, tem como consequência o acesso ao conhecimento: dos limites geográficos do planeta, do mar, de outros povos, de outras culturas.


. Tom dramático do poema:
‑ a tensão emocional resultante da visão da terra redonda surgindo magicamente das profundezas do mar;
‑ as três personagens:
. o sujeito poético, que se dirige ao Infante e interpela Deus, significando este facto a existência de um diálogo (implícito), o que está de acordo com o caráter misterioso e messiânico do poema;
. Deus;
. o Infante.


Recursos poético-estilísticos

1. Nível fónico
. Estrofes: três quadras.
. Métrica: versos decassilábicos heróicos, acentuados nas 6.ª e 10.ª sílabas.
. Ritmo predominantemente ternário, alternando com o ritmo binário.
. Rima:
. esquema rimático: abab / cdcd / efef;
. cruzada;
. consoante;
. grave e aguda;
. pobre e rica.
         A rima permite que certas palavras-chave se encontrem em posições de destaque: «nasce», «uma», «mundo», «português», «sinal», «Portugal».
. Transporte: vv. 7-8.

2. Nível morfossintático
. Verbos:
‑ presente: discurso aforístico do primeiro verso;
‑ pretérito perfeito: narração de acontecimentos passados;
‑ regresso ao presente («Falta cumprir-se Portugal») a sugerir urgência, necessidade.
         Esta sucessão presente / passado / presente sugere a dialética hegeliana tese, antítese, síntese e seu retorno.
. Adjetivos: «redonda», «inteira» ‑ designam um mundo circular, fechado, uno, todo.
. Frases curtas, correspondendo seis a um verso.
. Assíndeto: «Deus quer, o homem sonha, a obra nasce».

3. Nível semântico
. Vocabulário de conotações simbólicas:
‑ «sagrou-te»: talvez ligada à palavra «Sagres», sugere a escolha do Infante para uma missão divina («Deus quer»);
‑ o uso de maiúsculas (Mar, Império);
‑ «mar»: simboliza o desconhecido, o mistério, daí as expressões «desvendar a espuma», isto é, desfazer o mistério, descobrir, ultrapassando as dificuldades que se lhe deparam; é, pois, o traço de união de ilhas e continentes (vv. 2-3); «nos deu sinal», ou seja, dar a chave para decifrar o mistério;
‑ «espuma» (branca), «orla branca» (é o sulco de espuma deixado pelos navios portugueses; simboliza o longo percurso que tiveram de percorrer para que a empresa dos Descobrimentos se concretizasse), «clareou», «surgir» (sair das sombras, revelar-se, conhecer), «do azul profundo» (do mar imenso e profundo, é o símbolo do desconhecido, em oposição ao «clarear», que é o revelado): estas expressões sugerem a passagem do mistério para a descoberta, para o conhecimento, passagem caracterizada como repentina, espetacular, miraculosa; assim o sugere a expressão «E viu-se a terra inteira, de repente, / Surgir redonda…»;
‑ a visão da «terra redonda», surgida repentinamente, sugere a ideia de que a obra dos portugueses é a realização de um plano divino. O redondo, a esfera. É o símbolo da perfeição cósmica, da unidade (do mundo), da obra completa e perfeita que Deus quis: «Deus quer… / Deus quis que a terra fosse toda uma…»;
‑ as cores:
. azul: ligada ao mistério, ao desconhecido (o mar);
. branco da espuma vem clarear e revelar a «terra inteira, de repente»;
‑ o Infante: representa o povo português, mas também surge como o símbolo do homem universal, o herói que realizou um sonho que era vontade de Deus.
. Imagem e personificação: «E a orla branca (…) correndo, até ao fim do mundo», a sugerir a rapidez imparável das Descobertas.
. Gradação: «Deus quer, o homem sonha, a obra nasce», para explicar a lógica da relação Deus / Homem / obra. De acordo com as segunda e terceira estrofes, a obra nasceu, o mar passou a unir em vez de separar, o império cumpriu-se e desfez-se.
. Apóstrofe: «Senhor».
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