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quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Fases da produção literária de José Saramago


                De acordo com os estudiosos de José Saramago, a sua obra compreende três grandes fases: a fase da “portugalidade intensa[1], a fase universal e a fase dos romances fábula.

1.ª fase (1977-1991) – “Portugalidade intensa”:
- romances que, direta ou indiretamente, se relacionam com a cultura e com a História portuguesas;
- localização da ação no tempo e no espaço;
- recurso à nomeação de personagens.
                Esta primeira fase decorre entre a publicação de Manual de Pintura e Caligrafia, em 1977, e O Evangelho segundo Jesus Cristo (1991), abrangendo “um conjunto de romances que, direta ou indiretamente, se relacionam com a cultura e com a História portuguesas”[2]. Dela faz parte o Evangelho, pois, apesar de Portugal ser um estado laico, reconhece-se a primazia da tradição religiosa judaico-cristã.
                Trinta anos depois da publicação de Terra do Pecado, obra de que Saramago sempre procurou distanciar-se, conforme confessou a Carlos Reis em Diálogos com José Saramago, Manual de Pintura e Caligrafia aparenta ser uma “espécie de laboratório em que o autor ensaia as grandes características da sua prosa. A saber,
. a emergência de(a) M.(ulher) como mola de conhecimento,
. o ateísmo e as consequentes críticas à religião,
. o empenho ideológico,
. a mistura de subgéneros literários,
. o abandono do registo sintático-discursivo linear,
. o uso peculiar da pontuação, apesar de, no que toca a este ponto, Saramago considerar que a mudança se verifica com o romance seguinte, Levantado do Chão: “Até que, em 79, decidi que tinha de o escrever. E comecei sem nada de especial do ponto de vista formal. E, se eu tivesse continuado por aí, não teria dado com certeza nascimento ou origem ao que se pode chamar o meu modo peculiar de narrar – não quero dizer estilo. Então aconteceu-me um daqueles momentos muito belos que acontecem, quando acontecem. Aí a páginas vinte e tal, sem ter pensado nisso, começo a escrever libertando-me de toda essa história da pontuação, escrevendo como depois o livro saiu. E a tal ponto que, quando o acabei, tive de voltar às vinte e tal páginas iniciais para pô-las de acordo com o resto […]. Julgo que foi o estar a contar as histórias que me tinham sido contadas, como se estivesse a contar a quem me contou, que fez com que a narração ganhasse aquela espécie de «vou agora contar-vos, pelas minhas próprias palavras, aquilo que vocês me contaram». Sucedeu porque foi como se eu tivesse dito àqueles homens e mulheres, que eu conheci no Alentejo: «Agora sentem-se aí, que eu vou contar-vos a vossa história.”[3].
                Atente-se, relativamente à questão da pontuação, o que Saramago já havia dito em Cadernos de Lanzarote – Diário II:Todas as características da minha técnica narrativa atual (eu preferiria dizer: do meu estilo) provêm de um princípio básico segundo o qual o dito se destina a ser ouvido. Quero com isto significar que é como narrador oral que me vejo quando escrevo e que as palavras são por mim escritas tanto para serem lidas como para serem ouvidas. Ora, o narrador oral não precisa de pontuação, fala como se estivesse a compor música e usa os mesmos elementos que o músico: sons e pausas, altos e baixos, uns, breves ou longas, outras. Certas tendências, que reconheço e confirmo (estruturas barrocas, oratória circular, simetria de elementos), suponho que me vêm de uma certa ideia de um discurso oral tomado como música.”.
                Outra das razões que justifica a inserção do Evangelho nesta primeira fase tem a ver com o facto de ser possível a localização exata da ação no espaço e no tempo, algo que já não sucede com os romances Ensaio sobre a Cegueira (1995) e Ensaio sobre a Lucidez (2004). Por outro lado, o autor continua a recorrer à nomeação das personagens, um modo de as individualizar.

2.ª fase (1995-2004) – Ciclo universal:
- ressimplificação formal;
- questionação sobre “o que é ser-se humano”;
- apelo à imaginação do leitor através
. do anonimato das personagens;
. da indefinição dos espaços, o que permite sucessivas relocalizações.
                Esta fase corresponde a uma certa recusa de uma espécie de barroquismo e à necessidade maior de clareza. Esta inflexão é justificada também pelo desejo de “saber, no fundo, […] o que é isto de ser-se um ser humano […], é essa coisa tão simples e que não tem resposta: quem somos?”[4]. Deste modo, as personagens perdem o nome, os enredos são situados em espaços-tempo indefinidos (não obstantes romances que nos remetem para locais específicos, como Todos os nomes, 1997), permitindo sucessivas relocalizações, de acordo com a imaginação de cada leitor.

3.ª fase (2005-2009) – Os romances fábula:
- nova ressimplificação formal (maior obediência à sintaxe e à pontuação tradicionais);
- narrativas mas próximas do conceito de narratividade;
- predomínio de uma linha cómica, sem condicionar as preocupações ideológicas do autor.
                A nova ressimplificação formal, marcada pelos traços atrás identificados (maior obediência à sintaxe e à pontuação tradicionais, delinear de uma narrativa mais próxima do conceito de narratividade), é caracterizada, sobretudo, pela linha cómica que Saramago introduz nas suas obras, o que não invalida, porém, a manutenção das suas preocupações ideológicas que perpassam o seu trabalho. Essa veia crónica não é, todavia, um exclusivo desta 3.ª fase, pois já se encontra em romances como Memorial do Convento, Todos os Nomes ou A Jangada de Pedra, seja através da presença de um tom caricatural e cómico, seja através da introdução de episódios, comentários ou alusões que tendem a suavizar o tom predominantemente grave das narrativas. No entanto, parece claro que o tom predominante em José Saramago é essencialmente sério, recolhido, marcado pelo pessimismo e pelo desalento, em conexão com as suas preocupações de índole humanista e humanitária.


Bibliografia:
. O Ano da Morte de Ricardo Reis, Ana Paula Arnaut;
. Diálogos com José Saramago, Carlos Reis;
.



[1] Cristopher Rollason (“Saramago and Orwell”, in Adriana Alves de Paula Martins & Mark Sabine (eds.), In Dialogue with Saramago: Essays in Comparative Literature). Ver, a propósito, Ana Paula Arnaut, José Saramago, Lisboa: Edições 70, pp. 40-43.
[2] Ana Paula Arnaut, O Ano da Morte de Ricardo Reis.
[3] Ana Paula Arnaut, O Ano da Morte de Ricardo Reis.
[4] Entrevista a Jefferson del Rios, Beatriz Albuquerque e Michael Laub, “A terceira palavra”, in Revista Bravo (São Paulo).

'O Ano da Morte de Ricardo Reis' - Ficha de leitura (capítulos IV-VII)

VERSÃO 1

Assinala como verdadeira (V) ou falsa (F) cada uma das afirmações.
1.    O ministro da Instrução, citado nos jornais, afirma que «Salazar é o maior educador do nosso século».
2.    O primeiro-ministro do Estado Novo era também ministro da Agricultura.
3.    O segundo encontro de Reis com Pessoa dá-se no café Martinho, perto do Tejo.
4.    Um dia, no hotel, Reis prende por instantes o braço de Lídia, o que o deixa muito perturbado.
5.    No dia em que Ricardo Reis confessou que a achava muito bonita, começou a relação de amor entre os dois.
6.    A rapariga chorou, ao engomar o fato que Reis iria usar para ir ao teatro.
7.    Por coincidência, o protagonista encontrou Marcenda e o pai no Teatro Nacional.
8.    Os operários de uma fábrica estiveram presentes naquele espetáculo.
9.    A visita de Fernando Pessoa, nessa noite, provoca-lhe alguma contrariedade, pois esperava a companhia de Lídia.
10.   Os dois conversaram sobre verdade e fingimento.
11.   Num jantar, Marcenda contou a Reis que a mão ficara paralisada quatro anos antes.
12.   O médico acaba por lhe perguntar se ela não pode ou não quer mexer a sua mão.
13.   O Dr. Sampaio, convicto salazarista, recomendou a Reis o livro A Revolução.
14.   A sua leitura provoca a Reis o comentário: «Que estupidez».
15.   Os jornais reproduzem um discurso de Hitler, no qual este assegura o compromisso da Alemanha com a paz.
16.   A referência às colónias portuguesas é pretexto para uma reflexão sobre o Quinto Império.
17.   Reis assiste ao cortejo fúnebre de um homem morto a tiro, onde muita gente se vestia de vermelho.
18.   Esse traje provocatório originou uma rixa a custo dominada pela polícia.
19.   A vitória da esquerda nas eleições espanholas foi assunto da conversa num dos encontros com Pessoa.
20.   Na noite de Carnaval, Reis persegue um vulto, mascarado de morte.
21.   O hotel Bragança, entretanto, enche-se de exilados franceses.                                                                              



VERSÃO 2

Assinala como verdadeira (V) ou falsa (F) cada uma das afirmações.
1.    O primeiro-ministro do Estado Novo português era também ministro da Indústria.
2.    O seu ministro da Instrução defendia que os primeiros anos de ensino deviam proporcionar amplos conhecimentos.
3.    O segundo encontro com Pessoa aconteceu numa esquina da cidade.
4.    Chovia e ambos passearam, cada um com o seu chapéu, em direção ao rio.
5.    Depois de ter enlaçado a mão de Lídia, Reis sentiu uma intensa perturbação.
6.    No dia seguinte, ele disse-lhe que a achava muito bonita e a sua relação de amor começou.
7.    Por Salvador, Reis sabe que Marcenda e o pai iriam ao Teatro Nacional.
8.    Durante a peça, a atenção do protagonista dividiu-se entre a observação da jovem e o que se passava no palco.
9.    No final, aceitou a oferta de regressar ao hotel de táxi com o Dr. Sampaio e a filha.
10.   O teatro funcionava como um dos instrumentos de propaganda do Estado Novo.
11.   O terceiro encontro com Pessoa acontece na mesma noite.
12.   Fernando Pessoa reage ironicamente à confissão de Reis, de que espera companhia.
13.   Mais tarde, Marcenda conta a Reis que a sua mão esquerda ficara paralisada após a morte da sua mãe.
14.   Na sequência dessa conversa, o Dr. Sampaio pergunta a Reis se não poderia tratar a filha.
15.   Um livro recomendado a Reis pelo notário é de teor propagandístico, promovendo o Estado Novo.
16.   Os jornais reproduzem a posição inglesa, favorável à entrega de colónias portuguesas à Alemanha e à Itália.
17.   O protagonista assiste ao funeral do «Mouraria», vítima de um rival, pelos amores de uma fadista.
18.   No cortejo fúnebre, desfilaram prostitutas e criminosos, vigiados por um contingente policial.
19.   No quarto encontro, Pessoa diz a Reis que iria mascarar-se de morte, no Carnaval.
20.   A vitória da esquerda, nas eleições espanholas, enche o hotel de novos hóspedes.
21.   O protagonista inquieta-se com a instabilidade política no país vizinho.


As autoras do Novo Plural 12
Elisa Costa Pinto 
Paula Fonseca 
Vera Saraiva Baptista



. Correção da ficha [correção].

Tom Sawyer - Episódio 43: "Vi um cavalo branco"

'O Ano da Morte de Ricardo Reis' - Ficha de leitura (cap. I-III)


VERSÃO 1

Assinala como verdadeira (V) ou falsa (F) cada uma das afirmações.
1.    A primeira epígrafe do romance é da autoria de Ricardo Reis e diz «Sábio é o que se contenta com o espetáculo do mundo».
2.    O protagonista desembarca em Lisboa numa manhã de outono.
3.    O nome do protagonista é revelado quando este sai da alfândega.
4.    No Tejo, avistam-se navios de guerra portugueses.
5.    O taxista sugere ao viajante o hotel Central, por ficar perto do rio.
6.    O ano da morte de Ricardo Reis é o ano de 1935.
7.    No dia a seguir ao da sua chegada, Reis vai ao cemitério dos Prazeres, onde Pessoa fora sepultado.
8.    Ele conhece Lídia quando a rapariga lhe leva o pequeno-almoço.
9.    Saber o nome dela provoca em Reis um sorriso irónico e o desejo de escrever uma nova ode.
10.   É no segundo jantar no hotel que o protagonista vê a rapariga magra.
11.   Pelo gerente, ele sabe que ela e o pai viviam em Coimbra.
12.   Num passeio por Lisboa, Reis detém-se junto à estátua de Eça de Queirós.
13.   A estátua mais vezes referida, porém, será a de Luís de Camões.
14.   Na Rua do Diário de Notícias, o protagonista é surpreendido por uma multidão de miseráveis.
15.   Juntavam-se mais de mil pobres, à espera do bodo.
16.   Na noite da passagem do ano, os lisboetas enchiam as ruas de coisas velhas, que deitavam pelas janelas.
17.   Como estava combinado, Fernando Pessoa visita Ricardo Reis, no início do novo ano.
18.   Reis fora informado da morte de Pessoa por um telefonema de Álvaro de Campos.
19.   Fernando Pessoa informa Reis de que só ele o pode ver.
20.   Informa-o, também, de que poderão continuar a encontrar-se durante nove meses.
21.   Ao despedir-se, deseja-lhe «Feliz ano novo» e Reis retribui.





VERSÃO 2

Assinala como verdadeira (V) ou falsa (F) cada uma das afirmações.
1.    A primeira epígrafe do romance é da autoria de Ricardo Reis e diz «Sábio é o que se interroga perante o espetáculo do mundo».
2.    O protagonista desembarca em Lisboa numa tarde de inverno.
3.    No desembarque, o viajante encontra uma cidade sombria e silenciosa.
4.    No Tejo, avistam-se couraçados ingleses.
5.    O viajante pede ao taxista que o leve ao hotel Bragança.
6.    Um cavaleiro medieval decorava o corrimão, na entrada do hotel.
7.    É no primeiro jantar no hotel que Ricardo Reis avista Marcenda.
8.    Pelo gerente, ele sabe que Marcenda e o pai viviam no Porto.
9.    O ano da morte de Ricardo Reis é o ano de 1936.
10.   A visita ao cemitério onde Pessoa fora sepultado provoca lágrimas saudosas em Ricardo Reis.
11.   A voltar para o hotel, Reis percorre locais de Lisboa, entre os quais a Rua dos Douradores, onde Bernardo Soares vivia.
12.   A referida passagem dá lugar a uma relação intertextual com a «Ode marítima».
13.   Reis chama uma criada, para limpar o chão do seu quarto, e é então que conhece Lídia.
14.   Noutro passeio por Lisboa, Reis lembra versos antigos, alheando-se da realidade que o rodeia.
15.   Lê, também, os versos inscritos no pedestal da estátua de Luís de Camões.
16.   Na Rua do Século, depara-se com uma multidão de miseráveis, mais de mil, que iam receber esmola.
17.   Na noite da passagem do ano, Ricardo Reis volta a ver Marcenda.
18.   Ainda na mesma noite, mas já no novo ano, recebe a visita de Fernando Pessoa.
19.   Reis fora informado da morte de Pessoa por um telegrama de Álvaro de Campos.
20.   Fernando Pessoa informa que irão poder encontrar-se durante meio ano.
21.   Diz-lhe, também, que teve o cuidado de que ninguém o visse entrar.

As autoras do Novo Plural 12
Elisa Costa Pinto 
Paula Fonseca 
Vera Saraiva Baptista




. Correção da ficha [correção].

sexta-feira, 3 de agosto de 2018

O verbo «tar» (mais uma vez)


Eu tou
Tu tás
Ele tá
Nós tamos
Vós tais
Eles tão

     Isto é o que qualquer aluno mediano produz quotidianamente, mas, quando o próprio Presidente da República, ilustre ex-docente do ensino superior, passa o tempo a conjugar este novel verbo... vamos julgar o pobre do aluno? Já agora, o pobre do jornalista?

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