Português

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Texto argumentativo - Tipologia

     São diversos os momentos e as circunstâncias em que nos socorremos do protótipo textual argumentativo.
     Exemplificam-no o artigo de apreciação crítica, o artigo de opinião, o texto de reflexão, a dissertação, o comentário, na forma escrita.
     Na oralidade, encontramos o debate, a participação numa campanha eleitoral, um discurso político, uma alegação judicial.

Definição de texto argumentativo

     Um texto argumentativo é aquele que visa convencer, persuadir ou influenciar o «outro» do nosso ponto de vista, cuja veracidade se demonstra e prova. Como?
            Argumentar significa defender uma ideia ou uma opinião, alegando um conjunto de razões que justifiquem o nosso posicionamento. A argumentação é o desenvolvimento de um raciocínio com o fim de defender ou repudiar uma tese ou um ponto de vista, para convencer um oponente, um interlocutor circunstancial ou a nós próprios. A argumentação desenvolve-se em função de um destinatário, perante o qual argumentamos para o persuadir, dado não partilhar os mesmos pontos de vista ou as mesmas convicções que nós possuímos.
            Começamos por apresentar o nosso ponto de vista – a tese –, a partir da qual desenvolveremos o nosso raciocínio, a argumentação, constituída por um conjunto de argumentos logicamente encadeados, sustentados em provas e ilustrados e credibilizados a partir de exemplos.
            O texto argumentativo é tão antigo como o próprio Homem, uma vez que argumentar, ou seja, construir um texto (oral ou escrito) com base em argumentos logicamente encadeados está indissociavelmente ligado à actividade humana. Argumentar, persuadir, convencer empregando o rigor e a objectividade sempre fizeram parte do discurso humano, desde que o Homem começou a conviver, usou a palavra como meio de dar a conhecer aos outros as suas mundividências e como forma de convencer o(s) outro(s). A argumentação assume uma importância vital na vida do homem, que faz uso dela para justificar pensamentos, comportamentos, para persuadir os outros do seu ponto de vista, para influenciar o comportamento dos outros, como base para a tomada de decisões.
            Sócrates, filósofo grego (470-400 a.C.), Aristóteles, filósofo grego (384-322 a.C.), Cícero, o mais eloquente dos oradores romanos (106-43 a.C.), constituem talvez os “argumentadores” mais famosos da História da Humanidade. Os dois primeiros criaram mesmo escolas de argumentação. Aristóteles definiu a argumentação como a «arte de falar de modo a convencer».
            Toda a arte tem as suas normas e a argumentação não foge à regra. As suas etapas são:
. encontrar o problema;
. procurar os argumentos e os contra-argumentos;
. dispô-los adequadamente;
. usar as figuras de estilo que mais agradam;
. formular juízos de valor;
. etc.
            As qualidades principais do discurso argumentativo são o rigor, a clareza, a objetividade, a coerência, a sequencialização e a riqueza lexical.
            Para que a argumentação seja correcta, os raciocínios devem estar sujeitos às leis da lógica; daí que a argumentação do padre Vieira se baseie por sistema na Sagrada Escritura.

A argumentação

1. Quando usamos a argumentação?

     No nosso quotidiano, uma parte apreciável dos atos de comunicação possuem um caráter argumentativo, seja para defender um ponto de vista, uma opinião, seja para apresentar uma solução para um problema, para convencer os outros a aceder a um pedido nosso, etc.
     Argumentar é um ato de inteligência que, para ser eficaz, implica a obediência a um conjunto de regras.


2. O que é argumentar?

     Argumentar é expressar um ponto de vista, uma opinião, uma convicção, de forma a convencer e persuadir o ouvinte/leitor/interlocutor. Para que tal suceda, é necessário apresentar e desenvolver um raciocínio lógico, claro, coerente e convincente, bem sustentado em argumentos sólidos e exemplos verdadeiros.

     Por outro lado, argumentar é persuadir racionalmente, embora nem toda a persuasão seja racional. Se pensarmos na cena II do ato I da peça Frei Luís de Sousa, constataremos que D. Madalena de Vilhena, sobretudo na parte final do seu diálogo com Telmo Pais, em desespero de causa, recorre a «argumentos» emocionais para persuadir o velho aio de continuar a atormentá-la e a D. Maria com os seus constantes agouros em torno do regresso de D. João de Portugal. Algo de parecido sucede com a publicidade, quando pretende levar o consumidor a adquirir um determinado produto, não pelas suas qualidades, mas pela sua associação a um determinado modo / estilo / padrão de vida a que teremos acesso através da sua aquisição.
     Em suma, quando argumentamos racionalmente, apelamos à razão; quando argumentamos emocionalmente, dirigimo-nos às emoções, aos sentimentos, aos desejos, às frustrações, etc., do nosso interlocutor.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Texto de reflexão: "A crise económica atual - causas e soluções"

. INTRODUÇÃO

. TESE: Portugal vive um clima de austeridade por razões endógenas e exógenas.

. DESENVOLVIMENTO - ARGUMENTAÇÃO

     . Argumento 1) A corrupção em Portugal.
          . Exemplo 1) Os desvios de dinheiro: nas estradas, nas obras públicas...

     . Argumento 2) A adesão ao Euro.
          . Exemplo 2) A baixa da taxa de juros levou à expansão da despesa pública.

     . Argumento 3) Pouca produtividade interna.
          (Falta o exemplo)

     . Argumento 4) Adoção de medidas que aprofundam a crise.
          . Exemplo 3) Corte nos salários e subsídios dos trabalhadores.
          . Exemplo 4) Empobrecimento generalizado.
          . Exemplo 5) Aumento das falências de empresas.
          . Exemplo 6) Aumento do desemprego.
          . Exemplo 7) Maior desconfiança dos mercados conduz ao aumento dos juros.

     . Argumento 5) Subida da inflação.
          . Exemplo 8) Aumento do IVA na restauração, na cultura...


. CONCLUSÃO

     Soluções:
          1.ª) Cortes na despesa pública e diminuição do número de funcionários públicos.
          2.ª) Dinamização das exportações.
          3.ª) Diminuição das importações.
          4.ª) Melhoria da gestão dos dinheiros públicos.
          5.ª) Emigração.
          6.ª) Auto-emprego.
          7.ª) Recuperação da banca.

Comparação entre D. Madalena e Inês de Castro

     Desde logo, a leitura do episódio de Inês de Castro, de Os Lusíadas, insinua em D. Madalena o drama de um segundo casamento realizado sob a velada ameaça de que D. João de Portugal não tivesse morrido. De facto, estamos perante duas personagens para quem a felicidade não foi total, desde logo por intervenção do Destino. No caso de Inês, essa felicidade foi, sobretudo, breve, culminando com a sua morte. A interrupção da leitura feita por D. Madalena, precisamente nos dois versos que sugerem a efemeridade desse sentimento, remete para a semelhança entre os dois casos.
     D. Madalena procura estabelecer um confronto entre a situação de Inês, feliz "naquele ingano de alma ledo e cego / que a Fortuna não deixa durar muito" - felicidade que, em seu entender, não se mede pela duração, mas pela intensidade ("Viveu-se, pode-se morrer") -, e a sua situação: procura a felicidade pessoal, mas não a consegue alcançar pelos contínuos terrores que a perseguem, isto é, pelos remorsos de consciência moral, recalcada e abafada, mas viva e atuante.
     Por outro lado, antevemos aqui as imagens de duas figuras femininas pecadoras por amor-paixão que, embora diferentes nas suas circunstâncias e motivações, se acabam por sobrepor e ajustar.
     Em terceiro lugar, Inês de Castro representa a heroína trágica no amor, na beleza, na desventura e na morte. D. Madalena é igualmente trágica no amor, na beleza, na desventura e no desfecho infeliz que a destrói, não físicamente como aquela, mas psicologicamente. Ambas são perseguidas pelo Destino, inexorável e cruel, que as irmana na paixão impossível, embora por razões diversas. No entanto, há uma diferença entre as duas situações: a apaixonada de D. Pedro I ainda teve um "ingano de alma", ou seja, um momento de felicidade, ainda que fugaz, enquanto a esposa de Manuel de Sousa nem a esse breve "ingano" teve direito, o que faz com que deseje a felicidade, mesmo que de curta duração, após o que morreria feliz.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Neologismos?

     Três novas palavras, ainda não contempladas, de tão recentes, pelo Acordo Ortográfico:
  • porquausa (= por causa);
  • queram (= que eram);
  • fazas (= faças).

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

domingo, 20 de novembro de 2011

D. João de Portugal

     Filho do conde de Vimioso, D. João de Portugal era um nobre que acompanhou D. Sebastião a Alcácer Quibir, onde, supostamente, terá falecido ("... que Deus tenha em glória?"). Casou com D. Madalena de Vilhena, que muito amava ("Queria-vos muito...") algum tempo antes de partir para o Norte de África. Sobre ele, pouco sabemos até entrar em cena no final do ato II, além de ser um "... espelho de cavalaria e gentileza, aquela flor dos bons...".
     À semelhança de outras personagens, o seu nome de batismo é bíblico, pois evoca o nome do apóstolo João. Por outro lado, é também, desde a época em que decorrem os acontecimentos, o nome de um tipo literário tão do agrado dos românticos: o D. Juan.

Telmo Pais

     Telmo Pais era o aio fiel e honesto de D. João de Portugal que se manteve ao lado de D. Madalena após o desaparecimento daquele, em cuja morte não acredita, daí os seus constantes agouros e profecias, que aterrorizam D. Madalena ("... tenho cá uma coisa que me diz que, antes de muito, se há-de ver quem é que quer mais à nossa menina, nesta casa...") e a afirmação de que o seu senhor continua a ser D. João ("... não sei latim como o meu senhor... quero dizer, como o Sr. Manuel de Sousa Coutinho...").
     Religioso e crente, manifesta a sua adesão às ideias reformistas em voga na época, ao condenar o uso do latim na Bíblia, uma posição protestante.
     Amigo de Maria, ama-a profundamente e possui grande ascendente sobre ela e sobre a mãe ("... tu tomaste (...) um ascendente no espírito de Maria..."), embora inicialmente a tivesse rejeitado ("... era uma criança que eu não podia..."). Presentemente, pretende amá-la mais do que os próprios pais ("... que lhe quero mais do que seu pai.").
     Experiente em razão da sua idade avançada, fiel e honesto ("... o aio fiel de meu senhor D. João de Portugal."), foi "carinho e proteção, e amparo" de D. Madalena quando esta ficou viúva. Todavia, não aprova o segundo casamento e atormenta-a constantemente com os seus agouros, presságios, acusações e insinuações, configurando a lembrança viva e permanente do remorso recalcado na consciência dela. Neste contexto, é significativa a alusão à carta de D. João de Portugal, escrita na madrugada da batalha de Alcácer Quibir, onde afirmava o seguinte: "Vivo ou morto, Madalena, hei de ver-vos pelos menos ainda uma vez neste mundo.".  Por outro lado, atormenta D. Madalena com «ciúmes póstumos», por conta de D. João, o que explica as prevenções de Telmo relativamente a Manuel de Sousa e a sua aversão inicial por Maria.
     É, claramente, sebastianista, por duas razões: crê no regresso de D. Sebastião e acredita que o seu antigo amo não morreu. O único momento em que vacila, na cena II do ato I, é aquele em D. Madalena, desesperada, o atinge evidenciando a contradição que o marca e que provocará a fragmentação da sua alma: pretendendo ser tão amigo de Maria, sustenta uma crença (a do regresso de D. João) que, a concretizar-se, significará a morte dela.
     Note-se que Telmo, desde o início da ação, desempenha a função de coro das tragédias gregas: alimenta o sebastianismo, anuncia desgraças próximas, profere contínuos agouros e alimenta a presença de um passado, um tempo que D. Madalena quereria morto e enterrado, mas que não consegue - ou não a deixam.
     

Manuel de Sousa Coutinho

     Manuel de Sousa, o segundo esposo de D. Madalena, é um fidalgo ("... fidalgo de tanto primor, e de tão boa linhagem..."), um nobre culto que sabe latim ("... acabado escolar é ele."; "... o retrato daquele gentil cavaleiro de Malta que ali está..." - o ingresso na Ordem de Malta era limitado aos membros da aristocracia, aos quais se exigia certificado de nobreza). De acordo com Telmo, é um "guapo cavalheiro, honrado fidalgo, bom português...").
     O seu nome é bíblico. Com efeito, «Manuel» é um dos nomes do Messias (Emanuel) e significa «Deus connosco», significado que se aplica, como uma luva, à personagem dada a boa fé com que se casou com D. Madalena, viúva, e a tranquilidade e a paz de espírito que daí lhe advinha, revela em cinco aspetos: a resposta aos melindres de Madalena por ter de regressar ao palácio onde vivera com D. João (I, 8); a vivência cristão da graça de Deus pela contrição do coração (II, 3); o contentamento de viver e conviver com os frades de S. Domingos como de portas a dentro; o desapego dos bens materiais ("... coisas tão vis e tão precárias..."); o desapego pela própria vida ("... vida miserável que um sopro pode apagar." - I, 11).
     De acordo com as palavras insuspeitas de Telmo, Manuel de Sousa é um "fidalgo de tanto primor e de tão boa linhagem, como os que se têm por melhores neste reino em toda a Espanha..." e "... um guapo cavalheiro, honrado fidalgo, bom português...".

D. Maria de Noronha

     Personagem nobre (a designação de "dona" e o apelido "Noronha", que indicia alta estirpe), tem 13 anos, mas é precoce ("Tem treze anos feitos (...) está uma senhora..."; "... em tantas outras coisas tão altas, tão fora de sua idade, e muitas de seu sexo também..."; ".. em tantas outras coisas tão altas, tão fora de sua idade, e muitas de seu sexo também..."; "Compreende tudo! (...) Mais do que convém."). O seu nome evoca o da Virgem Maria: é pura e angélica (Madalena e Telmo apelidam-na constantemente de "anjo") - é a mulher-anjo dos românticos.
     Filha única, manifesta um espírito vivo ("... uma viveza, um espírito..."), é generosa (".... que coração!") e muito curiosa ("... aquela criança está sempre a perguntar, a querer saber..."), mas extremamente frágil / débil fisicamente ("... não é uma criança... muito... muito forte.").
     Muito precoce, quer física, quer psicologicamente, possui uma imaginação e uma curiosidade muito férteis e pouco próprias da sua idade. Ela própria afirma que pensa muito ("... passo noites inteiras em claro a lidar nisto..."; "... a pensar em tudo...") e afirma que tem sonhos estranhos e que lê nos olhos e nas estrelas. Intuitiva, possui um conhecimento íntimo de si que escapa aos familiares ("O que eu sou... só eu o sei, minha mãe... E não sei, não: não sei nada, senão que o que devia ser não sou..."). Não será casualidade o facto de o tio Frei Jorge lhe chamar, em dado passo da obra (cena 5, ato I), Teodora, nome que significa «sábia».
     Juntamente com Telmo, constitui a dupla de sebastianistas da peça e é uma espécie de porta-voz da sabedoria popular: "Voz do povo, voz de Deus". Tem interesses culturais: lê novelas de cavalaria e romances populares. Deixa transparecer um caráter varonil, revelado no desejo de ter um  irmão ("... um galhardo e valente moço capaz de comandar os terços de meu pai...") e no desejo de resistência aos governantes (cena V, ato I), do qual transparece todo o seu idealismo e patriotismo: "Fechamos-lhe as portas. Metemos a nossa gente dentro e defendemo-nos." (cena VI). Defende o povo e insurge-se contra as injustiças sociais de que ele é vítima: "Coitado do povo!"; "... onde a miséria fosse mais e o perigo maior, para atender com remédios e amparo aos necessitados.".
     Na relação com a mãe, ressalta a bondade e a ternura com que a trata e o sofrimento que sente quando observa a tristeza e a angústia de Madalena, que não compreende. Noutro momento, quando manifesta a tristeza que sente ao ver as flores murchas, revela toda a sua sensibilidade doentia.
     Em suma, Maria de Noronha possui os traços essenciais da chamada heroína romântica:
          . os ideais de liberdade;
          . a exaltação de valores de feição popular;
          . a atração pelo mistério;
          . a intuição;
          . a doença da época - a tuberculose -, cujos sintomas conhecemos desde cedo:
                    - a febre;
                    - as mãos que queimam;
                    - as rosetas nas faces;
                    - a audição a grandes distâncias (cena 6, ato I).
     Note-se que a doença de Maria favorece, ao longo da obra, a sua extraordinária fantasia e a morte no final.

sábado, 19 de novembro de 2011

D. Madalena de Vilhena

     No monólogo que abre o ato I, encontramos D. Madalena, uma mulher nobre (observe-se o tratamento de «D.», dirigido na época às senhoras dessa classe social), só, lendo Os Lusíadas - o que faz dela uma mulher culta -, mais concretamente o episódio de Inês de Castro. Os versos que lhe morrem nos lábios ("Naquele ingano d'alma ledo e cego, / que a fortuna não deixa durar muito...") deixam-na meditabunda e conduzem à expressão, através da sua fala, da tristeza, da angústia, da infelicidade, da insegurança e da infelicidade que a afligem. Toda a sua sensibilidade e fragilidade ficam vincadas quando a própria personagem afirma que vive cheia de medo e continuamente aterrorizada ("... este medo, estes contínuos terrores, que ainda me não deixaram gozar um só momento de toda a imensa felicidade que me dava o seu amor."). Ora, esta última fala deixa transparecer a imagem de uma mulher que ama e é correspondida, porém, ainda assim, vive infeliz: "Oh! que amor, que felicidade... que desgraça a minha!". Qual a causa, então, dessa infelicidade e dos terrores que a devastam?
     Embora ainda não o saibamos apenas pelo conteúdo desta cena inicial, ao longo da obra ficaremos a saber que o estado de espírito de D. Madalena se prende ao receio de que o primeiro marido, supostamente morto em Alcácer Quibir, ainda esteja vivo e regresse, cobrindo-a e à família de vergonha
     Ainda no monólogo, há a salientar a comparação entre as duas figuras femininas que o dominam e que, desde logo, pela tragédia que vitimou Inês de Castro, permite antecipar, enquanto presságio, a desgraça que atingirá D. Madalena, à semelhança do que sucedeu com a primeira. Note-se, porém, que, de acordo com a referida comparação, a situação de D. Madalena é «pior». De facto, enquanto Inês de Castro teve "paz e alegria", ainda que por breves instantes, a esposa de Manuel de Sousa vive em constante desassossego e contínuos terrores, sem conseguir "gozar um só momento de toda a imensa felicidade" que lhe podia dar o amor pelo marido.
     No início da cena II, surge em cena receosa e hesitante no que dizer a Telmo ("Olhai, Telmo, eu não vos quero dar conselhos..."). Ficamos a saber que casou muito jovem e que nutre grande respeito por Telmo, embora critique o ascendente que este possui sobre si e sobre Maria, pedindo-lhe que não insista nesse ascendente ("... não fales com ela desse modo, nessas coisas."). Vive atormentada e aterrorizada pelo passado e pelos agouros de Telmo ("... não entre,os com os teus agouros e profecias..."; "E de passados também...").
     Casou, pela primeira vez, com D. João de Portugal, muito jovem, tendo enviuvado pouco depois, com a singela idade de 17 anos. Nos sete anos seguintes, procurou exaustivamente D. João durante 7 anos, não se poupando a esforços ou gastos de dinheiro. Tendo em conta que a filha do segundo casamento tem, agora, 13 anos, podemos concluir que D. Madalena terá cerca de 38 anos. De facto, a batalha de Alcácer Quibir ocorreu há 21 anos, tinha ela 17; o seu segundo casamento deu-se 7 anos depois, teria ela 24; está casada há 14.
     Desde o início da peça, concluímos que vive constantemente atormentada e aterrorizada pelo passado e pelos agouros de Telmo, que lhe mantêm o passado bem vivo na memória, ou seja, a dúvida de que D. João não morreu e pode regressar a qualquer momento. E, na verdade, o velho aio não se poupa a esforços e recorda-lhe continuamente essa espada de Dâmocles que ela tem pendente sobre a cabeça: atente-se na forma como ele justifica as suas crenças, rememorando a carta escrita pelo seu amo, na véspera da batalha, na qual afirma que vivo ou morto, ainda haverá de voltar a ver a esposa.
     Mas ela própria contribuiu para o seu remorso e a consciência de viver em pecado, pois, além de não ter a certeza da morte de D. João, nunca o amou, embora o tenho respeitado sempre e lhe tenha sido fiel. Em contraste, ama profundamente Manuel de Sousa, dado visível na preocupação que manifesta com o tardar do seu regresso de Lisboa na última fala da cena II. Nesta, é também visível a tendência para o devaneio que a marca e que está de acordo com a sua tendência romântica e a extrema sensibilidade da sua alma.

Didascália inicial (acto I)


     O espaço onde decorre o ato I é um espaço colorido, iluminado pela luz que entra pelas duas amplas janelas voltadas para o rio Tejo (voltado para o exterior, portante) e ricamente decorado, ressaltando o luxo, a riqueza e a modernidade.
     Este espaço, por outro lado, contribui para a caracterização das personagens pois, simbolicamente, representa a liberdade e a felicidade (aparente) que ainda se fazem sentir, visto que a tragédia ainda não se abateu sobre a família.
     Simultaneamente, permite concluir que se trata da casa de uma família com um elevado estatuto social e económico.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

O Barroco na Literatura

1. O Barroco

          Dá-se o nome de Barroco ao estilo artístico que nasceu na Itália, nos finais do século XVI, e que, até meados do século XVIII, se desenvolveu na Europa, na América do Sul e nas colónias portuguesas do Oriente. Considerado o estilo mais conforme à Contrarreforma da Igreja de Roma e ao absolutismo, caracteriza-se pelo esplendor e pela exuberância.

          Na verdade, poderemos apresentar três causas para o aparecimento e desenvolvimento deste movimento artístico. Em primeiro lugar, a Contrarreforma na igreja católica, que pretendeu criar nos crentes uma exaltação religiosa, através do deslumbramento provocado pelas igrejas exuberantemente ricas e decoradas. Em segundo lugar, a adesão dos papas e dos soberanos europeus a um estilo artístico que, pela sua exuberância, exaltava o seu poder absoluto, através da grandiosidade excessiva dos palácios recheados de obras de arte e de decoração. Finalmente, a insatisfação dos artistas, por natureza seres insatisfeitos, que desejavam manifestar a sua rebeldia contra os limites da arte do Renascimento, cansados que estavam do equilíbrio, da harmonia e da simplicidade racional da Renascença.


2. Antecedentes


          A passagem do Renascimento para o Barroco processou-se através de um movimento designado por Maneirismo, que é um estilo italiano do século XVI, caracterizado por um certo culto da forma, por conceitos subtis, por um sentido negativo da vida, pelo desejo de obter efeitos emocionais, recorrendo a movimentos e jogos de contrastes.
          O vocábulo maneirismo teve origem no vocábulo italiano maniera, donde procede manierismo, termo muito usado pelos tratadistas e críticos de arte italianos da segunda metade do século XVI, com o significado de estilo de um artista -  a maniera de Rafael ou de Miguel Ângelo - ou de estilo de uma época ou de uma nação (maniera greca, maniera bizantina). Assim, os artistas que se preocupavam acima de tudo com a maneira ou que se esforçavam por imitar a maniera di Michelangelo foram naturalmente chamados maneiristas.
          Cronologicamente, os maneiristas nasceram entre 1525 e 1580, enquanto os barrocos nasceram cerca de oitenta anos depois.
          Este estilo veio da transformação dos valores formais do Renascimento. De facto, no século XVI, os escritores, saturados da imitação dos modelos clássicos, sem romperem definitivamente com eles, enveredaram por um caminho mais individual, com maior liberdade de imaginação. Foi a este modo de escrever que se chamou Maneirismo. Os temas prediletos deste estilo foram os que acentuavam as naturais limitações do Homem na Terra, a dor, o desengano da vida, a fugacidade do tempo. Por outro lado, sobressai o gosto pelas metáforas ousadas, pelas antíteses e pelas «agudezas verbais».
          A tendência para o exagero avoluma-se no século XVII, dando origem a uma literatura (e a uma arte) bem identificada e afastada do Classicismo primitivo. Para esta situação contribuíram vários fatores:

  • A partir de Copérnico, a Homem soube pela astronomia como estava longe de ter abrangido o espaço geográfico do cosmos. O tempo (milhões de anos-luz) surgiu-lhe concomitantemente com o infinito. Sentiu-se então demasiado pequeno para dominar a Natureza.
  • Depois da revolta de Lutero, as lutas religiosas e políticas semearam por toda a parte os horrores da dor e da morte. Em terra, múltiplos anos consecutivos de crise económica trouxeram a fome e multiplicaram os maltrapilhos. No mar, piratas cruéis assaltavam navios, roubavam fazendas e vidas.
  • Após a morte de Filipe II, a Espanha começou a mirrar até se converter no esqueleto de um gigante, numa sombra do que fora nos séculos XV e XVI. Portugal, unido a ela, não teve melhor sorte. Uma onda de pessimismo apossou-se então de todos os ânimos, aumentando a angústia provocada pelo desfazer de outros valores.
  • Acresce ainda o papel da Inquisição. Sendo-lhes vedada a análise crítica da sociedade, os escritores refugiaram-se nos malabarismos dos jogos verbais.
          Neste contexto de crise de valores, nasceu uma literatura de evasão, tendencialmente pessimista, exageradamente formalista ou conceptualista.


3. Origem do conceito


          A origem etimológica do termo barroco é discutível.
          De acordo com determinados autores, proviria do nome do pintor italiano Barocci; segundo outros, teria origem em barocco ou barocchio, duas palavras italianos que designam fraude. Outros há que entendem que deriva da palavra baroco, pertencente à lógica escolástica, designando um tipo de silogismo. Porém, a explicação mais comummente aceite é aquele que diz que provém de barroco, palavra portuguesa do século XVI que designava uma pérola de forma irregular. Aquele termo, por sua vez, provirá da palavra latina verruca, que significava uma pequena elevação de terreno; ou do nome da cidade de Barokia, na Índia, onde havia um mercado florescente de pérolas.
          Em suma, etimologicamente, a palavra «barroco» parece derivar do latim verruca, que significava, a princípio, pequena elevação de terreno e até qualquer excrescência ou mancha numa superfície lisa. Será, por isso, que nós temos, com esse sentido, o vocábulo verruga. Do sentido lato, passou-se a um sentido mais restrito: determinadas imperfeições das pedras preciosas. No século XVI, chamavam-se barruecas, baroques ou barrocas as pérolas não redondas ou manchadas. No século XVII, começou a utilizar-se a palavra baroque para significar qualquer coisa de forma irregular, desigual, bizarra; e, neste sentido, passou a qualificar determinada música e determinadas artes plásticas.
          Foi Carducci quem, em 1860, empregou o adjetivo barroco para qualificar a literatura do século XVII. Desde então barroco passou a designar o estilo dos artistas e escritores de Seiscentos.


4. Cronologia do Barroco


          O Barroco não atingiu, ao mesmo tempo, todos os países europeus. Assim:

  • na Itália, desenvolveu-se no século XVI;
  • na Espanha, a partir de 1570;
  • em França, na primeira metade do século XVII;
  • em Portugal, situa-se entre 1580 e 1756 (este delimitação está longe de ser rígida).

Regência verbal

          Certos verbos selecionam complementos que se iniciam por preposição. Esta relação que se estabelece entre certos verbos e os seus complementos designa-se regência verbal.

          Atente-se num velho exemplo: o verbo gostar seleciona um complemento oblíquo que se inicia pela preposição «de»:
                            . Eu gosto do Benfica.


          Veja-se outro exemplo: o verbo viajar seleciona, igualmente, um complemento oblíquo, neste caso introduzido pela preposição para:
                                                    . José Sócrates, graças a Deus, viajou para Paris.


          Quando um verbo que seleciona um complemento introduzido por uma preposição faz parte de uma oração subordinada relativa, a preposição antecede o pronome relativo que inicia essa oração:
                             . O clube de que eu gosto é o Benfica.
                             . A cidade para onde Sócrates viajou é Paris.

          As preposições selecionadas por estes verbos são obrigatórias na frase, visto que, se as omitirmos, ela torna-se agramatical:
                               . * O clube que eu gosto é o Benfica.
                               . * A cidade onde Sócrates viajou é Paris.
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