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segunda-feira, 1 de janeiro de 2024

Vida e obra de Luís de Camões

 1524 – 1525

Nascimento

Luís Vaz de Camões terá nascido em 1524 ou 1525, provavelmente em Lisboa (ou Coimbra) (não se sabe ao certo a data e o local do seu nascimento), no seio de uma família da pequena nobreza e oriunda da Galiza. O pai chamava-se Simão Vaz de Camões e a mãe, Ana de Sá (ou Ana Macedo, segundo alguns documentos).

 

1535 – 1545

Juventude em Coimbra

Segundo alguns autores, Camões viveu parte da sua juventude em Coimbra, onde se terá instalado desde muito novo, para aí fazer os seus estudos. Através do seu tio, D. Bento Camões, chanceler a Universidade e prior do Mosteiro de Santa Cruz, teve acesso às aulas de Humanidades, regidas pelos frades de Santa Cruz, e contacto com os ideais humanistas, bem como acesso a obras de grandes nomes da literatura renascentistas europeia.

 

Petrarca e a influência renascentista

Francesco Petrarca (1304 – 1374), poeta e humanista italiano, foi um dos grandes exemplos da nova estética do Renascimento. Seguidor da escola petrarquista, Camões viria a adotar os...


A conclusão do post encontra-se no link seguinte: vida-e-obra-de-camões.

domingo, 22 de janeiro de 2023

Biografia de Camilo Castelo Branco


 
Camilo Castelo Branco foi um dos escritores mais prolíficos da segunda fase do Romantismo português e a sua obra é a mais vasta e diversificada de todo o século XIX. Ele foi poeta, panfletário, prefaciador, tradutor, crítico, polemista, romancistas, dramaturgo, bibliógrafo, historiador, cultor de todos os géneros. A sua intensa atividade literária justifica-se pelo facto de Camilo ser um escritor profissional, isto é, viver daquilo que publicava.
 
Camilo Castelo Branco foi uma figura ímpar do Romantismo em Portugal, nomeadamente da segunda geração romântica, cujas vida e obra se entrelaçaram de forma muito intensa.
 
A existência do escritor foi uma vida de amor e de perdição: uma vida repleta de amores vários, mas também de sofrimento, dor e morte. No fundo, estamos na presença de uma novela ou de um romance tipicamente românticos.
 
As principais circunstâncias biográficas que o caracterizam podem sintetizar-se da seguinte forma:

 

bastardia: Camilo é um filho bastardo – a sua mãe era criada do seu pai;

 

orfandade: a mãe morre antes de Camilo completar dois anos, e o pai quando ele tem dez, por isso vai viver para casa de uma tia paterna, em Vila Real;

 

educação religiosa: em determinado momento, Camilo passa a viver em Vilarinho de Samardã, em casa de uma irmã mais velha, onde recebe uma educação religiosa e literária, ensinado por um padre;

 

aventuras sentimentais:

em 1841, casa, pela primeira vez, com Joaquina Pereira de França, uma camponesa de quem tem uma filha, mas abandona-as pouco tempo depois;

em 1846, rapta Patrícia Emília e por essa razão é preso na Cadeia da Relação do Porto, mas acaba igualmente por abandonar essa mulher e a filha que dela tivera;

a permanência no Porto, a partir de 1848, acentua a sua inconstância amorosa: envolve-se com uma freira, mantém uma paixão simultânea por duas senhoras, vive em mancebia com uma costureira;

conhece Ana Plácido, casada com um rico comerciante brasileiro, Manuel Pinheiro Alves: a partir de 1850, a paixão por essa mulher domina a vida sentimental do escritor, levando-o a cometer vários atos desregrados por causa desse amor – entra no seminário do Porto, como forma de aniquilar a paixão, rapta Ana Plácido e foge, entra na Cadeia da Relação do Porto (Camilo e Ana Plácido são acusados de adultério). Absolvidos e libertos em 1861, não mais se separam e acabam mesmo por casar em 1888 (o marido de Ana Plácido falecera em 1863). Têm três filhos;

 

vida boémia e turbulenta: no Porto, o escritor leva uma vida agitada. Por causa de amores, por questões jornalísticas (Camilo colabora em vários jornais) ou por outros motivos, Camilo envolve-se em polémicas, em rixas e desacatos;

 

convívio com a paisagem física e humana das províncias do Norte: a vida do escritor decorre praticamente toda no Norte do país (à exceção de curtos períodos na capital) – primeiro, em Vila Real e em Samardã, depois em Friúme, sempre em casa de familiares; entre 1844-45, reside na cidade do Porto, onde frequenta, sem sucesso, o curso de Medicina; posteriormente, desloca-se para Coimbra para cursar Direito (o que acaba por não acontecer); a partir de 1864, Camilo e Ana Plácido vivem em São Miguel de Seide, uma existência marcada pelo isolamento, pela doença e por vários dramas (morte do primeiro filho, loucura do filho Jorge, comportamento desregrado do filho Nuno; Camilo arquiteta, inclusive, o rapto de uma jovem para casar com esta o seu último filho);

 

conhecimento íntimo do meio portuense: as largas temporadas que passa no Porto dão ao escritor uma visão profunda e realista da sociedade portuense e dos seus diferentes elementos;

 

pobreza e doença: os seus últimos anos de vida são marcados por dificuldades económicas (Camilo chega mesmo a vender parte da sua biblioteca em leilão) e pelo avanço da cegueira, doença que já lhe havia sido detetada anos antes;

 

profissionalismo: Camilo vive exclusivamente do que escreve, o que faz com que seja um verdadeiro profissional das Letras. Assim se explica o seu ritmo febril de produção, bem como a extensa obra literária que nos legou: 173 títulos, não contando traduções, prefácios e outros textos dessa natureza.

 
1825 (ou 1826) – Nasce em Lisboa, na Rua da Rosa, no seio de uma família da pequena burguesia de raízes transmontanas, Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco, a 16 de março, filho natural de Manuel Joaquim Botelho Castelo Branco e de Jacinta Rosa, criada do próprio Manuel. A 14 de abril é batizado na Igreja dos Mártires. Não obstante, o escritor sempre se apresentou e contou os anos da sua vida e dos acontecimentos que nela o marcaram como tendo nascido em 1826, algo que era reconhecido pelos seus contemporâneos. De facto, na sua certidão de óbito, ocorrido a 1 de junho de 1890, regista-se a idade de 64 anos.
 
1827 (6 de fevereiro) – Morre a mãe.
 
1835 (22 de dezembro) – Morre o pai. Acompanhado pela irmã Carolina, mais velha, vai viver para Vila Real, para casa de uma tia paterna (Rita Emília). Nestes anos, frequenta, em Lisboa, a escola do mestre Minas Júnior, onde, entre outros, tem como colega o futuro Conde de Ouguela.
 
1839-1840 – Vai habitar em Vilarinho de Samardã com a irmã, que ali casa com um estudante de medicina, com cujo irmão, o Padre António José de Azevedo, convive e que o inicia na leitura dos clássicos e o ajuda a desenvolver o seu gosto pelas humanidades e pela escrita.
 
1841 – Em agosto, casa-se com Joaquina Pereira de França, de 14 anos, em Friúme, aldeia do concelho de Ribeira de Pena, onde passa a viver e trabalha como escrevente num tabelião. Com ela, tem uma filha, logo abandonando as duas. Entretanto, perde parte da herança paterna.
 
1843 – Regressa a Vilarinho da Samardã. Morrem a mulher e a filha de ambos pouco tempo depois. Em outubro, no Porto, faz exames em disciplinas de Humanidades e inscreve-se na Escola Médica, que frequenta até 1845, e na Academia Politécnica do Porto, mas não chega a concluir os estudos.
 
1844 – Começa a viver a vida literária e boémia (“do espírito”) portuenses e estreia-se como jornalista. Começa a publicar artigos em periódicos do Porto (“O Nacional”, “O Eco Popular”, “O Jornal do Porto”, “A Semana”, “O Portugal”, “O Portuense”, “O Mundo Elegante”, “O Porto e a Carta”, “O Clamor Público”, “Gazeta Literária do Porto”), atividade que continuará intensamente nos anos seguintes e que exercerá até ao final da vida. Escreve e publica poemas, assinando, a princípio, com as iniciais C. C. B. Além disso, usa diversos pseudónimos, entre eles os seguintes: Um Académico Conimbricense, Anastácio das Lombrigas, Anacleto dos Coentros, O Antigo Juiz das Almas de Campanhã, José Mendes Enxúndia, Rosário dos Cogumelos, A. E. Y. O. U. Y., Manuel Coco, João Júnior, Barão de Gregório.
 
1845 – Publica Os Pundonores Desagravados, poema heroico burlesco.

1846 – Rapta Patrícia Emília e por essa razão dá entrada na cadeia da Relação do Porto. Eventualmente, abandona-a também e a filha que dela tivera algum tempo depois. Na sequência da revolta da Maria da Fonte, terá combatido nas hostes de D. Miguel, o que lhe vale a nomeação para amanuense do Governo Civil em Vila Real, mas foge da cidade depois de ter publicado, no jornal “O Nacional”, duas cartas contra o governador civil. Vai viver sozinho para o Porto. Inscreve-se em Direito, em Coimbra, mas não conclui o curso.
 
1847 – Publica o drama histórico Agostinho de Ceuta.

1848 – Falece a filha que tivera com Joaquina Pereira e nasce-lhe outra, Bernardina Amélia, que tem com Patrícia Emília. Instala-se no Porto, onde vai viver permanentemente, até mudar, em 1864, para São Miguel de Seide, onde residirá até ao final da vida, na companhia de Ana Plácido. Neste e nos anos seguintes, publica, nos periódicos, no espaço do «folhetim», ou noutros, inúmeros artigos, crónicas e os primeiros embriões de narrativa ficcional. Publica, em folheto, sob anonimato (“Mandada Imprimir por Um Mendigo”), um relato onde está já presente a figura de narrador que dará o cunho camiliano dos seus romances e novelas posteriores, Maria! Não me Mates Que Sou Tua Mãe, a partir de um crime ocorrido em Lisboa.

1850 – Afirma ser, de profissão, “escritor público” e dedica-se totalmente ao ofício da escrita. Vive em Lisboa durante algum tempo e aí, na Imprensa Nacional, publica o seu primeiro romance, Anátema. Ser-lhe-á atribuído o folhetim “O Clero e o Sr. Alexandre Herculano”, publicado anonimamente, também na capital, em defesa do amigo. Conhece Ana Plácido, casada com Manuel Pinheiro Alves, cujo amor impossível quase o leva a abraçar o sacerdócio, que lhe é vedado por causa da vida aventurosa que levara até então.

1850-1851 – Matricula-se no curso de Ciências Teológicas, no Porto.

1852 – Submete-se a exame para obter ordens menores, que lhe são recusadas devido à sua vida aventurosa. Abando o Curso de Ciências Teológicas. É cofundador do jornal “O Cristianismo”. Colabora em publicações de poesia.

1853-1854 – Publica, primeiro em folhetim, no diário portuense “O Nacional”, depois em volume, Mistérios de Lisboa, novela de “terror grosso”, resposta, no panorama da literatura portuguesa, a Les Mystêres de Paris, de Eugène Sue (1842-1843). A maioria dos seus romances foi publicada inicialmente em folhetim, em periódicos, antes de sair em volume, como era costume na época.

1854 – Publica o livro de poemas Folhas Caídas Apanhadas na Lama, sob o pseudónimo Um Antigo Juiz das Almas de Campanha. Com Augusto Soromenho, é redator de A Cruz. Semanário Religioso.

1855 – Publica, no Porto, O Livro Negro do Padre Dinis.

1855-1856 – Publica os três volumes de «Cenas Contemporâneas», a que pertencem, entre outras pequenas novelas, os romances A Filha do Arcediago e A Neta do Arcediago.

1856 – Publica Onde Está a Felicidade?

1857 – Reside durante cerca de dois meses em Viana do Castelo, como redator do jornal “A Aurora do Lima”, e aí publica Cenas da Foz. Regressa ao Porto e publica, entre outras obras, Duas Horas de Leitura.

1858 – Publica, em Viana do Castelo, o «romance original» Carlota Ângela, que saíra em folhetins n’”A Aurora do Lima”. Publica também Vingança e O que fazem Mulheres. No final do ano, Camilo é aprovado para sócio correspondente da Academia de Ciências, por proposta de Alexandre Herculano.

1859 – Nos últimos anos, vê frustradas as diversas tentativas de ocupar cargos em instituições públicas, segundo alguns, devido à relação que mantém com Ana Plácido, uma mulher casada. Neste ano, vão viver ambos para Lisboa. O marido move-lhes “querela de adultério”. Antes do final do ano, regressam ao Porto. Camilo continua a publicar em jornais. De facto, a ligação adúltera entre Camilo e Ana Plácido é censurada pela sociedade portuense, por ela ser casada com um homem respeitado na cidade e ser cunhada de Bernardo Ferreira, filho da famosa Ferreirinha da Régua. Nessa sequência, os escritos do autor passam a ser recusados pelos jornais do Porto, o que o deixa sem meios de subsistência. Depois de Ana Plácido ter dado à luz um filho, presumivelmente de Camilo, Pinheiro Alves move aos dois amantes em processo de adultério.

1860 – Ana Plácido é presa (o adultério era crime na época), enquanto Camilo anda fugido à Justiça, que também o procura. Em outubro, entrega-se na Cadeia da Relação, no Porto, onde ambos recebem a visita do rei, D. Pedro V. Entrementes, continua a publicar em jornais e traduz romances franceses; em simultâneo, são feitas reedições de algumas das duas obras anteriores. A reedição de parte considerável dos seus romances torna-se, a partir de agora, regular. Estreia-se em Lisboa, no Teatro Nacional D. Maria II, a 10 de maio, o seu drama Abençoadas Lágrimas.

1861 – Publica Amor de Perdição (a data impressa no rosto é 1862), que diz ter escrito em quinze dias (“os mais atormentados da [sua] vida”, de acordo com a Introdução da novela), durante a sua prisão na Cadeia da Relação do Porto por adultério. Esta obra, de tipo passional, será considerada, por Miguel de Unamuno, como o maior romance da Península Ibérica no género. Publica ainda O Romance d’Um Homem Rico. É editada, no Porto, uma biografia de Camilo, da autoria de J. C. Vieira de Castro. Em outubro, Camilo e Ana Plácido são julgados, o tribunal absolve-os, saem em liberdade e vão viver para Lisboa.

1862 – Publica Memórias do Cárcere.

1863 – Nasce Jorge, seu filho com Ana Plácido, em Lisboa, que vem juntar-se a Manuel, que nascera quando Ana ainda vivia com o marido. Publica diversas obras (como O Bem e o Mal e Noites de Lamego, entre outras). Começa a sair em folhetins de periódico no Rio de Janeiro, um romance seu.

1864 – Instala-se em São Miguel de Seide, em Vila Nova de Famalicão, juntamente com Ana Plácido, Jorge e Manuel, na casa que ela herda do marido, entretanto falecido, que se tornará, a partir deste momento, a residência permanente do casal até ao final da vida do escritor. Nasce-lhes o terceiro filho, Nuno. Publica Amor de Salvação e Vinte Horas de Liteira, entre outros. Inicia colaboração no “Diário de Notícias”. Camilo vê-se obrigado a viver da sua pena e a escrever abundantemente para dar uma existência condigna à família.

1865 – Publica novas obras, como, por exemplo, A Sereia e O Morgado de Fafe.
 
1866 – Publicado A Que de Um Anjo, que virá a ser considerado um dos seus melhores romances de sátira da vida política, O Judeu, um dos seus mais apreciados romances históricos, A Enjeitada, Vaidades Irritadas e Irritantes, etc.

1867 – Publica O Senhor do Paço de Ninães, cuja ação se desenrola desde a partida de D. Sebastião para Alcácer Quibir até às conquistas na Índia, e A Bruxa do Monte Córdova.

1868 – Publica Mistérios de Fafe e Retrato de Ricardina, entre outras obras. Publica, ao longo de dez meses, uma série de artigos na “Gazeta Literária do Porto”, que reúne em Mosaico e Silva de Curiosidades Históricas, Literárias e Biográficas. O filho Jorge, a quem, mais tarde, dedica carinhosamente um livro, é dado como louco. De facto, os filhos são uma preocupação: Jorge pelos seus problemas mentais e os outros dois pela vida boémia e desorientada que levam.

1869 – Vive cerca de um ano em Lisboa. Publica Os Brilharetes do Brasileiro.

1870 – É-lhe recusado o título de Visconde que solicita, por viver «amancebado».

1871 – É representado no Teatro D. Maria II, em Lisboa, o seu drama O Condenado, em defesa do amigo Vieira de Castro, condenado por ter assassinado a mulher, supostamente adúltera. Publica Voltareis, ó Cristo?. Faz um primeiro leilão da sua biblioteca, por causa das difíceis condições de subsistência.

1872 – Publica-se em Madrid a tradução em castelhano de Amor de Perdição. D. Pedro II, Imperador do Brasil, concede-lhe a Ordem da Rosa. Publica, entre outros, o romance O Carrasco de Victor Hugo José Alves.

1873-1874 – Publica O Demónio do Ouro e O Regicida. Em janeiro de 1874, sai o n.º 1 de Noites de Insónia, oferecidas a quem não pode dormir, publicação mensal. Publica o volume Correspondência Epistolar entre José Cardoso Vieira de Castro e Camilo Castelo Branco. (O amigo tinha, entretanto, morrido no degredo, em Angola). Quase toda a sua restante correspondência e as polémicas serão publicadas postumamente, em grande parte por Alexandre Cabral.

1875 – Publica A Filha do Regicida, um romance histórico.

1875-1877 – Saem, em “publicação mensal”, a público, sucessivamente, as Novelas do Minho, que o integrarão na escola realista, anteriormente inaugurada programaticamente por Eça de Queirós. Em 1876, publica um Curso de Literatura Portuguesa. Os seus problemas de saúde, nomeadamente as dificuldades de visão, agravam-se.

1879 – Publica Eusébio Macário, apresentado, na edição d’O Primeiro de Janeiro de 27 de julho, como “primeiro romance da longa coleção faceta, sob o título geral de ‘Sentimentalismo e História’”.

1880 – A referida coleção consta de três obras: neste ano, publica a Corja e, em 1882, A Brasileira de Prazins. Apresenta-se com o objetivo de fazer «destroços», através da paródia de alguns recursos da «nova escola», mas o último é considerado como uma magistral adaptação da já antiga e consagrada escrita camiliana às características do novo programa realista.

1885 – Por lei de 20 de julho, o rei D. Luís concede-lhe o título de Visconde de Correia Botelho. É nomeado Académico Correspondente da Real Academia Sevilhana de Buenas Letras, a 1 de abril.

1885-1886 – Publica a «Crónica mensal de Literatura amena», Serões de São Miguel de Seide, «novelas, polémica mansa, crítica suave dos maus livros e dos maus costumes». Saem seis fascículos. Em 1886, publica Boémia do Espírito e Vulcões de Laura, o seu último romance.

1888 – Apesar da consulta cada vez mais assídua a médicos, no Porto e em Lisboa, o seu estado de saúde é cada vez mais débil. Casa, finalmente, com Ana Plácido, a 9 de março, a fim de garantir a segurança financeira aos filhos, num período em que a relação estava gasta pela erosão e por uma convivência tensa. Envia ao amigo Freitas Fortuna uma carta que ele próprio considera como uma “cláusula testamentária”, com disposições sobre o seu “cadáver” e o local onde quer ser sepultado. É feito Visconde de Correia Botelho.

1889 – Funda com Tomás Ribeiro Mensageiro, cujo n.º 1 é “consagrado a Sua Majestade Imperial o Sr. D. Pedro d’Alcântara”, e reúne um conjunto de textos memorialísticos em Delitos da Mocidade. Obtém uma pensão vitalícia para o filho Jorge, cuja loucura é irreversível.

1890 – A 1 de junho, suicida-se com um tiro na fronte, após a visita que lhe faz o oftalmologista Edmundo Machado, que lhe confirma a cegueira irremediável. De acordo com J. Viale Moutinho (2009), Camilo escrevera ao especialista a solicitar que o visitasse e examinasse, com estas palavras: “Sou o cadáver representativo de um nome que teve alguma reputação gloriosa neste país, durante 40 anos de trabalho. Chamo-me Camilo Castelo Branco e estou cego.” Na verdade, no final da vida, sente-se atormentado pela doença e pela ameaça da cegueira. É frequentemente assolado pela instabilidade psíquica e por período de grande desânimo. É sepultado no Porto, no cemitério da Lapa, no jazigo do velho amigo Freitas Fortuna. A certidão de óbito regista que morreu aos 64 anos. Nas Trevas – Sonetos Sentimentais e Humorísticos é a última obra do escritor publicada em vida.

Bibliografia:

. imprensanacional./pt/camilo-castelo-branco/;

. Jacinto do Prado Coelho, Introdução ao Estudo da Novela Camiliana, 2.ª ed., 2.º vol., 1983.

. José Viale Moutinho, Memórias Fotobiográficas (1825-1890), Lisboa, Ed. Caminho, outubro, 2009.

. Amor de Perdição, Coleção Resumos, Porto Editora;

. livro.dglab.gov.pt

segunda-feira, 17 de outubro de 2022

Serebriakova - uma vida, uma obra

     Este post é da autoria de Beatriz, uma professora de Filosofia de Setúbal, que possui um blogue onde escreve sobre diversos assuntos da atualidade e/ou do seu interesse: IP azul.

    Neste caso, trata-se da divulgação de um nome da pintura ucraniana desconhecido para o comum dos mortais: Zinaida Serebriakova. O post original é este: Serebriakova - uma vida, uma obra.


    Zinaida Lanceray nasceu em 1884, no Império Russo, perto de Kharhov, na atual Ucrânia, numa família artística.

    O seu pai era escultor, o seu avô um famoso arquiteto e o seu tio um pintor, o que significa que era originária de uma família de artistas. Ela seguiu os seus passos e estudou arte desde muito jovem.

Foi pupila do mestre Ilya Repin (1844 - 1930), com quem aprendeu sobre o Realismo, e mais tarde viajou para a Europa, onde estudou em França e na Itália.







    Nos seus quadros de Paris desta época, podemos ver que Serebriakova foi influenciada também pelo Pós-Impressionismo.







    Desde tenra idade, interessou-se pela vida das pessoas comuns, dos camponeses, dos pastores e pescadores e do mundo agrícola. Este era um tema ao qual voltaria vezes sem conta ao longo da sua vida.





    Em 1905, Zinaida casou com Boris Serebriakov e, durante a década seguinte, teve quatro filhos.

    Este acontecimento marcou o início dos seus chamados "Anos Felizes", caracterizados por outro tema que dominaria a sua carreira: a família.
    





    Serebriakova também pintou autorretratos. Com toda a sua vivacidade e autenticidade, constituem provavelmente o seu melhor trabalho.















    Porém, acima de tudo, pintava os filhos, fosse ao pequeno-almoço, de manhã, ou todos juntos a jantar.

 




   


    Serebriakova enviou o seu Autorretrato na Mesa de Toilette para uma exposição em 1909,tendo sido recebido com aclamação pela crítica. Mesmo nessa altura, a sua expressão surpreendentemente moderna foi um sucesso.

 

    Juntamente com Outono Verde e Rapariga Camponesa, os três quadros foram leiloados com sucesso.

    
    A partir de 1914, Serebriakova começou a atingit a plena maturidade artística e gozou dos anos mais bem sucedidos da sua carreira, com pinturas como Harvest (1915) e Bleaching Linen (1917).

    Estava pronta para se tornar parte da Academia de São Petersburgo.

    Porém, tudo mudou com a Revolução Russa de 1917.



    O primeiro problema foi artístico: o seu estilo pessoal já não era bem-vindo no mundo da arte vanguardista, suprematista e construtivista favorecido pela Rússia soviética.

    Em cima disso, ocorreu uma tragédia pessoal: o seu amado marido Boris foi preso em 1919 e morreu de tifo na prisão.

    Sem os seus rendimentos e com as comissões a diminuir no novo regime, as coisas tomaram um rumo descendente.
    Serebriakova era, agora, uma mãe viúva com quatro filhos para criar.

    Deixaram a propriedade familiar - que tinha sido saqueada - e mudaram-se para um apartamento em Petrogrado.

    Ela já não tinha dinheiro para comprar tintas a óleo, mas continuou a pintar, interessando-se também pelo ballet e pelo teatro, que a sua filha Ekaterina tinha começado a frequentar.






    Continuou igualmente a pintar os seus filhos, agora com uma certa melancolia, em vez da alegria mais pura anterior.










    Em 1924, viajou para Paris, na esperança de conseguir lá comissões e, assim, angariar dinheiro suficiente para sustentar a sua família.

    Mal sabia Serebriakova que as viagens seriam, em breve, restringidas pelo governo soviético.

    Deste modo, foi-lhe recusada a reentrada na Rússia e tornou-se uma exilada.






    No entanto, Serebriakova encontrou trabalho e comunidade em Paris com um grupo de emigrados russos e enviava os seus proventos para casa.

    Em 1926, o seu filho mais novo, Alexandre, foi autorizado a juntar-se a ela e, em 1928, Ekaterina.


    





    Aqui a vemos num autorretrato de 1930, com um ar algo mais cansado do que nos seus retratos anteriores.











    Visitou Marrocos várias vezes, países que lhe deixou uma grande impressão.

    Lá, encontrou um grande prazer em pintar o povo comum, como outrora tinha feito na Rússia.













    De regresso a França, Serebriakova continuou a pintar as pessoas comuns, fossem pescadores ou padeiros, em paralelo com retratos para clientes endinheirados.




  

    Nesta era do seu exílio parisiense, vemos um outro tema emergir mais plenamente na obra de Serebriakova: a mulher nua.
    A temática já lá estava há muito tempo, como com Bather (1911), mas durante as décadas de 1920e 1930 trabalhou nela com mais frequência e de forma muito diferente daquela de que os homens se socorrem para pintar o mesmo tema.



   

    Durante a Segunda Guerra Mundial, devido à sua nacionalidade e ao contacto frequente com a sua família na União Soviética, Serebriakova tornou-se suspeita na Paris ocupada pelos nazis.

    Foi forçada a renunciar à cidadania soviética e, aparentemente, a qualquer esperança de ver a restante família novamente.


    A vida e a carreira de Zinaida Serebriakova foram longas e voláteis, afetadas quer pelas Guerras Mundiais quer pela tragédia pessoal. No entanto, também se tornou uma artista de sucesso e aclamada pela crítica.

    Nesta pintura, vemo-la em novo autorretrato, este bastante mais feliz, datado de 1956.

    Quando a pintora caminhava já para o final da vida, graças a Khrushchev, a sua filha Tatiana recebeu autorização para visitar a mãe em Paris, em 1960. Deste modo, reuniram-se ao fim de trinta e seis anos de separação. Zinaida contava 76 anos e a filha 50.

    Em 1966, realizou-se em Moscovo uma vasta exposição do trabalho de Serebriakova que foi um sucesso crítico e comercial. A pintora viajou até lá, regressando a solo russo pela primeira vez em quase quatro décadas.

    Zinaida Serebriakova regressou a Paris e morreu lá no ano seguinte, em 1967, com 82 anos.

    Seja nas representações da sua família, do povo comum, ou de si própria, poucos pintores conseguiram alguma vez tal ternura, intimidade, vivacidade e honestidade.

quinta-feira, 15 de setembro de 2022

Vida e obra de José de Alencar


     José Martiniano de Alencar nasceu em Mecejana, Ceará, a 10 de maio de 1829. Fez os seus estudos elementares e secundários no Rio de Janeiro e, em 1843, foi para São Paulo, onde se formou em Direito. Regressou depois ao Rio e iniciou a atividade de jornalista e advogado. Faleceu em 1877.

    A sua produção literária é vastíssima e insere-se em vários domínios: romance, poesia, história, teatro. Dentre as suas obras, destacam-se Cinco Minutos (1860), As Minas de Prata (1862), Diva (1864), Iracema (1865), O Gaúcho (1870), Senhora (1875), O Sertanejo (1875).

    Foi um escritor que gerou muita polémica: uns julgam-no genial, magistral; outros fazem dele um secundário contador de patranhas de índios e vaqueiros. Uns elogiam o seu estilo e amor à "língua brasileira", outros irritam-se perante a exuberância das imagens. Se os comentários negativos são maus, os positivos correm o risco de o transformar num contador de histórias para adolescentes, o que tem criado a imagem de um romancista que não se pode levar a sério.

    Mas, na verdade, Alencar está para a prosa romântica como G. Dias está para a poesia: é o mais importante ficcionista do Romantismo brasileiro, quer pela sua vasta obra, quer pela variedade dos temas versados e pelo estilo. É um marco na tradição literária brasileira e foi o primeiro escritor a devotar-se integralmente à sua obra, mesmo nos momentos em que era um político.

    No prefácio a Sonhos d'Ouro, Alencar discute o período orgânico da literatura brasileira, dividida em três fases:

  • uma fase primitiva ou aborígene, que são as lendas e mitos da terra selvagem e conquistada (ex.: Iracema);
  • a segunda fase é histórica: representa o consórcio do povo com a terra americana (ex.: Guarani);
  • a terceira fase começa com a independência política e espera escritores que formem o verdadeiro gosto nacional (ex.: Gaúcho).
    Isto mostra que Alencar tinha consciência de ter tratado, nos seus romances, os aspetos fundamentais da realidade brasileira. Apesar dos vários domínios que abraçou, é na prosa de ficção que mais se destaca. Aqui, há sempre um elemento fundamental, que é o índio, como protagonista das lendas e factos históricos.

    Dentro do romance alencariano, podemos destacar alguns tipos:

        -» Romance urbano ou citadino, fruto de uma breve experiência jornalística, de uma observação da sociedade fluminense e da fantasia. Temos neste grupo romances como A Viuvinha, Diva, Senhora, A Pata da Gazela, etc. Obedientes ao figurino romântico, empregam os mesmos expedientes narrativos. Romances de intriga, entretenimento e namoro adolescente giram em torno do conflito de duas forças poderosas: amor e dinheiro, podendo surgir um terceiro membro que é a honra. O caso de Aurélia, heroína de Senhora, mostra perfeitamente este duelo de interesses e sentimentos, numa trama em que o dinheiro atribui à mulher o direito de esconder qualquer nódoa do passado e equiparar-se ao homem amado, a quem o dinheiro dá o direito de se render à evidência dos factos e tornar-se merecedor da mulher amada.
    Tais conflitos podiam dar-se apenas no domínio da burguesia, o que seria uma crítica; mas a forma como está organizado contém é uma apologia dessa classe, gozadora de ócios quase sempre néscios, preenchidos com algum negócio, forma de ação social que inclui o amor. Uma forma de pelintras, passando os dias a tentarem resolver o que chamavam de magna questão: sentimento amoroso que devia desembocar no casamento. Tudo se passa em ambientes burgueses, mesmo quando a história decorre em lugares não citadinos.

        -» Romance indianista: na linha de G. Dias, Alencar concebeu uma trilogia que abarcava o «modus vivendi» do indígena brasileiro: o Guarani retrata o encontro de um índio - Peri - com a civilização branca e portuguesa; em Iracema, temos uma intriga oposta: um europeu, Martim, descobre a vida primitiva do índio por meio da heroína que dá o nome ao romance; em Ubirajara, analisa os silvícolas no seu habitat natural. Nos três casos, o índio é visto com lentes cor de rosa, envolto num véu místico.
    Ser místico, o índio de Alencar é cheio de qualidades em flagrante contraste com o branco. Para os silvícolas vão todas as simpatias, aos brancos fica reservada a pior parte no contexto geral: batem-se em lutas fratricidas ou desconhecem os bons sentimentos dos nativos. A explicação para a idealização do índio reside na possível influência do pensamento de Rousseau, filtrado pela poesia de G. Dias e no facto de Alencar não conhecer de "visu" os heróis de suas narrativas. Quando muito teria convivido na infância com pessoas que lhe teriam contado lendas a respeito. A imaginação fizera o resto.
    O gosto de idealizar, que deliciava os românticos ávidos de exotismo paisagístico, eis o que se vê em Alencar. Quer pela ação, quer pelo código moral, os seus índios são talhados pelo molde dos cavaleiros medievais. Possuem apenas virtudes e chegam a superar os brancos nos mesmos valores de caráter que o Romantismo lhes atribui: autênticos cavaleiros andantes. Torna-se evidente o núcleo da resignada paixão de Iracema. Entrega-se a um branco num desprendimento natural; dá-lhe um filho: Martim regressa à pátria e a infeliz morre. É o quadro típico de um romance de cavalaria, onde o trato amoroso obedecia aos impulsos da sinceridade.
    Se virmos o respeito que o índio mostra pela religião cristã, fica desenhada a fisionomia medievalesca do indianismo de Alencar. Peri converte-se como bom cavaleiro à fé de Ceci e com isso descobre a explicação para o seu comportamento trovadoresco de subserviência mística à mulher. E Iracema morre de amor por se ligar ao branco. Sua morte simboliza a redenção do «pecado» de amar incondicionalmente. A morte recoloca-a no seu mundo original.

        -» Romance histórico, onde o medievalismo de Alencar ganha plenitude: As Minas de Prata, Guerra dos Mascates, Alfarrábios. Aqui põe-se à vontade, sem realizar, porém, o melhor da sua obra, pois pesavam-lhe a sombra de W. Scott e o exemplo de Herculano. O ficcionista esmera-se em situar os dramas numa geografia, para que a natureza sirva de pano de fundo e interlocutora. Ora, o romance histórico dispensa o diálogo com a natureza, porque desloca o eixo da efabulação para o facto documentado, a ação que a efetiva e a personagem que o realiza.

        -» Romance regionalista: O Gaúcho, O Sertanejo, O Tronco do Ipê e Til. O primeiro e o segundo passam-se respetivamente no Rio Grande do Sul e no Ceará. A ação dos outros decorre na baixada fluminense e na "confluência do Atibaia com o Piracicaba". Diferencia-os a geografia.
    Alencar quer, assim, oferecer um retrato das particularidades regionais do Brasil, das tradições e costumes ligados ao folclore. Ao longo dos romances históricos e indianistas apresenta as metamorfoses histórico-étnicas sofridas pelo país; agora ensaia um panorama dos vários aspetos do Brasil.
    No cerne deste tipo de romance temos a mesma visão do mundo presente dos anteriores, a demonstrar o truísmo da unidade na diversidade; os dados exteriores e a cenografia mudam sem comprometer o núcleo primitivo. Mas no regionalismo, Alencar pretendia-se realista.
    Como explicar a unidade na visão do brasileiro? De um lado, Alencar descobriria uma essencialidade imutável; de outro, seria incapaz de ver as diferenças entre os vários tipos de brasileiro. Isto reduz-se a um ponto: o encontro de um arquétipo brasileiro que mostrasse unos a respeito das variedades regionais, históricas, etc. Mas Alencar não pretendeu nem podia determiná-lo. Alencar era de um idealismo absoluto: "idealiza tudo, homens e cousas, não em virtude de uma estética preconcebida, mas porque é isso inerente à sua constituição artística."
    Daqui se pode deduzir que os romances regionalistas são ainda históricos, embora duma história contemporânea: fazem uso dos mesmos ingredientes narrativos presentes nos outros tipos de romance e não fogem à estereotípia medievalesca. A imaginação de Alencar socorre-se de um modelo fixo de protagonista, como se bastasse a verosimilhança do cenário e do enredo.
    Alencar movia-se na esfera do onírico e do fantasioso, não raro articulado aos mitos da infância. Implicando uma visão estacionária da história, tal apego à meninice leva-nos a formular uma hipótese de génese literária que também vale para os restantes românticos. A visão que Alencar tem do Brasil ofende os intelectuais brasileiros, porque ele reduz o brasileiro do campo ou da cidade: se homem, a Peri; se mulher, a Ceci. Isto é uma marca da herança portuguesa.

            Estilo de Alencar

    Ele é poeta na essência de sua cosmovisão e vestia o homem e a natureza de maravilhoso e concebia uma harmonia de paraíso para o mundo. Ao dizerem que Iracema é um poema em prosa, os críticos apenas apreendem uma parte da sua mundividência: poesia.
    Ele pinta a natureza com a imaginação, numa subjetividade em que o «eu» mais se contempla na paisagem do que observa, num idealismo de quem apenas encontra no universo as forças mágicas da infância. Ainda quando despido de recursos poéticos, é lírica a sua visão do mundo. A musicalidade é a característica essencial do seu estilo. Alencar concretiza-o pela utilização de ritmos poéticos e metáforas polivalentes.
    Alencar inaugura uma etapa na história do escritor brasileiro: com ele sai-se de uma atividade literária ocasional e diletante e inicia-se o processo de dignificação do homem de letras brasileiro. Nele se configura, pela primeira vez, a noção de literatura como forma de conhecimento da realidade brasileira e veículo de emoção estética superior.

terça-feira, 6 de setembro de 2022

Biografia / Vida de Aquilino Ribeiro


             Aquilino Ribeiro nasceu em Sernancelhe, freguesia de Carregal de Tabosa, distrito de Viseu, na Beira Alta, a 13 de setembro de 1885 e faleceu em Lisboa, a 27 de maio de 1963, após uma doença rápida, tendo os seus restos mortais sido trasladados para o Panteão Nacional em setembro de 2007, 44 anos após a sua morte. Era filho de Mariana do Rosário Gomes e do padre Joaquim Francisco Ribeiro e teve uma infância, ao que se sabe, de uma criança bastante travessa, a tal ponto que ainda recentemente era possível encontrar nessa zona quem tivesse ouvido contar histórias picarescas de um menino destinado pela família à vida de sacerdócio.

            A sua vida, tal como a de muitas das personagens a que deu vida, foi movimentada e aventurosa. Aos 10 anos, mudou-se com os pais para a aldeia de Soutosa, concelho de Moimenta da Beira, onde passou grande parte da infância. Estudou na escola de Soutosa e, seguidamente, no Liceu de Lamego, onde fez os estudos preparatórios, mais tarde em Viseu, em 1902, onde estudou Filosofia e Teologia. A pedido da sua mãe, entrou para o Seminário de Beja, onde fez apenas o primeiro e parte do segundo ano de Teologia, dado que não vocação religiosa. Em 1904, foi expulso do seminário, depois de ter dado uma réplica cortante a uma acusação do Padre Manuel Ançã, um dos dois irmãos que dirigiam a instituição na época.

            Em 1906, encontramo-lo em Lisboa, onde inicia a sua longa carreira de jornalista, com artigos de opinião (e princípio de um romance em folhetins – A Filha do Jardineiro) publicados em jornais como A Vanguarda, uma publicação republicana, o Jornal do Comércio, O Século (do qual foi, mais tarde, correspondente em Paris), A Pátria, Ilustração Portuguesa e o Diário de Lisboa. Dedicou-se também à tradução (traduziu, por exemplo, Il Santo, de Fogazzaro) e à redação, em colaboração com José Ferreira da Silva, do folhetim A Filha do Jardineiro, uma ficção simultaneamente de propaganda republicana e de crítica corrosiva às figuras do regime monárquico, incluindo o próprio rei D. Carlos. Além disso, foi um dos fundadores da Seara, onde também colaborou, escreveu em revistas como Homens Livres e Lusitânia e, juntamente com outros intelectuais seus amigos, entre os quais Raul Proença, constituiu-se como um dos animadores da publicação do Guia de Portugal.

            Verdadeiro homem de ação, um tipo social muito exaltado no início do século XX, aderiu ao movimento republicano, pelo qual se bateu, quer através da escrita, quer através da participação em iniciativas que acabaram por o levar à prisão. De facto, em 1907, foi acusado de bombista por causa do rebentamento de uns caixotes de explosivos que guardara no seu quarto e que levaram à morte de dois correligionários seus e detido na esquadra do Caminho Novo por fazer parte do Partido Republicano, de onde se evadiu em circunstâncias recambolescas, como se pode ler num volume de memórias. Chegou mesmo a correr um boato segundo o qual Aquilino teria sido, em 1908, a «terceira carabina», aliás inútil, já que os dois regicidas tinham levado a cabo a sua função de forma exemplar. Fugiu, portanto, da prisão e, após alguns meses de clandestinidade em Lisboa, refugiou-se em Paris, tendo frequentado na Sorbonne o curso de Filosofia e Sociologia. Aí, foi ensinado por mestres como George Dumas, André Lalande, Levy Bruhl e Durckeim, e contactou com a intelectualidade portuguesa que, igualmente por razõees políticas, se exilara fora de Portugal. Além disso, conheceu Grete Teidemann, a sua primeira mulher, com quem foi residir e casou na Alemanha, tendo o seu primeiro filho nascido, porém, em Paris. Visitou brevemente Portugal em 1910, depois de proclamada a República, tendo regressado em definitivo no ano de 1914, depois da eclosão da Primeira Guerra Mundial, deixando incompleto o curso de Filosofia, que abandonou já depois de se ter matriculado no quarto ano, como se pode comprovar pela consulta dos registos guardados no Centre d’Accueil et de Recherche des Archives Nationales de Paris.

            Em Portugal, nunca descurando o seu trabalho de escritor (escrita ficcional e cronística para a imprensa periódica, uma atividade que desenvolveu de forma regular ao longo de toda a vida), exerceu a carreira de professor no Liceu Camões durante três anos e foi, posteriormente, segundo bibliotecário – mais tarde conservador – na Biblioteca Nacional, para onde entrou a convite do amigo Raul Proença. Esta função, entre outras vantagens, deu-lhe a possibilidade de alimentar o seu amor pelos livros antigos e raros, um gosto que o levou a produzir trabalhos de investigação, publicados, por exemplo, nos Anais das Bibliotecas e Arquivos, e que se refletiu também na sua produção literária, de que é exemplo o seu primeiro romance, A Via Sinuosa. Além disso, como já foi referido anteriormente, fez parte de um grupo de intelectuais que desenvolveu uma significativa atividade cívica e cultural que teve a sua expressão mais visível na revista Seara Nova, uma publicação importantíssima quer na difusão dos ideais republicanos, quer na evolução da conturbada vida política da Primeira República.

Foi demitido do cargo de bibliotecário em 1927 novamente por razões políticas. Desta vez, participou na revolta frustrada contra a ditadura militar que, entretanto, fora instaurada no país após o golpe de 28 de maio de 1926. Fugiu para a Beira Alta e, em seguida, refugiou-se de novo em Paris – segundo exílio. Quando, clandestinamente, regressou a Portugal, escondeu-se em Soutosa. Entrementes faleceu a sua esposa. Em 1928, voltou a participar numa iniciativa antirregime (o chamado movimento do regimento de Pinhel), mas foi capturado e levado para a prisão do Fontelo, em Viseu, um edifício que ainda hoje pode ser visto na cidade. Na companhia de António Mota, conseguiu voltar a evadir-se serrando as grades do cárcere enquanto numa grafonola tocava um disco para abafar o som. Escondeu-se nas serranias beiroas e encetou uma difícil jornada que o levou de novo a Paris – terceiro exílio. Na capital francesa, casou em segundas núpcias [a primeira esposa havida falecido em 1927] com D. Jerónima Dantas Machado, filha do presidente da República Bernardino Machado, também homiziado aí depois de deposto por Sidónio Pais, e foi viver com ela para o Sul de França (Ustaritz e Baiona, onde, em 1930, lhe nasceu o primeiro filho do casal e o segundo de Aquilino). Enquanto isso, em Lisboa, em 1929, foi julgado e condenado à revelia. Viveu depois em Vigo e em Tui, cidades espanholas, até regressar clandestinamente a Abravezes, Viseu. Acabou por ser amnistiado em 1932, tendo ido residir para Cruz Quebrada.

            Acalmados os seus instintos revolucionários, embora tenha continuado a participar em ações críticas da ditadura salazarista, Aquilo Ribeiro pode, então, dedicar-se plenamente à escrita, prosseguindo a sua produção ficcional, o trabalho de tradução, o trabalho ensaístico (latu sensu) e a colaboração na imprensa, além das suas lendárias idas ao Chiado, ao final da tarde, para tertúlias à porta da Bertrand, a sua editora. Literariamente, nunca abdicou da originalidade nem alinhou com nenhum dos movimentos literários do seu tempo, desde o Modernismo (pela leitura de algumas cartas de Fernando Pessoa, ficamos a saber que Aquilino era apreciado pelo poeta) ao Presencismo, que o criticou fortemente, em especial José Régio (críticas essas publicadas em grande número na revista do movimento, a Presença), passando pelo Neorrealismo. Como foi indiciado atrás, não obstante a acalmia que a sua vida conheceu nesta época, o escritor jamais abdicou da sua consciência cívica e política, tendo continuado a criticar o regime, aderido ao MUD (Movimento de Unidade Democrática), publicado textos na imprensa diária de defesa da causa, apoiado a campanha presidencial de Norton de Matos, integrado, juntamente com outras figuras do saber, a Comissão Promotora do Voto e militado na candidatura do general Humberto Delgado à presidência da República, em 1958.

            Em 1933, o conjunto de novelas As Três Mulheres de Sansão foi galardoado com o Prémio Ricardo Malheiros, atribuído pela Academia das Ciências de Lisboa, e, em 1935, foi eleito sócio correspondente desta instituição, da qual se tornou sócio efetivo em 1957. Ao seu ativismo político soma-se a tenacidade com que, durante mais de duas décadas, lutou pela agregação forma e institucionalizada dos escritores até conseguir criar, apesar das forças políticas contrárias, a Sociedade Portuguesa de Escritores, em 1956, de que foi fundador, o primeiro presidente eleito e o sócio n.º 1. No ano seguinte, a Livraria Bertrand iniciou a edição das Obras Completas. Em 1959, foi publicado o romance Quando os Lobos Uivam, que, por causa do seu conteúdo incómodo para o poder político, que o considerou injurioso das instituições do poder, foi apreendido e o escritor processado, no entanto, em 1960, o processo foi amnistiado. Nesse mesmo ano, um grupo de intelectuais (entre os quais Francisco Vieira de Almeida, o proponente, José Cardoso Pires, David Mourão-Ferreira, José Gomes Ferreira, Maria Judite de Carvalho, Joel Serrão, Mário Soares, Vitorino Nemésio, Alves Redol, Luísa Dacosta, Vergílio Ferreira como subscritores) candidatou Aquilino Ribeiro ao Prémio Nobel da Literatura. Todos estes factos, juntamente com as homenagens que recebeu no Brasil quando lá se deslocou em 1952, o movimento de defesa que se gerou em seu torno a propósito da já citada publicação de Quando os Lobos Uivam (além da defesa formal, da responsabilidade do advogado Heliodoro Caldeira, o escritor recebe o apoio de cerca de três centenas de intelectuais portugueses, que elaboram um abaixo-assinado pedindo o arquivamento do processo e François Mauriac redigiu uma petição em seu amparo que foi assinada por figuras como Louis Aragon e André Maurois, além de ter sido publicado em vários jornais e revistas franceses) atestam o enorme prestígio que Aquilino Ribeiro possuía.

            No momento em que se preparava, nomeadamente através da Sociedade Portuguesa de Escritores, uma homenagem pública nacional, promovida por várias cidades e tendo por base a celebração do cinquentenário da publicação da obra Jardim das Tormentas, o escritor adoeceu repentinamente, vindo a falecer no Hospital da CUF a 27 de maior de 1963.

 

Bibliografia

AA. VV., Retratos para Aquilino, Câmara Municipal de Paredes de Coura, 2000.

ALMEIDA, Henrique, Aquilino Ribeiro e a Crítica, Porto, Edições Asa, 1993.

CENTRO DE ESTUDOS AQUILINO RIBEIRO (ed.), Cadernos Aquilinianos.

INSTITUTO PORTUGUÊS DO LIVRO (coord. Eugénio Rosa), Dicionário Cronológico de Autores Portugueses.

MALPIQUE, Cruz, Aquilino. O homem e o escritor. Porto. Divulgação, 1964.

MARTINS, Serafina, Aquilino Ribeiro, Instituto Camões.

MALPIQUE, Cruz, Aquilino. O homem e o escritor. Porto. Divulgação, 1964.

 

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