Português: 01/05/20

sexta-feira, 1 de maio de 2020

A receção de Os Maias

Em 20 de julho de 1888, cerca de um mês após a publicação de Os Maias, o jornal Repórter deu à estampa uma crítica à obra, da autoria de Fialho de Almeida.
Fialho, em primeiro lugar, considera que as personagens-tipo fundamentais dos romances anteriores de Eça se repetem n’Os Maias, dando como exemplo Craft, que confirmaria a «deslumbrada anglomania» do romancista. Por outro lado, considera igualmente repetitiva a visão pessimista sobre a sociedade lisboeta: «a permanência do escritor do ponto de vista maldizente dos outros seus volumes». Fialho de Almeida divide as personagens da obra em dois grupos, «um que tem viajado, outro que não tem viajado», observando que «O primeiro como que paira ainda numa certa região superior de ideias e elegância», enquanto o outro «enchafurda todo num atascal de parvoíce e de ignorância.».
Os elogios de Fialho centram-se em duas cenas: a entrevista de Castro Gomes com Carlos da Maia e a reconciliação de Carlos com a amante. Além disso, enaltece ainda o romance, considerando-o «um dos mais surpreendentes trabalhos de humour de que possa orgulhar-se uma literatura» e exaltando «o fantasista prodigioso, que, pelo poder da observação e pelo poder da ironia, iguala Theckeray».
Eça responde em 8 de agosto a partir de Bristol, através de uma carta, na qual, ironicamente, estranha ser acusado de maldizente por um escritor realista. No que diz respeito à uniformização das personagens, afirma que «Em Portugal há só um homem – que é sempre o mesmo, ou sob a forma de dandy, ou de padre, ou de amanuense, ou de capitão: é um homem indeciso, débil, sentimental, bondoso, palrador, deixa-te ir, sem mola de caráter ou de inteligência que resista contra as circunstâncias. É o homem que eu pinto – sob os seus costumes diversos, casaca ou batina. E é o Português verdadeiro. É o Português que tem feito este Portugal que vemos…».
Uma segunda polémica é espoletada por Bulhão Pato, que, ainda em 1888, escreve uma crítica, intitulada «O Grande Maia», incluída na coletânea poética Hoje, através da qual se pretende vingar de Eça por considerar que Tomás de Alencar, o representante do Ultrarromantismo n’Os Maias, era uma caricatura da sua pessoa. A 13 de dezembro desse mesmo ano, sai no jornal O País, do Rio de Janeiro, o artigo «Bulhão Pato e Eça de Queirós», em que o seu autor, Pinheiro Chagas, traz a público a ofensa sofrida pelo poeta, aproveitando-a para ridicularizar o romancista. Como resposta, em 8 de fevereiro de 1889, Eça faz publicar uma carta no jornal O Tempo, sob o título «Os Maias – Tomás de Alencar – uma explicação». Aí, o escritor afirma que «’ser retratado’ num romance ou numa comédia constitui (…) a mais decisiva evidência da celebridade», considerando também que a Sátira de Bulhão Pato visou somente «criar um tumulto de curiosidade, obrigar todos os olhos a volverem-se para o motivo que a provocou». E conclui esclarecendo que a personagem Tomás de Alencar não era a personificação de Bulhão Pato, pelo que nada poderia justificar «a permanência do sr. Bulhão Pato no interior do sr. Tomás de Alencar, causando-lhe manifesto desconforto e empaturramento». O romancista conclui, declarando que o «intuito final» da carta era «apelar para a conhecida cortesia do autor da Sátira, e rogar-lhe o obséquio extremo de se retirar de dentro do (seu) personagem». E deixa sem comentários a segunda sátira de Bulhão Pato, Lázaro Cônsul, datada de 1889, mais contundente e ofensiva, pois procurava rebaixá-lo como escritor por falta de vernaculidade na expressão linguística («Flaubert, Daudet, Zola resplendem no francês: / Tu, raso imitador, babas o português») e acusava-o de «caluniador da mulher portuguesa».

Bibliografia:
FERREIRA, Maria E. T., Orientações para a Leitura d’Os Maias de Eça de Queirós. Verbo.

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