Português: Análise do conto "George"

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Análise do conto "George"


1.º parágrafo

George encontra-se a caminhar numa “larga rua”, num dia de muito calor, rua essa que já percorrera há vinte anos. Ela é uma mulher de 45 anos (como viremos a descobrir mais à frente) que regressa à sua terra natal, mais de 20 anos de ter partido. A sua caracterização será feita em simultâneo com a de Gi.

A dupla comparação («Andam lentamente, mais do que se pode, como quem luta sem forças contra o vento, ou como quem caminha, também é possível, na pesada e espessa e dura água do mar.») traduz a lentidão da aproximação das duas personagens e, mais ainda, a dificuldade, o esforço para prosseguir o caminho. Por outro lado, sugere o quão difícil é caminhar contra elementos adversos e prepara a atmosfera pesada da vivência para a qual se encaminha a personagem.

▪ O ambiente que se faz sentir «na longa rua» é marcado pelo calor e por uma aragem de «forno aberto», o que significa que esse ambiente é incómodo e asfixiante.

A convocação de Gi cumpre um objetivo claro: George evoca o seu passado, materializado na figura daquela, representante da sua fase jovem, e perspetiva o seu futuro, criando uma imagem mental de si na velhice, Georgina.

A metáfora da bússola significa o seguinte: George sente que perdeu o rumo, o sentido orientador da sua vida, bem como muitas outras coisas, o que sugere que a personagem se sente desorientada, perdida.

A oração coordenada disjuntiva (“Perdeu ou largou?”) e a interrogação é bastante significativa. De facto, se a personagem «perdeu», poderá ter sofrido e lamentar a sua sorte ou o seu excesso de sonho e esperança. Se, por outro lado, «largou», então fê-lo voluntariamente, algo que pode ser ainda mais doloroso ou frustrante por depender, não do acaso, mas da sua própria vontade e capacidade de decisão. George aprecia a liberdade, por isso evita criar vínculos com objetos e lugares, o que acentua a possibilidade de as perdas serem deliberadas.

▪ Por outro lado, o recurso à conjunção coordenada disjuntiva traduz a incerteza e a ambiguidade do narrador no que à descrição que faz e ao seu discurso diz respeito.

O uso do plural (“caminham”) indica a existência de duas personagens: George e a outra.


2.º parágrafo

As duas personagens vestem vestidos brancos e caminham em sentido contrário, o que significa que se irão encontrar como num espelho. É esta característica física que aproxima o retrato de ambas.

▪ Nota para a referência do narrador ao facto de George ter querido, e quase conseguido, esquecer o nome da «outra», ou seja, o seu passado.


3.º parágrafo

Retrato da personagem: jovem, rosto vago e sem contornos; feições incertas e pálidas (comparação com os mortos). De facto, as feições de Gi começam por ser pouco nítidas e esfumadas, mas a sua voz «é muito real e viva».

Como o encontro com Gi ocorre no espaço interior da memória, a figura dificilmente aparece como visão, mas vai-se desmaterializando, permanecendo apenas como voz que possibilita o estabelecimento de um diálogo, à medida que esse contacto interior se prolonga.

Como se verá, a narração do encontro alterna com outros pensamentos de George sobre o seu passado, o que demonstra que o encontro se dá também em pensamento, por isso de forma fragmentada, como é característico da memória.

▪ Referência à “fotografia que tem corrido mundo numa mala qualquer, que tem morado no fundo de muitas gavetas”: personagem muito viajada.


4.º parágrafo

▪ Retrato da personagem:
- físico: olhos largos, semicerrados; boca fina; cabelos escuros e lisos; pescoço alto de Modigliani;
- socioeconómico: pobre, origens humildes.

▪ Pais de Gi / George: eram gente de trabalho, pobre e inculta, com pouca instrução; olhavam o interessa da filha pela cultura com um misto de superioridade característica dos adultos perante as crianças e de indignação ou vergonha por aquilo que, pensavam eles, faria ria as outras pessoas.

▪ Intencionalidade crítica do parágrafo: a pouca instrução dos pais da personagem está associada ao interesse do poder político em manter o povo na ignorância e afastado do conhecimento de outras realidades para além das que correspondiam ao seu espaço social, à sua mundividência. Desta forma, não desenvolviam o seu espírito crítico, o seu poder de reivindicação, algo que constituía um perigo para o regime de ditadura.


5.º parágrafo

▪ George partiu da vida “à descoberta da cidade grande”, porém, naquela época, não era aceitável uma mulher sozinha fazer isso, pois a cidade era considerada um local de perdição.

▪ George era filha de uma família sem grande cultura e vivia numa pequena vila do interior, com as perspetivas próprias de tal contexto: casar, ter uma casa e família/filhos, ser uma esposa e uma mãe exemplares (“… que hei de um dia ser uma boa senhora da vila, uma esposa exemplar, uma mãe perfeita…”) – ou seja, encarnar o papel tradicional reservado às mulheres –, mas sacrificar o gosto pela pintura e desenho que desde sempre manifestara e que a família sempre desvalorizara. Daí a sua decisão de partir, deixando para trás os pais, o noivo, as perspetivas de casamento e a própria vila, indo para longe e desligando-se de tudo.

▪ Que razões existem para a partida de George? A protagonista partiu para descobrir novas realidades, novas experiências, uma nova vida, em suma, com liberdade de escolha. A sua partida da vila foi motivada, portanto, pela vontade de romper com a vida convencional que lhe estava destinada, mas que ela não desejava.

▪ Note-se como vários dados biográficos da personagem surgem concentrados em poucas linhas, o que mostra que os factos não têm, atualmente, grande ou nenhum significado para si. Ou seja, como muitas outras pessoas, George quis mudar, teve várias experiências amorosas (umas grandes, outras casuais/superficiais), casou-se, divorciou-se e viajou muito, aquém e além-mar.

▪ Essa mudança espacial repercute-se no seu físico, nomeadamente no cabelo, cuja cor está sempre a alterar. Aliás, a sua caracterização física foca-se precisamente nas alterações que a sua figura sofreu ao longo do tempo.

▪ George quis distanciar-se da sua juventude, da sua vida com os pais, do seu primeiro namorado (Carlos), isto é, de tudo o que a ligava àquela terra, daí ter partido à descoberta da cidade grande «por além terra, por além mar».

▪ A vida de George acaba por se tornar vertiginosa, o que fica bem visível na sucessão de verbos (“casou-se, divorciou-se, partiu, chegou, voltou a partir e a chegar”), que nos dá a ideia de movimento constante, de procura também constante, de instabilidade emocional.

▪ Atualmente, vive em Amesterdão.


6.º parágrafo

▪ O sexto parágrafo introduza temática da habitação. Nos primeiros tempos após a partida da vila, George passou por dificuldades, tendo vivido em “quartos alugados mais ou menos modestos, depois em casas mobiladas mais ou menos agradáveis”.

▪ A protagonista esconde da mãe estas questões. Com ela comunica através de cartas, escassas (não gostava de escrever) e pouco minuciosas.

▪ As duas últimas notas biográficas do parágrafo são dedicadas à morte dos pais.


7.º - 10.º parágrafo

▪ Estes parágrafos continuam a focar-se na temática habitacional, focalizando o facto de George só habitar casas mobiladas, como já havia sido referido no parágrafo anterior.
   Nesta passagem do conto, destaca-se a necessidade ou o desejo de a personagem não criar ligações, afetos, não estar presa a nada emocionalmente. Só assim é completamente livre para viver, “senhora de si”.

▪ No entanto, esta forma de vida tem consequências negativas para a personagem. Por exemplo, causa-lhe sofrimento e dor (“fazes isso, enfim, toda essa desertificação, com esforço, com sofrimento”). No fundo, estamos perante uma forma de vida que propicia o vazio, a solidão, o desencanto (“os amigos que julga sinceros, sê-lo-ão?”).

▪ O desejo de ser livre subordina tudo o mais: “Queria estar sempre pronta para partir sem que os objetos a envolvessem, a segurassem, a obrigassem a demorar-se mais um dia que fosse. Disponível, pensava. Senhora de si. Para partir, para chegar.”.

▪ Psicologicamente, George caracteriza-se pelo desapego («viveu sempre em quartos alugados» ou «em casas mobiladas»), pela instabilidade afetiva («Teve muitos amores […], casou-se, divorciou-se, partiu, chegou, voltou a partir e a chegar, quantas vezes?»), pelo desejo intenso de liberdade («Queria estar sempre pronta para partir sem que os objetos a envolvessem, a segurassem, a obrigassem a demorar-se mais um dia que fosse.»).

▪ As constantes viagens representam o espírito de liberdade de George. A sua permanente itinerância relaciona-se com o desprendimento das coisas e das coisas, visto que queria estar sempre pronta para partir sem estar presa a nada nem a ninguém. É esta filosofia de vida que a leva a viver em quartos e casas mobiladas em que não conserva quase nada de seu, exceto alguns livros e poucos amigos.

▪ Este desapego das coisas é o mesmo que justifica o abandono da família e a manutenção com ela de contactos superficiais (as escassas cartas escritas à mãe) e que a leva a vender a casa dos pais, mesmo que Gi «talvez ainda [lá] more», isto é, mesmo que a própria George ainda mantenha ligações afetivas com ela e a venda comporte algum sofrimento.

▪ Em suma, a personagem (Gi) deseja ser livre, por isso evita criar vínculos com objetos e lugares, o que nos permite concluir que as perdas na sua vida serão deliberadas.


11.º parágrafo

▪ Os pais, de outro tempo e com outra mentalidade, não compreendiam o desejo de liberdade sentido pela filha.

▪ A referência às malas mostra a mudança do estatuto social da protagonista. De origens humildes, partiu de casa “com uma velha mala de cabedal riscado”, alcançou um bem-estar económico que lhe permite adquirir artigos mais caros e sofisticados (“E as suas malas agora são caras, leves, malas de voar e com rodinhas.”).


12.º parágrafo

▪ As duas personagens encontram-se, finalmente, cara a cara, depois de caminharem devagar uma em direção à outra.

▪ No início, a personagem com quem George depara é envolta em grande mistério. O seu rosto é uma memória esbatida conservada numa fotografia (3.º parágrafo) e vai ganhando nitidez de traços – olhos, boca, cabelos, pescoço (4.º parágrafo). Quando, agora, se encontram, o rosto está novamente esfumado, até o rosto do presente – George – encontrar o rosto do passado, a jovem Gi, uma “rapariguinha frágil, um vime, que ela tem levado a vida inteira a pintar”.

▪ O diálogo que se segue é, na verdade, um encontro de George com a jovem que foi naquela vila, por isso recorda detalhes como o do alfinete de ouro, e na despedida “não se tocam”, nem tal seria possível, e começam a mover-se ao mesmo tempo, lentamente, como quem anda na água ou contra o vento. A cada instante vão-se distanciando cada vez mais. E nenhuma delas olha para trás. “O esquecimento desceu sobre ambas.”.

▪ Em suma, Gi é George e mora na sua memória.


15.º parágrafo

▪ Este parágrafo marca a mudança (a evolução) operada de Gi para George: a juventude, a fragilidade física, as dificuldades económicas e a pobreza (simbolizadas pelo pregador de oiro que penhorou em Lisboa) de Gi → a pintura à maneira de Modigliani > a criação de um estilo próprio, a fama e o sucesso enquanto pintora, de George.


16.º parágrafo e seguintes – o diálogo entre Gi e George

▪ Motivo do regresso de George: vender a casa dos pais.

▪ Simbolismo da venda da casa: a rutura definitiva com o passado.

▪ Retrato de Gi:
- muito jovem
- quieta
- olhar esquecido e vazio
- não espantada com a venda da casa

▪ Projetos futuros de Gi:
1.º) Partir da vila, mesmo sabendo que não terá o apoio e a aprovação da família; sozinha, pois o namorado tem outros projetos que não envolvem sair da região.
2.º) Continuar simplesmente a pintar.

▪ A revelação dos projetos é feita através da memória de George, que, face à imagem de si mesma enquanto jovem, relembra os projetos que então tinha: deixar tudo, partir e pintar.

▪ Esses projetos colidem com os do seu namorado de então, Carlos, que deseja comprar uma terra e construir uma casa, financiados por uma herança recebida.

▪ Também os «outros» fazem projetos para Gi: ser “uma boa senhora da vila”, uma esposa exemplar, uma mãe perfeita, uma boa dona de casa, “com muito jeito para o desenho”, que será como que tolerado, podendo até “fazer retratos das crianças quando tiver tempo”. Espera-se, em suma, que case (a mãe já lhe está a fazer o enxoval), tenha filhos e cuide da casa.

▪ George tem pressa (tem de apanhar o comboio para regressar; no dia seguinte seguirá para Amesterdão, onde tem um ateliê).

▪ A despedida entre ambas é extremamente significativa: dão um beijo rápido, no ar, sem se tocarem; começam a mover-se ao mesmo tempo, devagar; afastam-se, sem nenhuma delas olhar para trás.

▪ Simbolismo da despedida: como a nota ”ambas dão um beijo rápido, breve, no ar, não se tocam, nem tal seria possível” deixa entender, este encontro é, na realidade, o encontro de George consigo mesma, com a recordação de um passado que não deixou saudades, a que não quer voltar, mas onde havia uma jovem, Gi, que nunca deixou de a acompanhar, isto é, que nunca se apagou da sua memória. Por se tratar de uma mera memória, a despedida não causa dor, visto que Gi permanecerá no passado, sempre jovem e sempre presente na memória de George. Por se tratar de uma mera memória, “não seria possível”, de facto, que as duas se tocassem: uma era apenas memória.

▪ A aproximação e o afastamento destas duas personagens revestem-se de mistério, de estranheza e ambiguidade. Alguns elementos fantásticos determinam estes efeitos: as feições incertas do rosto de Gi comparadas ao que acontece com o rosto das pessoas mortas, o rosto esfumado de Gi quando chega perto de George, a estranheza de Gi continuar jovem cerca de 23 anos depois, o beijo dado por Gi e George em que «não se tocam, nem tal seria possível».

▪ Em suma, Gi representa a imagem de George quando tinha 18 anos que esta imagina encontrar no seu regresso à terra onde nasceu e se criou.


38.º parágrafo

▪ No comboio, George tem consciência de que o passado ficou definitivamente para trás. Ao vender a casa dos pais, não lhe resta qualquer motivo para regressar. Nem ela o quer.

▪ No entanto, sente uma certa nostalgia pelo seu passado, por tudo o que ficou para trás na sua vida.

▪ Não obstante, uma parte de si mantém-se distante, livre de emoções: “uma simples lágrima no olho direito, o outro, que esquisito, sempre se recusa a chorar. É como se se negasse a compartilhar os seus problemas, não e não.”.

▪ As lágrimas simbolizam precisamente essa fragmentação de George: a lágrima nostálgica do olho direito e a recusa dessa nostalgia através do olho esquerdo, que recusa a emoção.


39.º - 40.º parágrafos

▪ A partir do 39.º parágrafo dá-se o encontro de George com Georgina.

▪ Este segundo encontro é semelhante ao primeiro: gradual, pouco nítido, visto que ambas surgem com contornos indefinidos e difusos que, gradualmente, se tornam mais nítidos.

▪ Note-se que George resiste ao aparecimento de Georgina, dado que fecha os olhos e tenta dormir. Parece mesmo encará-la com alguma hostilidade, visível nas expressões «velha» e «atirar à cara», bem como na forma como decide terminar o encontro, aludindo a uma dor de cabeça.

▪ Retrato da figura misteriosa (Georgina):
- senhora de idade (eufemismo), uma mulher velha
- mãos enrugadas
- uma carteira preta, cara, italiana – sinal exterior de riqueza
- sorri, um sorriso diferente do de Gi
- cabelo pintado de acaju
- rosto pintado de vários tons de rosa, discretamente mas sem grande perfeição
- boca esborratada

▪ A interrogação “porque havia de ter?” aponta para a metamorfose da figura feminina, salientando a sua evolução e transformação: o sorriso de uma mulher velha não é igual ao seu enquanto jovem.


41.º parágrafo e seguintes – diálogo entre George e Georgina

▪ Retrato de Georgina:
- quase 70 anos
- só
- vive de recordações
- sabe que George vive numa casa mobilada
- adivinha o que George sente

▪ Caracterização de George:
- 45 anos
- sente-se velha por vezes
- está a chorar
- gosta do seu trabalho
- irritada, não quer assumir a tristeza que, involuntariamente, sente

▪ Simbologia de Georgina e do encontro com George:

1.º) Georgina é fruto da imaginação de George. Aparece do nada e, quando George abre os olhos, já lá não está, “desapareceu”. Fala sem ter voz, mas George consegue ouvi-la. Estes dados permitem concluir que Georgina não existe, é imaginada por George, pelo que corresponde ao que ela supõe que poderá ser no futuro, daí a cerca de vinte e cinco anos.

2.º) Georgina, enquanto projeção da personagem, sabe tudo sobre George: (a) que só vive em casas mobiladas, (b) que está triste, (c) mas no dia seguinte terá esquecido o encontro com o passado, (d) que um dia será velha e sentir-se-á só, € que sentirá a falta de ligação à família e aos amigos, (f) que irá sentir a falta do afeto de que fugiu durante toda a vida, como simples fotografias, por exemplo.

3.º) Georgina simboliza a voz da experiência, o saber empírico que alerta George para os problemas com que se deparará no futuro, quando for velha. Dado que é um produto da imaginação de George, podemos considerar que a figura de Georgina representa o medo inconsciente do futuro por parte da protagonista do conto.

4.º) Georgina lembra a George que, embora as pessoas novas não pensem no assunto, a velhice chegará inevitavelmente e com ela os sentimentos de perda, solidão e abandono. É então, nesse momento, que se valorizam a família, os amigos e tudo aquilo que se perdeu ou abandonou. Daí que Georgina tenha tentado obter as fotografias que George nunca guardou.

▪ Na fase final do diálogo entre ambas, George queixa-se de uma dor de cabeça: «Dói-me simplesmente a cabeça.».
A causa desta dor é o facto de a protagonista estar a pensar o futuro, pois ela prevê que poderá ficar só, visto que não cultivou laços de amor ou de amizade. Por outro lado, essa situação poderá acarretar um grande vazio na sua vida perante a falta de raízes no que a rodeia.
Esta dor de cabeça poderá constituir também uma espécie de desculpa de que George se socorre para dar por indo o encontro com a sua imagem da velhice.


Penúltimo parágrafo

▪ George fecha os olhos e procura pensamentos mais agradáveis para fugir a essa dor: uma nova exposição, o quadro vendido que lhe rendeu muito dinheiro, a próxima viagem.

▪ George crê que a fuga a essa dor, a essa preocupação com o futuro, a esse vazio que tanto teme, reside no dinheiro e no êxito enquanto pintora, que lhe trará mais dinheiro. Para ela, quem tem dinheiro nunca está só.

▪ George tenta convencer Georgina, o seu «eu» futuro dessa verdade, porém ela já lá não está. Esfumou-se.

▪ Só nesta parte do conto se fica a conhecer o nome de George com quase 70 anos: Georgina. Desta forma, o narrador clarifica a dinâmica do conto, entre a realidade da personagem, a sua memória e a sua imaginação.


Último parágrafo

▪ A sensação de asfixia desaparece: «O calor de há pouco foi desaparecendo e agora não há vestígios daquela aragem de forno aberto.».

▪ George sente-se agora «tranquilizada». Depois das suas viagens ao passado e ao futuro, a protagonista sente-se tranquila, pois vai voltar a casa e, por outro lado, convence-se de que, graças ao seu dinheiro, na velhice, não será uma pessoa só, ao contrário do que Georgina prognosticara.

▪ Além disso, em breve estará de novo em casa, em Amesterdão, onde «vai morar com o último dos seus amores. No entanto, fica sempre no ar a dúvida, a incerteza: «durante quanto tempo?».

▪ O comboio constitui a representação real da viagem do passado para o futuro.

▪ Findo o conto, pode concluir-se que George desvalorizou a mensagem de Georgina, traduzindo isto, talvez, a incompreensão da velhice por parte dos mais novos, «pois esta idade só é verdadeiramente compreendida e sentida por quem a atinge e vive as limitações e o sofrimento que ela implica.». (Manual Palavras 12, p. 170)

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