Português: Análise de "Se Helena apartar"

terça-feira, 2 de março de 2021

Análise de "Se Helena apartar"


 
Assunto: o sujeito lírico descreve a beleza dos olhos de Helena, cuja magia e beldade é comprovada pelo efeito que provocam: tornam belos todos os elementos da Natureza, cativam os corações e a alma e o próprio amor lhes presta vassalagem.
 
 
Tema: o poder transformador de Helena / a beleza da mulher.
 
 
Estrutura interna
 
1.ª parte (mote) – Introdução: se Helena afastar os seus olhos do campo, nascerão abrolhos – a beleza da Natureza depende dos olhos de Helena.
 
2.ª parte (vv. 4-12) – Os efeitos / o poder dos olhos de Helena na Natureza:
▪ a verdura dos campos;
▪ acalma os ventos;
▪ transforma espinhos em flores;
▪ faz as ferras floridas;
▪ faz límpidas as fontes (isto é, purifica-as).
*     Os campos são verdes, porque Helena está presente e os seus olhos também possuem essa cor.
*     Os gados beneficiam indiretamente da cor dos olhos de Helena, pois o seu alimento é a verdura dos campos, que existe graças àquela.
*     Os versos 4 a 7 apresentam um discurso de 2.ª pessoa (“pasceis”, “sabei”), enquanto os restantes contêm um discurso de 3.ª pessoa. Além disso, no verso 5 está presente uma apóstrofe aos gados, que apascenta nos campos (eles são verdes devido à presença de Helena e à cor dos seus olhos), notando-se como a ação da mulher é muito abrangente, dado que têm influência direta na verdura e indireta nos animais que dela dependem.
*     Além disso, tornam a beleza bela e trazem-lhe paz e sossego.
 
3.ª parte (vv. 13-21) – Os efeitos dos olhos de Helena nas pessoas:
▪ trazem as vidas suspendidas – ou seja, causam admiração e fascínio;
▪ prendem os corações – isto é, seduzem (fazem com que os homens se apaixonem);
▪ uma alma pende cada pestana – sentido equivalente ao verso 18.
*     Helena é uma figura graciosa, inatingível, espiritualizada, divinizada (“Com graça inumana”), pertencente a outro mundo. O amor que inspira é um amor espiritualizado, inefável.
 
4.ª parte (vv. 22-24) – Os efeitos dos olhos de Helena no Amor (Cupido), que se ajoelha, rendido à magia do olhar:
▪ rendição (v. 22);
▪ êxtase e espanto / surpresa (v. 24).
*     Helena é tão bela que o próprio Amor (Cupido) tem para com ela uma atitude de vassalagem, ajoelhando-se na sua frente.
 
Uma outra possível divisão do texto passará por considerar que é constituído por duas partes: a primeira, situada entre os versos 1 e 13 e constituída pelos efeitos dos olhos de Helena na Natureza, e a segunda, entre os versos 14 e 24, compreendendo os efeitos nos seres humanos.
 
 
Caracterização dos olhos de Helena
▪ verdes: “A verdura […] deveis / aos olhos de Helena”;
▪ serenos: “Os ventos serena”;
▪ belos: “faz flores d’abrolhos”; “Faz serras floridas”;
▪ claros: “Faz claras as fontes”;
▪ luminosos: “na luz dos seus olhos”;
▪ meigos e sedutores: “Os corações prende”;
▪ graciosos e divinos: “Com graça inumana”
▪ amorosos: “Amor se lhe rende”.
 
 
Retrato da Natureza
 
• A imagem que nos é apresentada no poema corresponde ao locus amoenus clássico, isto é, uma paisagem idealizada, uma espécie de paraíso terrestre, constituído por elementos como o campo verdejante, um arvoredo vasto, flores coloridas e fontes claras (águas límpidas e transparentes).
 
• Esta natureza mágica propicia o amor, o encantamento sensorial e espiritual do Homem.
 
 
Relação entre Helena e a Natureza
 
• Os olhos / a beleza de Helena influencia(m) grandemente a Natureza: os seus olhos verdes e belos tornam a terra verde e florida, que depois serve de alimento para o gado; a paz do seu olhar serena os ventos, transforma os espinhos em flores e clareia a água das fontes.
 
• Por outro lado, estas características prendem os corações, isto é, fazem o Amor render-se, numa espécie de vassalagem amorosa (personificação do Amor – vv. 22 a 24).
 
• Em suma, a beleza da Natureza fica a dever-se à beleza de Helena, que tem o poder de transformar o que se situa em seu redor.
 
 
Análise formal
 
Classificação: vilancete constituído por um mote de 3 versos (terceto) e três voltas de 7 versos (sétimas).
 
Métrica: versos de 5 sílabas métricas – redondilha menor (medida velha).
 
Rima:
» esquema rimático: abb / cddccbb
» o 1.º verso do mote é branco
» rima emparelhada e interpolada
» aguda (vv. 1, 5 e 6) e grave (os restantes)
» consoante (todo o poema)
» pobre (“olhos” e “abrolhos”) e rica (“amena” e “Helena”)
» imperfeita (“giolhos” e “olhos”)
 
 
Recursos expressivos
 
Reiteração do nome «olhos» (5 vezes): enfatiza a importância, os efeitos e o seu poder transformador.
 
Adjetivos: realçam a beleza de Helena, dos seus olhos e respetivo poder.
 
Verbos:
Presente do indicativo: torna mais viva a presença dos olhos de Helena.
Futuro do indicativo: exprime os efeitos desastrosos do eventual afastamento dos olhos de Helena (v. 13).
 
Sinédoque: “seus olhos” (v. 2) – o sujeito poético atribui à mulher as maiores qualidades físicas e morais, referindo-se-lhe através de uma das partes do corpo mais importantes e expressivas – os olhos (são o espelho da alma).
 
Apóstrofe (v. 5): identifica o interlocutor do sujeito poético, que inconscientemente beneficia dos efeitos transformadores dos olhos de Helena, para lhe dar conta do seu extraordinário poder, capazes de colorir a verdura.
 
Hipérbato (vv. 8 a 10): o «eu» dá primazia à ação e ao objeto onde esta recaiu ao inverter a ordem natural dos elementos da frase, relegando para o fim o sujeito (“O ar de seus olhos”).
 
Anáfora (vv. 9, 11-12): enfatiza o poder transformador dos olhos de Helena sobre a Natureza.
 
Enumeração + Assíndeto (vv. 8 a 12): o sujeito poético enumera os elementos da Natureza afetados e transformados pelos olhos de Helena.
 
Interrogação retórica: salienta o poder dos olhos de Helena, que transita da Natureza para as vidas humanas; leva-nos a refletir sobre os efeitos dos olhos nos seres humanos (se eles conseguem ter todo aquele poder na Natureza, o que conseguirão fazer à vida das pessoas?).
 
Comparação (vv. 15-17): destaca a quantidade de vidas que Helena traz apaixonadas pela luz dos seus olhos; deste modo, reforça-se o efeito provocado por eles, equiparando um molho de ervas ao conjunto de vidas presas pelo fascínio de Helena.
 
Personificação (v. 22): traduz a atitude de vassalagem do Amor face aos olhos de Helena.
 
Sinédoque + Metáfora + Hipérbole (“De cada pestana / Uma alma lhe pende” – vv. 20-21): reforço do poder de Helena através da referência às pestanas enquanto agentes de sedução e magia (as pessoas ficam suspensas da beleza do seu olhar). As pestanas representam os olhos e estes simbolizam a própria Helena.
 

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