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sábado, 21 de setembro de 2024

A escola do século XIX em imagens - XIX

André-Henri Dargelas, – A Volta do Mundo (c. 1860)

    André Henri Dargelas foi um pintor francês que se dedicou a representar, dentro dos cânones de um realismo académico avesso a rasgos vanguardistas, a infância. Aplicou-se a retratar com sensibilidade e mestria o quotidiano das crianças em casa, na escola ou na rua, em brincadeiras infantis. Mas o pendor realista da sua arte não o impediu de recorrer à subtileza, à ironia e à imaginação nas suas representações.
    É o caso desta pintura, que já foi apropriadamente descrita como uma feliz metáfora da infância cavalgando o mundo. Ela recorda-nos que a irrequietude e a irreverência das crianças não são, como muitas vezes se tenta crer, um mal desta ou daquela geração mas, pelo contrário, uma característica da própria humanidade. Aproveitando a ausência do professor na sala de aula, os miúdos dão azo à sua imaginação, inventando novas utilidades para instrumentos pedagógicos como este avantajado globo terrestre que, transformado em brinquedo, surge destacado no centro da pintura.
    É uma brincadeira, na verdade, prestes a ser interrompida pelo adulto, provavelmente o professor da turma, assomando à porta da sala. Mas brincar é, como dizem os psicólogos, das coisas mais sérias que as crianças fazem, pois é também, e acima de tudo, uma forma natural de aprendizagem. Há um fascínio infantil em fazer descobertas e inventar desafios. Em explorar o mundo com uma curiosidade insaciável, ainda que de forma simbólica, pois não se chega a sair da sala de aula. E é esse simbolismo que, de forma especialmente feliz, a pintura de Dargelas nos procura transmitir.

domingo, 15 de setembro de 2024

A escola do século XIX em imagens - XVIII

Jean Geoffroy – Na Escola Maternal (1898)

    Neste quadro, a atenção do pintor recai sobre a educação pré-escolar, mais propriamente a École Maternelle, uma criação das reformas educativas ocorridas em França na década de 80 do século XIX. Estas escolas, que recebiam crianças entre os dois e os cinco anos, tiveram um papel fundamental tanto no apoio às famílias, acolhendo os filhos das classes trabalhadoras, como na socialização e nos cuidados às crianças, preparando, num ambiente afetuoso e lúdico, organizado mas ao mesmo tempo acolhedor, a sua futura integração no ambiente escolar. França tem, ainda hoje, uma das melhores redes de educação pré-escolar do Velho Continente, sendo esse apoio social, familiar e educativo um dos fatores cruciais que têm permitido ao país contrariar, até certo ponto, a quebra da natalidade que assola todo o continente.

    Na pintura de feição realista, em tons suaves mas expressivos, está representado o momento em que, acompanhadas e orientadas por educadoras atentas mas atenciosas, as crianças lavam as suas mãos. Incutir, desde a primeira infância, hábitos de higiene era um dos objetivos da escola maternal. Felizes e sorridentes, meninos e meninas cumprem o seu ritual de limpeza matinal!

Fonte: Escola Portuguesa.

domingo, 8 de setembro de 2024

A escola do século XIX em imagens - XVII

Max Silbert – Aula de Canto na Holanda (1907)

    Este quadro constitui já uma incursão na escola dos alvores do século XX, mostrando uma diversidade curricular, mesmo na escola elementar, que vai muito para além do ler, escrever e contar…
    Max Silbert, um pintor ucraniano naturalizado francês, país onde desenvolveu a sua obra artística, apresenta aqui, num registo quase fotográfico, uma aula de canto numa escola holandesa. Numa turma que hoje consideraríamos numerosa, uma pequena solista evidencia os seus dotes de cantora enquanto a professora toca a melodia. A maioria dos colegas assiste atentamente, aguardando a sua ocasião de participar também, embora se note, na pequena plateia, um ou outro distraído, e até mesmo, na primeira fila, um pequenote caído no sono!
    Trata-se de uma escola mista, o que não era o padrão comum na maioria dos países naquele tempo. Há, no entanto, uma marcada distinção entre meninos e meninas, que se evidencia sobretudo no facto de estas, mesmo as mais pequerruchas, trazerem a cabeça coberta com um lenço ou uma touca. Uma expressão de modéstia e pudor que hoje associamos ao conservadorismo islâmico, mas que foi, desde os tempos medievais e ainda durante boa parte do século XX, comum nalguns países da Europa cristã, como é o caso dos Países Baixos: uma nação associada a valores de liberdade e tolerância desde a sua fundação, mas surpreendentemente conservadora em certos aspetos do quotidiano…


domingo, 1 de setembro de 2024

A escola do século XIX em imagens - XVI


Winslow Homer – Escola Rural (1871)

    A pintura retrata uma escola rural algures no norte dos EUA. A Guerra da Secessão havia terminado há apenas meia dúzia de anos, e o pintor, Winslow Homer, viveu-a e retratou-a na primeira pessoa. Contudo, o ambiente que se respira neste quadro é de absoluta paz e tranquilidade. Envoltos na luz suave que entra pelas janelas e sob o olhar vigilante da professora, uma dúzia de alunos concentra-se nas tarefas escolares.

    As crianças são de diversas idades e de ambos os sexos: trata-se de uma pequena escola rural, de lugar único, diríamos hoje. Era então uma realidade que começava a desaparecer com o crescimento demográfico de aldeias, vilas e cidades e a progressiva massificação do ensino, e que aqui é evocada já, talvez, com alguma nostalgia.

Outra constatação interessante é a forma como meninos e meninas se trajam e calçam: enquanto os rapazes se apresentam descalços e com um aspecto mais informal ou até descuidado, as meninas parecem esmerar-se na sua apresentação. Um indício de maiores atenções dadas ao sexo feminino, ou um sinal de que as raparigas pobres eram, mais facilmente que os rapazes, privadas da escolarização?…

    Atente-se também na professora, uma mulher ainda jovem que, como muitas outras da sua geração, deixou de ser uma mera dona de casa, optando por exercer uma profissão. Uma realidade comum em anos de guerra e de pós-guerra, quando a falta de mão-de-obra masculina tende a abrir às mulheres o mercado de trabalho. E também o começo de um longo processo que converteu a docência, de início predominantemente masculina, numa profissão hoje largamente dominada pelas mulheres…

Fonte: Escola Portuguesa.

quarta-feira, 28 de agosto de 2024

A escola do século XIX em imagens - XV


Thomas Brooks – O Novo Aluno (1854)

    O quadro de Thomas Brooks transporta-nos até à Inglaterra vitoriana. O império britânico estava no seu auge, a indústria, o comércio, a finança e a marinha britânicas dominavam o mundo, fazendo da Inglaterra e do seu vasto império a primeira potência mundial. Mas persistiam, no interior rural inglês, escolas como a que, com grande mestria e atenção ao pormenor, aqui é representada.

    À sala de aula, dirigida por um professor já idoso, chega um novo aluno. Mais velho do que a maioria dos restantes, é trazido por uma auxiliar ou criada, que descobre a cabeça do rapaz na apresentação ao professor e à turma, enquanto os pais assistem, espreitando à porta. Da parte dos novos colegas, e face ao acanhamento e alguma desconfiança do rapaz, as reacções dividem-se entre a genuína curiosidade, o esgar trocista e a completa indiferença.

    Sobre a sala de aula, facilmente identificada pela profusão de mobiliário e material escolar, ainda não é desta que nos deparamos com o famoso “modelo do autocarro”… As carteiras e bancos distribuem-se algo desordenadamente pelo espaço pouco arrumado. A diferença de idades dos alunos e a heterogeneidade da turma sugerem-nos que a pedagogia aplicada deveria estar mais próxima do que hoje chamamos diferenciação pedagógica do que da rigidez que vulgarmente se associa à escola do antigamente.

Fonte: Escola Portuguesa.

domingo, 25 de agosto de 2024

A escola do século XIX em imagens - XIV


Nikolai Bogdanov-Belsky – À porta da escola (1897)

    Quando pintou este quadro, Bogdanov-Belsky era já um pintor conceituado na Rússia, embora estivesse na altura a viver em Paris, cidade onde completou a sua formação artística. Mas nunca esqueceu as suas origens humildes: nascido numa família de camponeses pobres e vivendo com dificuldades – uma realidade muito comum na Rússia czarista – o pintor conservou sempre um especial carinho pelos camponeses, que se exprime frequentemente nas suas pinturas.

    Nesta pintura, vemos em destaque um rapaz do campo que, num misto de curiosidade, acanhamento e vontade de aprender, observa o interior da sala de aula onde já se encontram o professor e os colegas., Não lhe vislumbramos o rosto, mas podemos apreciar o contraste entre as roupas grosseiras e esfarrapadas que veste e o interior organizado da sala de aula, com os alunos nas suas carteiras, o quadro preto à sua frente, mapas e quadros na parede. Nikolai Bogdanov-Belsky, um pintor formado no Realismo, dá aqui os seus primeiros passos no Impressionismo, o estilo então preponderante nas escolas de arte parisienses que frequentou. Uma influência que se nota facilmente, por exemplo, no cuidado tratamento da luz que se projecta no interior da sala.

    Este retrato do novo aluno à porta da escola não só nos transporta ao ambiente de uma escola rural dos finais do século XIX como adquire até um cunho autobiográfico: o artista revê-se neste humilde rapaz, à partida predestinado às lides do campo, mas com enorme vontade de aprender muitas mais coisas do que as que o esquálido mundo em que vive tem para lhe ensinar. E é a escola que lhe abrirá novos e deslumbrantes horizontes. Isto é o exacto oposto do discurso cretino dos detractores da “escola do século XIX”: a escola não existia nesse tempo, como nos querem convencer, para formatar alunos destinados às profissões mecânicas. Pelo contrário, foi graças à instrução escolar que milhares e milhares de estudantes pobres, mas aplicados e talentosos, puderam escapar da sua condição de partida e daquilo que seria o seu destino quase inevitável: o trabalho nos campos, nas fábricas ou nas minas.

Fonte: Escola Portuguesa.

segunda-feira, 19 de agosto de 2024

A escola do século XIX em imagens - XIII


Ludwig Passini – Aula de latim (1869)

    Nesta aguarela do pintor austríaco Ludwig Passini, ainda uma sala de aula do século XIX, embora diferente das que tenho apresentado: trata-se de uma aula de latim, certamente num seminário ou outra escola religiosa. Percebemos isso pelas vestes do professor e dos alunos, pois curiosamente não vemos crucifixos ou outros símbolos religiosos na decoração das paredes. O ambiente e a organização do espaço, com os estudantes dispostos em filas laterais e o professor ao centro e ao fundo, num plano mais elevado, são reminiscências das escolas e universidades da Idade Média e do Antigo Regime.
    Nestas escolas, o estudo do latim assumia um papel preponderante. Apesar de ser já então uma língua morta, continuava a ser uma disciplina estruturante, como hoje se diz do Português ou da Matemática. Língua de cultura por excelência, era em latim que se celebravam os ofícios católicos, realidade que persistiu até à segunda metade do século XX, só alterada com o Concílio Vaticano II. Embora escrita originariamente noutras línguas, era na sua versão latina que a Bíblia era estudada e comentada. Um bom domínio da língua dos antigos Romanos era assim requisito indispensável na formação do clero.

    Nos países católicos, os seminários, obrigatoriamente existentes em todas as sedes de diocese, tiveram um papel importante na formação académica dos jovens, permitindo-lhes um percurso que nem sempre desembocava na vida religiosa. Em Portugal, ainda durante a maior parte do século XX, os seminários permitiram a milhares de jovens, estudiosos mas de parcos recursos, realizar estudos secundários. Movida pela necessidade de formar sacerdotes, a Igreja Católica proporcionava ensino gratuito, alojamento e alimentação aos estudantes que acolhia, na esperança de que um bom número deles viesse a enveredar pelo sacerdócio. De quase duas dezenas de crianças e adolescentes que vemos na pintura, quantos lá terão chegado?…

Fonte: Escola Portuguesa.

sexta-feira, 16 de agosto de 2024

A escola do século XIX em imagens - XII


Eduard Ritter – Sala de aula no Tirol (c. 1840)

    Eis, em pleno século XIX, uma sala de aula nada convencional: em vez do mobiliário habitual – carteiras, lousas, secretária, estrado, mapas na parede – o que vemos é um aposento da casa do professor, com quadros na parede e móveis domésticos, sem faltar o pormenor da fruta que o docente vai depenicando durante a aula.
    Mais curiosa ainda é a forma como as crianças surgem divididas em dois grupos contrastantes: à esquerda, junto ao professor, três meninas aplicadas apresentam os seus trabalhos ao professor, enquanto o grupo mais numeroso dos rapazes, à direita, se entretêm com diversas tropelias. O mestre, já idoso, concentra-se nas suas alunas predilectas e no enorme cachimbo que vai fumando, aparentemente alheio a desordem que grassa lá para atrás. A indisciplina não é apenas, como aqui se vê, um problema do nosso tempo…
    Outra reflexão que este quadro nos sugere e que se mantém actual: como explicar que a indisciplina e os comportamentos disruptivos em geral surjam mais frequentemente associados, nas escolas, ao género masculino? Sendo esta uma realidade tanto empírica como estatisticamente demonstrável, o que leva a que os rapazes, de um modo geral, tendam a comportar-se pior na escola? Serão determinantes as características biológicas e psicológicas associadas a cada um dos géneros, as mesmas que levam a que também haja mais delinquentes, criminosos e presidiários entre os homens? Ou é a escola, da forma como tradicionalmente se organiza, que tende a valorizar determinados estereótipos atitudinais e comportamentais mais associados aos género feminino?
    Poderá ser um pouco de tudo isto, mas há um factor de natureza mais sociológica não menos relevante: antes da escolaridade ser obrigatória, eram quase só os rapazes que iam à escola. Numa família pobre ou mesmo remediada, era comum os rapazes estudarem pelo menos o tempo suficiente para aprenderem a ler e escrever, enquanto as suas irmãs ficavam em casa. E é quando começam a ser mandadas à escola que muitas raparigas, vendo nos estudos a possibilidade de ter uma vida diferente das suas mães e avós, e sabendo que ao primeiro sinal de insucesso serão retiradas da escola, não hesitam: agarram essa oportunidade com unhas e dentes…

sexta-feira, 9 de agosto de 2024

A escola do século XIX em imagens - XI


Jean Geoffroy – Aula da escola primária (1889)

    A escola que hoje consideramos tradicional, por vezes mesmo retrógrada e ultrapassada, acompanhou o processo de construção e afirmação da cultura e da civilização ocidentais. Períodos em que o acesso à escolarização aumentou, como a Baixa Idade Média, o Renascimento ou o Iluminismo, foram também épocas de crescimento económico e florescimento cultural. Uma das razões que explica, ainda hoje, o relativo atraso económico da Europa meridional é a persistência, nalguns casos até ao final do século XX, de elevadas taxas de analfabetismo. Sem o contributo da escola tradicional, que hoje se contesta a favor de ensinanças domésticas ou de míticas “comunidades de aprendizagem”, e independentemente das suas transformações presentes e futuras, nunca teríamos alcançado os padrões de vida da sociedade industrial e tecnológica em que hoje vivemos, duplicado ou triplicado a esperança média de vida, afirmado a democracia e as liberdades individuais, massificado o acesso à saúde, à cultura, à arte e ao conhecimento em geral.
    O quadro de Geoffroy reflete uma realidade recente que o pintor testemunhou: a implementação de leis (1882-83) que impuseram a escolaridade obrigatória em França. Foi uma aposta decidida do novo regime republicano – em Portugal também assumida a partir de 1910, embora com resultados bem mais limitados – que trouxe mais crianças às escolas, obrigando a investir na abertura de novas salas e na formação de mais professores. Igualmente importante foi o fomento da rede pública das chamadas escolas maternais, aptas a receber as crianças em idade pré-escolar: um apoio social fundamental que em Portugal, quase 150 anos depois, e com uma baixíssima natalidade, ainda não conseguimos assegurar plenamente a todas as famílias trabalhadoras!
    O objetivo da escolaridade obrigatória era, além do combate ao flagelo do trabalho infantil, criar novas gerações mais qualificadas e instruídas, mais aptas tanto para ingressar no mercado de trabalho cada vez mais exigente como para participar de forma consciente e ativa na vida política democrática. Num tom subtilmente propagandístico, o pintor mostra-nos a sala de aula como um espaço ordenado e organizado quase na perfeição. Distribuídos ao longo de quatro carteiras corridas, vemos alunos atentos e empenhados na realização das tarefas escolares, sob orientação e vigilância da professora. E não se diga que esta é uma escola retrógrada e ultrapassada: o que aqui vemos são pedagogias ativas em plena execução, com os alunos a construírem ativamente o seu próprio saber, aplicando conhecimentos e desenvolvendo competências!…

A escola do século XIX em imagens - X


Gerrit Dou, Escola nocturna (c. 1660)


    Este quadro foi pintado no século XVII e foca o tema da escola noturna.
    Antes da invenção da eletricidade, estudar à noite exigia ainda mais esforço e sacrifício do que aquele que ainda hoje implica a escola em regime pós-laboral. A iluminação era fraca, dependente da luz bruxuleante de velas e lamparinas, e esse constrangimento ao labor de alunos e professores é aqui magistralmente explorado pela mestria do pintor, que introduz no quadro nada menos de que quatro distintas fontes de luz.
    A penumbra em que a cena se desenrola esbate contornos e pormenores: percebemos o professor e uma aluna debruçados em torno de um texto que esta lê, enquanto o mestre lhe chama a atenção para algo importante. Em volta, outros alunos leem, escrevem, estudam as matérias.
    Contudo, o esquematismo da cena transporta consigo uma ideia poderosa; a luz e as trevas são uma metáfora feliz e recorrente da eterna luta do conhecimento contra a ignorância. As luzes que aqui se iluminam representam a vontade de aprender, de vencer a escuridão do desconhecimento, da superstição e do preconceito. E essa sempre foi e será a missão fundamental da escola, em todos os tempos.

quinta-feira, 8 de setembro de 2022

A escola do século XIX em imagens - IX


Nicolay Bogdanov-Belsky, Cálculo mental na escola pública (1895)

    Esta interessante pintura russa retrata, de modo pouco habitual, a sala de aula: em vez de alunos alinhados nas suas carteiras, eles aglomeram-se, pensativos, em torno do quadro preto e da figura tutelar do professor. O que fazem? Tentam resolver, mentalmente, um problema matemático que o professor lhes colocou.

    Esclareça-se antes de mais que este docente não corresponde à figura convencional do mestre-escola em atividade nas escolas rurais oitocentistas. Trata-se de Sergey Rachinsky, um professor universitário de Botânica que a dada altura largou a vida académica em Moscovo para se tornar professor numa pequena cidade, onde não se limitava, como aqui se vê, a “dar a matéria”, mas se empenhava, através de desafios colocados aos seus alunos, em fazê-los pensar.

    Além desta mensagem clara que a pintura transmite – a escola pública deve desafiar os alunos, retirando-os da zona de conforto do facilitismo e da falta de exigência, exigindo-lhes esforço para aprender e colocando-lhes desafios que os façam desenvolver todo o seu potencial – há uma outra ideia pertinente que, quando a diminuição das qualificações exigidas para dar aulas está na ordem do dia, é importante salientar: o professor não precisa de saber apenas a matéria que ensina aos alunos. A sua preparação deve ser bem mais vasta e abrangente. A qualidade da formação científica e pedagógica dos professores é, mais do que avaliações do desempenho burocráticas e vexatórias, a melhor garantia que podemos ter em relação à qualidade da escola pública.

Fonte: Escola Portuguesa.

domingo, 4 de setembro de 2022

A escola do século XIX em imagens - VIII


John Frederick Lewis, Escola árabe (c. 1850)

    Embora a arte europeia tenda a representar sobretudo, como é natural e expectável, o mundo dos europeus, não faltam, a partir do Renascimento e da expansão europeia, exemplos de pinturas e outras obras artísticas que refletem a descoberta e o contacto com outros continentes, civilizações e culturas. Trata-se de um olhar, de início curioso e ocasional, que se vai tornando mais atento e sistemático à medida que as principais potências do Velho Continente constroem ou consolidam, no século XIX, os seus impérios coloniais.

    John F. Lewis, um inglês que viveu a sua infância no Cairo, registou, nesta pintura a guache e aguarela, o ambiente de uma típica maktab, a escola muçulmana que correspondia sensivelmente ao que hoje designamos por ensino básico. Os rapazes que desejassem prosseguir os seus estudos ingressariam depois numa madrassa. Umas e outras são escolas religiosas, sublinhando a ligação umbilical, também patente no mundo ocidental, entre a escola e a religião. Só que, enquanto na Europa a laicização progressiva da sociedade foi abrindo espaço à separação entre a escola pública, destinada a formar cidadãos, e as escolas da Igreja, vocacionadas para a formação do clero, no mundo muçulmano essa distinção entre religião e laicidade tem-se mostrado mais difícil e custosa.

    A pintura, de contornos difusos, mas onde não falta expressividade, foca-se nas figuras do professor, já idoso – a idade avançada é, neste contexto, um símbolo de sabedoria -, e de um dos seus alunos, que se prepara para recitar a lição. O apelo à memória, hoje tão criticado, era um elemento essencial dos sistemas de ensino mais tradicionalistas e conservadores. E será sempre fundamental, embora ninguém defenda hoje o decorar de matérias como um fim em si mesmo: a verdade é que só somos verdadeiramente conhecedores daquilo que conseguimos armazenar, de forma organizada e compreensiva, no nosso cérebro.

sexta-feira, 2 de setembro de 2022

A escola do século XIX em imagens – VII


George Haanen, Escola nocturna (1835)

    Eis uma faceta da escola oitocentista que não poderia faltar nesta série: a escola noturna. As aulas à noite têm hoje uma presença pouco mais do que residual nos sistemas educativos, mas foram cruciais em épocas em que a maioria da população começava a trabalhar com uma escolarização mínima, ou mesmo sem ter tido oportunidade, na infância, de frequentar a escola. Neste contexto, e à medida que os trabalhadores vão percebendo que a formação escolar lhes pode abrir novas perspetivas profissionais e de desenvolvimento pessoal, a vontade e a necessidade de voltar a estudar começam a impor-se.

    Na imagem, percebemos que boa parte dos alunos que chegam a esta escola, iluminada a velas e candeias, é ainda criança: na primeira metade do século XIX, o trabalho infantil era uma realidade muito frequente, o que remetia estas crianças desafortunadas para a escola noturna, única forma de escaparem ao analfabetismo. Posteriormente, graças sobretudo à luta sindical, esta situação começará a mudar, com o aparecimento de legislação restritiva do trabalho de menores e o aumento progressivo da idade mínima para trabalhar. Aliás, e já que se fala em sindicalismo, refira-se também o papel importante que os sindicatos tiveram, praticamente desde o seu aparecimento, na promoção do ensino e da formação profissional entre os seus associados.

    Nesta escola, o ambiente de aprendizagem parece pouco formal, reinando algo parecido com o que hoje chamaríamos diferenciação pedagógica, o que é natural tendo em conta as diferenças de idades, as motivações e os níveis de conhecimento de uns e outros. Assim, enquanto uns alunos estudam autonomamente, outros fazem uma pausa no estudo e aquecem-se junto à salamandra. Um dos discentes, vestido de verde, ouve a explicação do professor, que por sua vez mira de relance aqueloutro – talvez um novo aluno? – que acaba de chegar à escola, trazido pela mãe…

Fonte: Escola Portuguesa.

terça-feira, 30 de agosto de 2022

A escola do século XIX em imagens – VI


Paul des Amoignes - Na sala de aula (1886)

    Este quadro constitui um exemplar da pintura naturalista francesa. Nesta observação cirúrgica e quase fotográfica da sala de aula, a figura de um pequeno estudante destaca-se pelo olhar intenso e penetrante, certamente dirigido à figura do professor.

    Alguns colegas escrevem aplicadamente, outros mostram-se apáticos, distraídos ou aborrecidos. Mas só este rapaz levanta o lápis do caderno para prestar atenção ao professor. É uma realidade de todos os tempos e de todas as escolas: nem todos os alunos têm o mesmo interesse, a mesma capacidade de concentração, a mesma facilidade em aprender. Mas o desafio de dar a todos a sua oportunidade, razão de ser da escola, em especial da escola pública, é hoje ainda mais pertinente do que há um ou dois séculos.

    A técnica do pintor é primorosa, não só no traço e na ambiência naturalista, mas também na forma como os rostos à volta do protagonista se apresentam desfocados – algo que na técnica fotográfica se consegue reduzindo a profundidade de campo – reforçando o impacto e o dramatismo da imagem. E atraindo o nosso olhar, irresistivelmente, para o aluno que quer aprender.

 Fonte: Escola Portuguesa.

quinta-feira, 25 de agosto de 2022

A escola do século XIX em imagens – V


Albert Anker, Exame escolar (1862)

     Revisitando Albert Anker, deparamo-nos com o testemunho de uma realidade praticamente extinta na escola atual: o tradicional exame da 4.ª classe. Perante um punhado de examinadores – professores, inspetores, diretores escolares – os petizes de ambos os sexos devem demonstrar a sua aptidão académica.

    Numa escola suíça, vemos a tradicional sala com carteiras de bancos corridos, onde os alunos se acotovelam, à excepção do que está a ser examinado e do pequeno grupo dos que aguardam a sua vez – estes ficam de pé, à frente dos restantes, face ao examinador.

    Entre nós, o “exame da 4.ª classe” manteve-se até 1974, tendo sido abolido após a Revolução de Abril, tendo sido brevemente ressuscitado durante o ministério de Nuno Crato, embora em moldes diferentes, tanto do modelo do Estado Novo, como daquele que vemos nesta imagem. A verdade é que os tempos mudam, e tanto os objetivos e finalidades do ensino básico como a evolução das teorias e práticas pedagógicas acabaram por desaconselhar este tipo de avaliações formais, banidas na generalidade dos países.

Fonte: escolapt

quarta-feira, 24 de agosto de 2022

A escola do século XIX em imagens – IV


Jan Steen, Escola rural (c.1665)

 

    De volta ao século XVII para ilustrar uma presença comum em muitas escolas ao longo dos tempos, até mesmo nos progressistas Países Baixos: o castigo corporal, neste caso aplicado com recurso à palmatória, um instrumento de punição, alguns dirão mesmo de tortura, que muitos portugueses hoje idosos ainda tiveram o desprazer de conhecer nos seus tempos de escola. Aqui quem, sob o olhar atento dos colegas, dá a mão à palmatória, é um desafortunado rapaz que terá, ao que podemos supor, rasgado e atirado ao chão a folha onde fazia os exercícios.

    É muito antiga, e até certo ponto faz sentido, a associação do estudo ao esforço: para aprender é preciso vontade, determinação, persistência, espírito de sacrifício. Mais difícil de aceitar, e nos dias de hoje ideia definitivamente posta de parte, é que esse esforço deva assumir a forma de punição física. O velho ditado espanhol, la letra con sangue entra, não é definitivamente, para tomar à letra…

    Voltando ao quadro, repare-se na simplicidade do mobiliário, numa sala de aula ainda pouco estruturada enquanto tal. Mesas e bancos – apenas o professor se sentará numa cadeira – compõem o mobiliário e contrastam com as lousas e os objetos de uso doméstico e quotidiano pendurados nas paredes. Escreve-se em folhas e cadernos com penas que se molhavam em tinteiros. O lápis não era ainda de uso comum e a caneta com aparo só surgirá no século XIX. No topo da imagem, passando quase despercebida num primeiro olhar, uma prateleira fixa à parede aloja os livros e papéis necessários ao ofício do mestre-escola.

Fonte: escolapt

terça-feira, 23 de agosto de 2022

A escola do século XIX em imagens – III


Jean-Baptiste Trayer, Escola Primária na Bretanha (1882)

    Neste quadro, encontramos uma representação bastante realista de uma sala de aula na região da Bretanha, França. Trata-se de uma escola em ambiente rural, o que é sublinhado pela presença de uma galinha com os seus pintos na sala de aula, ante a indiferença geral da turma. Do lado oposto, o crucifixo pendurado na parede assinala que esta é, na França laica e republicana de então, uma escola católica.

    Outra característica interessante é tratar-se de uma turma de raparigas. Com a extensão progressiva da escolaridade ao género feminino, os ainda rígidos padrões morais da época impunham, quase sempre, a separação de sexos, uma ideia que a moderna pedagogia desacreditou completamente, mas ainda subsiste em alguns colégios religiosos, assente no mito de que rapazes e raparigas aprendem de forma diferente, pelo que só em turmas separadas é possível levar uns e outros a alcançar o máximo das suas potencialidades.

    Um olhar mais atento dirigido às pequenas alunas permite-nos captar algumas singularidades: enquanto a professora explica algo a uma das meninas, outras fazem os exercícios ou leem a lição. Em primeiro plano, duas meninas puseram de parte o caderno escolar para brincarem com a pequena boneca que uma delas tem nas mãos. Na primeira fila, uma miúda cansada não resiste e adormece em plena aula: ir à escola implicava frequentemente um longo percurso a pé, pelo que muitas destas crianças já chegavam exaustas à sala de aula. Além disso, e ao contrário dos rapazes, a quem não era exigida a participação nas tarefas domésticas, muitas raparigas tinham de ordenhar animais, acender a lareira ou ajudar a mãe a tratar dos irmãos mais novos antes de saírem para a escola.

quinta-feira, 18 de agosto de 2022

A escola do século XIX em imagens – II


Albert Anker, Escola Rural (1894)
 

    Este quadro do pintor suíço Albert Anker pretende representar uma sala de aula de meados do século XIX. Ao contrário do que sucedia em épocas mais antigas, o espaço físico da aula é aqui mais organizado, embora o mobiliário e os materiais pedagógicos disponíveis sejam exíguos. Trata-se de uma escola em meio rural, frequentada por crianças de origem modesta, como se vê pela roupa e calçado que usam.

    A turma é numerosa – na área visível da sala contam-se, sem dificuldade, perto de 40 alunos – e heterogénea, incluindo rapazes e raparigas de diversas idades. Repare-se na separação de sexos e na desigualdade de acesso à educação, mesmo na Suíça, um dos países económica e socialmente mais evoluídos da Europa oitocentista: os rapazes, em muito maior número, ocupam as filas de carteiras ao centro; as raparigas sentam-se em bancos laterais, onde não dispõem sequer de uma superfície para pousar o caderno. Um misto de “sala em U” e “modelo do autocarro” que demonstra como, ao longo da história da Educação, estes conceitos, que se pretendem simplificadores e unificadores, assumiram e assumem diversas nuances…

Fonte: Escolapt

quinta-feira, 11 de agosto de 2022

A escola do século XIX em imagens – I

    O primeiro quadro da série faz-nos recuar até ao século XVII e a uma sala de aula que eventualmente faria as delícias de alguns pedagogos pós-modernos. Mas também por aqui se percebe que as ideias destes pouco ou nada nos trazem de novo.


Jan Steen, A escola da vila (c. 1670)

    O ambiente na sala é caótico ou, numa leitura mais moderna e otimista do que aqui se observa, cada um aprende ao seu ritmo: uns estudam atentamente, outros põem a conversa em dia; este dorme, outros brincam, aquele lá ao fundo faz palhaçadas empoleirado em cima de uma mesa.

    Existem não um mas dois professores na sala, o que demonstra que o par pedagógico não é uma invenção contemporânea. A pedagogia não é diretiva: os professores não dão aula, esclarecem dúvidas aos alunos que querem aprender. Mas a divisão do trabalho deixa algo a desejar: enquanto a professora cumpre a sua tarefa, o seu parceiro entretém-se com alguma coisa que tem entre mãos…

    No século XVII, eram raras as escolas que não pertencessem a instituições religiosas. Haveria escolas laicas, geridas por particulares ou comunidades locais, mas a noção de escola pública era inexistente. A sala de aula era um espaço desorganizado, sem mobiliário específico, onde se misturavam crianças e jovens de diversas idades e níveis de conhecimento: dificilmente reconheceríamos nesta imagem os conceitos atuais de turma ou de sala de aula. Não havia qualquer controlo sobre a formação académica dos docentes, as matérias lecionadas ou as práticas pedagógicas usadas.
    Eram os filhos das classes trabalhadoras que frequentavam escolas como esta: antes de se afirmar a moda dos colégios internos de elite, alta nobreza e alta burguesia recorriam geralmente a aulas particulares para o ensino dos seus rebentos. Nada que surpreenda: também nos dias de hoje, os mais ativos propagandistas da escola do século XXI raramente a escolhem para a educação dos seus próprios filhos…
Fonte: escolapt

sexta-feira, 15 de julho de 2022

A descoberta da Pedra da Roseta

     A escrita hieroglífica morreu no Egipto no século IV d.C. e com o tempo perdeu-se o conhecimento de como ler hieróglifos, até que a Pedra de Roseta foi descoberta, a 15 de julho de 1799. Com a mesma mensagem tanto em hieróglifos como em grego, a Pedra de Roseta foi a chave para decifrar hieróglifos anteriormente não traduzidos. De repente, três mil anos de escrita indecifrável tornaram-se legível.

    Em 1798, Napoleão zarpou rumo ao Egito com cerca de quatro centenas de navios: queria expulsar os ingleses do Mediterrâneo oriental e bloquear o seu lucrativo comércio com a Índia. Mas também estava fascinado com o próprio Egito, que o seu ídolo, Alexandre, o Grande, tinha conquistado 2000 mil anos antes. Porém, desiludiu-se, pois o Egito já não era a joia que tinha sido para Alexandre. Era um remanso de água quente, seco e pobre. "Nas aldeias", disse Napoleão, "eles nem sequer têm ideia do que são tesouras". Ainda assim, viam, a partir dos seus espantosos monumentos antigos – pirâmides e obeliscos perfurando as nuvens – e da sua estranha, indecifrável e bela língua-figurada, chamada hieróglifos, que esta tinha sido em tempos uma civilização formidável. Napoleão levou consigo cerca de cento e sessenta savants-cientistas, como lhes chamavam: estudiosos, e artistas, com as suas bússolas, réguas, lápis e canetas – para descrever o que podiam deste antigo reino lendário.


Vivant Denon, por Robert Lefevre
(1809)

    Entre eles encontrava-se Dominique Vivant Denon, que pode ser considerado o primeiro egiptólogo, embora fosse mais um artista. Um homem do mundo que frequentava os salões das diversas cortes europeias, juntou-se a Napoleão, já passava dos 50 anos de idade, para inventariar e desenhar os monumentos faraónicos descritos até então de forma fantasiosa.

    "Ao longo da campanha, Denon, indiferente aos perigos, madrugava para explorar monumentos e desenhar. Desenhava a cavalo, enquanto descansava, enquanto comia, no meio de uma batalha... registava tudo. O desenho de Denon é escrupulosamente fiel ao seu modelo, sem deformações poéticas. Fez um registo completo do que viu. Estima-se que gastou umas 40.000 folhas durante a viagem.

    Hoje algumas delas são de valor inestimável, porque são o único vestígio que resta de monumentos destruídos após a fuga de Napoleão – um exemplo disso é o desenho da capela de Amenhotep III em Elefantina." (Denon) A obra pioneira de Denon será completada, com o trabalho de eruditos de outras áreas na monumental Description de l'Egypte (1809-1822).



Frontispício da 1.ª edição de
Description de l'Egypte

    Os 1000 desenhos de Denon estão na origem da Egiptomania que tomou conta dos europeus nos séculos XIX e XX.

    Napoleão nomeou-o Diretor-Geral dos Museus e ele criou o Museu – mais tarde chamado Museu do Louvre – com as obras arrebanhadas pelo Império no Egito, Itália, Países Baixos, Alemanha e Espanha.

    "Em 1799, uma equipa a trabalhar sob um oficial francês para reconstruir um forte perto da cidade portuária de Rosetta – agora conhecida como Rashid – descobriu uma pedra tão grande que não a podia mover. Pierre-François Bouchard, um dos savants de Napoleão, treinado como cientista e como soldado, mandou que a retirassem inteira. Assim que a limparam, ele percebeu imediatamente a sua importância.

    Quando, dois anos mais tarde, os franceses finalmente se renderam aos britânicos, estes roubaram os roubos dos franceses como despojos de guerra – incluindo a Pedra de Roseta, que foi para o Museu Britânico."


A Porta Denon, do Louvre
    Vários estudiosos tentaram decifrar os hieróglifos da Pedra, mas foi Jean-François Champollion quem o conseguiu. Champollion cresceu no sudoeste de França, o mais novo de sete. O seu pai era livreiro; a sua mão não sabia ler nem escrever. Ele tinha pouco dinheiro. Já ia na meia-idade, já tinha, mais ou menos, fundado a Egyptologia, mas não tinha dinheiro para ir ao Egito. Foi mais tarde, depois da fama. desde muito cedo, tinha mostrado um dom extraordinário para as línguas. Ainda na adolescência, aprendeu não só grego e latim, mas também hebraico, árabe, amárico, sânscrito, siríaco, persa e caldeu. Começou a aprender Coptic, a língua da Igreja Ortodoxa Egípcia, que se pensava (corretamente, como se veio a verificar) ser descendente do Antigo Egito." [Pedra de Roseta]

Champollion encontrou alguma correspondência entre as imagens hieroglíficas e a representação gráfica dos sons, semelhante, mas não igual, ao que chamamos de letras. No seu estudo da Pedra de Roseta, descobriu grupos de sinais dentro de anéis chamados cartuchos. Teorizou que este relevo tipográfico era digno dos nomes de reis e descobriu que correspondia aproximadamente à altura em que estes foram citados no texto grego. Os dois nomes de reis que lhe deram a chave foram os de Ptolomeu e Cleópatra.

    Afinal o que diz a Pedra de Roseta? Nada de excitante.

    "Diz-nos que a pedra deveria ser instalada num muro do templo em honra do governante Ptolomeu V Epifanes Eucharistos e o seu propósito cerimonial é, presumivelmente, responsável pelo seu tom. O texto foi inscrito em 196 a.C., para celebrar a coroação de Ptolomeu. (Ele tinha-se tornado faraó cerca de nove anos antes, mas, como na altura tinha apenas cinco anos, uma série de regentes tratou inicialmente dos assuntos de Estado). Começa com uma longa invocação do rei:

    «O senhor do sagrado uraeus-cobras cujo poder é grande, que assegurou o Egito e o fez prosperar, cujo coração é piedoso para com os deuses, aquele que prevalece sobre o seu inimigo, que enriqueceu a vida do seu povo, senhor de jubileus como Ptah-Tanen [o deus de Memphis], rei como Pre [o deus Sol], governante das províncias superiores e inferiores, o filho dos deuses que amam o seu pai, que Ptah escolheu e a quem o Sol deu a vitória, a imagem viva de Amon, o filho do Sol, Ptolomeu, que vive para sempre, amado de Ptah, o deus cuja beneficência é perfeita.»


Fonte: IP AZUL

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