● D. Madalena, acompanhada de Frei Jorge, deseja
entrar no compartimento, pois ouviu vozes conversando dentro e, supondo que uma
delas é a de Manuel de Sousa, deseja falar com ele. A sua entrada em cena
mostra-nos uma mulher «desgrenhada e fora de si, procurando com os olhos
todos os recantos da casa», sinal de que quer desesperadamente encontrar
Manuel de Sousa e julga que a estão a impedir. D. Madalena “vive” estas duas
cenas desesperada e completamente dominada pelos sentimentos, ao gosto romântico,
sem controlo sobre as suas emoções, como se pode comprovar através da
didascália “(Entrando desgrenhada e fora de si, procurando, com os olhos,
todos os recantos da casa)”.
● D. Madalena deseja falar com ele por um motivo
claro: tentar remediar a situação, impedir a tomada de hábito. Para tal,
argumenta que talvez estejam a agir de forma precipitada, ao acreditarem nas
palavras de “um romeiro, um vagabundo… um homem enfim que ninguém conhece”, mas
Manuel de Sousa, tratando-a novamente pelo primeiro nome, contraria-a,
jurando-lhe que o amor de ambos é impossível. Ele mostra-se decidido a aceitar
o seu destino, chamando a atenção de D. Madalena, na cena 8, para a
impossibilidade de o mudarem.
● Esta postura diferente de Manuel e Madalena é facilmente
justificável: ele conhece toda a verdade, ou seja, que o Romeiro é D. João de
Portugal, ao contrário dela, que ainda ignora este facto, e vê a entrada no
convento como a única solução digna para a situação. E critica mesmo a esposa
e, num tom ríspido e decidido, despede-se dela.
● O tom inicial com que Manuel de Sousa se dirige à
esposa é ríspido e frio, tratando-a, de forma formal, por “senhora”, o que a
deixa magoada: “Oh, que ar, que tom, que modo esse com que me falas.”. Comovido
(“enternecendo-se”), Manuel trata-a então pelo nome próprio, mas logo cai em si
e retoma a formalidade e rispidez iniciais.
De facto, ele dirige-se à esposa usando diferentes
formas de tratamento:
. formal (“senhora”): atitude de distanciamento;
. familiar (“querida”): atitude de proximidade, de
intimidade.
● Esta oscilação das formas de tratamento traduz o
contraste entre o amor que Manuel de Sousa sente por D. Madalena (que lhe
corresponde) e a dor de não o poder cultivar e marca a despedida emotiva entre
ambos.
● Na parte final da cena 7, Telmo procura falar à
parte com Frei Jorge (“Tenho que vos dizer, ouvi.”) e os dois “Conversam ambos
à parte.”. Embora não saibamos as palavras que trocaram entre si, é fácil
deduzir que o velho aio estará a dar seguimento à solicitação de D. João,
tentando convencer o frade de que o Romeiro é um impostor. A finalidade é
evitar a destruição da família, nomeadamente de Maria.
● Ao constatar que a sua tentativa fracassou, procura
fazer o mesmo junto de D. Madalena, mas sem sucesso, visto que Frei Jorge o
impede de falar com ela: “Telmo sai com repugnância, e rodeando para ver se
chega ao pé de Madalena. Jorge, que o percebe, faz-lhe um sinal imperioso; ele
recua, e finalmente se retira pelo fundo.”.
● Por que razão age Frei Jorge assim?
Contrariamente a D. Madalena, o frade sabe que o
Romeiro é D. João de Portugal, por isso, enquanto membro do clero, assume a
defesa da verdade dos factos, impedindo Telmo de mentir para salvar Maria. Ele
não pode aceitar uma mensagem que iria contra as leis de Deus. Na sua
perspetiva de religioso, a única solução para a situação será o ingresso na
vida monástica. Pelo contrário, se tivesse aceitado a proposta de D. João via
Telmo, estaria a ser conivente com uma relação adúltera e bígama. Estando D.
João vivo, ali ou na Palestina, o segundo casamento de D. Madalena com Manuel
de Sousa era nulo. Eles viviam em pecado e Maria era uma filha ilegítima. Esta
situação, agora que a verdade é conhecida, não pode continuar.
● A cena 8, na sequência da anterior, confirma as
atitudes contrastantes de Manuel e de D. Madalena:
- Madalena: crê que
é possível recuperar a sua família e que a mensagem do Romeiro não passou de um
embuste (cena 7);
- Manuel: não vê
salvação e, decidido, enfrenta a vida religiosa.
● As didascálias ajudam a evidenciar o estado de
espírito e a postura de Manuel de Sousa [“(Caindo em si e gravemente)”, “(Tomando
os hábitos de cima do banco.)”, “(Vai para a abraçar e recua)”, “(Foge
precipitadamente pela porta da esquerda)”]: racional e determinado, pega
nos hábitos que vai usar juntamente com D. Madalena, recusa abraçá-la e sai
rapidamente para evitar mais sofrimento.
● A fala final de Manuel de Sousa da cena 8 está
prenhe de expressões que associam a decisão tomada a uma morte simbólica: “Para
nós já não há senão estas mortalhas (tomando os hábitos de cima da banca), e a
sepultura de um claustro.”. A referência aos condes de Vimioso é significativa
neste contexto.