Português: 28/02/22

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Análise da cena 2 da Farsa de Inês Pereira

 
Continuação do quadro de costumes: apresentação de um regime matriarcal, representado por uma mãe de bom senso a quem cabe a educação da filha (a mãe tenta convencer Inês, utilizando, muitas vezes, ditados populares), com os maridos ausentes nas “partes d’além”.
 
 
Caracterização da Mãe
 
• Quando regressa a casa da missa, é irónica: demonstra que conhece bem a filha e que, portanto, já sabia que Inês, sendo preguiçosa, durante a sua ausência não estaria a trabalhar (vv. 37 a 40). Considera-a...

Continuação do post: [cena 2].
 

Análise da cena 1 da Farsa de Inês Pereira

Cantiga entoada por Inês
 
            Na cantiga que abre o monólogo inicial [de uma das duas versões da peça que chegaram até nós], Inês questiona-se sobre o que acontecerá quando não se vê a pessoa amada, se, vendo-a, só se sofre e morre de amor. Deste modo, ela exprime o sofrimento de amor associado à morte de amor, traços característicos da poesia trovadoresca, nomeadamente das cantigas de amor.
            Tendo em conta o estado de espírito que patenteia ao longo da primeira cena, a cantiga – cuja temática é o sentimento amoroso – indicia que Inês está pronta e desejosa de ter uma relação amorosa, o que, considerando o tom queixoso do seu monólogo, lhe parece impossível naquele momento.


Caracterização de Inês Pereira

• Inês canta e finge que trabalha num bordado, mas logo começa a reclamar do tédio que essa tarefa lhe causa e da vida que leva, sempre fechada em casa. Está cansada das tarefas domésticas; é preguiçosa – detesta a costura (vv. 3-4).

• Mostra-se aborrecida com a vida que leva (“enfadamento”), enraivecida, furiosa e revoltada por ter de realizar tarefas de que não gosta (“Renego deste lavrar” – v. 1; “e que raiva” – v. 6).

• Rejeita a vida que leva (“Renego deste lavrar” – v. 3).

• Revela-se compadecida, compassiva, piedosa em relação a si própria (“Coitada, assi hei de estar” – v. 10).

• Mostra-se determinada a encontrar maneira de se ver livre das suas tarefas e da vida que leva (“hei de buscar maneira / dalgum outro aviamento” – vv. 10-11).

• Sente-se prisioneira em casa da Mãe (“Coitada assi hei d’estar / encerrada nesta casa.” – vv. 12-13) e sem horizontes.

• Queixa-se de que nunca se diverte (“Todas folgam e eu não / todas vem e todas vão / onde querem senão eu” – vv. 25-27) e inveja as outras moças da sua idade, que são livres de sair de casa e de se divertir.

• Sente que a sua vida é vazia (“Esta vida é mais que morta” – v. 30).

• Em suma, Inês queixa-se pelo facto de:
- ter de desempenhar tarefas domésticas;
- estar sempre fechada em casa;
- não se divertir;
- não ter liberdade.


Linguagem

Comparações:

- “assim hei d’estar encerrada nesta casa / como panela sem asa / que está sempre num lugar” (vv. 12-15): a comparação estabelece-se entre a casa, considerada uma prisão, e uma panela sem asa, ou seja, a um objeto a que falta um elemento, a asa, para ter utilidade. Deste modo, Inês mostra que não está satisfeita com a vida que leva, considerando-a inútil.

- “Sam eu coruja ou corujo, / ou sam algum caramujo”: a comparação com animais notívagos e dependentes de outros seres, presos ou que vivem dentro de um casulo, como entende ser o seu caso (dependente da Mãe), privada das saídas de casa durante o dia e vivendo sob a alçada da progenitora, indiciam o seu estado emocional.

Enumeração: “Oh Jesu que enfadamento, / e que raiva, e que tormento, / que cegueira, e que canseira” (vv. 7-9) – traduz a indignação que sente pela vida a que está sujeita e de que não gosta.

Interrogações retóricas – destacam a insatisfação e a revolta de Inês relativamente à vida que tem:

- questiona a inutilidade da sua vida: “Coitada, assi hei de estar / encerrada nesta casa / como panela sem asa, / que sempre está num lugar?” (vv. 10-13);

- lamenta-se por considerar a sua vida um desperdício: “E assi hão de ser logrados, / dous dias amargurados, / que eu possa durar viva?” (vv. 14-16);

- questiona-se sobre a sua condição: “Hii! E que pecado é o meu, / ou que dor de coração?” (vv. 26-27);

- enfatiza o seu lamento, o seu desespero e a sua revolta por estar fechada em casa: “Sam eu coruja ou corujo, / ou sam algum caramujo / que não sai senão à porta” (vv. 29-31).
Anáfora (vv. 25-26).
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