A Ilíada inicia-se com uma expressão de raiva e frustração. A causa é simples: a Guerra de Troia já dura há nove anos e os Aqueus são incapazes de derrubar as muralhas da cidade. O exército grego saqueia Crise, uma cidade aliada dos Troianos (também designados como «Dárdanos», «Dardânidas» ou «Dardânios») e captura duas jovens donzelas, Criseida e Briseida, distribuídas respetivamente a Agamémnon (rei dos Aqueus) e Aquiles, o maior guerreiro aqueu como escravas e concubinas.
O velho Crises, pai de Criseida e
sacerdote de Apolo, dirige-se ao acampamento dos Aqueus para resgatar a filha,
trazendo consigo riquezas incontáveis. Agamémnon, porém, rejeita o resgate,
escorraçando Crises com palavras cruéis e enfatizando o papel da filha enquanto
concubina. Neste passo inicial do poema, é clara a intenção de retratar o rei
aqueu como um monarca arrogante e cruel, tendo em conta, além da forma como se
dirige ao velho sacerdote, o modo diferente como Aquiles trata Briseida, que é
muito mais do que mero objeto sexual.
Este início da obra contrasta com o
seu final, nomeadamente o canto final, que nos apresenta uma situação oposta:
um pai idoso, Príamo, vai à tenda de Aquiles para resgatar o cadáver do seu
filho Heitor, sendo acolhido num espírito de humanidade e compaixão. Fecha-se aí
o círculo, com o apaziguamento da cólera (que, em grego, é a primeira palavra
da Ilíada), sentimento cujas consequências trágicas conheceremos ao
longo dos 24 cantos do poema.
Perante a recusa de Agamémnon,
Crises reza, desesperado, a Apolo, pedindo-lhe que castigue os Aqueus. O deus
acolhe o pedido e assola o exército grego com uma epidemia de peste, o que leva
à convocação de uma assembleia, onde Agamémnon consulta Calcas para determinar
a causa da peste. Para grande fúria do monarca, o adivinho declara que só
restituindo Criseida ao pai se acalmará a fúria de Apolo. Aquiles sustenta a
posição de Calcas, o que enfurece Agamémnon, que, despeitado, hostiliza o
guerreiro, apropriando-se de Briseida. Furioso, Aquiles insulta o rei aqueu,
regressa à sua tenda e desiste de participar na guerra, para repor a verdade
dos factos, o que equivale a coagir Agamémnon a aceitar que a real hierarquia o
coloca abaixo do próprio Aquiles, herói supremo. Para mostrar ao monarca quem é
mais importante no contexto bélico, o guerreiro pede aos deuses que permitam
que os Troianos derrotam o seu próprio exército – os Aqueus – até que ele
regresse ao combate. Queixa-se a sua mãe, a deusa Tétis, que lhe promete ir
pedir a Zeus que o desafronte, mandando reveses aos Aqueus. Criseida é
restituída ao pai, e a peste cessa. Por seu turno, Tétis obtém de Zeus o
assentimento que pretende, para desagravar o filho. Mal ela se retira,
desenrola-se a este propósito uma discussão no Olimpo, entre Zeus. Hera,
acalmada com grandes dificuldades por Hefesto, o filho de ambos. O canto
inicial termina com um festim dos bem-aventurados, a que não falta o canto e a
música de Apolo e das Musas.
No Canto II, Agamémnon tem um sonho
enganador, enviado por Zeus para o induzir a atacar. Os exércitos marcham para
o campo da batalha, mas Páris, o príncipe troiano que espoletou a guerra ao raptar
Helena, esposa de Menelau, irmão de Agamémnon, propõe um duelo entre si e
Menelau, destinado a pôr cobro ao conflito através da luta entre os dois
principais interessados. O aqueu concorda e o duelo começa, todavia, quando Menelau
está prestes a vencer o adversário, a deusa Afrodite leva Páris de volta a
Troia e a batalha recomeça.
O Canto V põe-nos em contacto com os
feitos de guerreiros de Diomedes, que, com a ajuda de Atena, fere Afrodite e
Ares, dois dos deuses apoiantes dos Troianos. Entretanto, Heitor, um príncipe e
o maior guerreiro troiano, regressa brevemente a Troia para pedir a Hécuba que
faça oferendas a Atena, trazer Páris de volta ao campo de batalha e se despedir
de Andrómaca, sua esposa. Segue-se novo duelo, desta vez entre Heitor e Ájax, o
guerreiro aqueu mais forte a seguir a Aquiles, que adquire vantagem, mas não
pode matar o adversário.
Segue-se uma trégua destinada a cada
lado enterrar os seus mortos, que é aproveitada pelos Aqueus para construir uma
muralha em redor dos seus navios. Quando a luta recomeça no dia seguinte, Zeus
proíbe os deuses de intervirem na guerra, cumprindo assim a promessa feita a
Tétis, mandando reveses aos Aqueus de tal ordem que forçam Agamémnon a enviar
uma embaixada a Aquiles, destinada a solicitar a reconciliação e o seu regresso
à contenda, com ofertas riquíssimas, incluindo o retorno de Briseida. A
iniciativa, porém, mão frutifica, pois ele não se desculpa perante Aquiles e a
sua cólera mantém-se.
Incapazes de dormir, Ulisses e
Diomedes fazem uma incursão noturna com o intuito de espiar o exército troiano,
cruzando-se com Dólon, o espião enviado por Heitor, e matando-o. De manhã,
Agamémnon faz recuar os Troianos para a sua cidade, mas, graças a uma intervenção
de Zeus, os Troianos atacam com êxito a muralha e trincheira defensiva dos
Aqueus. A derrota parece iminente. Segue-se o dolo do pau dos deuses: Hera
consegue seduzir e adormecer Zeus de modo a desviar as suas atenções do campo
de batalha, para que Poseidon possa socorrer os Aqueus. Estes, auxiliados pelo
deus do mar, expulsam os Troianos para fora da muralha, contudo Zeus desperta e
continua a favorecer os Troianos, de acordo com a promessa feita a Tétis, e o
seu avanço é tal que se preparam para incendiar as naus dos Aqueus, o que
equivale a cortar-lhes a retirada. Perante a iminência da derrota, Aquiles
consente que o seu amigo Pátroclo (que lhe solicitara que regressasse à batalha
e salvasse os seus, o que o maior guerreiro aqueu não aceita por permanecer
irado), revestido das suas próprias armas e conduzindo o seu carro, para iludir
os Troianos a pensar que Aquiles tinha voltado, vá para o combate, à frente dos
Mirmidões. Pátroclo é um excelente guerreiro e a sua presença no campo de batalha
ajuda os Aqueus a empurrar os Troianos para longe dos navios e de volta para as
muralhas da cidade. No entanto, Pátroclo acaba por morrer às mãos de Heitor,
que, num acesso de orgulho, tira a armadura de Aquiles ao adversário morto e
veste-a, enquanto os Aqueus recuperam o corpo frio do seu herói, graças à ação
sobretudo de Menelau.
Profundamente ferido pela triste notícia,
Aquiles resolve regressar à batalha para vingar a morte do amigo. Tétis
dirige-se ao Olimpo e convence Hefesto a forjar uma nova armadura e armas de
ouro. Após a reconciliação com Agamémnon, Aquiles retorna à luta à frente do
exército aqueu. Enquanto isso, Heitor não espera que Aquiles regresse à refrega
e ordena aos seus homens que acampem fora das muralhas de Troia, mas, quando
eles avistam o filho de Tétis, refugiam-se, aterrorizados, dentro delas. O
guerreiro aqueu elimina todos os cavalos de Troia que vê e luta com o deus do
rio Xanthus, que está furioso porque o adversário fez com que tantos cadáveres caíssem
nos seus afluentes.
A luta titânica entre o maior dos
heróis aqueus e o maior dos troianos ocupa três livros. Depois de diversos
recontros em que Eneias, príncipe troiano, se evidencia, dá-se finalmente o
combate junto do rio (em que o Escamandro, transbordante de guerreiros
derrubados pelo aqueu, inunda a planície, ameaça submergi-la e só é dominado
pelo sogro ígneo de Hefesto), e a morte de Heitor, depois de uma longa
perseguição em volta das muralhas de Troia. De facto, envergonhado por ter
liderado o seu exército à derrota, o maior dentre os Troianos recusa-se a
refugiar-se dentro da cidade com eles e espera pro Aquiles fora dos portões da
cidade, no entanto perde a coragem e foge quando o inimigo se aproxima, sendo
perseguido três vezes, até que Atena o engana e ele para. A armadura divina de
Aquiles protege-o, mas este acaba por o atingir mortalmente através de um ponto
fraco que nele existe e que o aqueu bem conhece. Aquiles amarra o corpo de
Heitor à parte de trás do seu carro e arrasta-o pelo acampamento de batalha até
ao acampamento aqueu.
Após o regresso de Aquiles, os
Aqueus cremam Pátroclo e realizam uma série de jogos em sua honra. Nos nove
dias seguintes, Aquiles arrasta o corpo de Heitor em círculos, em redor do
esquife funerário do amigo.
No canto final, Príamo, o velho rei
de Troia, ousa ir à tenda de Aquiles, pedir-lhe, com ricos presentes, a
restituição do corpo do seu filho; o herói comove-se com as palavras de Príamo,
aceita e concede umas tréguas de doze dias para se realizarem os funerais de
Heitor, ato com que termina o poema.