Português: Aquilino Ribeiro
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segunda-feira, 28 de julho de 2025

Resumo dos capítulos de O Malhadinhas

    A função do primeiro capítulo é apresentar a personagem principal é apresentar a personagem principal, os seus interesses e motivações, iniciando-se com uma reflexão do almocreve sobre o contraste entre o presente e o passado, contraste esse que traduz o seu saudosismo, que perpassa toda a narrativa. No capítulo inicial ainda, encontramos dois elementos muito importantes: o mulinho, a quem o protagonista se refere sempre com carinho e que está ligado às peripécias mais importantes da sua vida; Brízida, a figura que impulsiona os atos mais marcantes da sua existência. Em suma, logo no primeiro capítulo, deparamos com os fios condutores de várias ações: a saudade, o mulinho, Brízida, os dois rivais e tio Agostinho.
    O segundo capítulo gira em torno da figura de Brízida que, como é a mola impulsionadora de vários atos de almocreve, contribui para realçar a sua psicologia. O episódio central é a luta com o de Santa Eulália. A presença em cena de Rita contribui para destacar a figura de Brízida e para enfatizar a força motivadora que ela constitui para o protagonista.
    O terceiro capítulo centra-se no rapto de Brízida: o Malhadinhas enamora-se da prima, porém, tendo dúvidas acerca do amor da rapariga e confrontado com os avanços de um abade novo e galã, rapta-a e foge pelos campos, em busca do padre amigo que os há de casar. Foca igualmente a perseguição que sofre da parte de tio Agostinho e o triunfo final do almocreve na luta contra as forças adversas.
    Desflorada a mulher, o quarto capítulo centra-se na relação conjugal entre os primos e no esforço feito para se afirmar perante tio Agostinho, a quem não inspira confiança. O protagonista esforça-se para mudar o seu comportamento, a sua conduta, agora com o estatuto de homem casado. Sucede, no entanto, que essa transformação não se concretiza. Por último, ficamos ainda a par dos episódios em que intervêm o Capa-Cavalos de Sendim e o Bisagra a feira.
    O capítulo cinco tem como episódio central a rixa entre o almocreve Malhadas e o tenente da Cruz, da qual sai vitorioso o protagonista. Este vê-se cercado por um grupo de homens armados, liderados pelo tenente, com a intenção de o matar, por causa de desentendimentos e rivalidades antigas. Malhadinhas enfrenta os adversários com uma foice e traça um círculo no chão, desafiando quem o quiser atacar. No auge da rixa, surge em cena Bernardo do Paço, uma figura simultaneamente respeitada e temida na região, que intervém em defesa do almocreve. Assim, Bernardo repreende o tenente e desmobiliza e Cruz é humilhado, enquanto Malhadinhas e Bernardo selam a sua amizade na venda da Maria Bicha com vinho.
    O sexto capítulo relata dois episódios. O primeiro compreende a agressão violenta e pública de Bisagra ao padre Antunes, quando o encontra com a sua esposa. O escândalo subsequente tem como consequência a correção dos comportamentos dos envolvidos, e Malhadinhas orgulha-se por ter, indiretamente, contribuído para isso com a sua má língua. O outro episódio consiste na recordação de uma visita do protagonista a casa de Duarte, durante a qual, após muita bebida, primeiro elogia Joaquina, a mulher do amigo, e depois insulta violentamente, levando a que Duarte finalmente se imponha na própria casa e «meta» a mulher na ordem. Deste modo, o almocreve comprova a funcionalidade da língua enquanto meio para «endireitar o mundo que andasse torto», desmascarando a hipocrisia e impondo uma forma de justiça, seja provocando um escândalo conjugal seja restaurando a autoridade de um amigo sobre a esposa.
    O sétimo capítulo tem como fulcro a aventura vivida com o almocreve Fontinha, a fuga, que determina o abandono da profissão de almocreve. Durante uma confraternização com o regedor e os cabos, acabam todos por se embriagar, e Malhadinhas, percebendo que poderia ser preso por distúrbios e insultos, foge de Aveiro durante quatro anos. Outro episódio refere-se à ajuda a Bernardo, o amigo que o salvara em tempos de apuros (cap. V), que agora encontra em perigo, cercado por ciganos e espanhóis. Os dois enfrentam juntos os inimigos e escapam com dificuldade do aperto, mas o seu cavalo quase morre de exaustão. Para recuperar o prejuízo da iminente perda do animal, finge que este ainda está saudável, enche odres de vento simulando carga e acaba por o vender, enganando o comprador. O cavalo acaba por “deitar a alma” «na primeira ladeira».
    O capítulo oito tece considerações acerca da relação do protagonista com Brízida e relata a vingança sobre Bentinho, que lhe «desviou» a neta. De facto, depois de tecer comentários sarcásticos sobre a sua numerosa descendência, Malhadinhas alude à desonra causada por duas netas, nomeadamente Luísa, que foi seduzida por Bentinho, um barbeiro e curandeiro charlatão. Inicialmente, o almocreve mostra-se tolerante, acreditando que o namoro irá desaguar em casamento, no entanto muda de atitude ao descobrir que Bentinho apenas se vangloriava da conquista e desonrava a neta. Durante a festa de São sebastião, dominado pela raiva e pela vergonha, decide vingar-se. Espera-o à saída e agride-o violentamente. De seguida, foge, mas é encontrado pela guarda, que lhe diz que ninguém o condenará, visto que se limitou a lavar a honra.
    O penúltimo capítulo descreve a aventura vivida na serra com o frade Joaquim das Sete Dores, um homem corpulento, astuto e falador, que lhe pede boleia. Durante o percurso, os dois conversam sobre a vidam a fé, superstições e mezinhas populares. O frade, que tem fama de saber lidar com partos difíceis e proteger mulheres de males no resguardo, dá a Malhadinhas três nóminas (amuletos religiosos),que ele diz serem eficazes para proteger Brízida e os filhos. Desde então, a esposa do protagonista nunca mais teve partos difíceis nem faltou leite para os filhos. Este é um capítulo revelador: o almocreve conclui, no presente, a veracidade das palavras do frade, ditas no passado, a propósito da sua profissão. Por outro lado, este capítulo prepara o desfecho da narrativa. A saudade do passado e do ofício acentua-se. O episódio na serra e a conversa com o frade constituem um ponto de partida para a reflexão do presente, momento em que a ação se conclui. Com efeito, é exatamente no momento em que corre perigo, em que enfrenta a agressividade do clima e do espaço (o nevão na serra, o frio, a ameaça dos lobos), que Malhadinhas faz o balanço da sua vida, das agruras do seu ofício, o que motiva o comentário do frade, que lhe mostra como, em todos os ofícios e situações, há ossos duros de roer. A agressividade do espaço está em consonância com a agressividade do protagonista, que se vai moldando às circunstâncias sociais e do espaço. O seu instinto de luta apura-se perante a hostilidade do ambiente. Por último, este episódio vivido pelo almocreve vai deixar marcas profundas nele: no futuro, já velho, recordá-lo-á, para dar razão ao frade, assumindo-se então como um homem plenamente realizado que não renega as duras vivências que lhe permitiriam afirmar-se como herói.
    O capítulo X dá conta das preocupações de Malhadinhas relativamente à vida após a morte, nomeadamente a preocupação com esse momento, não por medo, mas por crença. O protagonista queixa-se dos impostos absurdos cobrados por uma velha cavalgadura que mal valia os guizos de um gato. Indignado com o «governo de ladrões», decide vender o cavalo e, com esse negócio, encerra em definitivo o seu ofício de almocreve, confessando, porém, profundas saudades desse tempo. Mais tarde, já idoso e doente, acredita estar próximo da morte, por isso chama o padre, confessa-se, recebe o viático e pede a Brízida para ver a espingarda que fora sua companheira de vida. Desconfiada, a esposa recusa entregar-lha, o que se mostra uma atitude sensata, visto que a intenção de Malhadinhas era disparar sobre ela e sobre si, movido pelo ciúme e pelo medo de refazer a vida após a sua morte. Apesar dos maus presságios (incluindo o barbeiro, que o dá por morto), todos ficam surpreendidos ao assistirem à sua recuperação momentânea, no entanto, consciente da proximidade do fim, sai pela última vez à rua, amparado no seu velho cajado. Senta-se num poial de pedra e, sereno como um romeiro cansado, adormece de vez.

Análise de O Malhadinhas

I. Cronologia de Aquilino Ribeiro


II. Biografia de Aquilino Ribeiro


III. Obra de Aquilino Ribeiro


IV. Ação

        1. Introdução

        2. Resumo dos capítulos


domingo, 27 de julho de 2025

A ação de O Malhadinhas: Introdução

    O Malhadinhas é uma história narrada na 1.ª pessoa, em forma de monólogo, e dirigida a um grupo de ouvintes, isto é, o protagonista, cujo nome dá origem ao título da obra, no final da vida, conta a sua história, recheada de episódios de diversa índole.
    A ação resume-se de forma simples: Malhadinhas é um almocreve, um serrano rústico, grosseiro e matreiro, que não tem quaisquer problemas em usar a «faquinha» que transporta à cintura para corrigir o que entende por injusto. Defendendo-se à navalhada e golpes de pau (e por vezes a tiro)dos inimigos que vai encontrando ao longo da vida, o protagonista apresenta-nos uma série de episódios picarescos.
    O Malhadinhas é constituído por 10 capítulos, nos quais o narrador, um almocreve, relata as suas aventuras. Deste modo, a ação central é a sua vida experimentada e dura, um relato caracterizado pelo saudosismo do passado, que contrasta com o tempo presente, marcado pela velhice e pela tal saudade, e que culmina com a morte do herói.
    No início da novela, o protagonista tece considerações sobre o presente e sobre o passado e prossegue, até ao desenlace, com a evocação saudosa de episódios da sua vida. A notícia final, que constitui uma espécie de epílogo, corrobora o relato da personagem, configurando o desfecho natural da narrativa, delimitando-a como uma ação fechada. Por outro lado, o desenvolvimento da ação contém outras ações / peripécias conectadas com o fio condutor da narrativa – a vida do almocreve.
    Cada um dos 10 capítulos possui uma finalidade própria que está ao serviço desse fio condutor: o registo psicológico, como o próprio autor caracteriza a novela. Os vários episódios relatados ao longo do texto confluem para o mesmo ponto: a caracterização das várias experiências e vivências do almocreve. As diferentes peripécias encadeiam-se sucessivamente, constituindo um todo coeso e harmonioso no qual avulta a psicologia do protagonista.

quinta-feira, 31 de agosto de 2023

Cronologia de Aquilino Ribeiro


  
1885 – Nasce em Carregal de Tabosa (concelho de Sernancelhe), no dia 13 de setembro.

1895 – Muda-se para Soutosa, concelho de Moimenta da Beira. Faz exame de instrução primária. Entra no Colégio de Nossa Senhora da Lapa.

1900 – Entra no Colégio de Lamego. Estuda Filosofia em Viseu. Entra depois no Seminário de Beja, obedecendo a um desejo da sua mãe, que queria fazê-lo sacerdote.

1904 – Expulso do Seminário, regressa a Soutosa.

1906 – Vai para Lisboa. Colabora no jornal republicano A Vanguarda.
 
1907 – É preso por ser anarquista na sequência de uma explosão no seu quarto na Rua do Carrião, a 28 de novembro, em Lisboa, na qual morre um carbonário.

1908 – Evade-se da prisão em 12 de janeiro e, durante a clandestinidade em Lisboa, mantém os contactos com os regicidas, refugiado numa casa de Meira e Sousa, na Rua Nova do Almada, em frente da Boa Hora.
 
1910 – Estuda na Faculdade de Letras da Sorbonne. Vem a Portugal após o 5 de outubro e regressa a Paris, onde conhecera Grete Tiedemann.

1912 – Reside alguns meses na Alemanha.
 
1913 – Casa com Grete Tiedemann e regressa a Paris.
 
1914 – Nasce o primeiro filho, Aníbal Aquilino Fritz Tiedemann Ribeiro. Declarada a Primeira Guerra Mundial, Aquilino regressa a Portugal, sem ter terminado a licenciatura.

1915 – É colocado como professor no Liceu Camões, onde ficará durante três anos.
 
1919 – Entra para a Biblioteca Nacional de Portugal, a convite de Raul Proença.

1921 – Integra a direção da revista Seara Nova.

1927 – Entra na revolta de 7 de fevereiro, em Lisboa. Exila-se em Paris. No fim do ano, regressa a Portugal, clandestinamente. Morre a primeira mulher.
 
1928 – Entra na revolta de Pinhel. Encarcerado no presídio de Fontelo (Viseu), evade-se e volta a Paris.
 
1929 – Casa em Paris com Jerónima Dantas Machado, filha de Bernardino Machado. Em Lisboa, é julgado à revelia em Tribunal Militar e é condenado.

1930 – Nasce-lhe o segundo filho, Aquilino Ribeiro Machado, que viria a ser o 60.º Presidente da Câmara Municipal de Lisboa – (1977-1979).
 
1931 – Vai viver para a Galiza.
 
1932 – Volta a Portugal clandestinamente.

1933 – Recebe o Prémio Ricardo Malheiros da Academia das Ciências de Lisboa, pelo seu livro As Três Mulheres de Sansão.
 
1935 – É eleito sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa.
 
1952 – Faz uma viagem ao Brasil, onde é homenageado por escritores e artistas, na Academia Brasileira de Letras.

1958 – Publica Quando os Lobos Uivam. É nomeado sócio efetivo da Academia das Ciências de Lisboa. É militante da candidatura de Humberto Delgado à presidência da República.
 
1960 – É proposto para o Prémio Nobel da Literatura.
 
1962 – Nasce-lhe a primeira neta, Mariana, a quem dedica O Livro da Marianinha.
 
1963 – É homenageado em várias cidades do país por ocasião dos cinquenta anos de vida literária. Morre no dia 27 de maio. Nessa mesma hora, a Censura comunicava aos jornais não ser mais permitido falar das homenagens que lhe estavam a ser prestadas. É sepultado no Cemitério dos Prazeres.

1974 – É publicado o livro de memórias Um Escritor Confessa-se. Como escreve José Gomes Ferreira no prefácio, Aquilino sabe mentir a verdade.
 
1982 – A 14 de abril é agraciado a título póstumo com o grau de Comendador da Ordem da Liberdade.
 
2007 – A Assembleia da República decide homenagear a sua memória e conceder aos seus restos mortais as honras de Panteão Nacional.

terça-feira, 6 de setembro de 2022

Biografia / Vida de Aquilino Ribeiro


             Aquilino Ribeiro nasceu em Sernancelhe, freguesia de Carregal de Tabosa, distrito de Viseu, na Beira Alta, a 13 de setembro de 1885 e faleceu em Lisboa, a 27 de maio de 1963, após uma doença rápida, tendo os seus restos mortais sido trasladados para o Panteão Nacional em setembro de 2007, 44 anos após a sua morte. Era filho de Mariana do Rosário Gomes e do padre Joaquim Francisco Ribeiro e teve uma infância, ao que se sabe, de uma criança bastante travessa, a tal ponto que ainda recentemente era possível encontrar nessa zona quem tivesse ouvido contar histórias picarescas de um menino destinado pela família à vida de sacerdócio.

            A sua vida, tal como a de muitas das personagens a que deu vida, foi movimentada e aventurosa. Aos 10 anos, mudou-se com os pais para a aldeia de Soutosa, concelho de Moimenta da Beira, onde passou grande parte da infância. Estudou na escola de Soutosa e, seguidamente, no Liceu de Lamego, onde fez os estudos preparatórios, mais tarde em Viseu, em 1902, onde estudou Filosofia e Teologia. A pedido da sua mãe, entrou para o Seminário de Beja, onde fez apenas o primeiro e parte do segundo ano de Teologia, dado que não vocação religiosa. Em 1904, foi expulso do seminário, depois de ter dado uma réplica cortante a uma acusação do Padre Manuel Ançã, um dos dois irmãos que dirigiam a instituição na época.

            Em 1906, encontramo-lo em Lisboa, onde inicia a sua longa carreira de jornalista, com artigos de opinião (e princípio de um romance em folhetins – A Filha do Jardineiro) publicados em jornais como A Vanguarda, uma publicação republicana, o Jornal do Comércio, O Século (do qual foi, mais tarde, correspondente em Paris), A Pátria, Ilustração Portuguesa e o Diário de Lisboa. Dedicou-se também à tradução (traduziu, por exemplo, Il Santo, de Fogazzaro) e à redação, em colaboração com José Ferreira da Silva, do folhetim A Filha do Jardineiro, uma ficção simultaneamente de propaganda republicana e de crítica corrosiva às figuras do regime monárquico, incluindo o próprio rei D. Carlos. Além disso, foi um dos fundadores da Seara, onde também colaborou, escreveu em revistas como Homens Livres e Lusitânia e, juntamente com outros intelectuais seus amigos, entre os quais Raul Proença, constituiu-se como um dos animadores da publicação do Guia de Portugal.

            Verdadeiro homem de ação, um tipo social muito exaltado no início do século XX, aderiu ao movimento republicano, pelo qual se bateu, quer através da escrita, quer através da participação em iniciativas que acabaram por o levar à prisão. De facto, em 1907, foi acusado de bombista por causa do rebentamento de uns caixotes de explosivos que guardara no seu quarto e que levaram à morte de dois correligionários seus e detido na esquadra do Caminho Novo por fazer parte do Partido Republicano, de onde se evadiu em circunstâncias recambolescas, como se pode ler num volume de memórias. Chegou mesmo a correr um boato segundo o qual Aquilino teria sido, em 1908, a «terceira carabina», aliás inútil, já que os dois regicidas tinham levado a cabo a sua função de forma exemplar. Fugiu, portanto, da prisão e, após alguns meses de clandestinidade em Lisboa, refugiou-se em Paris, tendo frequentado na Sorbonne o curso de Filosofia e Sociologia. Aí, foi ensinado por mestres como George Dumas, André Lalande, Levy Bruhl e Durckeim, e contactou com a intelectualidade portuguesa que, igualmente por razõees políticas, se exilara fora de Portugal. Além disso, conheceu Grete Teidemann, a sua primeira mulher, com quem foi residir e casou na Alemanha, tendo o seu primeiro filho nascido, porém, em Paris. Visitou brevemente Portugal em 1910, depois de proclamada a República, tendo regressado em definitivo no ano de 1914, depois da eclosão da Primeira Guerra Mundial, deixando incompleto o curso de Filosofia, que abandonou já depois de se ter matriculado no quarto ano, como se pode comprovar pela consulta dos registos guardados no Centre d’Accueil et de Recherche des Archives Nationales de Paris.

            Em Portugal, nunca descurando o seu trabalho de escritor (escrita ficcional e cronística para a imprensa periódica, uma atividade que desenvolveu de forma regular ao longo de toda a vida), exerceu a carreira de professor no Liceu Camões durante três anos e foi, posteriormente, segundo bibliotecário – mais tarde conservador – na Biblioteca Nacional, para onde entrou a convite do amigo Raul Proença. Esta função, entre outras vantagens, deu-lhe a possibilidade de alimentar o seu amor pelos livros antigos e raros, um gosto que o levou a produzir trabalhos de investigação, publicados, por exemplo, nos Anais das Bibliotecas e Arquivos, e que se refletiu também na sua produção literária, de que é exemplo o seu primeiro romance, A Via Sinuosa. Além disso, como já foi referido anteriormente, fez parte de um grupo de intelectuais que desenvolveu uma significativa atividade cívica e cultural que teve a sua expressão mais visível na revista Seara Nova, uma publicação importantíssima quer na difusão dos ideais republicanos, quer na evolução da conturbada vida política da Primeira República.

Foi demitido do cargo de bibliotecário em 1927 novamente por razões políticas. Desta vez, participou na revolta frustrada contra a ditadura militar que, entretanto, fora instaurada no país após o golpe de 28 de maio de 1926. Fugiu para a Beira Alta e, em seguida, refugiou-se de novo em Paris – segundo exílio. Quando, clandestinamente, regressou a Portugal, escondeu-se em Soutosa. Entrementes faleceu a sua esposa. Em 1928, voltou a participar numa iniciativa antirregime (o chamado movimento do regimento de Pinhel), mas foi capturado e levado para a prisão do Fontelo, em Viseu, um edifício que ainda hoje pode ser visto na cidade. Na companhia de António Mota, conseguiu voltar a evadir-se serrando as grades do cárcere enquanto numa grafonola tocava um disco para abafar o som. Escondeu-se nas serranias beiroas e encetou uma difícil jornada que o levou de novo a Paris – terceiro exílio. Na capital francesa, casou em segundas núpcias [a primeira esposa havida falecido em 1927] com D. Jerónima Dantas Machado, filha do presidente da República Bernardino Machado, também homiziado aí depois de deposto por Sidónio Pais, e foi viver com ela para o Sul de França (Ustaritz e Baiona, onde, em 1930, lhe nasceu o primeiro filho do casal e o segundo de Aquilino). Enquanto isso, em Lisboa, em 1929, foi julgado e condenado à revelia. Viveu depois em Vigo e em Tui, cidades espanholas, até regressar clandestinamente a Abravezes, Viseu. Acabou por ser amnistiado em 1932, tendo ido residir para Cruz Quebrada.

            Acalmados os seus instintos revolucionários, embora tenha continuado a participar em ações críticas da ditadura salazarista, Aquilo Ribeiro pode, então, dedicar-se plenamente à escrita, prosseguindo a sua produção ficcional, o trabalho de tradução, o trabalho ensaístico (latu sensu) e a colaboração na imprensa, além das suas lendárias idas ao Chiado, ao final da tarde, para tertúlias à porta da Bertrand, a sua editora. Literariamente, nunca abdicou da originalidade nem alinhou com nenhum dos movimentos literários do seu tempo, desde o Modernismo (pela leitura de algumas cartas de Fernando Pessoa, ficamos a saber que Aquilino era apreciado pelo poeta) ao Presencismo, que o criticou fortemente, em especial José Régio (críticas essas publicadas em grande número na revista do movimento, a Presença), passando pelo Neorrealismo. Como foi indiciado atrás, não obstante a acalmia que a sua vida conheceu nesta época, o escritor jamais abdicou da sua consciência cívica e política, tendo continuado a criticar o regime, aderido ao MUD (Movimento de Unidade Democrática), publicado textos na imprensa diária de defesa da causa, apoiado a campanha presidencial de Norton de Matos, integrado, juntamente com outras figuras do saber, a Comissão Promotora do Voto e militado na candidatura do general Humberto Delgado à presidência da República, em 1958.

            Em 1933, o conjunto de novelas As Três Mulheres de Sansão foi galardoado com o Prémio Ricardo Malheiros, atribuído pela Academia das Ciências de Lisboa, e, em 1935, foi eleito sócio correspondente desta instituição, da qual se tornou sócio efetivo em 1957. Ao seu ativismo político soma-se a tenacidade com que, durante mais de duas décadas, lutou pela agregação forma e institucionalizada dos escritores até conseguir criar, apesar das forças políticas contrárias, a Sociedade Portuguesa de Escritores, em 1956, de que foi fundador, o primeiro presidente eleito e o sócio n.º 1. No ano seguinte, a Livraria Bertrand iniciou a edição das Obras Completas. Em 1959, foi publicado o romance Quando os Lobos Uivam, que, por causa do seu conteúdo incómodo para o poder político, que o considerou injurioso das instituições do poder, foi apreendido e o escritor processado, no entanto, em 1960, o processo foi amnistiado. Nesse mesmo ano, um grupo de intelectuais (entre os quais Francisco Vieira de Almeida, o proponente, José Cardoso Pires, David Mourão-Ferreira, José Gomes Ferreira, Maria Judite de Carvalho, Joel Serrão, Mário Soares, Vitorino Nemésio, Alves Redol, Luísa Dacosta, Vergílio Ferreira como subscritores) candidatou Aquilino Ribeiro ao Prémio Nobel da Literatura. Todos estes factos, juntamente com as homenagens que recebeu no Brasil quando lá se deslocou em 1952, o movimento de defesa que se gerou em seu torno a propósito da já citada publicação de Quando os Lobos Uivam (além da defesa formal, da responsabilidade do advogado Heliodoro Caldeira, o escritor recebe o apoio de cerca de três centenas de intelectuais portugueses, que elaboram um abaixo-assinado pedindo o arquivamento do processo e François Mauriac redigiu uma petição em seu amparo que foi assinada por figuras como Louis Aragon e André Maurois, além de ter sido publicado em vários jornais e revistas franceses) atestam o enorme prestígio que Aquilino Ribeiro possuía.

            No momento em que se preparava, nomeadamente através da Sociedade Portuguesa de Escritores, uma homenagem pública nacional, promovida por várias cidades e tendo por base a celebração do cinquentenário da publicação da obra Jardim das Tormentas, o escritor adoeceu repentinamente, vindo a falecer no Hospital da CUF a 27 de maior de 1963.

 

Bibliografia

AA. VV., Retratos para Aquilino, Câmara Municipal de Paredes de Coura, 2000.

ALMEIDA, Henrique, Aquilino Ribeiro e a Crítica, Porto, Edições Asa, 1993.

CENTRO DE ESTUDOS AQUILINO RIBEIRO (ed.), Cadernos Aquilinianos.

INSTITUTO PORTUGUÊS DO LIVRO (coord. Eugénio Rosa), Dicionário Cronológico de Autores Portugueses.

MALPIQUE, Cruz, Aquilino. O homem e o escritor. Porto. Divulgação, 1964.

MARTINS, Serafina, Aquilino Ribeiro, Instituto Camões.

MALPIQUE, Cruz, Aquilino. O homem e o escritor. Porto. Divulgação, 1964.

 

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