Português: 29/09/14

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Registos formal e informal - Formas de tratamento

1. Registos formal e informal

                O contexto situacional em que se encontram dois interlocutores condiciona as escolhas linguísticas que ambos fazem. Por outro lado, o tipo de relação social que mantêm (marcado por fatores como a idade, o sexo, o grau de instrução, etc.) condiciona igualmente o grau de formalidade da sua interlocução, que pode oscilar entre um registo mais informal ("Dá-me esse livro!") e um registo cuidado ou mais formal ("Não se importa de me dar esse livro?").


2. Formas de tratamento

                Cada falante dispõe de um conjunto de formas de tratamento para comunicar e que refletem as relações existentes entre si: de familiaridade, de amizade, de submissão, etc.
                A opção por uma determinada forma de tratamento em detrimento de outra é determinada por alguns critérios:
. a relação de familiaridade / proximidade;
. a idade e o estatuto social dos falantes (em termos de hierarquia social e profissional;
. o sexo;
. o grau de instrução;
.


                As principais formas de tratamento são as seguintes:

. Familiar (é usado na intimidade, entre iguais e de mais velhos para mais novos): tu, querido, amigo;

. Nome próprio: o João, a Maria;

. Você: este termo é considerado, pelo português europeu, uma forma de tratamento menos respeitosa, de nível mais popular. Situa-se entre o tu e o senhor. Por outro lado, em determinados ambientes (citadinos, classes mais altas), o uso de você é considerado elegante, sendo usado entre iguais, ou como forma de tratamento íntimo. Porém, nos estratos socioculturais mais populares de determinadas regiões, o pronome você ainda é usado de inferior para superior como sinal de respeito, de deferência. Pelo contrário, nos estratos mais cultos, este tratamento é entendido como muito deselegante e a sua utilização ofensiva. Já no que diz respeito ao português do Brasil, o você é de utilização corrente e familiar;

. Sujeito nulo subentendido: quando nos dirigimos a uma pessoa com quem não temos suficiente familiaridade para a podermos tratar por tu e como entendemos o uso de você como deselegante e ofensivo, optamos por recorrer ao sujeito nulo subentendido ou, então, à explicitação do nome do nosso interlocutor ou do grau de parentesco precedido de artigo definido:
. Está bom?
. A mãe foi à missa?
. A avó vai sair com o avô?
. A Joana viu o seu colega no cinema?

. De cortesia: o senhor / a senhora: estas formas de tratamento formal mostram maior respeito ou distância social no tratamento;

. Académico: senhor professor, senhor doutor, Professor Doutor, etc.;

. Honorífico: Senhor Primeiro-Ministro, Senhor Presidente da República, Vossa Excelência, Vossa Senhoria;

. Eclesiástico: Vossa Santidade (Papa), Vossa Eminência (cardeais), Monsenhor, Vossa Reverência, etc.;

. Nobiliárquico: Vossa Alteza, Vossa Majestade, Sua Majestade, etc.

                Estas formas de tratamento podem surgir conjugadas:
. A senhora dona Cláudia…
. Senhor engenheiro…



Fontes:

     » Dicionário Terminológico;
     » AMORIM, Clara e SOUSA, Catarina, Gramática da Língua Portuguesa, Areal Editores

Análise de "As palavras", Eugénio de Andrade

As palavras

São como cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.

Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.
Desamparadas, inocentes,
leves.

Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.

Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?

                “As palavras” é uma composição poética da autoria de Eugénio de Andrade, pseudónimo do poeta José Fontainhas, nascido a 19 de janeiro de 1923 no Fundão e falecido em 13 de junho de 2005, no Porto, incluído na obra O Coração do Dia.
                Formalmente, o poema é constituído por quatro estrofes, duas sextilhas e duas quadras, num total de 20 versos, maioritariamente brancos ou soltos, à exceção do 1 e do 3, que apresentam rima cruzada, e aborda o tema da reflexão sobre o valor polissémico das palavras.
                Relativamente à sua estrutura interna, o texto divide-se em duas partes: a primeira, constituída pelas primeiras três estrofes e a segunda pela última. Na primeira parte, o sujeito poético descreve as palavras, enquanto na última faz duas interrogações retóricas, chamando deste modo a atenção do leitor para o seu papel de descodificador delas.
                Logo a abrir, as palavras são comparadas a um cristal, revelando-se, assim, desde logo o seu sentido polissémico, devido ao facto de os cristais possuírem várias faces, tal como a palavra possui vários sentidos. Além disso, como os cristais, as palavras podem adquirir vários significados (polissemia), podem ser claras, transparentes, belas, brilhantes, isto é, são “multifacetadas”. De seguida, são identificadas com um punhal, metáfora que remete para a agressividade, dor, morte e sofrimento que podem carregar; com um incêndio, pois podem queimar, destruir, aludindo pois à sua capacidade de destruição e também de regeneração; e finalmente com o orvalho “apenas”, metáfora que nos conduz à suavidade das palavras, capazes de despertar a calma, a brandura, o amor e a esperança.
                A segunda estrofe ensina-nos que as palavras são essenciais na comunicação entre os seres humanos e intemporais, pois têm carregado, através dos tempos, as histórias e os segredos dos homens. Com o passar do tempo vão recebendo novos significados, evoluindo, carregando os segredos da história dos homens e acompanhando os seres humanos como instrumento indispensável de comunicação; trazem consigo um saber muito antigo (“Secretas vêm, cheias de memória”). Em simultâneo, porém, também causam insegurança e agitam as pessoas, fazendo-as estremecer como os barcos, que agitam as águas, e os beijos, que também fazem estremecer. Com efeito, os versos 8 a 10 (“Inseguras navegam / barcos ou beijos / as águas estremecem”) revelam insegurança quer das palavras, que agitam as pessoas, quer dos barcos, que agitam as águas. Ao amor representado pelos beijos, ninguém lhes fica indiferente, assim como às palavras.
                Na terceira estrofe, o sujeito poético caracteriza as palavras como “desamparadas” (porque estão ao alcance de todos), “inocentes” (porque não representam qualquer perigo, mas podem ser usadas e abusadas) e “leves” (quando não têm importância no texto). Estamos na presença de características que conferem alguma fragilidade às palavras, mas não nos devemos esquecer que as palavras podem ser usadas de várias formas, com vários tons. Uma palavra “leve” e “inocente” também pode ofender, caluniar... Por sua vez, a metáfora e a antítese “Tecidas são de luz / e são a noite” realçam as contradições que as palavras contêm (positividade versus negatividade) e o seu sentido conotativo: há as que surgem cobertas de luz, são claras, transparentes, mas estas mesmas podem também ser a noite, podem ser negras, escuras, sombrias. Por seu turno, nos versos “E mesmo pálidas / verdes paraísos lembram ainda”, o sujeito lírico sugere que as palavras podem não ser intensas nem coloridas, mas ainda assim podem ser aprazíveis e alegres, lembrando o paraíso.
                O poema termina com duas interrogações retóricas, através das quais o eu poético chama a atenção do leitor, dizendo-lhe que lhe cabe o papel de intérprete das palavras, do seu significado, de acordo com a sua experiência de vida, com o seu modo de sentir. É o leitor que vai abrir as conchas puras, com as palavras lá dentro cheias de mistério, atribuindo-lhes um sentido. As interrogações retóricas “Quem as escuta? Quem/as recolhe, assim, /cruéis, desfeitas, /nas suas conchas puras?” apelam à releitura das palavras.

'Personagem'

     Deve dizer-se a personagem ou o personagem?
     A palavra personagem é um galicismo (ou francesismo). Ora, as palavras francesas terminadas em -age são normalmente do género masculino: le personnage.
     Ao contrário, em português, os vocábulos terminados em -agem pertencem normalmente ao género feminino, daí que digamos a personagem. No entanto, persiste quem atribua à palavra o género masculino e diga o personagem. Este facto justifica-se pela sua introdução em Portugal através do galicismo, daí a tendência par manter o mesmo género do termo francês. O fenómeno linguístico que aqui ocorre é conhecido por «palavras de género oscilante».
     Perante os dois usos, o mais adequado será o que corresponde ao género feminino: a personagem. De acordo com António Marques (Tento na Língua), por três razões:
  • esse uso é mais conforme ao caráter da língua portuguesa;
  • a maior parte dos falantes e dos escritores assim o entende na prática;
  • a maioria dos dicionários registam a palavra como feminina.

A palavra 'moral'

     A palavra moral provém do adjetivo latino moralis [ac. morale(m)] e significa, tendo em conta a etimologia, tudo o que se relaciona com os costumes (latim: mos, moris).

     Por via da derivação imprópria, o adjetivo, nas línguas novilatinas, substantivou-se, podendo usar-se ora como adjetivo ora como substantivo.

     Como adjetivo, sujeita-se ao género do nome a que está ligado e significa o comportamento moral, a atitude moral.

     Como nome, pode assumir os dois géneros, mas o seu significado varia consoante o género. Assim, pode remeter para os valores que regem a conduta humana, os princípios morais (a honestidade ou a sua ausência, a virtude ou a sua ausência, etc.).
          . A moral dos alunos é assinalável. (isto é, são boas pessoas, têm
            comportamentos e ações dignas e positivas).

Por outro lado, pode remeter para o estado de espírito da pessoa:
          . O moral dos sportinguistas está em baixo. (ou seja, os adeptos
            do Sporting estão desanimados, tristes...).

     A palavra, usada na expressão "moral da história", significa a lição que é possível aprender com uma determinada narrativa.

     Por último, convém não confundir «moral» com «mural», termo que remete para algo afixado ou pintado numa parede, num muro:
          . Os alunos coloriram o mural da biblioteca com os seus textos.



     Em síntese:


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