Português

segunda-feira, 13 de abril de 2020

Ensino a distância ou ensino à distância ?

     Surgiu nos documentos oficiais, a propósito da situação de pandemia que o mundo enfrenta por causa da COVID-19, a expressão «ensino a distância».
      
     Na nossa humílima opinião, a expressão correta é, precisamente, «ensino à distância».

     Muito melhor do que alguma vez nós seríamos capaz de fazer, a professora Regina Rocha explica porquê neste post do Ciberdúvidas:


     «À distância» é a expressão correcta por três razões.

     Deverá dizer-se «ensino à distância», ou «ensino a distância»?

     Considero que «ensino à distância» é a construção correcta.

     A expressão «à distância» ou constitui uma locução adverbial (ex.: «À distância, o general observava atentamente a movimentação das tropas»), ou faz parte de uma locução prepositiva (ex.: «Estavam à distância de 200 metros do quartel»).

     Não encontrei registos de, em Portugal, alguma vez haver dúvidas a este respeito. A gramática de maior divulgação em Portugal nas últimas décadas (Celso Cunha e Lindley Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, João Sá da Costa, Lisboa, Junho de 1984) inclui a expressão «à distância» numa lista de locuções adverbiais de lugar (2.ª ed., Outubro de 1984, p. 541).

     No Brasil, os gramáticos de maior nomeada referem o mesmo.

     Argumentam os defensores da expressão «a distância» que haveria contracção da preposição com o artigo (à) apenas no caso de se tratar de uma locução prepositiva («à distância de»), isto é, quando a dimensão ou a natureza da distância fosse determinada pela expressão que se lhe seguisse (ex.: «à distância de um telefonema»). Não encontrei nenhuma regra gramatical que sustentasse esta posição.
Que razões levam a que, nesta resposta, se defenda a locução adverbial «à distância», e não «a distância»? Apresento três.

1.ª – A locução está cristalizada há muitas décadas, décadas de uso corrente na norma culta. Esta é a primeira e primordial razão, pois, mesmo que na sua origem tivesse havido uma formação indevida (que não considero ser o caso, como explicarei de seguida, no ponto 2, desde o momento em que a maioria dos falantes cultos a adoptou e as gramáticas a registaram, ela ganhou legitimidade.

2.ª – A expressão «à distância» contém um substantivo que pede um complemento do nome (expresso ou subentendido). Por exemplo, se se ouvir a frase «A distância foi percorrida em cinco segundos», é natural que se pergunte «Que distância?». Tal significa que está subentendido um complemento. Na expressão «ensino à distância» está subentendido um complemento («à distância dos alunos», «à distância de quem vai receber essas lições»).

Ora, quando uma locução adverbial contém um substantivo que admite um complemento implícito, terá de se utilizar a contracção da preposição, pois está precisamente subentendido esse complemento.

Exemplos:

a)    «conta à ordem» (subentendido «de alguém»), diferente de «conta a prazo» (simples natureza da conta);

b)    «proceder à revelia»; «julgamento à revelia» (subentendido «de alguém», sem a comparência «do arguido» — em direito);

c)    «desenho à vista»; «dinheiro à vista» (subentendido «de alguém»);

d)    «letra à cobrança»; «envio à cobrança» (subentendido «do devedor»).

3.ª – Não tenho conhecimento de argumentos linguisticamente pertinentes que destruam a legitimidade da locução adverbial «à distância».

Assim, considero correctas as seguintes expressões: «ensino à distância», «formação à distância», «cursos ministrados à distância», «comando à distância».»

#EstudoEmCasa no Youtube


     A DGe já criou um conjunto de canais no Youtube [link] nos quais estarão disponíveis os vídeos complementares ao E"D e que serão transmitidos, em sinal aberto, através da RTP Memória.

     As ligações para os diversos canais são as seguintes:

          . Pré-escolar: #EstudoEmCasa – Pré-Escolar.

          . 1.º ciclo: #EstudoEmCasa – 1.º Ciclo.

          . 2.º ciclo: #EstudoEmCasa – 2.º Ciclo.

          . 3.º ciclo: #EstudoEmCasa – 3.º Ciclo.

          . Ensino secundário: #EstudoEmCasa – Secundário.

COVID-19: ponto de situação do dia 12 de abril


quinta-feira, 9 de abril de 2020

Origem e significado de corona e vírus

     Frederico Lourenço revela, neste seu texto [corona-e-vírus-em-tempo-de-corona-vírus] a o3igem das duas palavras, bem como o seu significado primitivo, além do erro que consiste a sua junção numa só palavra.

«Duas palavras gregas (com roupagem latina) dominam a actualidade mundial. Se, por um lado, a formulação que ouvimos todos os dias («coronavírus») fere os meus ouvidos de helenista/latinista – pois como é que um substantivo («corōna») pode qualificar outro substantivo («vīrus»)? -, por outro lado tenho-me entretido com os pensamentos ziguezagueantes sobre estas duas palavras, suscitados pela sua repetição permanente. Sentado ontem ao balcão de um pequeno restaurante de Coimbra, enquanto o noticiário televisivo repetia em tons histéricos o nome «coronavírus», dei por mim a pensar como as palavras têm a sua história; e como as pessoas a quem o ensino actual nega a possibilidade de estudar Grego e Latim passam ao lado dessa história. Por via da herança grega e latina, palavras como «corōna» e «vīrus» têm uma história milenar, cuja viagem (pelo menos a reconstruível) começa com Homero e tem ponto de passagem no Novo Testamento.
À partida, quando olhamos para as palavras latinas «corōna» e «vīrus», diríamos que nada têm a ver uma com a outra: a primeira tem como sentido primário «grinalda», «coroa»; a segunda tem como sentido primário «veneno». No entanto, na utilização mais antiga que se conhece destas duas palavras, elas estão estranhamente ligadas por um denominador comum: o arco do qual se disparam flechas.
À imagem do arco está associada a palavra grega «korōnē» (donde deriva em latim «corōna») desde a Ilíada, poema em que o termo serve para designar a ponta do arco.
Por seu lado, a palavra latina «vīrus» é a forma itálica da palavra grega «īós» (que no tempo de Homero talvez ainda se pronunciasse «wīós»). Esta palavra «īós», antepassada da nossa palavra «vírus», é objecto de fascínio para os helenistas, porque tem três sentidos à primeira vista diferentes: «flecha»; «veneno»; «ferrugem».
Podemos questionar hoje se, linguisticamente, a etimologia de «īós» no sentido de «flecha» é a mesma de «īós» no sentido de «veneno» e «ferrugem»; mas os antigos não tinham essa consciência. Se perguntássemos a Homero a razão de as palavras para «flecha» e «veneno» serem homógrafas, ele responder-nos-ia certamente que, muitas vezes, as flechas são portadoras de veneno pelo facto de serem envenenadas. O arco do qual a primeira flecha da Ilíada é disparada (arco esse, justamente, cuja descrição no Canto 4 nos dá a primeira atestação da palavra «korōnē») é tacitamente suspeito de disparar flechas envenenadas.
Porquê? Porque o médico militar nesse canto da Ilíada, «quando viu a ferida, onde embatera a seta aguda, / chupou dela o sangue e, bom conhecedor, nela pôs fármacos / apaziguadores» (Ilíada 4.217-219).
Depois de Homero, «korōnē» e «īós» seguiram caminhos divergentes. No que diz respeito a «korōnē», há que referir a sua acepção ornitológica («corvo»), o que terá talvez conduzido à acepção de «coroa», quiçá inspirada pela crista de algum pássaro. No entanto, em grego a acepção de «coroa» é rara. Quando os soldados romanos tecem uma coroa de espinhos para pôr na cabeça de Jesus, a palavra grega é «stéphanos» (στέφανος); na Vulgata, no entanto, lemos «corōna».
Por seu lado, a palavra grega «īós» («veneno»), correspondente a «vīrus» em latim, está praticamente ausente do Novo Testamento, embora surja de modo curioso na Epístola de Tiago, onde a primeira ocorrência aponta para a acepção de «veneno» (Tiago 3:8) e a segunda para a acepção de «ferrugem» (5:2). Note-se que a conotação associada a «īós» em grego é quase sempre negativa; mas temos uma excepção curiosa na expressão para designar o mel, que Píndaro inventa num dos seus poemas: «veneno [īós] inofensivo das abelhas».
Também em latim, «vīrus» tem quase sempre uma conotação negativa; contudo, o poeta Estácio, no séc. I d.C., surpreende-nos ao referir um «vírus benigno» com propriedades medicinais, que pode ser colhido «nos campos dos Árabes» (Estácio, «Silvae», 1.4.104).
Que «vīrus» será esse em concreto? Estácio não nos diz. O facto de lhe chamar «benigno» leva a crer que será bem diferente do nosso coronavírus, que, fiel à história mais antiga das palavras que o compõem, tem percorrido em flecha o mundo inteiro.
Um último pensamento: vários autores romanos (Horácio, Plínio [tio], Marcial) aplicaram ao substantivo «vírus» o adjectivo «grave». Esperemos que este vírus que agora nos ocupa se reveja mais na sua identidade homérica de flecha… e que acabe por se tornar, já agora, como escreveu Píndaro, ἀμεμφής: inofensivo.».

Três retratos femininos em Os Maias

     Trata-se de um estudo muito interessante, focado em três das personagens do romance Os Maias: Maria Monforte, Maria Eduarda e a Condessa de Gouvarinho.

     A tese de mestrado pode ser encontrada aqui [três-retratos-femininos-os-maias].

A História na Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho

     «N‟ “A Inaudita Guerra”, estabelece-se um diálogo conciliador entre a História e o Maravilhoso e ambos se conjugam para alertar sobre a necessidade de interrogar as raízes de um presente à deriva de valores e de certezas. Sendo o insólito o elemento estruturador dos seis contos que integram a obra, A Inaudita Guerra na Avenida Gago Coutinho, estes mantêm operativa uma combinatória de estratégias e de procedimentos técnico-discursivos, de forma a veicular uma moral que não se realiza dentro das expectativas do leitor. Subversivos e provocatórios, os contos têm em comum o facto de encenarem confrontos, onde o Bem é esmagado pelo Mal, funcionando, assim, como veículos de expressão e/ou contestação de ideologias.»

     Para aceder, clicar aqui [estudo].
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