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sexta-feira, 23 de setembro de 2022

Análise do poema "Variações sobre «O Poema Pouco Original do Medo» de Alexandre O’Neill", de Manuel Alegre


            Este poema de Manuel Alegre foi escrito em 1965,em plena vigência do Estado Novo, que é o equivalente a falar em falta de liberdade, censura, medo, opressão. A literatura não ficou indiferente à situação: houve escritores que a aceitaram, enquanto outros procuraram combater o regime, o que forçou alguns ao exílio, como sucedeu com Manuel Alegre.

            O título do texto relaciona-o com o poema de Alexandre O’Neill por meio do nome «variações», termo que remete para uma versão de algo. Assim sendo, iremos encontrar diferenças entre as duas composições.

            Relativamente à estrutura interna, podemos dividir o texto em três partes. A primeira corresponde à primeira estrofe, que nos dá conta da invasão da cidade pelos ratos e o seu domínio sobre “as gentes”. A segunda parte, composta pela segunda estrofe, evidencia a postura do «eu», que não se conforma nem se acomoda à vontade dos ratos, não se deixa intimidar nem oprimir. A terceira parte, a terceira estrofe, apresenta o resultado do poder transformador do canto, isto é, a liberdade de expressão combate o medo.

            A primeira estrofe dá-nos conta de uma situação: os ratos invadiram a cidade e dominaram toda a gente, como o demonstra o seu comportamento – tomaram as casas e roeram o coração das pessoas, a vida, o sol, a lua e o amor. Quer isto dizer que o medo reina, governa tudo e todos, incluindo o próprio país. A metáfora do verso 4 (“Cada homem traz um rato na alma.”) significa que as pessoas foram dominadas pelo que os ratos simbolizam negativamente. A aliteração do /r/ do verso 5 sugere a forma como os ratos roem e o ruído que produzem ao fazê-lo, bem como a sua ação dominadora e destruidora dos seres humanos. Por sua vez, o verso 6 traduz a noção de que todos têm de aceitar os valores e as ideias representadas pelos ratos. Por outro lado, simboliza a desumanização das pessoas, ao retirar-lhes os traços humanos, substituídos pelos dos roedores.

            Por que motivo terá o «eu» selecionado estes animais para desenvolver a temática do poema? Os ratos são bichos que vivem e se alimentam do lixo, que se reproduzem rapidamente e em grande escala. Quando atuam em grupo, têm um efeito devastador. Além disso, são responsáveis pela transmissão de várias doenças graves para os humanos, como, por exemplo, a peste negra. Por último, o termo «rato», quando aplicado às pessoas como adjetivo qualificativo, significa que as ditas são medrosas, se acobardam.

            Deste modo, podemos deduzir que os ratos, neste poema, simbolizam o medo, a opressão, a desumanização do indivíduo, etc.

            A segunda estrofe mostra a atividade e o comportamento do «eu». Assim, afirma-se um homem, por oposição a um rato. Por outro lado, ao contrário dos roedores, que chiam, ele canta e grita-lhes não, isto é, enfrenta-os corajosamente, não se deixando intimidar nem oprimir. Por conseguinte, enche a toca de sol, que simboliza a liberdade (o sol fica no céu), a luz, a esperança; de luar e de amor. Cada uma das ações do sujeito poético é seguida de um verso entre parênteses e anafórico (“Cá fora”), que traduz a oposição entre os ideais que defende – a liberdade, por exemplo – e que estão a ser destruídos pelos ratos (“roeram o sol”, “roeram a lua”, “roeram o amor”) e a situação vivida.

            A última estrofe reflete o poder transformador da ação e do canto do «eu». Esses quatro versos estão prenhes de esperança e representam a semente da mudança que foi plantada: a toca do sujeito poético não é mais dominada pelos animais; pertence agora a um conjunto de homens que canta e que, através do seu canto, a enche de sol, ou seja, subverte a situação num sentido positivo. O sol e o canto simbolizam os princípios que os ratos haviam destruído, concretamente a liberdade de expressão, a vida, o amor. Por outro lado, a antítese entre os ratos que chiam e os homens que cantam representa a humanização destes. Em suma, esta estrofe apresenta-nos a imagem de um conjunto de homens unidos e a cantar contra os ratos, isto é, todos os que oprimiam, para permitir que a cidade, sinédoque do país (Portugal), se voltasse a encher de sol, ou seja, de liberdade.

            Deste modo, podemos concluir que este poema reflete o medo e a opressão vividos nos anos 60 em Portugal, em plena ditadura salazarista. Assim, não é de estranhar o posicionamento crítico do poeta, que denuncia e expõe a opressão e a falta de liberdade suscitadas pelo regime, como forma de dominar “as gentes”, a sociedade.

            A presença do canto dos homens neste poema relaciona-se com uma tendência da época, que consistia em fazer da poesia uma arma de combate, de denúncia da situação, em suma, uma arma política. Assim sendo, o poeta, nesta composição, denuncia a opressão e a falta de liberdade de expressão, mostra a sua postura perante a realidade vivida na época face à opressão e perseguição da polícia através da figura dos ratos.

quinta-feira, 22 de setembro de 2022

Mais um verão chega ao fim

Método Científico

Análise do poema "Caminho", de Camilo Pessanha


 Caminho
 

Tenho sonhos cruéis, n’alma doente

Sinto um vago receio prematuro.

Vou a medo na aresta do futuro,

Embebido em saudades do presente…

 

Saudades desta dor que em vão procuro

Do peito afugentar bem rudemente,

Devendo, ao desmaiar sobre o poente,

Cobrir-me o coração dum véu escuro!...

 

Porque a dor, esta falta d’harmonia,

Toda a luz desgrenhada que alumia

As almas doidamente, o céu d’agora,

 

Sem ela o coração é quase nada:

Um sol onde expirasse a madrugada,

Porque é só madrugada quando chora.

 
            O título do soneto remete para o olhar em frente, para o que pode vir (por exemplo, uma rua, uma estrada). De forma específica, podemos dizer que esse caminho representa a própria vida, caracterizado por sensações e sentimentos vários, como veremos pela análise.

            Nas duas quadras, o sujeito poético descreve o seu drama existencial, o seu percurso de vida (passado, presente e futuro), enquanto nos dois tercetos amplia esse sentimento ao descrever a dor como uma falta de harmonia, embora necessária aos corações humanos, demonstrando que o seu sofrimento é recorrente no percurso de outras vidas.

            O sujeito poético é um ser sofrido, consumido por uma dor existencial, que não é motivada por nenhuma razão palpável, como o amor não correspondido, a perda ou a morte.

            Na primeira quadra, o «eu» descreve a sua angústia em relação ao caminho que deve percorrer e declara-se um sonhador, embora viva um momento de dor e medo, do qual, apesar de tudo, sente saudades. A rima entre o adjetivo «doente» e o nome «presente» contribui para a construção da ideia de que o presente do «eu», embora seja passível de saudade, é um momento de sofrimento, no qual a sua alma se encontra doente, assolada por essa dor. No que diz respeito à sua trajetória, o sujeito poético afirma que tem sonhos cruéis que mantém na sua alma. Por outro lado, sente um receio que o faz caminhar com medo pelo estreito caminho que o levará ao futuro. Ao mesmo tempo em que há o medo, sente saudades do presente, no sentido de que o caminho que o levará ao futuro o faz sentir saudades do presente, que logo se transformará em passado, assim que o caminho for percorrido. Por outro lado, a rima entre o adjetivo «prematuro» e o nome «futuro» mostram que a angústia do sujeito lírico existe em todos os momentos, que o medo é antecipado, incluindo o que se relaciona com o futuro, o incerto.

            Na segunda quadra, a rima entre a forma verbal «procuro» e o adjetivo «escuro» sugere que, embora o «eu» procure libertar-se da dor que sente, a escuridão e o sofrimento constituem a sua resposta. Mais uma vez afirma que sente saudades do presente e da dor que o caracteriza, da qual se procura afastar, porém em vão. Essa dor agrava-se com o anoitecer (“ao desmaiar sobre o poente” – v. 7). O mesmo véu que cobre a noite cobre o seu coração e torna-o sombrio, tomado pela dor, pelos medos e pelas incertezas. A metáfora “desmaiar sobre poente” representa o sono, o momento de adormecer. Além do caminho que é a vida, há outros caminhos: o que transforma dia em noite, sol em escuridão.

            No primeiro terceto, o sujeito poético compara a dor à falta de harmonia, a qual se pode entender como um desconcerto, uma inadaptação ao mundo, à sociedade e a si mesmo. Por outro lado, a dor é a luz desregrada que ilumina as almas, a luz que ora é forte, ora é fraca, mas sem a qual não é possível sobreviver, como se comprova no segundo terceto: “Sem ela o coração é quase nada: / Um sol onde expirasse a madrugada, / Porque é só madrugada quando chora.” (vv. 12-14). Estes versos significam que, sem essa luz e consequentemente a dor, que gera a luz, o coração é quase nada. A rima entre «agora» e «chora» evidenciam o sofrimento que caracteriza o «eu» no presente. A escuridão e a madrugada constituem símbolos de solidão e dor.

            Em suma, podemos concluir que a mensagem do soneto é que a passagem do tempo não altera a vida do sujeito poético e os seus sentimentos de dor, solidão e pessimismo, que são parte constituinte do caminho a percorrer e do próprio «eu».

segunda-feira, 19 de setembro de 2022

Análise do poema "Reais Ausências", de Ana Luísa Amaral


             O sujeito poético aborda o tema da ausência das mulheres na História oficial e imaginária de Portugal e da Inglaterra, como fica bem evidente nos versos seguintes: “Não há rainhas, não. / Quando se fala em mitos, é sempre Artur / ou D. Sebastião”. Esta referência consecutiva aos reis Artur e Sebastião não é casual, dado que o mito construído em torno do soberano português se assemelha imenso ao do monarca de Camelot, na figura do rei que iria regressar para resgatar a pátria.

            Ao longo do poema, o «eu» enumera reis e rainhas, estabelecendo entre eles constantes conspirações, no sentido de evidenciar a escassa importância que é dada a elas, falemos da rainha santa Isabel – famosa pelo milagre das rosas –, comparada com Henrique VIII – famoso por ter casado seis vezes, por ter sido declarado soberano da nova Igreja Anglicana (fundada após a sua rutura com a Igreja Católica), por ter exercido o poder mais absoluto dentre os monarcas ingleses e pela peça homónima de Shakespeare –, seja comparando Maria da Escócia – uma soberana bela, instruída, culta e inteligente, condenada à morte pela filha de Henrique VIII, Isabel I, sua prima – a D. Dinis, marido da rainha portuguesa Isabel, famoso trovador e místico plantador do pinhal de Leiria, cuja madeira, de acordo com a Mensagem, serviria para construir as naus das Descobertas.

            Por outro lado, o sujeito poético parece sugerir que as figuras femininas teriam sido as responsáveis pela ruína dos reis míticos, Artur e Sebastião. De facto, de acordo com a História, Guinevere traiu Artur com Lancelot, um dos seus cavaleiros da Távola Redonda, enquanto D. Sebastião, por ser solteiro (correspondendo tal à ausência de uma mulher) e ter morrido em Alcácer Quibir, esteve na origem do fim da dinastia de Avis e da perda da independência nacional.

            A ausência da mulher assume particular relevância na já citada Mensagem, na qual são referidas unicamente D. Teresa, “Mãe de reis e avó de impérios”, e D. Filipa de Lencastre, o “Humano ventre do Império”, a que só génios concebia, o que equivale a dizer que as mulheres são importantes não pelos seus atos ou pelas suas qualidades, mas apenas pela função de mães, de terem concebido e dado à luz os reis de Portugal. Assim sendo, o papel das mulheres é reduzido à conceção, “como se a virtude da mulher pudesse ser medida pelas virtudes de seus filhos, como se esses filhos fossem uma continuação da mãe, não um começo em si.”(Rhea Willmer, in Ana Luísa Amaral e Ana Cristina César: modos de pensar o feminino na poesia contemporânea em português, p.45).

            As rainhas deveriam ser, entre as mulheres em geral, especialmente férteis, visto que dependia delas o assegurar a descendência e os sucessores ao trono. Outra obra de referência, o Memorial do Convento, aborda, logo de início, esta premência de assegurar a sucessão. Com efeito, existe grande preocupação no círculo da corte por causa de a rainha, após quase dois anos de casamento, ainda não ter dado um filho a D. João V. A função da mulher é reduzida no romance, mais uma vez, a parir filhos, daí o narrador se referir a ela através de uma metáfora bíblica: “vaso de receber”.

            Voltando ao poema, a única figura feminina que assume relevância enquanto monarca é a rainha Vitória. É importante, neste contexto, salientar o facto de esta soberana ter assumido o trono unicamente pelo facto de, à época, não haver nenhum homem que sucedesse, por linha direta, ao rei George III, bem como a realidade de não ter assumido o poder em Hannover, onde vigorava a lei sálica (uma lei originária dos Francos Sálios, estabelecidos no Norte da França e da Bélgica atuais, que excluía as mulheres da sucessão à terra dos seus antepassados, por se considerar que, através do casamento, elas deixavam a sua família para integrar a do marido. Esta lei, que inicialmente se aplicava exclusivamente às sucessões privadas, graças a uma interpretação abusiva dos juristas, serviu mais tarde para as excluir da sucessão da coroa). Não obstante, o «eu» lírico destaca que “na forma de mandar, foi mais que homem”.

            É frequente, quando as mulheres que lideram governos exercem o poder de forma rígida e conservadora, compará-las a homens, como se fosse necessário que se masculinizassem para exercer esse poder. São exemplos disto a ex-primeira-ministra inglesa Margaret Thatcher (apelidada de Dama de Ferro) e Golda Meir, em Israel. Esta comparação estará, eventualmente, relacionada com o facto de estas figuras não terem assumido, durante a sua governação, uma postura maternal relativamente ao seu povo nem “uma posição progressista esperada por muitos homens e mulheres que veem no conservadorismo uma forma de perpetuar as desigualdades, dentre as quais, as desigualdades entre homens e mulheres.” (Rhea Willmer, ibidem, p. 46). Deste modo, a rainha Vitória, mesmo não sendo uma monarca absolutista, acaba por ser comparada a um homem pela forma como exerceu o poder e pela rigidez em termos de normas sociais, vestuário e linguagem, traços evidenciados no poema por expressões como “toucados opressores” e “verso espartilhado e de costumes”.

            Perante isto, o sujeito poético parece procurar um modo feminino e diferente de exercer o poder num “reinado feminino e língua nova, / nariz torcido à guerra no saber ancestral / de entranhas próprias”, mas não encontra nenhum exemplo de tal: “não me lembro nenhuma”. Apesar de haver figuras como as rainhas Santa Isabel e Vitória, que exerceu o poder durante mais de sessenta anos, não existe nenhuma monarca mitificada pela maneira como exerceu o poder. Veremos como a História registará a longo reinado de Isabel II, de Inglaterra, recentemente falecida. A única exceção talvez seja Inês de Castro. Porquê? Em primeiro lugar, esta figura assumiu grande relevância literária (tal como os reis Artur e Sebastião, por exemplo), constituindo um dos mais importantes episódios de Os Lusíadas e servindo de base à escrita de uma tragédia, da autoria de António Ferreira. Em segundo lugar, foi coroada depois de morta. Em terceiro lugar, possui sobrenome próprio (Castro), dado que não chegou a casar com D. Pedro. Em quarto lugar, a sua mitificação não dependeu da sua função de mãe, visto que a conceção de filhos de um rei foi a consequência do seu amor por D. Pedro e das suas relações sexuais com o filho do rei (D. Afonso IV, que a mandou matar). Assim sendo, Inês de Castro é assassinada – e posteriormente mitificada – por não ter seguido o modelo de Nossa Senhora. Com efeito, esta concebeu o filho de Deus sendo virgem, para que o fruto do seu ventre fosse puro, sem a mancha do pecado do sexo, enquanto Inês satisfez os seus desejos sexuais femininos de um modo que só foi permitido às mulheres trazer a público e através de uma linguagem muito recentemente.

            Note-se, porém, que num outro poema, intitulado “Inês e Pedro: quarenta anos depois”, Ana Luísa Amaral traça um retrato muito cruel do casal. Assim, Inês é, quarenta anos depois, uma mulher velha e desdentada, enquanto o seu amado Pedro sofre de cãibras e o passado é mera fantasia ou imaginação. Um pouco à semelhança do que aconteceu com Diana de Gales, a morte prematura permite a Inês de Castro tornar-se um mito: ela está morta, mas permanece jovem e bela. Envelhecer e tornar-se um mito é algo extremamente difícil para as mulheres. Atente-se, por exemplo, no caso da atriz Greta Garbo, que abandonou a sua carreira em Hollywood, para ficar imortalizada no auge da sua beleza.

 

Bibliografia:

• FERNANDES, Maria Lúcia, As Palavras e as Coisas na Poesia de Ana Luísa Amaral.

• JUNQUEIRA, Maria Aparecida, Imagens: tempos espacializados na Poesia de Ana Luísa Amaral.

WILLMER, Rhea, Ana Luísa Amaral e Ana Cristina César: modos de pensar o feminino na poesia contemporânea em português.
 

Análise do poema "O amor é o amor", de Alexandre O'Neill


             Este poema aborda a temática o amor, como o título indicia, em métrica irregular (que vai do verso dissílabo até ao decassílabo) e rima emparelhada e cruzada, com um verso branco ou solto (o oitavo).

            O amor é apresentado como algo intrínseco à natureza humana, algo absoluto e imaginativo, que oscila entre o mundo real e o onírico: “O amor é o amor – e depois?” – v. 1). Atente-sena repetição e interrogação presentes no verso 1, que mostram que o amor é algo natural na existência humana. Por seu turno, a repetição, no verso 3, da expressão «a imaginar» reforça a noção de que o amor é movido pela vertente emocional do ser humano.

            O «eu» poético está apaixonado e deseja o contacto físico com a pessoa amada (“O meu peito contra o teu peito, / Cortando o mar, cortando o ar”) por e com alguém que o faz sentir completo (“somos um? somos dois?”). Observe-se a expressividade da construção paralelística do verso 5, que realça o facto de o amor, para o sujeito poético, não possuir barreiras e ter uma força invencível, que é capaz de superar qualquer obstáculo, desafiando a própria natureza (representada, no verso, pelos elementos «mar» e «ar»).

            Por outro lado, o sujeito poético exalta o poder que o amor tem sobre si, distinguindo que, apesar de, fisicamente, haver dois corpos (“Na nossa carne estamos”), os seus espíritos unem-se num só (“somos um? somos dois?”). Para que este sentimento seja realizado, os amantes têm de ser livres e são-no(“Num leito / Há todo o espaço para amar.”). Atente-se na enumeração do verso 9, que realça a liberdade que existe entre o «eu» e o «tu» do poema.

            A fusão metafísica de ambos os espíritos apaixonados, depois da união física dos corpos, é perspetivada como o auge do relacionamento amoroso entre amos (“E trocamos – somos um? somos dois? / espírito e calor!” – vv. 10-11).

            Obedecendo a uma estrutura circular, o poema encerra com a repetição do verso que o inicia.
 

Análise do poema "Os dias sem ninguém", de Al Berto


 Os dias sem ninguém
 
dizem que a paixão o conheceu
mas hoje vive escondido nuns óculos escuros
senta-se no estremecer da noite enumera
o que lhe sobejou do adolescente rosto
turvo pela ligeira náusea da velhice
 
conhece a solidão de quem permanece acordado
quase sempre estendido ao lado do sono
pressente o suave esvoaçar da idade
ergue-se para o espelho
que lhe devolve um sorriso tamanho do medo
 
dizem que vive na transparência do sonho
à beira-mar envelheceu vagarosamente
sem que nenhuma ternura nenhuma alegria
nenhum ofício cantante
o tenha convencido a permanecer entre os vivos
 

            Como é característico de alguma poesia contemporânea, este poema pauta-se pela liberdade formal, nomeadamente ao nível da rima (versos brancos ou soltos) e da métrica.

            O título da composição remete para a solidão, a tristeza, a melancolia e a desolação de alguém. No entanto, o primeiro verso do texto aponta numa direção diferente, isto é, essa figura já amou e se apaixonou no passado, talvez na juventude (“dizem que a paixão o conheceu”), de acordo com a informação dada por um sujeito indeterminado (“dizem”). Todavia, o presente é de solidão, ideia veiculada pela imagem “vive escondido nuns óculos escuros”, que significa que essa pessoa se fecha em si mesmo, se recolhe, se esconde de «tudo»  – sentimentos, pessoas e até de si mesmo.

            Além disso, essa figura reflete durante a noite, procurando perceber o que restou do jovem que fora, dos sonhos que tivera e do amor que vivera, do rosto adolescente que a velhice turvou. Esse ser conhece, como ninguém, coisas como a solidão, a tristeza, a melancolia e a inversão nos seus próprios sentimentos, como alguém que permanece acordado, consciente da sua posição enquanto pessoa.

            Por outro lado, sente a passagem do tempo, o avançar da idade e a aproximação da velhice, por isso olha-se ao espelho, o que pode simbolizar o olhar sobre si mesmo, uma reflexão interior, sobre a sua vida. E o espelho dá-lhe como resposta (“devolve”) o medo, que norteia a sua existência.

            A última estrofe mostra-nos que essa pessoa envelheceu pouco a pouco, consumido pela solidão, sem sentir, em nenhum momento, alegria, felicidade, ternura. Deste modo, levou uma vida entregue à solidão e, mesmo enquanto vivo, absorveu a experiência de uma morte enquanto pessoa, alguém que poderia ter tido desejos, sonhos, amores, amizades, mas não o fez / faz.

sábado, 17 de setembro de 2022

Análise do Capítulo IX de Iracema


     Este capítulo inicia-se com todos os preparativos que Iracema faz para a partida de Martim, o que é uma obrigação de hospitalidade.
    Como se vinha adivinhando, mostra-se a estreita ligação que se estabelece entre Martim e Iracema, o que se nota sobretudo no momento da despedida. A reação de ambos é semelhante.
    Há uma constante referência à tarde e à noite, que é reflexo do seu estado de espírito. A referência à noite surge como descrição do momento do dia, mas também pode ser prenúncio da fatalidade que se vai agravando progressivamente. A referência à noite tem, assim, três vertentes diferentes:
            » noite como elemento da natureza:
            » prenúncio de fatalidade;
            » reflexo de um estado de espírito.

Análise do Capítulo VIII de Iracema


     Iracema acorda triste e Martim dá conta do que se passa. Há uma constante referência a elementos da natureza brasileira.
    Vemos novamente a diferença entre Iracema, perfeitamente consciente da sua posição, embora dividida entre o amor que sente pelo guerreiro branco e o preço que terá de pagar pela sua atitude, e Martim inconsciente daquilo que o rodeia. É aqui que a figura feminina lhe vai revelar o seu segredo: "Guerreiro branco, Iracema é filha de Pagé e guarda o segredo da jurema. O guerreiro que possuísse a virgem de Tupã morreria."
    A reação de Martim mostra um certo orgulho. Ele, perante o sacrifício que faz Iracema, podia ter outra atitude, mas recua quando sabe o preço que tem de pagar. Por isso, decide partir. Todos estes factos vêm em função de uma caracterização positiva de Iracema e de uma caracterização negativa de Martim.

Análise do Capítulo VII de Iracema


     Iracema encontra Irapuã e entre ambos trava-se uma violenta discussão. Irapuã está despeitado, porque Iracema escolheu um guerreiro que não era da sua tribo e quer vingar-se de Martim, e ela procura defendê-lo. Apesar de Irapuã ser um jovem guerreiro que defende a sua tribo, ele aparece como vilão e como principal obstáculo ao amor de ambos.
    Iracema sente que está cada vez mais próxima de Martim, mas a par desta certeza surge a inquietação causada pelo perigo que está a decorrer. Isto leva-nos a realçar que, quanto mais consciência se tem do perigo que se está a passar, mais valor tem o seu sacrifício. É o que se passa com Iracema, pois esta consciência do perigo e a sua resolução de ir em frente são aspetos positivos na sua caracterização.

Análise do Capítulo VI de Iracema


     Neste capítulo, encontramos a análise psicológica de Martim e Iracema. Embora a ligação de ambos tenda a tornar-se mais forte, Martim revela-se um herói romântico, mostra-se dividido entre a saudade do seu povo e o desejo de Iracema. Essa saudade engloba de certa forma a mulher branca, por que Iracema pergunta a Martim. Ele abandona então os seus pensamentos e volta para Iracema. Isto provoca uma grande instabilidade, o que advém do facto de o herói não conseguir ser fiel nem à saudade nem à atração por Iracema. São dois apegos fortes que ele não consegue distinguir. Iracema representa um papel contrário: está tão decidida que lhe revela o segredo de que é guardiã, tendo consciência de tudo o que faz e da dualidade que invade Martim.
    O motivo da sombra também aqui aparece; aliás, ele é uma constante ao longo da obra. A sombra serve como correspondente do estado de alma a uma natureza sombria.
    O capítulo termina com uma suspensão do que vai acontecer a seguir: "Súbito, a virgem tremeu; soltando-se rápida do braço que a cingia, travou do arco."

Análise do Capítulo V de Iracema


     As figuras de Iracema e Martim estão afastadas. O capítulo trata de um conselho que se destinava a decidir sobre a guerra. Surgem então duas posições: uns, chefiados por Irapuã, defendem a guerra; outros, como Andira, irmão de Araquém, não aceitam a guerra. Temos a oposição entre Irapuã com todo o seu ímpeto de guerreiro novo e Andira com toda a sabedoria adquirida com a idade; este pensa no melhor para a sua tribo; aquele pensa apenas no seu valor como guerreiro. Perante esta situação, a posição de Martim vai-se tornando mais insuportável.

Análise do Capítulo IV de Iracema


     Em todos os romances do Romantismo, há sempre um herói e um vilão. O mesmo acontece aqui: Martim é o herói e Irapuã é o vilão.
    Desde o início vai-se evidenciando uma série de elementos que separam Martim de Iracema, mas apesar disso há entre eles uma ligação que se vai estreitando e tornando mais forte. Os elementos contra são vários:
        » raça: Martim é branco; Iracema é índia;
        » condição: ele é guerreiro branco; ela é sacerdotisa de um deus da sua religião: Tupã;
        » amizades: ela é da tribo dos Tabajaras e ele é amigo dos Pitiguaras, inimigos dos
            Tabajaras.
    A questão da amizade é muito importante, porque se vai encontrar sempre a oposição entre as duas tribos que se chegam a guerrear. Elas representam dois elementos opostos: Pitiguaras simbolizam o mar e os Tabajaras a terra. É o mar dos Pitiguaras que caracteriza Martim e é a terra dos Tabajaras que caracteriza Iracema. Contudo, apesar de tudo, a ligação deles vai-se acentuando no meio deste conflito.

Uma narrativa sobre pinguins, hotéis e família

 Os pinguins e o otel e a familia

    Os pinguins e a familia viajaram para o otel de casas e quando chigaram lá gostaram da surpresa e a familia foram para o café e o filho. Esta noite os pinguins viajaram popé da familia e todo juntos ficaram feliz e conte e ficaram impresiodados e muitos pensadores. Quando apareceu o pinguim ficaram todos felizes e contente quando ele apareceu quando o ape as coisas da mãe a mãe disse não fás mal filho adorado e ficaram contentes quando apareceu o filho adorado e tavam impresionado e quando ficaram felizes já era de noite e foram rápido a jantar para ir a vestir o pijama para ir dormir na quama descansado para amanha ir a escola.

    Mais do que calinada ou motivo de riso, este escrito deveria ser causa de reflexão, mesmo tendo em conta que se trata de 2.º ano de escolaridade e de uma prova de aferição. Ao fim de quase de dois anos de escolaridade, o(a) aluno(a) em questão está neste estágio no que diz respeito à escrita.
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