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segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Memória

. Etimologia

     Na antiguidade grega, Mnemosine (Memória) era uma divindade que dava o poder de recuar no tempo e recordá-lo para transmiti-lo à sociedade – deusa da memória, no fundo.


. Definição

     As memórias são escritos em que um autor recorda e narra factos ligados à sua pessoa ou à sua época.


. Tipos

     - memórias de viagem;
     - memórias de infância;
     - ...


. Características

     - Pertence ao género literário narrativo.
     - É uma forma de escrita sobre si mesmo.
     - Constitui:
          o relato de factos/vivências pessoais e familiares;
          . o testemunho dum tempo e dum meio;
          . o relato de acontecimentos históricos e políticos.
     - A narrativa de memórias tem um fundo histórico-cultural, sujeito à filtragem subjetiva de quem a produz.
     - O papel fundamental neste tipo de texto é desempenhado pela memória. Os acontecimentos são passados pelo crivo da lembrança, que por vezes precisa de auxiliares: diários íntimos, cartas, jornais, etc.
     - Os factos são relatados num desfasamento temporal: o presente do discurso (da escrita) e o passado da história.
     - O discurso está centrado na primeira pessoa, com os verbos preferencialmente no pretérito imperfeito (para presentificar o passado) e no pretérito perfeito.
     - As memórias possuem enorme valor documental, pois constituem o testemunho de um tempo, um espaço e um meio. De facto, o narrador descreve todos os acontecimentos e condicionalismos que determinaram a sua infância, sejam de ordem familiar, social, cultural ou política.
     - Nas memórias, acumulam-se nomes de personagens ilustres que foram atores da história, ao mesmo tempo que o memorialista é actor da sua história.
     - A memória constitui uma recriação seletiva do passado: sendo seletiva, guarda apenas os factos e ocorrências significativos, aqueles que, por motivos diversos, se assumam como mais marcantes.
     - Neste tipo de texto, como a designação deixa antever, desempenha papel central a memória, pois é ela, enquanto faculdade que permite conservar recordações, que propicia a lembrança dos acontecimentos passados relatados.
     - A exterioridade possui um peso enorme: ainda que alusivo à vida do sujeito da enunciação, o texto centra-se sobretudo na sua relação externa com o meio e as outras pessoas, não registando apenas, como sucede com o diário, a posição do «eu» face ao mundo.

Protótipos textuais

                Embora cada texto seja uma unidade distinta, não deixa de ser agrupável num tipo ou género, a partir das suas marcas verbais, semânticas, formais e pragmáticas.
                Os tipos textuais são modelos mentais, abstratos, que o leitor, de acordo com os conhecimentos adquiridos na audição e na leitura, guarda na sua memória e lhe permitem reconhecer, produzir e classificar textos com marcas específicas. Cada tipo de texto define-se, pois, por um determinado conjunto de características, umas constantes e outras variáveis.
                Os textos são constituídos por sequências, estruturalmente organizadas entre si e em relação ao todo que constituem, configurando assim a organização do texto. Essas sequências poderão atualizar diferentes tipos textuais, podendo, num mesmo texto, ocorrer sequências de diferentes tipos. Por exemplo, é frequente que, num texto narrativo, ocorram sequências descritivas ou dialogais, além das narrativas.
                A configuração de um texto representa, assim, a sua estrutura global, permitindo classifica-los em diferentes tipos.


1. Texto narrativo

                O texto narrativo tem como principal objetivo relatar eventos, factos ou acontecimentos.
                O texto narrativo possui cinco características específicas: uma ação ou ações, localizada(s) no tempo e no espaço, protagonizada por uma pessoa ou personagem, que confere unidade à ação ou atravessa toda a narrativa, e contada por um narrador, que pode ser, ou não, uma das personagens.
                Por outro lado, os eventos representados encadeiam-se de forma lógica e orientam-se para um desenlace, desenvolvendo-se ao longo de três momentos, sobretudo no de texto de índole literária:
. Situação inicial: situação de estabilidade, em que se apresentam as personagens, situadas no tempo e no espaço. Habitualmente, são frequentes as sequências descritivas neste momento inicial.
. Complicação / problema: é o conjunto de eventos que geram um conflito, desequilibrando a situação inicial, e que constituem o núcleo da narração. Frequentemente, há textos narrativos que alternam situações de equilíbrio e desequilíbrio, correspondendo à ocorrência de vários episódios ou capítulos de uma obra.
. Resolução: é a solução do conflito e o regresso a uma situação de equilíbrio.
                São exemplos do protótipo textual narrativo textos literários, como o romance, a novela, o conto, a fábula, a lenda, o mito, a parábola, a banda desenhada, a (auto) biografia, e não literário, como a notícia, a reportagem, a crónica, o relatório, o relato histórico ou de experiências pessoais, o relato oral, etc.
                As principais marcas linguísticas desta tipologia textual são as seguintes:
. o uso predominante de verbos de ação;
. o predomínio do pretérito perfeito do indicativo ou do presente histórico;
. o uso do pretérito imperfeito para iniciar a narrativa;
. a abundância de organizadores e conectores temporais e espaciais (“quando”, “depois”, “um dia”, etc.);
. o recurso a advérbios de valor locativo e temporal;
. o uso de marcadores discursivos explicativos e conclusivos (“assim”, “porque”, “por esse motivo”, etc.).


2. Texto descritivo

                O texto descritivo constrói-se em torno de um dado assunto ou objeto, ao qual se atribuem predicados ou características diversos. Por outro lado, esse assunto ou objeto pode ser descrito de forma genérica / global, ou desdobrado e descrito nas suas partes constituintes.
                Podem ser objeto de descrição pessoas, personagens (os seus traços físicos e psicológicos), espaços (físicos, psicológicos ou sociais), fenómenos atmosféricos e todo o tipo de objetos. As sequências textuais descritivas surgem frequentemente articuladas com sequências textuais de outros tipos. Por exemplo, é frequente surgirem, em textos narrativos, sequências descritivas que permitem caracterizar uma personagem ou um espaço social, por forma a motivar o desenrolar da ação.
                O texto descritivo pode concretizar-se de diferentes formas:
. num texto corrido (uma enciclopédia, por exemplo);
. numa introdução seguida de uma listagem de itens caracterizadores de algo;
. num texto narrativo ou num texto científico.

                As principais marcas linguísticas deste protótipo textual são as seguintes:
. verbos de estado para a descrição estática (“ser”, “estar”, “parecer”, etc.) e verbos de ação para a descrição dinâmica;
. predomínio do pretérito imperfeito e do presente do indicativo;
. adjetivos e expressões caracterizadoras;
. conectores e marcadores discursivos (aditivos, enumerativos, etc.);
. advérbios com valor locativo;
. vocabulário expressivo e figuras de estilo.


3. Texto argumentativo

                O texto argumentativo tem como objetivo central justificar e / refutar ideias e opiniões. A sua intenção comunicativa é convencer, persuadir o(s) interlocutor(es), levando-o(s) a aceitar determinado ponto de vista, ideia ou produto, etc., obtendo assim a sua aprovação, ou refutar uma opinião alheia, estabelecendo relações entre factos, hipóteses, provas e refutações. Deste modo, pode afirmar-se que um texto argumentativo se caracteriza, por um lado, pela expressão de uma opinião que, sendo controversa, suscita uma defesa e abre espaço de contestação e, por outro lado, pela apresentação de argumentos a favor ou contra uma determinada tese.
                O texto argumentativo apresenta, geralmente, a seguinte estrutura:
. Tese: apresentação da opinião que se se pretende defender.
. Premissa: pode(m) ou não estar expressa(s), representando algo que é inequivocamente aceite.
. Argumentos: conjunto de provas ou razões que sustentam a tese, que devem ser fidedignas, autênticas e relevantes. Podem funcionar como argumentos exemplos, ilustrações, narrações, descrições, estatísticas, comparações, referências históricas, etc. Normalmente, os argumentos são apresentados de forma gradativa e crescente, partindo-se dos mais frágeis para os mais fortes e irrefutáveis.
. Conclusão: é uma demonstração clara da tese defendida.
                Como exemplo do protótipo textual argumentativo, podemos referir os discursos políticos, a publicidade, os discursos da imprensa escrita e falada, os debates, a propaganda política, situações informais de interação sobre aspetos práticos e quotidianos.
                As principais marcas linguísticas são as seguintes:
. verbos de opinião e crença (“achar”, “julgar”, “crer”, “dever”, “querer”, “gostar”, “ser preciso”, “concordar”, etc.);
. verbos declarativos (“afirmar”, “considerar”, “declarar”, etc.);
. verbos que indicam uma relação entre a causa e o efeito (“causar”, “motivar”, “originar”, “provocar”, “ocasionar”, etc.);
. uso frequente do verbo “ser” ou equivalente na elaboração da tese;
. predomínio do presente, pretérito perfeito e futuro do indicativo com valor universal;
. frases declarativas e interrogativas;
. marcadores e conectores discursivos com valores diversos: aditivo (“mais”, “além disso”), exemplificativo / confirmativo (“por exemplo”, “com efeito”), contrastivo (“mas”, “no entanto”, embora”), explicativo e conclusivo (“porque”, “pois”, “com efeito”, “por conseguinte”).


4. Texto expositivo

                O texto expositivo tem como objetivo a análise ou a síntese de ideias, conceitos e teorias; expor, explicar e informar sobre algo, apresentando problemas e propostas de resolução dos mesmos, acompanhados, ou não, de justificação.
                Constituem exemplos de atualização deste tipo textual os manuais da área das ciências naturais (onde abundam textos em que se passa constantemente da exposição – sucessão de informações com o objetivo de dar a conhecer algo – à explicação – com o intuito de fazer compreender o porquê do problema e a sua resolução).
                Algumas das marcas linguísticas que caracterizam esta tipologia textual são estas:
. verbos com sentido expositivo (“ser”, “ter”, “consistir”, etc.) no presente, pretérito perfeito e futuro do indicativo, normalmente com valor universal e intemporal;
. adjetivos e advérbios para descrever, precisar e situar;
. uso frequente de analogias e comparações;
. enunciação objetiva na terceira pessoa, omitindo as marcas do sujeito enunciador e estruturas que indicam uma avaliação pessoal (“na minha opinião”, “julgo”, “creio”, “parece-me que”, etc.), recorrendo antes a estruturas impessoais (“deve-se”) e passivas;
. léxico especializado;
. conectores e marcadores de causa e consequência, confirmativos e exemplificativos, explicativos e conclusivos.


5. Texto conversacional ou dialogal

                O texto conversacional é atualizado em textos em que intervêm, pelo menos, dois interlocutores que tomam a palavra alternadamente e que produzem um número variável de trocas verbais, cooperando na produção do texto.
                Este protótipo textual manifesta-se em qualquer interação verbal, como, por exemplo, numa conversa telefónica, nas interações quotidianas orais, no comentário de acontecimentos, em debates e nas entrevistas.
                As marcas linguísticas que o enformam são as que, seguidamente, se enunciam:
. características do discurso oral (repetições, quebras sintáticas, etc.);
. segmentos de reformulação;
. marcadores conversacionais (“olha”, “ouve”, etc.);
. formas de tratamento;
. formas verbais do modo indicativo e do imperativo;
. uso da segunda pessoa de verbos, pronomes e determinantes;
. modos de localização espacial que indicam proximidade ou afastamento relativamente aos interlocutores.


6. Texto instrucional ou diretivo

                Os textos que atualizam o tipo textual instrucional ou diretivo têm subjacente o objetivo de controlar o comportamento do(s) seu(s) destinatário(s), de o(s) ensinar a praticar determinada ação.
                São textos que incitam à ação, estabelecem regras de comportamento ou que fornecem instruções sobre as etapas e os procedimentos que deverão ser seguidos de modo a alcançar um determinado objetivo.
                Este protótipo textual é atualizado numa grande diversidade de textos: avisos / enunciados simples como «Não pisar a relva» ou «Proibido fumar», receitas de culinária, instruções de montagem, regras de utilização de um programa / máquina, instruções de montagem de um aparelho, alguns provérbios, manuais de instruções, a posologia dos medicamentos, “slogans”, etc.
                As principais marcas linguísticas são as seguintes:
. verbos, em geral, de movimento que incitam à ação;
. formas verbais no imperativo, conjuntivo (“insira-se”), infinitivo (“Não fumar”) e futuro do indicativo;
. frases imperativas;
. marcadores discursivos predominantemente temporais.


7. Texto preditivo

                O texto preditivo tem como função informar sobre o futuro, antecipando ou prevendo acontecimentos / eventos que irão ou poderão acontecer.
                A palavra «preditivo» é um adjetivo formado a partir da forma verbal «predizer», que significa «dizer antes», «anunciar com antecedência», «prognosticar», «vaticinar» ou «profetizar». Assim, o discurso preditivo afirma algo antecipadamente, antes de os factos serem observados ou comprovados.
                O protótipo textual preditivo manifesta-se, por exemplo, em boletins meteorológicos, profecias, horóscopos, alguns provérbios, etc.
                Algumas das marcas linguísticas que o caracterizam são as seguintes:
. expressões com valor temporal de futuro;
. predomínio do futuro do indicativo ou complexos verbais com utilização de auxiliar temporal.

Bibliografia:
. Domínios, de Zacarias Nascimento et alii;
. Gramática da Língua Portuguesa, de Clara Amorim.

domingo, 5 de outubro de 2014

'Vozes dos animais'

Palram pega e papagaio
E cacareja a galinha
Os ternos pombos arrulham
Geme a rola inocentinha

Muge a vaca, berra o touro
Grasna a rã, ruge o leão,
O gato mia, uiva o lobo
Também uiva e ladra o cão.

Relincha o nobre cavalo,
Os elefantes dão urros,
A tímida ovellha bala,
Zurrar é próprio dos burros.

Regouga a sagaz raposa,
Brutinho muito matreiro;
Nos ramos cantam as aves,
Mas pia o mocho agoureiro.

Sabem as aves ligeiras
O canto seu variar:
Fazem gorjeios às vezes,
Às vezes põem-se a chilrar.

O pardal, daninho aos campos,
Não aprendeu a cantar;
Como os ratos e as doninhas
Apenas sabe chiar.

O negro corvo crocita,
Zune o mosquito enfadonho,
A serpente no deserto
Solta assobio medonho.

Chia a lebre, grasna o pato,
Ouvem-se os porcos grunhir,
Libando o suco das flores,
Costuma a abelha zumbir.

Bramam os tigres, as onças,
Pia, pia o pintainho,
Cucurica e canta o galo,
Late e gane o cachorrinho.

A vitelinha dá berros
O cordeirinho balidos,
O macaquinho dá guinchos,
A criancinha vagidos.

A fala foi dada ao homem,
Rei dos outros animais:
Nos versos lidos acima
Se encontra em pobre rima

As vozes dos principais.

                                         Pedro Dinis
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