O «eu»
poético abre o poema exprimindo o seu desejo insistente e constante de
expressar o seu amor profundo pelo «tu»: “vontade constante / de dizer te quero
tanto”. Estamos na presença da expressão de um sentimento profundo e intenso.
Por vezes,
o sujeito poético distrai-se dessa vontade, todavia o contacto físico da pessoa
amada, o seu abraço, trazem-no de volta ao desejo inicial, evidenciando, assim,
a força e o poder desse contacto íntimo. Não podemos descartar a sensação de
segurança e carinho que um abraço transporta para a pessoa que o recebe.
Por
outro lado, esse gesto de afeto tem um enorme efeito no «eu» poético,
configurando um momento de transcendência. De facto, a presença física e o
contacto com a pessoa amada são tão importantes e poderosos que o mundo desaparece,
nada mais importa. O facto de, nessa ocasião, “o mundo não tem [ter] membros
superiores” sugere que há um desapego desse mundo físico, que, sem eles, não
pode intervir ou interferir.
É,
então, que se atinge o clímax da relação entre o «eu» e o «tu», concretamente
através do beijo: “e então me beija.” É o ápice da união física e emocional
entre ambos, o momento supremo. Segue-se a alusão a uma possibilidade ou
hipótese: o «eu», se quisesse, poderia cometer os atos mais violentos (“matar”)
sob a influência do amor intenso. A antítese entre o afeto expresso nos versos
anteriores e estes dois últimos pode traduzir, na esteira, por exemplo, de
Petrarca ou Camões (“Amor é um fogo que arde sem se ver”), os efeitos
contraditórios do amor, ou ser o símbolo de um amor tão intenso que pode
destruir.
Enigmaticamente,
o sujeito declara-se possuidor de muito ar, sugerindo talvez ima sensação de
plenitude, o resultado da intensidade emocional experimentada. Subitamente, ele
sente “na ponta dos dedos / a coragem de dizê-la”, ou seja, encontra coragem
para, finalmente, expressar a vontade manifestada inicialmente, o seu amor,
através da “ponta dos dedos” (da escrita?).
O
título – “A violência” – parece, pois, apontar para violência, a
intensidade, do sentimento amoroso, bem como para a luta interna do «eu»
travada entre a vontade de expressar sentimentos e emoções intensos e o receio
de o fazer, isto é, para o impacto que aqueles / aquelas têm em si, tanto
física como emocionalmente. O amor, recorrendo novamente a Camões, é um
sentimento intenso e contraditório, mas, ainda assim, desejado pelos corações
humanos.