Português: Resultados da pesquisa para d. joão iii
A apresentar mensagens correspondentes à consulta d. joão iii ordenadas por data. Ordenar por relevância Mostrar todas as mensagens
A apresentar mensagens correspondentes à consulta d. joão iii ordenadas por data. Ordenar por relevância Mostrar todas as mensagens

sábado, 30 de novembro de 2019

Análise da Cena IV do Ato I de Frei Luís de Sousa

Caracterização das personagens (a partir das cenas III e IV)

a. Maria:
. sebastianista fervorosa e nacionalista, crê que D. Sebastião está vivo e vai regressar;
. é uma espécie de porta-voz da sabedoria popular: “Voz do povo, voz de Deus”;
. lê muito (novelas de cavalaria e romances populares);
. manifesta interesse por temas impróprios para a sua idade: romances populares sobre D. Sebastião e a batalha de Alcácer Quibir;
. sofre ao observar o sofrimento da mãe, que não compreende;
. é bondosa, carinhosa e terna com a mãe;
. muito precoce, possui uma imaginação e curiosidade pouco próprias da sua idade: “Maria, que tu hás de estar sempre a imaginar nessas coisas que são tão pouco para a tua idade”;
. pensa muito (“passo noites inteiras em claro a lidar nisto”; “a pensar em tudo”): Maria passa as noites em claro, a rever as suas atitudes e as dos pais, para tentar descobrir as razões da sua preocupação, por considerar que há algo que não lhe é revelado;
. tem sonhos estranhos, em cuja interpretação revela poderes de profecia: lê nos olhos e nas estrelas;
. é muito intuitiva;
. é alegre, mas sente-se subitamente invadida por grande tristeza (“uma tristeza muito grande que eu tenho”): essa tristeza está relacionada com a constante preocupação dos pais com ela; o seu poder intuitivo e de observação permitem-lhe perceber a preocupação dos pais com a sua saúde e crenças; quando pergunta à mãe por que razão o pai não tinha permanecido na Ordem de Malta e deixara o hábito, parece expressar o desejo de que o pai nunca o tivesse feito, o que corresponderia à sua inexistência; ela compreende que há algo que lhe escondem;
. é visionária e muito sensível: “não quero sonhar, que me faz ver coisas lindas às vezes, mas tão extraordinárias e confusas…”;
. possui um conhecimento íntimo de si própria que escapa aos familiares: “O que eu sou… só eu o sei, minha mãe… E não sei, não: não sei nada, senão que o que devia ser não sou…”;
. é corajosa, de personalidade forte, destemida e idealista, dotado de caráter varonil, revelado no desejo de ter um irmão e de resistência aos governadores: “um galhardo e valente mancebo capaz de comandar os terços de meu pai”; “Tomara eu ver seja o que for que se pareça com uma batalha!”;
. insurge-se contra as injustiças sociais: “Coitado do povo!”; “… onde a miséria fosse mais e o perigo maior, para atender com remédios e amparo aos necessitados (cena V);
. Frei Jorge chama-lhe Teodora, nome que significa sábia (cena V);
. é idealista e patriota, manifestando toda a sua vontade de resistir aos governadores: “Fechamos-lhes as portas. Metemos a nossa gente dentro e defendemo-nos.” (cena VI);
. fica entusiasmada com a notícia trazida pelo pai, dando largas à sua imaginação, ao seu idealismo e ao seu patriotismo;
. sofre de tuberculose, a doença dos românticos – sintomas:
- a febre
- as mãos a queimar
- as rosetas nas facetas
- a audição a grandes distâncias (cena VI)
modelo da heroína romântica:
. ideais de liberdade
. exaltação de valores de feição popular
. crença na independência nacional
. atração pelo mistério
. intuição
. doença da época (tuberculose)
. linguagem:

NOTAS:
1.ª) A doença de Maria favorece ao longo da obra a sua extraordinária fantasia e a morte no final.
2.ª) Maria tem duas atitudes contrastantes: uma de crítica, outra de afeto para com sua mãe. A alteração deve-se à observação do aspeto doloroso da sua mãe.

b. D. Madalena:
. sofre (chora) com as palavras de Maria;
. evidencia uma grande tensão psicológica, agravada pela menção inconsciente de Maria a aspetos que a aterrorizam;
. manifesta grande preocupação perante a precocidade da filha.

c. Telmo Pais:
. tem uma presença silenciosa, mas identifica-se com os ideais de Maria;
. contribui para o clima de opressão;
. aparenta resignação e convencimento;
. manifesta preocupação com a debilidade de Maria.


Características da tragédia

Agón de D. Madalena:
- com Maria: para esta, há um enigma que nem a mãe, nem o pai, nem mesmo Telmo se prontificam a decifrar; são segredos e mistérios intuitivamente pressentidos que não consegue desvendar:
. a razão por que nem a mãe nem o pai, apesar do seu patriotismo (“… que ele não é por D. Filipe, não é, não?”) acreditavam no regresso de D. Sebastião;
. a razão por que, quando em tal se falava, o pai mudava de semblante, e a mãe se afligia e até chorava;
- com D. João de Portugal, nas reações de aflição, sublinhadas pelas lágrimas, sempre que Maria se refere à crença popular da sobrevivência e possível regresso de D. Sebastião – cena III.

Agón de Maria:
- com D. Madalena:
. a propósito da sobrevivência e do regresso de D. Sebastião (cena III) – D. Madalena não acredita, nem lhe convém acreditar nem uma coisa nem outra. Maria acredita firmemente;
. desconfia que a mãe oculta alguma coisa muito importante; por isso, está sempre atenta, a observar os sobressaltos, a ansiedade da mãe a seu respeito; por isso, lê nas palavras, nas ações e nos gestos da mãe (e do pai), à procura de indícios, de respostas para a sua curiosidade (cena IV);
. não pode cumprir as esperanças nela depositadas (cena IV);
. por isso, desejaria ter um irmão (cena IV);
- com Manuel de Sousa:
. duvida do patriotismo do pai (cena III), por causa das atitudes que ele toma, ao ouvir falar de D. Sebastião: “Ó minha mãe, pois ele não é por D. Filipe, não é, não?”;
. a hipótese não tem fundamento.
NOTA:
Este conflito de Maria com os pais, pois ambos não aceitam ouvir falar do regresso de D. Sebastião, tem razões óbvias: se o monarca não morreu, também não terá morrido D. João de Portugal; o segundo casamento de D. Madalena seria nulo.
- com D. João de Portugal (antes da mudança de palácio – cena IV):
. pressente intuitivamente que alguém, fazendo sofrer a mãe, também não a deixa ser feliz;
. por isso, procura uma resposta, com os meios ao seu dispor: “… leio… nas estrelas do céu também, e sei cousas…”; “… não quero sonhar, que me faz ver coisas… lindas às vezes, mas tão extraordinárias e confusas”.
NOTA:
É da essência do drama provocar situações e sentimentos incompatíveis no interior das personagens:
. Maria não consegue explicar a perturbação dos pais;
. D. Madalena não pode revelar a causa das suas preocupações, o que se passa no foro da sua consciência.

▪ D. Madalena parece caída nas garras de um destino inexorável: a última fala de Maria da cena IV lança nela a dúvida se teria valido a pena ter casado uma segunda vez.

▪ A constatação de algo misterioso que paira sobre a ação e as personagens.

Presságios:
. as flores murchas e os sonhos deixam antever a tragédia com que encerra a obra: a morte progressiva de Maria (ela colheu papoilas para pôr debaixo do travesseiro, por estas estarem associadas ao sono e ao sonho, acreditando que, assim, terá uma noite descansada; no entanto, as flores, que representam, entre outras coisas, a beleza efémera, murcharam rapidamente, indiciando a proximidade da morte;
. a contemplação do retrato do pai remete para a intuição do malogro do casamento dos pais.


Características românticas

▪ O sebastianismo de Telmo e Maria.

▪ O nacionalismo e patriotismo de Maria, visível na resistência aos governadores castelhanos.

▪ Linguagem: exclamações, interrogações, reticências, frases curtas, adequação ao íntimo e ao estado de espírito das personagens, etc.

▪ Caracterização de Maria:
. o modelo da mulher-anjo;
. os ideais de liberdade;
. exaltação de valores de feição popular;
. atração pelo mistério;
. intuição;
. tuberculose, a doença dos românticos.

▪ Crenças: agouros, superstições, sonhos, visões de Madalena, Telmo e Maria (cenas II e IV).



quinta-feira, 28 de novembro de 2019

Análise da Cena III do Ato I de Frei Luís de Sousa

Diálogo Madalena – Maria

Tema: o possível regresso de D. Sebastião.


Perspetiva e reação das personagens sobre e ao tema

Maria, como personagem sebastianista, acredita piamente que D. Sebastião está vivo e vai regressar num “dia de névoa muito cerrada” e fundamenta a sua posição em argumentos como a fé e a crença do povo que, segundo ela, terá toda a razão de ser.
Curiosa e intuitiva, questiona por que razão o pai, sendo tão patriota, não gosta de ouvir falar no regresso do rei, que iria retirar do trono português o rei espanhol, e chega a alvitrar a possibilidade de ser pró-castelhanos, não obstante toda a sua postura patriótica, por ele revelada através de palavras e ações.
Note-se como, nesta cena, as palavras e atitudes de Maria revelam todo o seu extraordinário poder de observação e de análise de comportamentos.

Telmo Pais crê profundamente no regresso de D. Sebastião, mantendo viva igualmente viva a esperança no retorno do seu amo, D. João de Portugal.

Por seu turno, D. Madalena procura demover a filha e afastá-la dessas ideias, fazendo uso, inicialmente, de argumentos racionais: (a) os relatos dos tios Frei Jorge e Lopo de Sousa, homens cultos, sobre o que aconteceu na batalha e (b) a desvalorização das crenças populares, que apresenta como quimeras (ilusões).
Quando verifica que a sua argumentação não resulta, aflige-se a chora. As reações dos pais devem-se ao facto de a sobrevivência e o regresso de D. Sebastião e D. João de Portugal, cuja morte nunca fora confirmada, implicariam a nulidade do seu casamento e a ilegitimidade de Maria. Deste modo, as constantes referências ao assunto adensam os seus receios e terrores.

Segundo Maria, o seu pai, Manuel de Sousa, perante esta possibilidade, muda de semblante, fica pensativo e carrancudo, o que mostra que não estará totalmente certo da morte de D. Sebastião, e leva a filha a, por momentos, duvidar do seu patriotismo.


Visão de Maria sobre D. Sebastião

Para Maria, D. Sebastião é um herói por quem nutre grande admiração e em quem deposita todas as esperanças para resgatar Portugal das garras do domínio castelhano: “o nosso bravo rei”, “o nosso santo rei D. Sebastião”, etc.


segunda-feira, 25 de novembro de 2019

Análise da Cena II do Ato I de Frei Luís de Sousa


Funcionalidade da cena: apresenta informações obre
. os antecedentes da ação
. as personagens, seus problemas e estado de espírito
. a situação em que se encontram
. a época em que decorre a ação


Assunto: apresentação das personagens principais, a qual resulta de um propósito de D. Madalena: pedir a Telmo que não incuta no espírito de Maria as suas crenças e agouros sobre uma desgraça iminente a cair sobre a sua família.


Antecedentes da peça

Datas
Acontecimentos
▪ Antes de 1578
▪ Casamento de D. Madalena com D. João de Portugal.
▪ 4 de agosto de 1578
▪ Batalha de Alcácer Quibir.
▪ Desaparecimento de D. Sebastião e de D. João de Portugal.
▪ Suposta viuvez de D. Madalena.
▪ 1578-1585
▪ Diligências de D. Madalena para encontrar D. João, mas sem sucesso.
▪ 1585
▪ Casamento de D. Madalena e Manuel de Sousa Coutinho.
▪ 1586
▪ Nascimento de Maria.
▪ 1589
▪ Ano em que decorre a ação da peça.


Caracterização das personagens

▪ D. Madalena:
. nobre: a designação dona só se dava na época às senhoras da aristocracia;
. receosa e hesitante no que quer dizer a Telmo;
. critica o ascendente do aio sobre si e, sobretudo, Maria, pedindo-lhe que não insista nesse ascendente;
. casou muito jovem com D. João de Portugal;
. enviuvou com 17 anos;
. procurou exaustivamente D. João, desaparecido na batalha de Alcácer Quibir, durante 7 anos;
. terá 38 anos: a batalha de Alcácer Quibir ocorreu há 21 anos, tinha ela 17; o seu segundo casamento teve lugar 7 anos depois, teria ela 24; casou pela segunda vez há 14; Maria tem 13;
. vive constantemente atormentada e aterrorizada pelo passado e pelos agouros de Telmo, que lhe mantém esse passado bem vivo, ou seja, a dúvida de que D. João não morreu e pode voltar a qualquer momento, o que destruiria o seu casamento e tornaria Maria uma filha ilegítima, por isso não consegue ser feliz, já que não se consegue libertar desse medo;
. não amou D. João, mas respeitou-o sempre;
. é profundamente apaixonada por Manuel de Sousa;
. sente-se vítima do destino;
. a contradição entre a felicidade aparente e a desgraça íntima que revela uma consciência moral atormentada pela imagem sempre obsessivamente presente de D. João de Portugal e pelo remorso proveniente da consciência de pecado – de facto, a personagem sente-se culpada por ter casado com Manuel de Sousa, sem ter a certeza acerca da morte do primeiro marido;
. revela, na última fala da cena, a tendência para o devaneio, o que já acontecera na primeira cena e está de acordo com a tendência romântica e a extrema sensibilidade da sua alma.


Telmo Pais:
. não possui nobreza de sangue, mas está intimamente ligado à aristocracia pelo modesto título de escudeiro;
. manifesta ideias reformistas ao condenar o uso do latim na Bíblia (posição dos Protestantes);
. o seu verdadeiro senhor continuar a ser D. João, primeiro marido de D. Madalena, dado como morto na batalha de Alcácer Quibir (“… não sei latim como o meu senhor… quero dizer, como o sr. Manuel de Sousa Coutinho…”);
. possui grande ascendente sobre Maria e D. Madalena;
. é o confidente de D. Madalena, a quem reprova o segundo casamento;
. nas palavras de D. Madalena, é “… o aio fiel de meu senhor D. João de Portugal…”, digno “… da confiança, do respeito, do amor e do carinho…” de todos e “o escudeiro valido, o familiar quase parente, o amigo velho e provado de teus amos…”;
. era o aio de D. João, a quem queria como “filho”; é-o também de Maria, a quem “… ao princípio não podia ver”, mas ela acabou por o cativar: “quero-lhe mais que seu pai” – a sua não aceitação inicial era originada por ela ser fruto do casamento de Madalena e Manuel de Sousa, que Telmo via como uma traição a D. João, cuja morte não aceita; porém, com o passar dos anos, a formosura e bondade de Maria cativaram-no de tal modo que agora afirma ter-lhe mais amor do que os próprios pais;
. foi “carinho e proteção” e amparo de D. Madalena quando esta enviuvou;
. atormenta-a com os seus constantes agouros, presságios e acusações – é a lembrança viva e permanente do «remorso» oculto e recalcado na consciência de D. Madalena;
. ama profundamente Maria, como se constatará no ato III, pretendendo ter-lhe mais amor do que os próprios pais;
. não aprova o segundo casamento de D. Madalena e atormenta-a com insinuações, agouros, profecias (como, por exemplo, a da carta de D. João de Portugal, escrita na madrugada da batalha de Alcácer Quibir, onde afirmava: “vivo ou morto, Madalena, hei de ver-vos pelo menos ainda uma vez neste mundo” – se não voltou, é porque está vivo; além do mais, D. João nunca deixaria de cumprir a sua palavra;
. atormenta-a também com ciúmes póstumos, por conta de D. João: é isto que explica as prevenções de Telmo em relação a Manuel de Sousa e a sua aversão inicial por Maria;
. começa a ser visível a sua divisão entre o amor a D. João e o amor a Maria (fragmentação que será confirmada na cena V do ato III): sendo tão amigo dela e pretendendo ter-lhe tanto amor, sustenta uma crença que, a concretizar-se, significaria a morte da jovem;
. é sebastianista:
- crê que os eu antigo amo não morreu;
- acredita no regresso de D. Sebastião e, consequentemente, de D. João;
. funções ou papéis que desempenha:
- coro:
. alimenta o sebastianismo;
. anuncia desgraças próximas;
. profere contínuos agouros;
. comenta a ação dramática, predizendo o seu desfecho trágico, através dos seus presságios e agouros;
- alimenta a presença de um passado, um tempo que D. Madalena quereria enterrar mas não consegue, ou não a deixam;
- confidente de D. Madalena;
- leva à revelação dos pensamentos das outras personagens;
. os seus apartes revelam as dúvidas que possui relativamente à morte de D. João, bem como a sua intenção de salvar Maria de uma desgraça que considera iminente.


Maria:
. nobre:
- a designação de “dona”;
- o apelido “Noronha” indicia alta estirpe (“é sangue de Vilhenas e de Sousas”);
. o seu nome evoca o da Virgem Maria: é pura e angélica (Madalena e Telmo apelidam-ma de anjo) – configura a imagem da mulher-anjo dos românticos, contrastando com D. Madalena;
. tem 13 anos;
. é alta;
. é precoce, tanto física (“Tem treze anos feitos… está uma senhora…”) como psicologicamente: “… em tantas outras coisas tão altas, tão fora de sua idade, e muitas de seu sexo também…”; “Maria tem uma compreensão…”;
. é curiosa (“… aquela criança está sempre a querer saber, a perguntar”) e perspicaz (“tão perspicaz”);
. é bondosa (“um anjo como aquele… e então que coração!”);
. dotada de espírito vivo (“uma viveza, um espírito!”);
. é sonhadora;
. possui uma imaginação muito fértil;
. segundo D. Madalena, é dotada de “Formosura e engenho, dotes admiráveis daquele anjo”.


Manuel de Sousa Coutinho:
. nobre: “… o retrato daquele gentil cavaleiro de Malta que ali está” (o ingresso na Ordem de Malta era limitado aos membros da aristocracia, aos quais se exigia certificado de nobreza);
. o seu nome é bíblico: é um dos nomes do Messias (Emanuel) e significa “Deus connosco”, significado que se adequado à personagem, dado(a):
- a boa fé com que se casou com D. Madalena, viúva;
- a tranquilidade e a paz de espírito que daí lhe adivinha, revelada
. na resposta aos melindres de Madalena por ter de regressar ao lar onde vivera com D. João (I, 8);
. na vivência cristã da graça de Deus pela contrição do coração (II, 3);
. pelo contentamento de viver e conviver com os frades de S. Domingos como de portas a dentro, quase no início da mesma cena;
. no desapego dos bens materiais, “coisas tão vis e tão precárias”;
. no desamor pela própria vida (“vida miserável que um sopro pode apagar” – I, 11);
. nas palavras de Telmo:
- “fidalgo de tanto primor e de tão boa linhagem, como os que se têm por melhores neste reino em toda a Espanha”;
- “é um guapo cavalheiro, honrado fidalgo, bom português”.


D. João de Portugal:
. nobre: nobreza de sangue que vinha do pai (“aquele nobre conde de Vimioso”), a designação dom, atribuído apenas a alguns membros da aristocracia; o nome de família do Conde de Vimioso;
. nas palavras de Telmo: “… espelho de cavalaria e gentileza, aquela flor dos bons…”;
. o nome de batismo:
- é bíblico: evoca o nome de um dos apóstolos;
- é também, desde a época em que decorrem os acontecimentos, o nome de um tipo literário (cf. um D. Juan).


Relação Telmo vs. D. Madalena

            Pelo que é dado ler nesta cena, a relação entre estas duas personagens supera em muito a tradicional ligação entre um criado e o seu senhor. De facto, o escudeiro apresenta-se mais como um elemento da família de D. Madalena do que enquanto mero aio, graças aos longos anos passados ao serviço da família (primeiro de D. João e depois de Manuel de Sousa). Quando ela enviuvou aos 17 anos, foi o seu amparo e quase um pai, daí a liberdade de que goza quando lida com D. Madalena. Esta respeita-o e reconhece-lhe alguma autoridade sobre si, seguindo também os seus conselhos como se fosse sua filha. De igual forma, ele respeita-a e aconselha-a, não obstante ter sido contrário ao segundo casamento.
            Assim sendo, é natural que a relação (que se foi estreitando ao longo dos anos) entre ambos seja de grande respeito, amizade, confiança e abertura, como se comprova ao longo de todo o diálogo, que é motivado pelo pedido que D. Madalena quer fazer ao seu velho aio: acabar com as conversas sobre o passado com Maria, ligadas à ideia de que de D. Sebastião está vivo e, por extensão, D. João, facto que, a ser verdade, acarretaria consequências trágicas para Maria, reduzida então à condição de filha ilegítima.
            E é a questão do passado e da forma como este é alimentado em Maria pelo escudeiro que perturba a relação. Note-se como Madalena sofre e chora quando Telmo afirma que a jovem deveria ter nascido “em melhor estado”, pois está claramente a sugerir que ela era merecedora de ter nascido no seio de uma família constituída por pais casados legitimamente, sem qualquer sombra a pairar sobre ela, o que não sucede na perspetiva do aio, dado acreditar que D. João ainda está vivo. A ser assim, a família seria destruída e Maria uma filha ilegítima, com todas as consequências ao nível da mentalidade e das convenções sociais da época.
            Por isso mesmo, no final da conversa, Telmo reconhece que D. Madalena tem razão: se continuar a estimular o interesse de Maria pelo passado, com as suas crenças e agouros, poderá levá-la a descobrir o passado da sua mãe. A ideia de que D. João de Portugal poderá estar vivo despertaria nela a possibilidade da ilegitimidade e o receio de tal situação poderia agravar seriamente o seu estado de saúde já tão debilitado.


Relação Telmo vs. Manuel de Sousa

            Telmo manifesta grande respeito e admiração por Manuel de Sousa, cujas qualidades elenca e elogia, mas não lhe dedica a mesma consideração e estima que nutria por D. João de Portugal, visto que considera que não é digno de ocupar o lugar do seu antigo amo.


Tempo

da ação: 28 de julho de 1599, fim da tarde de uma sexta-feira;

narração cronológica dos acontecimentos ocorridos antes do início da peça:
- casamento de D. Madalena com D. João de Portugal antes de 1578;
- desaparecimento deste em África, na batalha de Alcácer Quibir, a 4 de agosto de 1578 – sexta-feira – D. Madalena tinha 17 anos;
- D. Madalena procurou D. João durante 7 anos (de 1578 a 1585), não se poupando a esforços;
- casou com Manuel de Sousa há 14 anos – 1586;

histórico:
- a existência de peste em Lisboa e
- a discórdia entre portugueses e castelhanos, de acordo com as palavras de D. Madalena (última fala da cena), o que nos remete para o domínio filipino;
- as várias referências à batalha de Alcácer Quibir;
- a alusão de Telmo à Reforma protestante, quando menciona a tradução da Bíblia para as línguas dos países onde se implantou.


Características da tragédia clássica da cena

▪ A presença do Destino, por quem D. Madalena se sente perseguida/vítima.

Hybris de D. Madalena: nunca amou D. João.

Pathos: os terrores de D. Madalena.

▪ Os agouros e presságios de Telmo.

▪ A presença do coro nos agouros, comentários e prenúncios de desgraças próximas de Telmo.

Agon:
- de D. Madalena:
. interior, de consciência;
. contínuo;
. crescente;
. com Telmo: apesar de, durante os 7 anos de «viuvez», lhe ter obedecido como a um pai, D. Madalena não segue o conselho de esperar o regresso de D. João, anunciado na carta profética, escrita na madrugada da batalha de Alcácer Quibir;
. com D. João, presente nas conversas com Telmo, testemunha da «desobediência» de D. Madalena, conversas essas cheias de reticências, de subentendidos, de duplos sentidos, de alusões, de agouros, de «futuros», de pressentimentos de desgraças iminentes;
- de Telmo:
. de consciência: começa a ser evidente o conflito de consciência entre o desejo do regresso de D. João de Portugal e o amor a Maria;
. com D. Madalena:
- desaprova o seu casamento com Manuel de Sousa, baseado nos dizeres da carta profética de D. João, escrita na madrugada da batalha;
- e na superstição (maravilhoso popular) de que, se ele voltasse e aparecesse a D. Madalena, não se iria embora sem lhe aparecer também (o que não se tinha verificado);
- daí os “ciúmes”, as alusões, os agouros, os “futuros”;
- o conflito de Telmo com D. Madalena fica sempre sem solução;
. com Maria:
- a princípio, não a podia ver, por causa do seu nascimento em berço ilegítimo (“Digna de nascer em melhor estado”);
- o conflito com Maria termina, porque ela acabou por o cativar e ele lhe quer como um pai;
. com Manuel de Sousa:
- apesar das qualidades que lhe reconhece, é, em sua opinião, inferior a D. João de Portugal;
- por conta deste tem “ciúmes”
- e uma certa aversão, por o considerar um intruso.

▪ O caráter ominoso, carregado de mistério e de fatalismo, conferido ao tempo pela repetição de determinados números (3, 7, 14, 21, 13) e pela sexta-feira:
. D. Madalena procurou D. João durante 7 anos;
. D. Madalena e D. Manuel de Sousa estão casados há 14 anos (2X7);
. a batalha (e o consequente desaparecimento de D. Sebastião e D. João) ocorreu há 21 anos (3X7);
- 3:
. perfeição;
. 3 fases da existência;
- 7:
. tragédia;
. conclusão de um ciclo:
- 21:
. completa a tríade do 7, indicando o fechar de um ciclo e o iniciar de outro ainda desconhecido, mais concretamente de três (7: o ciclo da busca de novas sobre D. João; 14: o tempo de vida em comum de Madalena e Manuel; 21: o encerrar de todos os ciclos e o início de um novo).

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...