Laertes é
filho de Polónio e irmão de Ofélia. O seu nome pode ser encontrado na Odisseia:
Laertes era o pai de Ulisses, um dos protagonistas dos designados poemas
homéricos, uma figura que simboliza a sabedoria, a experiência e a tradição. Na
obra de Homero, ele é um homem idoso e sábio que se afasta do centro do poder
após a partida do filho pra a guerra de Troia. Por outro lado, ele representa a
dor e o sofrimento dos pais que veem os descendentes partir para a batalha e
aguardam o seu regresso, sãos e salvos.
O Laertes de
Shakespeare é um filho e cidadão leal, demonstrando um profundo afeto e sentimento
protetor por Ofélia, sua irmã, aconselhando-a a manter distância de Hamlet,
pois acredita que este não tem intenções sérias relativamente a ela,
mostrando-se gentil e amoroso.
Laertes, no
início da peça, mora em França, onde é estudante universitário, ansiando
iniciar a sua vida ativa o mais rápido possível. A vida numa grande metrópole
mostra-o como uma pessoa cosmopolita e galante, mas também impulsiva,
impetuosa, agindo por vezes movido pela emoção, mostrando-se rápido a agir, o
que o faz contrastar com Hamlet. De facto, o filho de Polónio é alguém ativo e
físico, enquanto o segundo se mostra reflexivo, hesitante, passivo e verbal.
Ambos partilham algo (os pais assassinados e o desejo de vingar as suas mortes
violentas), porém Laertes é decidido e ativo na obtenção da vingança, não
perdendo tempo com reflexões ou hesitações, nem com a certificação da pessoa
responsável pela morte do progenitor e da irmã. Ao tomar conhecimento da morte
de Polónio, regressa imediatamente à Dinamarca e, furioso, invade o castelo de
Elsinore com a intenção de vingar a morte do pai. A sua paixão e impulsividade
são claras na maneira rápida e decidida como busca justiça, sem pensar ou ter
em conta todas as circunstâncias e consequências. Não obstante essas diferenças
entre as duas personagens não impede que o final de ambos seja o mesmo: a
morte. Por trás de tudo isso está outro traço semelhante entre os dois: a
obsessão pela honra da família.
No entanto,
a sua forma de ser e agir acabam por se voltar contra ele. Com efeito, o seu
caráter impulsivo e irrefletido fazem de si uma presa fácil para Cláudio
manipular, no sentido de atingir os seus objetivos, ou seja, de eliminar
Hamlet. Assim, o rei, compreendendo que Laertes está furioso com a morte do pai
e devastado com a da irmã, canaliza esses sentimentos na direção do sobrinho/
enteado, o grande obstáculo à conservação do seu poder, aproveitando
astutamente a vulnerabilidade emocional para o atiçar contra o inimigo comum.
Para isso, instila no jovem a noção da culpabilidade de Hamlet, alimentando e
direcionando dessa forma o desejo de vingança. E nada o detém: insinua que o
príncipe tem de ser punido e joga com a honra pessoal e familiar, sugerindo
que, se nada fizer para repor a justiça, tal ausência de ação seria profundamente
desonroso para Laertes. Depois de manipular o filho de Polónio de maneira hábil
e astuta, propõe-lhe um plano para vingar a morte do pai num duelo contra
Hamlet, sugerindo que use uma espada afiada e envenenada para garantir que o
adversário morra durante o confronto ao ser atingido. Além disso, envenena uma
taça de vinho que seria oferecida a Hamlet caso ele vencesse o duelo,
estabelecendo, assim, um plano duplo para garantir a sua morte. Porém, a
astúcia cruel de Cláudio não se esgota aí: ele manipula o orgulho, a vaidade e
a honra de Laertes, sugerindo que prove a sua habilidade na esgrima ao mesmo
tempo que vinga o pai de modo digno e público, apelando, desta forma, ao
sentido de honra do jovem e à necessidade de demonstrar publicamente o seu
valor.
O filho de
Polónio serve a sua coroa, mas antes de tudo situa-se a família, claramente a
sua prioridade e a instituição pela qual está sempre disposto a lutar. Essa
lealdade para com a família, que inicialmente parece ser uma qualidade sem
mácula, cega-o, orientando-o para um único curso de ação: a violência. Nesse
contexto, os seus métodos são simples e práticos: encontrar Hamlet e assassina-lo
assim que o vir. Só após a insistência de Cláudio se convence a agir de outro
modo, isto é, a fazer com que a morte de Hamlet pareça um acidente.
Instantes
antes de morrer, Laertes percebe o seu erro em toda a trama e revela a Hamlet a
traição de Cláudio, imediatamente antes de perdoar o príncipe pela sua atuação
na morte de Polónio.
Em suma,
Laertes é claramente uma figura trágica que cai por causa das suas próprias
ações. Durante o duelo final, ele é mortalmente ferido pela própria espada
envenenada que havia preparado, em conluio com Cláudio, num gesto traiçoeiro,
para liquidar Hamlet. Compreendendo, nos momentos finais, que foi vítima da
manipulação do rei e que a sua obsessão por vingança resultou na sua própria
morte, mostra-se arrependido e pede também perdão a Hamlet, revelando, assim, um
lado mais nobre e consciente das suas próprias falhas.