Português: 20/08/24

terça-feira, 20 de agosto de 2024

Caracterização de Cláudio

    Cláudio é o atual rei da Dinamarca, casado com Gertrudes, anteriormente sua cunhada, após o falecimento do sei primeiro marido, o rei Hamlet, tendo-se tornado, depois do matrimónio, padrasto do jovem príncipe Hamlet, além de tio. No contexto da peça, representa o antagonista, o vilão, do sobrinho.
    Quando a obra tem início, Cláudio tinha acabado de ascender ao trono, ocupando o posto que pertencera ao seu falecido irmão, que morrera recentemente. Para grande constrangimento do jovem Hamlet, ele também desposou a viúva do mano, sua mãe. O aparecimento do fantasma do velho rei ao próprio filho, revelando que Cláudio o assassinou para obter o trono e incitando-o a vingá-lo, faz disparar a desconfiança e o ódio do sobrinho pelo tio e estabelece definitivamente o antagonismo entre ambos.
    Por outro lado, Cláudio é um político calculista, ambicioso, lascivo e dominado pela luxúria, mas, em simultâneo, astuto e inteligente, contrastando com a maioria das outras personagens masculinas da peça. De facto, as demais figuras preocupam-se com questões como a justiça, a moralidade ou a vingança, ao passo que o rei tem como única preocupação a conservação do poder que alcançou por meio do crime, tornando-se um assassino ao envenenar o irmão. De facto, movido pela ambição e pela ganância desmedidas, o soberano visa unicamente manter o que conquistou por todos os meios necessários, não importando o custo. Assim, fica extremamente preocupado quando as suas suspeitas de que o sobrinho conhece os seus crimes se conformam, após a encenação de uma peça de teatro que espelha o modo como assassinou o irmão. A partir daí, o seu único objetivo passa por se livrar de Hamlet. Primeiro, envia-o para Inglaterra, dando instruções a quem o acompanha que o assassine. Como o plano não funciona, cria um duelo entre Laertes e Hamlet, envenenando a espada do primeiro, de modo a que, quando atingir o adversário, o fira mortalmente. Prevendo a possibilidade de o plano não se concretizar como imagina, engendra uma alternativa: envenena vinho que pretende oferecer a Hamlet, caso este derrote Laertes. Tudo isto permite caracterizá-lo como um homem falso, maquiavélico, moralmente corrupto, não obstante no início da obra se apresentar como alguém cordial, educado e preocupado com o sobrinho, mas esta postura é forçada, é fingida. Gradualmente, à medida que a ação se vai desenrolando, a sua verdadeira natureza revela-se como o algodão: frio, implacável, calculista, egoísta, etc. Para atingir o seu desiderato, usa habilmente a linguagem para manipular outras personagens, bem exemplificado pelo diálogo, já no final da peça, que trava com Laertes. Curiosamente – ou não –, Shakespeare compara o seu discurso a veneno a ser derramado nos ouvidos dos seus interlocutores – o método que ele usou para se livrar do irmão.
    A relação matrimonial com Gertrudes parece ser sincera, mas, tendo em conta as características já elencadas, é cabível que se tenha casado com a cunhada como forma estratégica para o auxiliar a obter o trono da Dinamarca após a morte do anterior monarca. O medo crescente que tem do sobrinho faz com que se preocupe apenas consigo, daí, por exemplo, que, quando Gertrudes o informa de que o filho assassinou Polónio, Cláudio não questiona se a esposa poderia ter corrido perigo, mas apenas comenta que ele teria estado em perigo se estivesse na sala.
    Na cena 2 do quinto ato, insiste num terceiro método para liquidar Hamlet (o cálice de vinho envenenado), além dos dois já estabelecidos: a espada afiada e o veneno na sua lâmina, a acrescentar à tentativa falhada de o enviar para Inglaterra para o matar. Os seus planos fracassam graças a um acidente – a troca das espadas por parte de Hamlet e Laertes – tudo corre mal a partir daí: Gertrudes bebe inadvertidamente o vinho envenenado e morre; Laertes e Hamlet morrem também, mas antes o segundo fere o tio mortalmente e obriga-o a beber o resto do vinho envenenado. Deste modo, é lícito concluir que Cláudio é derrubado pela sua própria ambição, maquinação assassina e cobardia.

Caracterização de Hamlet

    Hamlet é o protagonista, a personagem que dá título à peça. No início da obra, conta cerca de 30 anos; é filho da rainha Gertrudes e do falecido rei Hamlet e sobrinho do atual monarca, Cláudio.
    Hamlet é uma figura melancólica, amarga e cínica, dominado pelo ódio, motivado pelas ações e desconfianças relativamente ao tio e pelo casamento da mãe com o homem que suspeita ser o assassino do seu pai. Por outro lado, é alguém reflexivo, sendo dominado sobretudo por questões existenciais, e pensativo que estudou na Universidade de Wittenberg, tendo esses estudos sido interrompidos pela morte do pai. Mostra-se frequentemente indeciso e hesitante, o que alterna com momentos em que age impulsiva e precipitadamente. Todos estes dados estão em consonância com a sua imaturidade e com a luta interior para distinguir entre o que a sociedade espera dele e aquilo em que acredita.
    O fantasma do seu pai aparece-lhe e ordena-lhe que se vingue de Cláudio por o ter assassinado, porém questiona se a vingança é algo correto e fica obcecado em provar a culpa do tio antes de agir. Ele tem de ter a certeza de que foi efetivamente Cláudio quem assassinou o rei Hamlet. É ainda atormentado por inúmeras questões, como, por exemplo, a vida depois da morte, o suicídio, o que sucede aos corpos após a morte, etc. O seu caráter hesitante leva à inação, à reflexão sobre o significado da vida e da morte, bem como à dificuldade em distinguir o que é real do que não é. Como foi referido anteriormente, os momentos de reflexão e hesitação alternam com outros em que age de forma precipitada e impulsiva. Quando age, fá-lo com grande rapidez e escassa ou nenhuma precipitação, como é exemplificado pelo assassinato de Polónio, que ele esfaqueia através de uma cortina, sem verificar previamente quem se esconde atrás dela. Por outro lado, parece ser-lhe fácil adotar comportamentos indiciadores de loucura, comportando-se de forma errática e perturbando as outras personagens com o seu discurso agressivo, irónico e pleno de insinuações.
    O seu caráter indeciso tem consequências funestas: os maus-tratos dirigidos a Ofélia contribuem para a sua loucura progressiva e a sua morte; os que visam a mãe fazem-na sofrer e afastam-nos; até o assassinato de Polónio se relaciona de alguma forma com as suas hesitações e indecisões. Além disso, à medida que adia a concretização da vingança e a reivindicação do trono, o reino da Dinamarca torna-se progressivamente mais instável e exposto a ameaças externas.
    O estado do seu país (“Algo está podre no reino da Dinamarca”) e da família deixa-o triste e melancólico. Por exemplo, a sua deceção com o casamento rápido da mãe com o tio é enorme; por outro lado, repudia Ofélia, uma jovem que anteriormente declarou amar, de forma bastante dura. Alguns dos seus discursos indiciam o seu desgosto e a sua desconfiança relativamente à generalidade das mulheres, exemplificadas pela mãe e por Ofélia. Em diversos momentos da peça, reflete sobre a sua própria morte e até o suicídio. Seja como for, a sua preocupação com a Dinamarca é sentida meramente em termos pessoais e filosóficos, visto que as ameaças exteriores à segurança nacional e os interiores à sua estabilidade ocupam muito pouco o seu pensamento. Mais: algumas dessas ameaças nascem do seu próprio descuido.
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...