- muito feio (“era extremamente feio”, o que o
torna inseguro na relação com a mulher.
• Caracterização psicológica:
- é pouco inteligente (“Os dotes de espírito não
o recomendavam também.”);
- é ambicioso, mas mesquinho, ingrato /
oportunista e avaro (episódio dos pastéis e da vitela que lhe ofereceram);
- é retratado de forma caricatural e irónica,
como o exemplificam as anedotas que sobre ele se contavam em Vila Real;
- é orgulhoso, rude e ridicularizado, como se
pode comprovar pelas alcunhas que lhe dão (“brocas” e “doutor Bexiga”), as
quais indiciam rudeza e baixo nível intelectual da personagem;
- não possui qualidades, exceto o talento para
tocar flauta e a capacidade de fazer rir a rainha;
- recorre a favores: “Escassamente lhe
chegavam os recursos para os alicerces: escreveu à rainha e obteve generoso
subsídio com que ultimou a casa.”;
- é um homem inseguro.
• Profissão:
- é juiz em Cascais;
- posteriormente, é corregedor em Viseu, a
partir de 1801.
• Irmãos: Marcos e Luís possuem um temperamento
impulsivo e violento.
• Nome: Rita Teresa Margarida Preciosa da Veiga
Caldeirão Castelo Branco (a acumulação de apelidos de família indica a
sua condição aristocrática).
• Linhagem / Caracterização
social:
- é uma aristocrata lisboeta (“filha
dum capitão de cavalos, e neta de outro”);
- é uma dama do paço: D. Rita é uma
“formosa dama de D. Maria I”, habituada à vida da corte;
- é notável pela sua “jerarquia”,
isto é, pela sua posição social, que é superior à de Domingos Botelho;
- é orgulhosa da sua linhagem;
- é arrogante, altiva, presunçosa,
desdenhosa (com) e despreza a nobreza da província (“O mais audacioso não
ousava fitá-la de rosto, quando o ela remirava com a luneta em jeito de tanta
altivez e zombaria”), em que se incluem os familiares de Domingos Botelho,
sentimentos que se revelam, por exemplo, quando inferioriza os fidalgos de Vila
Real, afirmando que “eram menos limpos que os carvoeiros de Lisboa”, ou quando,
ao ver as liteiras, sugere, com desprezo, que o tempo naquela província tinha
parado no século XII;
- despreza também o espaço rural, que
considera atrasado e destituído de refinamento e elegância.
• Caracterização física: muito bela (“Rita era uma formosura; que ainda
aos cinquenta anos se podia prezar de o ser.”).
• Caracterização psicológica:
- não se adapta à vida no interior do
país;
- é infeliz e sente saudades da vida
da corte;
- é autoritária com o marido.
- têm cinco filhos (o “mais velho era
Manuel, o segundo Simão”);
- a relação entre os dois é fria e
infeliz (“A dama do Paço não foi ditosa com o marido.”);
- Domingos Botelho:
. inicialmente, mostra-se submisso a D. Rita, pois
sente-se inferior a ela;
. é inseguro e submisso aos caprichos da esposa, pois
receia desagradar-lhe.
- D. Rita:
. sente-se infeliz e saudosa da corte;
. é arrogante e autoritária para com o marido;
. tem clara ascendência sobre o marido: toma decisões,
desdenha dele e leva os seus planos avante;
. faz constantes exigências ao marido e torna-se cada
vez mais distante (“mais enfadada no trato íntimo”), mas mantém-se fiel ao
marido.
• Ocupação: estudante em Coimbra – frequenta o segundo ano
jurídico.
• Atitudes / Caracterização
psicológica:
- escreve ao pai queixando-se de que
não pode viver com Simão, com medo do seu génio sanguinário;
- é medroso, de fracas convicções e
volúvel: mostra medo do irmão sete anos mais novo, pede ao pai um novo destino,
etc.;
- é oportunista: aproveita-se da sua
posição social para ascender na carreira militar.
• Idade: 15 anos.
• Ocupação: estudante em Coimbra – estuda humanidades.
• Caracterização física:
- é um jovem adolescente com aparência de
adulto: “Os quinze anos de Simão têm aparência de vinte”;
- possui uma constituição física robusta: “É
forte de compleição…”;
- é fisicamente atraente: “belo homem com as
feições da mãe, e a corpulência dela”.
• Caracterização psicológica /
Temperamento:
- possui génio sanguinário: o
episódio da pancadaria na fonte acentua o “génio sanguinário” de Simão e
explica, posteriormente, o ódio entre os Botelhos e os Albuquerques, visto que
alguns dos homens que Simão espancou eram criados de Tadeu de Albuquerque, pai
de Teresa;
- rebelde, desafiador e arruaceiro:
“(…) Simão emprega em pistolas o dinheiro dos livros, convive com os mais
famosos perturbadores da academia, e corre de noite as ruas insultando os
habitantes e provocando-os à luta com assuadas.”;
- possui um caráter forte;
- é impulsivo, agressivo e violento;
o irmão tem medo do seu génio sanguinário;
- manifesta propensão para a
marginalidade: “convive com os mais famosos perturbadores da academia”;
- é inteligente, estudioso, aplicado:
“(…) Simão recolhe a Viseu com os seus exames feitos e aprovados…”;
- mostra-se carinhoso com a irmã
Rita: “com quem ele brincava puerilmente, e a quem obedecia”.
• Atitude social:
- transgressão de barreiras sociais:
“Na plebe de Viseu é que ele escolhe amigos e companheiros”;
- desprezo pela condição da família:
“zomba das genealogias”.
2. Com a mãe: D. Rita não mostra um grande amor por Simão,
sobretudo porque o filho zombava da sua genealogia (o fidalgo ri-se da glória
de um antepassado da mãe, o “general Caldeirão, que morreu frito”), o que ela
não tolerava, dado que valorizava os seus antepassados ilustres e os seus
pergaminhos. Por outro lado, ela não aprova as companhias do filho, da “plebe
de Viseu”, que considera indignas do seu estatuto social. Deste modo, a esposa
de Domingos Botelho cumpre o seu papel de mãe, sem dedicar ao filho o afeto que
se espera de uma progenitora pelo seu rebento.
• Simão, o herói romântico:
- temperamento violento, marginal e
imprudente: “génio sanguinário”;
- virilidade: “Os quinze anos de
Simão têm aparências de vinte. É forte de compleição”; “um belo homem com as
feições de dua mãe”;
- rebeldia:
. Simão escolhe os seus amigos e companheiros “na plebe
de Viseu” e “zomba das genealogias”;
. na academia “convive com os mais famosos
perturbadores”;
- transgressão, o que o coloca em
conflito com a família e lhe custa a inimizade do irmão:
- caráter de exceção, que surpreende
o próprio pai: “O corregedor admira a bravura de seu filho Simão”;
- representa uma alteração de
mentalidades, uma rutura com a sociedade e a ordem estabelecida: zomba de
genealogias, contestando os antepassados da mãe, o que constitui um eco dos
efeitos da Revolução Francesa.
Por um lado, o narrador refere as datas e o passado da
família de Simão, na segunda metade do século XVIII.
Por outro, traça o trajeto temporal que leva Domingos
Botelho e a sua família de Lisboa a Cascais, daqui para Vila Real,
posteriormente para Lamego e, por fim, para Visei.
Além disso, o narrador procede à concentração do
tempo, algo característico do género novela e que é visível no ritmo narrativo
rápido, que nos leva de 1767, ano em que Domingos Botelho se formou, a 1801,
quando já é corregedor em Viseu.
Para que a concentração temporal se concretize, o
narrador faz uso dos seguintes recursos:
• resumo: “Dez anos de enamorado, malsucedido,
consumira em Lisboa o bacharel provinciano”;
• elipse: “Decorridos alguns dias, D.
Rita disse ao marido que tinha medo de ser devorada das ratazanas”.
Isto é conseguido porque o narrador tem um bom
conhecimento dos acontecimentos que morra, o que lhe permite escolher as partes
da ação que resume ou que simplesmente elimina.
Em suma, as datas apresentadas neste capítulo são
as seguintes:
• 1758: Fernão Botelho relacionou-se
com nobres associados à tentativa de regicídio;
• 1767: Domingos Botelho forma-se em
Coimbra;
• 1775: é juiz em Cascais;
• 1784: é transferido para Vila Real;
nasce Simão;
• 1801: é corregedor em Viseu.
Quer
isto dizer que a ação narrada neste capítulo abrange um período de mais de
quarenta anos, o que equivale a dizer que os eventos são narrados de forma
abreviada, daí o ritmo nmarrativo ser também muito rápido.
De facto, o narrador caracteriza as classes privilegiadas
dos locais onde a família de Domingos Botelho vai vivendo – Lisboa, Cascais,
Vila Real e Viseu –, retratando os seus costumes, os seus valores, os seus
comportamentos e as suas práticas, na segunda metade do século XVIII. Esta
época é caracterizada pela tensão entre os valores retrógrados e autoritários
da sociedade portuguesa marcada pelo Absolutismo e o desejo de mudança.
Neste contexto, a figura de D. Rita Preciosa é
fundamental, pois é através dela que o narrador retrata o contraste entre a
vida em Lisboa e na província. Esta é apresentada como um espaço rural atrasado,
destituído de refinamento e elegância, onde persistem os valores tradicionais,
conservadores e retrógrados e a nobreza é decadente (“A [liteira] dos Correias
de Mesquita era a mais antiquada no feitio, e as librés dos criados as mais
surradas e traçadas que figuravam na comitiva.”). Esta ideia é exemplificada
por várias atitudes de D. Rita, como, por exemplo, quando inferioriza os
fidalgos de Vila Real, ao afirmar que “eram menos limpos que os carvoeiros de
Lisboa”, ou quando, ao ver as liteiras, sugere que o tempo naquela zona do país
tinha parado no século XII:
“ – Em que século estamos nós nesta montanha? – tornou
a dama do paço.
– Em que século?! O século tanto é dezoito aqui como
em Lisboa.
– Ah! Sim? Cuidei que o tempo parara aqui no século
doze…”.
Deste modo, através desta personagem, é criticada a
arrogância da fidalguia / nobreza de Lisboa e a mesquinhez de alguns fidalgos,
nomeadamente a partir dos episódios dos pastéis e da vitela, mas também o
provincianismo e a decadência da nobreza de Vila Real.
Através de Domingos Botelho e dos seus irmãos, critica-se
o facto de a honra estar associada ao nascimento, ao berço, à linhagem,
independentemente das qualidades do indivíduo, e não ser resultado de uma
conduta violenta. Este “desconcerto”, como diria Camões, mantém-se bem vivo na
atualidade. Foi conhecido há dias a notícia de que um aluno candidato ao
mestrado em Medicina na Universidade Católica ter sido aceite, ultrapassando
outros candidatos com notas superiores, porque os seus familiares teriam feito
donativos anteriormente à instituição.
D. Rita Preciosa e Domingos Botelho representam a nobreza
decadente de província e a ascensão de uma nova classe que vive próxima da
corte. Neste contexto, convém atentar no contraste que existe entre a relação
deste casal e o amor de Teresa e Simão e com as mudanças que provinham da
Revolução Francesa. Este contraste simboliza a substituição da velha geração
por uma nova com novos ideais.
• Linguagem popular: as alcunhas de Domingos Botelho (“Brocas”,
“doutor Bexiga”); “dizendo que receberia como escárnio um presente de doces,
que valiam dez patacões”.
• Vocabulário depreciativo: “Domingos Botelho era
extremamente feio”, “bacharel provinciano”, “A dos Correias de Mesquita era a
mais antiquada no feitio, e as librés dos criados as mais surradas e traçadas que
figuravam na comitiva”, “a neta do general frigido no caldeirão”, “brutal e
estúpido juiz”.
• Escassez de diálogo: o único momento dialogal
acontece quando se narra a chegada de D. Rita e Domingos Botelho a Vila Real.
• Predomínio de frases curtas: “D. Rita quer que seu
filho seja cadete de cavalaria”.
• Profusão de verbos associados à ideia de movimento
e de dinamismo, como, por exemplo, “ir”, “quebrar”, “espancar”, “partir”,
“fugir”, etc.
• Uso do presente histórico: “Manuel […] tem vinte e
dois anos, e frequenta o segundo ano”.
• Descrições breves: no que se refere à caracterização
física de Simão, o narrador apresenta apenas alguns traços gerais; no episódio
dos cântaros, o mesmo narrador não descreve o local, os objetos ou os
intervenientes.
• Predomínio da caracterização indireta das personagens:
o retrato psicológico das personagens é conseguido através, sobretudo, do seu
comportamento.
• Uso predominante do discurso indireto: “[…] ele
responde que seu irmão o quer forçar a viver monasticamente…”.
• Uso frequente da coordenativa copulativa: “O pai
maravilha-se do talento do filho, e desculpa-o da extravagância por amor do
talento.”
• Uso do eufemismo irónico para caracterizar Domingos
Botelho: “[…] minguavam-lhe dotes físicos…”.