Português

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Funções sintácticas (GC3)

1.
     a) O Ernesto e a Miquelina
     b) Todos
     c) Homens com barriga proeminente
     d) Os alunos conhecedores da obra pessoana
     e) Um homem casado
     f) Ver televisão
     g) ----- (nulo subentendido)
     h) tu
     i) ----- (nulo subentendido)
     j) ----- (nulo expletivo)
     k) ----- (nulo indeterminado)
     l) ----- (nulo expletivo)
     m) ----- (nulo expletivo)
     n) ----- (nulo expletivo)

1.1.
     a) sujeito composto
     b) sujeito simples
     c) sujeito simples
     d) sujeito simples
     e) sujeito simples
     f) sujeito simples
     g) sujeito nulo subentendido
     h) sujeito simples
     i) sujeito nulo subentendido
     j) sujeito nulo expletivo
     k) sujeito nulo indeterminado
     l) sujeito nulo expletivo
     m) sujeito nulo expletivo
     n) sujeito nulo expletivo

2.

3.
     a) Margarida
     b) Jovem
     c) Zé Gato
     d) Ó Átila
     e) chefe
     f) Ó Sr. Duarte
     g)
     h) Ó chefe
     i) -----
     j) Carolina
     k) Ó Sara

terça-feira, 5 de outubro de 2010

"Ela canta, pobre ceifeira"

          Esta composição poética é constituída por seis quadras (de notar que o uso da quadra é uma marca «popular» da poesia pessoana) de versos octossílabos e rima cruzada, de acordo com o esquema abab, sendo de salientar a existências de duas irregularidades: a rima toante em "ceifeira" e "cheia" e a rima forçada entre "eu" e "céu".

          O assunto do texto gira em torno do confronto entre a pessoa de uma ceifeira que o sujeito poético vislumbra fugazmente e ele próprio. Note-se que não há qualquer referência concreta à ceifeira que a individualize (por exemplo, nome, rosto...), o que sugere esse carácter fugaz da «visão» tida pelo SP.
          Em suma, estaremos perante um instantâneo constituído por:
               . uma ceifeira;
               . um dia luminoso de Verão (v. 6);
               . o canto da ceifeira (vv. 1, 3, 8, 11);
               . o trabalho da ceifa enquanto canta (vv. 3, 10).

          O tema do texto é a dor de pensar, de ser racional, lúcido, do qual derivam outras temáticas tão caras ao ortónimo:
               . a consciência da efemeridade da vida;
               . o tédio existencial;
               . a dispersão e o aniquilamento finais.

          A nível da forma, estamos perante um poema constituído por seis quadras (o uso da quadra é uma marca «popular» da poesia pessoana) em versos octossílabos ("E / la / can / ta / po / bre / cei / fei/"), com rima cruzada, segundo o esquema a b a b.

          Nas três primeiras estrofes (1.ª parte), encontramos a descrição da ceifeira e do seu canto. Com efeito, ele vislumbra uma ceifeira a cantar, sinónimo (aparente) de alegria, felicidade, suavidade, serenidade, inocência e espontaneidade. No entanto, em simultâneo, a descrição é marcada por notas dissonantes: ela é "pobre" (isto é, "infeliz", "coitada") e a sua voz encontra-se cheia de dor, de amargura disfarçada ("... e a sua voz, cheia / De alegre e anónima viuvez" - vv. 3-4 - nota para a metáfora e o paradoxo). Deste modo, o canto da ceifeira, que aparentemente exprime sentimentos eufóricos, revela, na perspectiva do sujeito poético, superficialidade, irreflexão e inconsciência, ideia comprovada na terceira quadra.

          Este quadro provoca uma reacção antitética no sujeito poético: por um lado, alegra-se por a ver feliz, graças à sua voz alegre e cheia de vida que o encanta e prende; por outro lado, entristece, pois sabe que, se a ceifeira tivesse consciência do seu mundo, da sua situação, não encontraria motivos para cantar. No entanto, "canta como se tivesse / Mais razões para cantar que a vida" (comparação), só que o sujeito poético vê na sua voz "curvas", metáfora que poderá sugerir a ondulação, a suavidade do seu canto, bem como enigmas, dificuldades; vê ainda "o campo e a lida", isto é, o trabalho árduo, excessivo e nal remunerado, o sofrimento, o rebaixamento do ser humano, a mulher transformada em instrumento de produção. Como se explica, então, que, não obstante este quadro, ela continue a cantar? Sucede que a ceifeira não reflecte (na sua vida), logo é inconsciente, e é esta inconsciência que justifica o seu canto e a sua alegria.

          A segunda parte do poema abarca a 4.ª, a 5.ª e a 6.ª estrofes, nas quais o sujeito poético menciona os efeitos da audição do canto da ceifeira em si.

          Na quarta estrofe, começa por confessar a submissão em si do sentimento à razão, que conduz à dor de pensar: "O que em mim sente 'stá pensando" (v. 14). Dito de outra forma, a sua racionalidade está na base da sua incapacidade de sentir, o que revela um contraste profundo entre ele e a ceifeira: ela é feliz porque inconsciente; pelo contrário, o sujeito poético é infeliz porque consciente (pensa).

          Esta constatação leva-o a formular um desejo impossível, dirigido à ceifeira, para que continue a cantar, mesmo "sem razão", e que derrame dentro dele o seu canto. Por outro lado, deseja transformar-se nela e possuir a sua inconsciência, mantendo a sua própria consciência, paradoxo que revela a impossibilidade de concretização desse desejo.

          Verificada a impossibilidade de ser inconscientemente alegre, como a ceifeira, o sujeito poético invoca (apóstrofe) o céu, o canto e a canção pedindo-lhes que entrem por ele dentro, disponham da sua alma como sombra própria e o levem. Perante a dor de pensar que o atormenta, o sujeito poético manifesta o desejo de dispersão, de aniquilamento - traduzido pelo recurso ao imperativo e pela gradação ("entrai", "tornai", "passai"), bem como pela personificação daqueles três elementos - , que culmina no derradeiro verso do poema, de alguma forma eufemístico: "Depois, levando-me, passai".
          Em suma, frustrada a possibilidade de possuir a alegria inconsciente com a "consciência disso" da ceifeira e porque "a vida é tão breve" (referência à temática da brevidade / fugacidade da vida), o sujeito poético entreg-ase aos responsáveis pela alegria da ceifeira (o ceú, por onde o canto se espalha; o campo, sinónimo do seu trabalho, e a canção, reveladora da sua alegria inconsciente), sabendo de antemão que o seu caso é insolúvel. Procura, então, um anestésico para a sua dor de pensar, a sua incurável angústia: a dissolução, o aniquilamento.

          Em suma, o poema revela-nos uma dupla perspectiva sobre a existência / vida:
               » o sujeito poético é infeliz porque pensa, porque racionaliza em excesso: "O que em mim sente 'stá pensando"; daí que ele inveje, admire e deseje a serena e alegre inconsciência da ceifeira;
               » esta, por sua vez, julga-se feliz, porque apenas sente, não racionaliza, não intelectualiza a sua realidade, as suas emoções, o que leva o sujeito poético a exclamar "Ah, canta, canta sem razão!" e a desejar "Ter a tua alegre inconsciência". Deste modo, a ceifeira e o seu canto constituem a metáfora da felicidade inatingível.
          Além disso, a sua figura simboliza:
               » a simplicidade da vida;
               » a identificação com a terra;
               » a possibilidade de o sujeito poético ser feliz, caso possuísse a alegre inconsciência dela.

          O poema oscila entre a objectividade e a subjectividade:

sábado, 2 de outubro de 2010

Roy Orbison: «Mistery Girl»



          Os U2 estarão hoje e amanhã na Cidade dos Doutores. Quantos saberão que o tema acima foi composto pelo seu vocalista Bono?

          Roy Kelton Orbison (23 de Abril de 1936 – 6 de Dezembro de 1988) foi um cantor, compositor e músico americano, originário do Texas, onde viveu os primeiros anos de vida e começou a cantar, num estilo «rockabilly» / «country».

          Durante os anos 60 do século que nos viu nascer, Orbison alcançou enorme sucesso, tendo vinte e duas das suas canções atingido o Top Forty, incluindo temas imortais como «Only the Lonely», «Crying» (mais tarde re-cantado com K. D. Lang) e «Pretty Woman» (recuperado no filme com o mesmo título, protagonizado por Julia Roberts e Richard Gere, de 1990).

           Durante os anos 70, a sua carreira estagnou, para regressar em força nos anos 80, tendo, em 1985, lançado o álbum (na época, o CD, o DVD, etc., eram ficção científica) «Class of '55», com Jerry Lee Lewis, Johnny Cash e Carl Perkins. Em 1989, foi lançado «Mistery Girl», um álbum póstumo que incluía o tema hoje proposto e que consolidou o estatuto de Roy Orbinson, falecido a 6 de Dezembro do ano anterior, de ataque cardíaco, depois de um dia passado com os filhos a lançar pequenos modelos de aviões. Tinha 52 anos.

Análise do poema "Autopsicografia"

» Comentário

          "Autopsicografia" é um dos poemas mais conhecidos de Fernando Pessoa ortónimo, escrito de acordo com a poética tradicional: a composição poética adoptada é a quadra e a métrica o verso de redondilha maior; já a rima segue o esquema ABAB nas três quadras, sendo, por conseguinte, cruzada.

          Em termos temáticos, estamos perante um texto que se debruça sobre a teoria do fingimento poético, uma espécie de arte poética, ou de como se «faz» poesia, em particular, e arte, em geral. Nesse sentido, o sujeito poético parte de uma espécie de axioma - "o poeta é um fingidor" -, uma metáfora assente no verbo "fingir", que, neste caso, não remete para o campo da «mentira» (fulano é um fingidor = fulando é um falso = fulano é um mentiroso). De facto, estamos na presença de uma derivação do verbo latino «fingere, que significa «modelar, transformar, criar». Quer isto dizer que o poeta é um criador, um transformador.
          Esta tese do «eu» é demonstrada nos versos 2 a 4 a partir do exemplo da dor. Quer isto dizer que o acto de criação poética consiste na expressão de uma dor que, sendo primeiro sentida pelo sujeito poético, é «fingida» e representada, posteriormente, através da linguagem. Dito de outra forma, ele finge algo (a dor) de que teve experiência directa, recusando a simulação de uma experiência emocional que não se teve.  Este dado remete, desde já, para uma dupla dor: a dor real sentida pelo SP e a dor fingida, imaginada, sendo esta última fruto da racionalização da primeira. Nota-se aqui a recusa da passagem imediata da experiência à arte, visto que a dor realmente sentida não é aquela que vai surgir no poema. Adiante-se desde já que a opção do heterónimo Caeiro é exactamente a oposto, privilegiando a espontaneidade. A oração subordinada iniciada pela conjunção «que» traduz a consequência do que foi estabelecido na oração anterior - "finge tão completamente" -, ou seja, a consequência do acto de fingimento. Os advérbios "tão" (intensidade) e "completamente (modo) evidenciam o elevado grau de intensidade do acto de fingir. Ou seja, sobre o modelo da dor real, o poeta finge a dor em imagens e fá-lo de modo tão perfeito que o seu fingimento se lhe apresenta mais autêntico. Deste modo, a dor fingida transforma-se numa nova dor (imaginária), cuja potencialidade de comunicação absorve todas as virtualidades da dor inicial.
           A segunda quadra abre com uma perífrase ("E os que lêem o que escreve") que remete para os leitores. Quer isto dizer que, se na primeira estrofe o poeta tinha apresentado o processo de criação poética na perspectiva do poeta, na segunda o vai fazer na óptica do leitor. Assim, o leitor não terão acesso a qualquer das dores do poeta - a dor real e a dor imaginada -, pois a primeira ficou com aquele e a segunda não é sentida pelo leitor como dor, porque o não é (esta dor é do domínio dos sentidos, enquanto a poesia se situa no domínio do espírito). No entanto, também ele tem de ter acesso a uma dor real para a poder fingir a partir do acto intelectual que é a leitura do poema. Esta dor intelectualizada, resultante da leitura do poema, é a que resulta da interpretação dos leitores, o que significa que há tantas dores dos leitores quanto as interpretações por eles feitas.

          A terceira estrofe, de carácter conclusivo, explica o papel do coração (sentidos) e da razão (inteligência) no processo de criação artística. Assim, o sujeito poético estabelece um contraste entre o coração, símbolo da sensibilidade e centro dos sentimentos, e a razão, o raciocínio, o pensamento, apresentando o primeiro como um "comboio de corda", um brinquedo, procurando demonstrar que, na produção poética, a sensibilidade é subordinada à disciplina, ao mecanicismo da razão (as calhas da roda), ao pensamento. O movimento do coração nas calhas (símbolo da fixidez e da impossibilidade de mudança de rumo) é, pois, mecanicista e processa-se a um ritmo inalterável; por outro lado, "entretém" a razão, ou seja, ilude-a, distrai-a, ocupa-a, mas também a mantém, a conserva e alimenta, fornecendo-lhe elementos para o fingimento, a criação poética. Quer isto dizer que as calhas exprimem a subordinação do sentir em relação à razão (pensamento), que ocupa um papel predominante na produção artística. Mas como o comboio não pode dispensar o carril, e o carril só tem razão de ser na passagem do comboio, razão e sensibilidade encontram-se intimamente ligadas.
          Além disso, convém notar que a disposição circular dos carris aponta para outra linha de força da poesia de Pessoa: o coração "entretém" a razão, mas não lhe permite quaisquer avanços, porque se desenvolve em círculos, repetitivamente, o que gera angústia, pessimismo, cansaço.
          E o que dizer do facto de Pessoa ter escolhido a dor enquanto «elemento» demonstrativo da sua tese?



» Desenvolvimento


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