– Qué apanhá sordado?
– O quê?
– Qué apanhá?
Pernas e cabeças na calçada.
Este poema de Oswald de Andrade traz
para a poesia um facto quotidiano: nos quatro versos, o «eu» poético sugere um
confronto entre um capoeirista e um soldado. Esse confronto sucede, porque o
capoeirista provoca o soldado (“Qué apanhá sordado?”) e o chama para a luta.
Durante muito tempo, os capoeiristas
foram vistos de forma preconceituosa, isto é, como arruaceiros, e muitas vezes
eram presos por praticar a sua arte. No caso desta composição, o «eu» propõe
uma inversão: em vez de o capoeirista ser vítima da arbitrariedade da polícia,
é ele quem provoca o soldado.
O último verso indicia a concretização
da luta: o capoeirista investe contra o soldado, derruba-o, provavelmente com
um golpe de capoeira. Note-se que o conflito é descrito à maneira cubista, isto
é, em partes, como um mosaico de imagens.
O registo de língua predominante no
diálogo é o popular: “qué”, “apanhá”, “sordado”, vocábulos repetidos
anaforicamente no terceiro verso, à exceção do último. Qual é o objetivo do
poeta ao colocar na boca do capoeirista a linguagem popular? Deste modo, ele
reproduz a fala de um indivíduo simplório, uma linguagem dinâmica que traduz a
visão da briga, semelhante à capoeira. No último verso, chave de ouro do texto,
terminado o diálogo, a sintaxe está correta, isto é, de acordo com a norma
gramatical.
O diálogo e a linguagem quotidiana
são características do Modernismo. Temos então a anulação das fronteiras que
encontramos no Manifesto. Outra coisa que é típica do Modernismo, mas
principalmente de Oswald de Andrade, é a ideia de progresso, de rapidez; é a poesia
feita rapidamente. Por outro lado, no poema está presente a visão da literatura
nacionalista, fundamentada nas características naturais do povo brasileiro.
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