Português: José Mauro de Vasconcelos
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segunda-feira, 16 de junho de 2025

Resumo do capitulo II de O Meu Pé de Laranja Lima

    O capítulo abre com Zezé a explicar que, na sua família, os mais velhos tomavam conta dos mais novos e relembra com carinho a relação com os irmãos, especialmente com Lalá, que já não lhe dá tanta atenção desde que começou a namorar. Deste modo, a relação mais próxima atualmente é a que mantém com o mais novo, Luís, por quem Zezé demonstra grande carinho e responsabilidade.
    Os dois irmãos vão brincar para o quintal e Zezé, com a sua fértil imaginação, transforma o espaço num zoológico (que, na verdade, não passa de um galinheiro), na Europa e até num campo de aviação, imaginando que o morcego Luciano era um avião. A criança inventa histórias, dá nome a lugares e cria brinquedos com objetos simples, tudo para entreter o irmão, bem como para se proteger do mundo que o rodeia, já que é frequentemente punido pelas suas travessuras.
    Enquanto brincam, Zezé escuta a conversa entre Glória e Lalá sobre si e apercebe-se de que elas já têm conhecimento de uma das suas últimas travessuras – cortar uma corda de roupa com um pedaço de vidro. Ele sente-se culpado e, resignadamente, aceita a punição que certamente se seguirá.
    A mãe decide que todos devem ir visitar a casa nova, para onde se mudarão dois dias após o Natal, facto que desperta em Zezé a recordação da dura infância da progenitora, impedida de frequentar a escola e forçada a trabalhar desde os seis anos. Este passo suscita o tema do Natal, abordado num tom triste e melancólico, em virtude da pobreza da família. Zezé, não obstante, tem alguma esperança no nascimento do Menino Deus.
    Ao visitarem a casa pela primeira vez, cada irmão escolhe uma árvore do quintal. Zezé fica para trás e entristece, porque as melhores já foram escolhidas. Glória tenta animá-lo e indica-lhe um pé de laranja lima. Inicialmente, o menino rejeita-o, mas Glória destaca o facto de serem ambos muito jovens e de poderem crescer juntos, como irmãos. Depois de escolher a sua árvore, Zezé sente-se insatisfeito e frustrado, desejando ser muito rico no futuro para poder comprar uma selva inteira. Nesse momento, enquanto está sentado no chão, só e a choramingar, a árvore fala pela primeira vez com a criança, dizendo-lhe que concorda com Glória e que ela iria perceber que tinha feito uma boa escolha. Zezé reage com admiração, mas rapidamente se deixa encantar pela forma como a árvore lhe explica que a ligação entre os dois é única e especial. A partir desse momento e até a mudança de casa se concretizar, o menino visita o pé de laranja lima – que passa a chamar Minguinho – com regularidade. Rapidamente, cria um vínculo mágico com a árvore, imaginando que falam um com o outro. O pé passa então a representar um refúgio emocional para Zezé, um amigo secreto que o compreende e escuta. O capítulo termina com o menino a declarar que, mesmo se pudesse trocá-lo por outras árvores, não o faria.

sexta-feira, 13 de junho de 2025

Estrutura de O Meu Pé de Laranja Lima

    O Meu Pé de Laranja Lima está dividido em duas secções relativamente proporcionais, dois momentos que caracterizam distintamente o crescimento de Zezé.
    A primeira parte da obra tem o subtítulo “No Natal, às vezes nasce o Menino Diabo”, é constituída por cinco capítulos (“O descobridor das coisas”, “Um certo pé de laranja lima”, “Os dedos magros da pobreza”, “O passarinho, a escola e a flor” e “Numa cadeia eu hei de ver-te morrer”) e apresenta as personagens que darão corpo ao enredo principal, permitindo, dessa forma, começar a desenhar o perfil do protagonista, o “descobridor das coisas”, conjugando a vulnerabilidade natural de uma criança de cinco anos com a determinação e a força de uma criança que crê que o mundo existe para ser entendido e explorado.
    Miguel Neves Santos (op. cit., pp. 7-11), subdivide esta primeira parte nas seguintes sequências: “A família e o «Descobridor de Coisas»”, “A Ilusão e a Desilusão: Sonho e Miséria”, “Imaginação e Crescimento”, “Memória e Esperança”, “A Sensibilidade e o Bom Coração do «Menino Diabo»”.
    A segunda parte, composta por nove capítulos (“O morcego”, “A conquista”, “Conversa para cá e para lá”, “Duas surras memoráveis”, “Suave e estranho pedido”, “De pedaço em pedaço é que se faz ternura”, “O Mangaratiba”, “Tantas são as velhas árvores”, “A confissão final”), tem como subtítulo “Foi quando apareceu o Menino Deus em toda a sua tristeza” e é nela que se desenvolvem os aspetos mais marcantes da narrativa. Deste modo, o leitor assiste ao crescimento de Zezé, cuja existência oscila entre a felicidade e a tristeza, a esperança e o infortúnio.
    O subtítulo remete para momentos de revelação e de transformação, que se revelam também dolorosos e que guiam o percurso de aprendizagem de Zezé, uma criança que, graças à experiência que vai adquirindo, deixa progressivamente de o ser, “principalmente aos olhos de um narrador adulto que parece também notar tal facto, à medida que compõe a história que quer contar.” A testemunha de tudo isso é o pé de laranja lima, o «amigo de todas as ocasiões” que se constitui como uma das mais importantes para a compreensão da obra.
    Miguel Neves (op. cit., pp. 13-19) subdivide esta segunda parte nas seguintes sequências: “Amigos Inesperados: a Importância das personagens secundárias”, “Pequenas e Grandes Conquistas: a Vida é feita de Mudanças”, “Entre o Céu e o Inferno: o Afeto dá Lugar à Violência”, “Sarar as Feridas e Reparar os Sonhos”, “A Dor e o Vazio Impostos pela Perda Irreparável”.

Análise de O Meu Pé de Laranja Lima, de José Mauro de Vasconcelos

 I. Vida de José Mauro de Vasconcelos


II. Obras


III. Obra


IV. Época


V. Ação

        1. Resumo

        2. Estrutura

        3. Resumo dos capítulos

                3.1. Primeira parte

                        3.1.1. Primeiro capítulo

                        3.1.2. Segundo capítulo

                        3.1.3. Terceiro capítulo


quinta-feira, 12 de junho de 2025

Resumo do capitulo I de O Meu Pé de Laranja Lima

A obra abre com o relato de uma caminhada de Zezé e Totoca, seu irmão, que lhe dá instruções práticas para a vida e o afasta da imaginação e das ilusões que poderão colocar o protagonista em perigo ou fazê-lo sofrer. Por meio de comentários, breves memórias e curtas analepses, o leitor começa a conhecer as personagens e o contexto da ação.
    Os dois irmãos caminham de mãos dadas e Totoca ensina a Zezé coisas do mundo, como, por exemplo, o caminho para a escola ou como atravessar a rua em segurança, nomeadamente a movimentada Rio – São Paulo, explicando que, antes de o fazer, é necessário olhar para os dois lados. O protagonista sente medo, mas esforça-se para não o demonstrar, enquanto o irmão o incentiva a fazer o trajeto sozinho, afirmando que está a crescer e necessita de aprender.
    Enquanto caminham, conversam sobre diversos temas. Zezé evidencia uma grande curiosidade filosófica e poética sobre a vida. Por exemplo, questiona se a “idade da razão pesa” e mostra admiração por Tio Edmundo, um senhor aposentado que ele considera «sábio» e que gostaria de imitar quando crescesse, incluindo uma gravata de laço, porque todos os poetas que vê nas revistas usam esse acessório.
    Entretanto, chegam à nova casa para onde a família se vai mudar. Zezé gosta da habitação, mas não compreende o motivo da mudança. A conversa revela, então, um contexto familiar difícil: o pai está desempregado, a família enfrenta problemas financeiros, por isso terão que se mudar para a outra casa. Além disso,  a mãe começará a trabalhar fora, e até a irmã Lalá já está empregada. O próprio Totoca, apesar de ainda ser jovem, terá que ajudar na missa para contribuir financeiramente para o núcleo familiar.
    Mesmo sendo criança, Zezé percebe a dureza da vida e tenta lidar com as circunstâncias com criatividade e fantasia. Assim, pergunta sobre o seu «zoológico», uma brincadeira infantil que envolve a presença imaginária de animais como panteras e leoas. Totoca brinca de forma afetuosa, dizendo que será ele quem desmontará o zoológico da casa antiga para o remontar na nova.
    Totoca, de seguida, tenta descobrir como o irmão mais novo conseguiu aprender a ler sozinho, mesmo antes de completar seis anos, um acontecimento que causara o espanto de toda a família. Zezé insiste que não sabe como aprendeu e ninguém o ensinou. Recorda-se apenas de uma ocasião em que perguntou a Tio Edmundo se era possível alguém aprender a ler com cinco anos, ao que aquele respondeu afirmativamente, acrescentando que era, no entanto, incomum. Zezé recorda também um episódio em que surpreendeu Jandira, a irmã, ao ler uma oração afixada atrás da porta. Ninguém acreditava que ele realmente soubesse ler, por isso Jandira deu-lhe um jornal e a criança leu-o. Em poucos minutos, os vizinhos e os familiares estavam reunidos para assistir ao «fenómeno», concluindo que tinha aprendido a ler sem ajuda direta de ninguém, o que causou um misto de espanto, orgulho e desconfiança.
    Posteriormente, Zezé relembra uma conversa com Tio Edmundo, durante a qual lhe pediu um presente: um cavalinho de pau chamado “Raio de Luar”, como o do cinema. O homem aceita o pedido, mas em troca quer um abraço, um gesto a que a criança acede sinceramente, ao perceber que o Tio se sente só e falta dos filhos. Logo a seguir, promete-lhe que vai ler para ele, provando a sua habilidade recém-descoberta.
    No final do capítulo, Tio Edmundo cumpre a promessa e oferece-lhe o cavalinho. Ele testa Zezé com um jornal, e a criança lê corretamente até palavras difíceis como «farmácia». Em suma, ninguém entende como o pequeno aprendeu a ler, e nem este mesmo sabe explicar – é tratado quase como um «milagre». Emocionado, Tio Edmundo compara o seu nome ao de José do Egito, que também foi um menino especial, e prognostica que a criança será alguém especial. Zezé não entende as palavras do homem, mas afirma que quer ouvir essa história quando “crescer mais”, pois adora histórias difíceis.
    Neste contexto, Totoca fica impressionado, mas, em simultâneo, aborrecido por o irmão ter aprendido a ler tão cedo, acrescentando que agora ele terá que ir à escola, pois a irmã Jandira considerou que seria uma forma de manter a casa mais tranquila pela manhã. Além disso, avisa que não voltará a atravessar a rua com Zezé, que terá de aprender a fazê-lo sozinho.

quarta-feira, 11 de junho de 2025

Resumo de O Meu Pé de Laranja Lima

    O Meu Pé de Laranja Lima é uma obra narrativa autobiográfica que relata a infância sofrida e as desventuras de Zezé, um menino de cinco anos natural de Bangu, periferia do Rio de Janeiro, no final dos anos 20 do século XX. Muito esperto e independente, aprende a ler sozinho e, como qualquer criança deixada solta, “vive aprontando”, expressão que designa as asneiras e partidas que prega e que, regra geral, têm consequências desastrosas para quem as faz e as sofre: “Aprendia descobrindo sozinho e fazendo sozinho, fazia errado e fazendo errado, acabava sempre tomando umas palmadas.”

    A sua vida é tranquila e estável, habita uma casa confortável e vive com conforto material, até ao momento em que o pai perde o emprego e a mãe se vê forçada a trabalhar na cidade, mais especificamente no Moinho Inglês, uma fábrica de tecidos. Para agravar a situação, a família é extensa – Zezé tem cinco irmãos: Glória, Totoca, Lalá, Jandira e Luís. Operária na fábrica, a mãe passa o dia a trabalhar enquanto o pai, desempregado, fica em casa e começa a beber. Em virtude da nova situação para que é arrastada, a família vê-se forçada a mudar de casa e a levar uma vida modesta, por isso não é de espantar que os Natais outrora fartos sejam substituídos pela mesa vazia e por uma árvore sem presentes. No quintal da nova residência, existem diversas árvores, e cada membro da família escolhe uma para chamar sua. Zezé é o último a escolher e fica com um modesto pé de laranja lima, com o qual mantém longas conversas e a que chama carinhosamente Minguinho e Xururuca. Dadas a sua traquinice e as constantes travessuras, é frequente ser agredido fisicamente pelos pais e pelos irmãos, indo depois consolar-se com a árvore. Certa vez, foi sovado de tal maneira por uma das irmãs e pelo pai que ficou uma semana sem ir à escola.

    A outra grande amizade de Zezé é Manuel Valadares, também conhecido por Portuga, um emigrante português que trata a criança com o afeto, a atenção e paciência que não tinha em casa. Por uma fatalidade do destino, Valadares é atropelado pelo comboio e morre, evento que tem um fortíssimo impacto em Zezé, que fica doente. Outro acontecimento dramático marca negativamente a sua vida: o pé de laranja lima é cortado por ter crescido mais do que era suposto.

    Zezé recupera e recomeça avida, apesar de sentir um enorme vazio. Entretanto, a situação económica da família melhora quando o pai encontra emprego numa fábrica. Por outro lado, não há também motivo para temer o corte do pé de laranja lima, dado que tal não acontecerá tão cedo. É neste contexto que a história termina, com Zezé a assumir simbolicamente que a sua árvore amiga já fora cortada, associando-a ao desaparecimento do Portuga, sem o pai perceber.

    A ação termina com o narrador a ser um Zezé agora adulto que se dirige a Manuel Valadares, mais de quarenta anos depois, e lhe confessa o impacto que teve na sua existência. Por outro lado, desabafa a influência que teve em si o facto de ter sido precocemente atingido pela realidade dura e cruel, que choca com a inocência, a alegria e a esperança que deveriam caracterizar a infância.

Época de escrita de O Meu Pé de Laranja Lima

    O período de vida de José Mauro de Vasconcelos coincidiu com uma época marcada por algumas das transformações mais importantes ocorridos no mundo ocidental.
    Em termos históricos e políticos, o escritor viveu a sua adolescência e juventude no chamado Período (ou Era) Vargas, numa alusão ao governo liderado por Getúlio Vargas, entre 1930 e 1945. Esta fase da História do Brasil ficou marcada por um conjunto de reformas sociais e económicas que tiveram como foco principal a industrialização e a crescente urbanização, bem como pela forte centralização do poder e pelo nacionalismo.
    Posteriormente, surge o período histórico que coincide com a vida adulta do escritor e que diz respeito à fase compreendida, sensivelmente, entre a década de cinquenta e o início dos anos 80 do século XX. São anos marcados pela instabilidade política e pela alternância entre a democracia e a ditadura militar, que se estendeu de 1964 a 1985. Assim sendo, quando publicou O Meu Pé de Laranja Lima, o Brasil já estava sob o regime militar, caracterizado, entre outras coisas, pela censura e pela repressão política. Esta época de alternância ficou marcada por um surto de crescimento e progresso, acompanhado de grandes desequilíbrios sociais, que persistem e, de certo modo, se acentuam na vida quotidiana dos brasileiros. Ao tema da pobreza juntam-se, sistematicamente, os da injustiça e da opressão, por exemplo, e que inspiram muitas das suas obras. A taxa de pobreza era muito elevada, havia graves problemas de acesso à educação e saúde, especialmente no interior do país e entre as classes mais baixas, daí que muitas famílias migraram do campo para as cidades em busca de melhores condições. Além disso, havia também problemas de negligência infantil, com crianças de classes populares a enfrentarem abandono, trabalho precoce e violência, temas tratados em diversos livros de José Mauro de Vasconcelos.
    Culturalmente, a vida do escritor coincide com as diferentes fases do Modernismo, caracterizado pela liberdade criativa, pelo olhar atento ao comportamento humano, pela tendência para exibir traços nacionalistas e pela valorização dos aspetos que revelam a identidade de cada região.
    Por outro lado, novamente nas palavras de Miguel Santos (op. cit., p. 6), “Privilegia-se […] o espaço da imaginação, a exploração dos limites da consciência racional do indivíduo, o papel do sonho e até do delírio, mas, ao mesmo tempo, não se negligencia o real, a ciência, o conhecimento e promove-se uma visão reflexiva e inquiridora face ao mundo. São também estes alguns dos traços que tornam a sua obra não só uma viagem através da sensibilidade humana, mas também um relevante e esclarecedor testemunho acerca da realidade social, de que todos fazemos parte.”

terça-feira, 10 de junho de 2025

A obra de José Mauro de Vasconcelos

    Miguel Neves Santos, numa análise de O Meu Pé de Laranja Lima, publicada na coleção Análise de Obras Essenciais, da Fábula Educação, pronuncia-se sobre a obra de José Mauro de Vasconcelos nos seguintes termos: “A nitidez dos cenários que apresenta nos seus textos decorre, então dos espaços e ambientes que ele mesmo percorre, à medida que interiormente vai dando forma aos seus romances, através da memória e da imaginação. O autor define da seguinte maneira a génese do seu processo criativo: «Quando a história está inteiramente feita na imaginação é que começo a escrever. Só trabalho quando tenho a impressão de que o romance está saindo por todos os poros do corpo. Então vai tudo num jacto.»
    É talvez por isso que as obras de José Mauro se revestem de uma linguagem simples, tantas vezes corrente e popular, mas com uma acuidade tremenda, que coloca o leitor em permanente contacto com os aspetos concretos da realidade em que o autor quis reparar e nos quais quis que o leitor se focasse.
    Neste contexto, O Meu Pé de Laranja Lima (1968) surge como um dos momentos mais altos da carreira literária do autor. Redigido numa fase de inquestionável maturidade artística, esta obra coloca em evidência as suas virtudes poéticas, naquela que é também uma viagem ao passado, num romance com um evidente cariz autobiográfico, posto desde logo em destaque pela escolha do nome do protagonista, Zezé, mais uma das múltiplas ocasiões em que a infância de José Mauro se projeta literariamente.
    A história desta criança de seis anos, personagem principal do enredo, criou um estrondoso impacto em leitores de todas as idades, facto que se mantém até aos dias de hoje, visto tratar-se de uma das obras mais lidas de sempre. De facto, continua a ser admirável o número de pessoas que, ao longo dos anos, vai afirmando que foi esta a sua primeira leitura significativa enquanto jovens, que foi esta a primeira vez que entenderam o valor emocional que um livro pode acarretar, que foi após a leitura desta obra que se tornaram verdadeiramente leitores.
    Em suma, José Mauro de Vasconcelos coloca nas suas obras as vivências quotidianas de um mundo contemporâneo que definitivamente tarda em revelar-se moderno e sofisticado para todos. A sua escrita expõe o seu apreço pela clarificação dos pensamentos e sentimentos das personagens a cada instante. Além dos papéis sociais, importa sobretudo a dimensão psicológica e a carga emotiva que cada pessoa traz consigo (nada melhor que uma criança para reparar com profundidade nos aspetos mais simples da existência). São esses cenários repletos de humanidade que privilegia e é precisamente esse lado pessoal que permite ao leitor ligar-se às vidas que vão surgindo página após página. Muitas das obras do autor estabelecem, inclusivamente, interessantes nexos de intertextualidade com outros romances e autores da época, como, por exemplo, a célebre história d’ Os Capitães da Areia, publicado em 1939, por Jorge Amado.”

Obras de José Mauro de Vasconcelos

. Banana Brava (1942)

. Barro Blanco (1945)

. Longe da Terra (1949)

. Arara Vermelha (1953)

. Arraia de Fogo (1955)

. Rosinha, Minha Canoa (1962)

. Doidão (1963)

. O Garanhão das Praias (1964)

. O Meu Pé de Laranja Lima (1968)

. Rua Descalça (1969)

. O Palácio Japonês (1969)

. Farinha Órfã (1970)

. Chuva Crioula (1972)

. O Veleiro de Cristal (1973)

. Vamos Aquecer o Sol (1974)


segunda-feira, 9 de junho de 2025

Biografia de José Mauro de Vasconcelos

    José Mauro de Vasconcelos nasceu em Bangu, no Rio de Janeiro, no dia 26 de fevereiro de 1920, no seio de uma família pobre, oriunda do Nordeste brasileiro e com raízes portuguesas (era filho de um imigrante lusitano). Viveu uma infância com parcos recursos, tendo ido viver aos 8 anos para casa de uns tios, na cidade de Natal, no Rio Grande do Norte. Os seus primeiros anos foram marcados, portanto, por um contexto socioeconómico desfavorável, um facto de que contribuiu para que tivesse um olhar bastante crítico sobre o mundo. A nova família educou-o com esmero, porém acabou por se aperceber de que era um «menino dado», o que deixou marcas no seu trabalho adulto como uma nostalgia de perda.
    Aos 9 anos, aprendeu a nadar e recordou, ao longo de toda a sua vida, com grande prazer, a época em que mergulhava nas águas do Rio Potengi para se preparar para competições de natação em que participava regularmente, tendo vencido diversas. O seu primeiro emprego sucedeu aos 16, 17 anos, como parceiro de treino de boxers peso-pena.
    A sua juventude foi agitada, nomeadamente após os anos de frequência da escola, marcada por um curso superior inacabado e incursões em áreas profissionais muito distintas (carregou bananas numa quinta em Mazomba, foi pescador, garimpeiro, pugilista, professor primário em Recife...). No curso ginasial, leu romances de Graciliano Ramos, Paulo Setúbal e José Lins do Rego.
    A frequência durante dois anos do curso de Medicina permitiu-lhe que se tornasse uma espécie de enfermeiro, enquanto viajava pelo interior profundo do Brasil. Por outro lado, serviu de modelo para o Monumento à Juventude Brasileira, uma estátua da autoria do escultor Bruno Giorgi, em 1941, que foi colocada nos jardins do Ministério da Educação, no Rio de Janeiro.
    À semelhança do que sucedeu com o escritor Lima Barreto, conviveu de perto com a loucura, dado que o pai adotivo era diretor de um hospício e aí teve oportunidade de ler livros de psiquiatria e conviveu com os loucos. Numa entrevista dada à revista “Manchete”, em 1973, declarou que talvez esse interesse o tenha conduzido à frequência do curso de Medicina.
    Depois de ter concluído os estudos secundários, José Mauro de Vasconcelos frequentou sucessivamente as faculdades de Medicina, Direito e Desenho e Filosofia, sem, contudo, ter concluído qualquer curso. Em 1952, beneficiando de uma bolsa de estudos, frequentou durante três dias a Universidade de Salamanca, em Espanha, saindo com o pretexto de que “tudo ali era muito chato”, facto que evidencia o seu empenho em dar prioridade às múltiplas experiências que se inscrevem no lado mais prático e emocional da sua vida, em detrimento de um saber académico que condicionasse a liberdade da sua imaginação. De Salamanca partiu para Madrid, Itália e França, a expensas próprias. Regressado ao Brasil, estabeleceu-se no Rio de Janeiro, cidade onde trabalhou como lutador de boxe, como referido anteriormente.
    Começou a escrever em 1940, tendo sido os romances de estreia – Banana Brava e Barro Blanco – bem recebidos pelos críticos literários, tendo chegado a ser comparado a Jack London. As experiências vividas foram criando a matéria-prima para as suas histórias. Com efeito, os traços realistas e autênticos das suas obras decorrem, de facto, do seu contacto com questões como a pobreza extrema, as desigualdades sociais, a mudança, a família, a morte e os sonhos. De facto, o conhecimento que foi adquirindo, sobretudo durante as suas viagens, a partir dos 20 anos, pelo Brasil e pela Europa, constituiu uma das principais bases da sua criação literária. Por exemplo, da sua primeira viagem à selva, durante a qual abriu mato a peito, morou com os índios e se aventurou no garimpo, nasceu a obra Banana Brava, um livro-experiência que lhe “custou a perna direita quebrada em três lugares”. No regresso da aventura, ao subir o rio Tocatins, trazia a obra pronta na cabeça, tendo-a escrito em 27 dias. Quando chegou a São Paulo, onde residia por favor na casa de uma tia, decidiu tratar da perna paralisada, por isso viajou para o Rio de Janeiro a fim de se tratar num hospital de indigentes, onde conheceu um grade dominicano que leu o livro e o levou para a Editora Agir.
    José Mauro de Vasconcelos, apesar das suas origens bem humildes, frequentou a alta sociedade paulista, aparecendo com frequência nas colunas sociais de Tavares de Miranda, da revista “O Cruzeiro”. Por outro lado, soube também valorizar as dedicatórias inscritas nos seus textos. Por exemplo, em O Meu Pé de Laranja Lima, faz uma oferta a Ciccillo, com a advertência “para os vivos” na edição original, e “para os que nunca morreram”, nas edições posteriores à morte do amigo, antes de mencionar os parentes já falecidos.
    José Mauro de Vasconcelos participou também no cinema nacional. Assim, em 1956, no romance Arara Vermelha foi adaptado e distribuído pela Columbia Pictures do Brasil, com Tom Payne na realização e Anselmo Duarte, Odete Lara, Milton Ribeiro, Hélio Santos e Ricardo Campos no elenco. Em 1961, estreou-se como ator no filme Mulheres e Milhões, tendo sido galardoado com o prémio Saci de melhor ator. Em 1962, participou em A Ilha, ao lado de grandes nomes, como Eva Vilma, Elizabeth Hartman ou Laura Verney.
    José Mauro de Vasconcelos faleceu em São Paulo, a 24 de junho de 1984, aos 64 anos, vítima de uma broncopneumonia.
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