* educação cuidada
* prendada (sabia tecer)
* "era bonita" –
"boca delicada e um tanto carnuda"
- "nariz tão perfeito (...) impessoal"
- "pés (...) bem feitos"
* confidente da mãe
* era a preferida da mãe
* mais mole do que Quina
* bem disposta e de natureza
honesta ("temperamento incorruptível")
* indolente e preguiçosa
("pousona")
* optava pelas tarefas que lhe
permitiam permanecer sentada
2. Retrato de Quina
. amizade, proteção e altruísmo
por Estina, apesar da desigualdade de tratamento da mãe
. combativa
. grande capacidade de
argumentação
. aparência e forma de estar
masculinas
. sentido de justiça, ainda que
tivesse de se alienar dos sentimentos
. independente (pp. 32-33)
. fisicamente
- "não era bonita"
- era pequena como o pai
. moralmente
– falas capciosas
- génio equilibrado
- mentirosa e chicaneira
- gostava de grandes relações
- não tolerava o que não conseguia obter
- acudia a todos os trabalhos agrícolas
- tinha fé nas artimanhas dos advogados
- pensava que podia sempre iludir a lei
- cultivava-se em coisas do foro
- fazia-se importuna
- corria de um juiz a um
influente e deste a um delegado
- desejava apressar a justiça
- comprava testemunhas
- impunha teorias
- desprezava os legistas que
não a favoreciam
- considerava letra morta os
seus artigos (pp. 36-37)
Em suma, Quina
era calamitosa e insuportável, frívola, trabalhadora, astuta, velhaca,
intriguista. Podemos mesmo considerá-la, a nível moral, maquiavélica, pois os fins
justificam os meios. Note-se que o seu retrato é o oposto do de Estina.
3. Retrato de
Maria da Encarnação
* Maria é a
expressão individualizada de uma sociedade matriarcal, onde a única função do
homem é a reprodução da espécie. Ela é uma espécie de força de compensação e a
garantia de continuidade da família, pelos cuidados que, atentamente, dedica
aos filhos e às condições económicas da casa: "(...) Maria, que era a
parte vigilante, a chama oculta sob a cinza do lar, mas fulcro de continuidade
e de calor, mereceu do destino uma irónica compensação, pois seria o seu nome
que se perpetuaria no único dos filhos que deixaria descendência. (...) Naquela
casa, donde o homem ficava ausente largos dias e onde o pulso dele parecia
indeciso ou sem vontade, sentia-se sobrecarregada com um grande fardo que
talvez a sua vida inteira fosse impotente para carregar." (pp. 33-34)
* Pelo seu
espírito pouco atento a fenómenos relacionados com a metafísica, passa e segue
alheia ao que vai além da simplicidade da vida quotidiana: "(...) Seria
com o nome dela que a casa da Vessada continuaria; mas isto, que apenas poderia
ter um significado romântico, ela, se o chegasse a compreender, não o poderia
apreciar, pois não passava, par si, dum facto circunscrito às coisas que tanto
desprezava ou que nem sequer pressentia." (p. 33)
* Não obstante
a frieza e o seu carácter estoico, Maria é possuidora de sentimentos nobres
que, com a exigência das situações, manifesta com espontaneidade. Preocupada
com a opinião pública, defende a sua imagem social de mulher moralmente
exemplar e despreza a humildade da redenção dos pecadores: "(...) E foi
Maria quem a socorreu e quem, furtando-se de ser vista (...). Se ela lhe
tivesse pedido perdão, experimentaria decerto mais constrangimento. Detestava o
impudor da humildade, (...)" (p. 35)
* Mostra-se
irrefletida e irracional quando se lhe apresentam grandes dificuldades:
"(...) Esquecia a razão, e arruinava-se prazenteiramente até ao último
ceitil; até ao último momento esperava vencer e recuperar tudo, e, se lhe
explicavam miudamente as impossibilidades desse resultado, não
compreendia." (p. 36)
* A veneração
que Maria tem pelo marido, aumentada após a morte deste, leva-a a querer dar
proteção e abrigo ao filho de Francisco e de Isidra: "(...) O seu
bastardo, filho de Isidra, era recebido com honras, numa aliança grave,
profunda, ao facho patriarcal que continuava a velar as gerações que se
desdobravam." (p. 39)
4. Noção de
propriedade e de casamento
Há um grande
sentido de defesa da propriedade privada, de posse: "Entretanto, a casa
viu-se envolvida numa dessas querelas, história terrível, de águas de justiça,
e que o povo parece tomar como um derivativo do vício do jogo. Maria, e logo
depois Quina, litigavam como se jogassem." (p. 36)
É a ideia da
defesa incondicional dos direitos de propriedade, entendida como herança
sagrada a transmitir ao herdeiro seguinte.
Por seu lado, o
casamento é visto como forma de enriquecimento e em que o amor é secundário e
até supérfluo: "(...) E o homem que ela amava desistira do casamento,
medida esta tida por demais natural entre o povo do campo, para quem o
casamento é mais do que o imperativo da espécie - é a união de dois
patrimónios.
- As mulheres
só gostam de tratantes - dizia ela, como se anunciasse um teorema de
geometria." (p. 39)
Dois episódios
exemplificam esta conceção: o casamento de Estina com Luís Romão desfaz-se por
falta de património, de dote, da parte dela; o mesmo acontece com Quina e Adão,
que, juntamente com o avô, representam o tipo dos agiotas, profundamente
gananciosos e materialistas.
5. Espaço
social
É evidente a
crítica à emigração de cidadãos portugueses para o Brasil que, contrariamente
às promessas de riqueza associadas a este país, promove, em muitos casos, a
penúria e as doenças mortais, mesmo em jovens de tenra idade: "Um deles,
Abílio, morreu ao passar apenas a adolescência, de regresso já duma tentativa
de fortuna no Brasil." (p. 33)
"O exemplo
dessa fortuna resolveu a ida de Abílio para o Brasil. Tinha pouco mais de treze
anos, era loiro e muito bonito. Voltou ainda antes da morte do pai, para
acabar, esgotado de suores, emborcando frascos de xaropes vários, de agriões,
de caracóis e de cenoura." (p. 38)
Além deste aspeto,
o Brasil simboliza a causa da existência de uma burguesia ostensiva e
prepotente proveniente das camadas sociais campesinas que passam, no seu novo
estado, a renegar as origens: "O filho mais velho de Narcisa Soqueira -
ela tinha dum segundo casamento uma enteada e um outro filho - voltara do
Brasil, rico, com faíscas de brilhantes a despedirem dos dedos e das
abotoaduras todas, com zaragatices de bordados nos coletes, muito pachá,
querendo café - moca, dizia - ao dejejum e fazendo olhos redondos para as coisas
do campo." (p. 37)
De facto, esta
personagem representa os emigrantes bem-sucedidos materialmente que gostam da
ostentação e o seu comportamento denota artificialismo, ideia já aflorada nas
páginas 25 e 26 quando são focadas as personagens do tio José e do conde de
Monteros.
6. A visão
negativa dos homens e a sociedade matriarcal
Os homens são
apresentados como seres negativos, marialvas e aventureiros, desbaratadores de
fortunas: "Mas todos eles eram muito do pai: volúveis, fracos com aduladores
e com mulheres, moralmente a tender para a cobardia das
responsabilidades...".
"Começavam
a fazer-se visíveis os resultados da fanfarronice estroina de Francisco
Teixeira. O desequilíbrio doméstico tomava, com o tempo, uma feição mais grave.
Os gastos do amo, o seu profundo desleixo das terras, obrigavam agora a família
a uma estrita temperança."
"Naquela
casa, donde o homem ficava ausente largos dias...".
Este
comportamento de Francisco, fazendo da casa apenas pousada e da esposa apenas
reprodutora da espécie, a mãe dos seus filhos legítimos, irá ter consequência
negativas na personalidade de Quina (aversão aos homens, como fonte de ruína
económica da família).
Destes factos
resulta a conceção matriarcal da sociedade, o exercício dum poder matriarcal,
onde a mulher detém o poder e responsabilidades administrativas e económicas.
Todavia, a
figura do pai não era contestada. Essa contestação restringia-se à consciência
de cada personagem: "Nestas contendas, que não passavam nunca de uma
reserva orgulhosa entre marido e mulher, não era permitido aos filhos tomar
partido. A própria Maria castigava com mão expedita aquele que esboçasse uma
crítica contra o pai. E, contudo, todos sabiam que era por culpa da sua boémia
(...) que a sua casa se afundava."
7. Morte de Francisco
Teixeira
A sua morte,
muito chorada pela família, ocorreu num momento crítico, em que estava iminente
a perda da própria Vessada. O facto de, com a sua morte, ainda ser possível
evitar a mutilação completa do património familiar contribui para que, apesar
de tudo, Francisco ficasse, para sempre, como o chefe querido e respeitado da
família (pp. 38-39). De facto, a sua morte marca uma promessa de riqueza para a
sua família e constitui a única alternativa para esta se libertar da situação
precária e das ameaças judiciais da perda da Vessada.
8. A
fragmentação do tempo
O tempo do
discurso é predominantemente fragmentado nestes capítulos iniciais. O discurso
vai seguindo, ao longo de todo o romance, um movimento de vai-e-vem, sem regras
estabelecidas, facto este compreensível, se lembrarmos que a recuperação do
passado cabe a Germa, que conversa com Bernardo.
Observem-se as
constantes analepses e prolepses, as elipses, os sumários, as pausas.
Em suma, o
tempo é descontínuo, desordenado, isto é, o narrador (des)organiza o tempo
cronológico através dos processos referidos no parágrafo anterior.
9.
Narrador/narradora: voz omnipotente e omnipresente
Germa é a
personagem que tem a seu cargo fazer a longa retrospetiva da vida da família.
Ela é, portanto, a narradora (homodiegética), mas é frequentemente substituída
por um narrador omnisciente, ou seja, que sabe mais do que as personagens e se
desloca facilmente no espaço e no tempo.
Este narrador
omnisciente manifesta-se também como omnipotente, conduzindo a narrativa à sua
maneira, fragmentando a ordem cronológica, recorrendo à analepse e à prolepse,
dirigindo-se ao leitor num estilo familiar, fazendo constantes digressões.
9.1.
A opção por narrar em vez de mostrar
A obra
aparece-nos como um conjunto de histórias que se vão acumulando, narradas por
alguém que só diz delas o que quer e quando quer. Daí o facto de muitas delas
serem interrompidas para serem retomadas posteriormente. A própria
caracterização de Quina vai sendo feita à medida que a ação, o tempo e as
condições avançam e se transformam. O narrador dá saltos no tempo, utiliza o
resumo, não se preocupa com uma estruturação sólida da intriga, o importante é
o narrar e a atenção ao pormenor.
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