Português: Resultados da pesquisa para d. joão iii
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sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

Vida de Manuel de Sousa Coutinho

Antes de ser frade, chamava-se Manuel de Sousa Coutinho, nascido em Santarém cerca de 1555. Cavaleiro da Ordem Militar de Malta, Manuel de Sousa foi aprisionado por piratas e esteve algum tempo cativo em Argel (1576-77?), onde teria conhecido outro cativo ilustre, Cervantes. Por volta de 1584-86, de regresso a Portugal depois de dois anos passados em Valência, casou com D. Madalena de Vilhena, viúva de D. João de Portugal, desaparecido com D. Sebastião em Alcácer Quibir. Em 1599, foi nomeado capitão-mor de Almada. Em 1600, lançou fogo a uma das suas casas, para impedir que ali se hospedassem os governadores do Reino em nome do rei Filipe de Espanha, fugidos da peste que grassava em Lisboa. A causa do incêndio assenta em razões pessoais e não em hostilidade ao rei castelhano, de quem até recebera, em 1592, uma recompensa de 200$000.
Em 1613, quando já lhes falecera a única filha, Manuel e D. Madalena seguiram o exemplo recente dos Condes de Vimioso, professando ambos, ele no convento de S. Domingos de Benfica e ela no convento, dominicano também, do Sacramento. Sobre esta sua decisão de professar, entre várias opiniões que corriam, o primeiro biógrafo de Frei Luís de Sousa, Frei António da Encarnação, elegeu a seguinte e pouco verosímil versão: um peregrino trouxera a nova inesperada de que D. João de Portugal, desaparecido trinta e cinco anos atrás, vivia ainda na Terra Santa; assim, a vida em comum de Manuel e D. Madalena tornara-se impossível, pois este segundo casamento era nulo e insustentável. Foi esta versão que constituiu o ponto de partida do Frei Luís de Sousa.
No convento, levou uma vida austera e dedicou-se à escrita, tendo desempenhado também a função de enfermeiro – ele que fora guarda-mor da Saúde de Lisboa. Da sua pena saiu a obra Vida de Frei Bartolomeu dos Mártires, arcebispo de Braga. Ainda se dedicou à ordenação e redação da História de S. Domingos particular do Reino e Conquistas de Portugal, um conjunto de monografias sobre os conventos dominicanos do país. Finalmente, escreveu por incumbência de Filipe III uns Anais de D. João III, publicados por Alexandre Herculano em 1844. Consta que terá escrito ainda outras obras, que se perderam.
Faleceu em 1632.

sábado, 30 de novembro de 2019

Análise da Cena IV do Ato I de Frei Luís de Sousa

Caracterização das personagens (a partir das cenas III e IV)

a. Maria:
. sebastianista fervorosa e nacionalista, crê que D. Sebastião está vivo e vai regressar;
. é uma espécie de porta-voz da sabedoria popular: “Voz do povo, voz de Deus”;
. lê muito (novelas de cavalaria e romances populares);
. manifesta interesse por temas impróprios para a sua idade: romances populares sobre D. Sebastião e a batalha de Alcácer Quibir;
. sofre ao observar o sofrimento da mãe, que não compreende;
. é bondosa, carinhosa e terna com a mãe;
. muito precoce, possui uma imaginação e curiosidade pouco próprias da sua idade: “Maria, que tu hás de estar sempre a imaginar nessas coisas que são tão pouco para a tua idade”;
. pensa muito (“passo noites inteiras em claro a lidar nisto”; “a pensar em tudo”): Maria passa as noites em claro, a rever as suas atitudes e as dos pais, para tentar descobrir as razões da sua preocupação, por considerar que há algo que não lhe é revelado;
. tem sonhos estranhos, em cuja interpretação revela poderes de profecia: lê nos olhos e nas estrelas;
. é muito intuitiva;
. é alegre, mas sente-se subitamente invadida por grande tristeza (“uma tristeza muito grande que eu tenho”): essa tristeza está relacionada com a constante preocupação dos pais com ela; o seu poder intuitivo e de observação permitem-lhe perceber a preocupação dos pais com a sua saúde e crenças; quando pergunta à mãe por que razão o pai não tinha permanecido na Ordem de Malta e deixara o hábito, parece expressar o desejo de que o pai nunca o tivesse feito, o que corresponderia à sua inexistência; ela compreende que há algo que lhe escondem;
. é visionária e muito sensível: “não quero sonhar, que me faz ver coisas lindas às vezes, mas tão extraordinárias e confusas…”;
. possui um conhecimento íntimo de si própria que escapa aos familiares: “O que eu sou… só eu o sei, minha mãe… E não sei, não: não sei nada, senão que o que devia ser não sou…”;
. é corajosa, de personalidade forte, destemida e idealista, dotado de caráter varonil, revelado no desejo de ter um irmão e de resistência aos governadores: “um galhardo e valente mancebo capaz de comandar os terços de meu pai”; “Tomara eu ver seja o que for que se pareça com uma batalha!”;
. insurge-se contra as injustiças sociais: “Coitado do povo!”; “… onde a miséria fosse mais e o perigo maior, para atender com remédios e amparo aos necessitados (cena V);
. Frei Jorge chama-lhe Teodora, nome que significa sábia (cena V);
. é idealista e patriota, manifestando toda a sua vontade de resistir aos governadores: “Fechamos-lhes as portas. Metemos a nossa gente dentro e defendemo-nos.” (cena VI);
. fica entusiasmada com a notícia trazida pelo pai, dando largas à sua imaginação, ao seu idealismo e ao seu patriotismo;
. sofre de tuberculose, a doença dos românticos – sintomas:
- a febre
- as mãos a queimar
- as rosetas nas facetas
- a audição a grandes distâncias (cena VI)
modelo da heroína romântica:
. ideais de liberdade
. exaltação de valores de feição popular
. crença na independência nacional
. atração pelo mistério
. intuição
. doença da época (tuberculose)
. linguagem:

NOTAS:
1.ª) A doença de Maria favorece ao longo da obra a sua extraordinária fantasia e a morte no final.
2.ª) Maria tem duas atitudes contrastantes: uma de crítica, outra de afeto para com sua mãe. A alteração deve-se à observação do aspeto doloroso da sua mãe.

b. D. Madalena:
. sofre (chora) com as palavras de Maria;
. evidencia uma grande tensão psicológica, agravada pela menção inconsciente de Maria a aspetos que a aterrorizam;
. manifesta grande preocupação perante a precocidade da filha.

c. Telmo Pais:
. tem uma presença silenciosa, mas identifica-se com os ideais de Maria;
. contribui para o clima de opressão;
. aparenta resignação e convencimento;
. manifesta preocupação com a debilidade de Maria.


Características da tragédia

Agón de D. Madalena:
- com Maria: para esta, há um enigma que nem a mãe, nem o pai, nem mesmo Telmo se prontificam a decifrar; são segredos e mistérios intuitivamente pressentidos que não consegue desvendar:
. a razão por que nem a mãe nem o pai, apesar do seu patriotismo (“… que ele não é por D. Filipe, não é, não?”) acreditavam no regresso de D. Sebastião;
. a razão por que, quando em tal se falava, o pai mudava de semblante, e a mãe se afligia e até chorava;
- com D. João de Portugal, nas reações de aflição, sublinhadas pelas lágrimas, sempre que Maria se refere à crença popular da sobrevivência e possível regresso de D. Sebastião – cena III.

Agón de Maria:
- com D. Madalena:
. a propósito da sobrevivência e do regresso de D. Sebastião (cena III) – D. Madalena não acredita, nem lhe convém acreditar nem uma coisa nem outra. Maria acredita firmemente;
. desconfia que a mãe oculta alguma coisa muito importante; por isso, está sempre atenta, a observar os sobressaltos, a ansiedade da mãe a seu respeito; por isso, lê nas palavras, nas ações e nos gestos da mãe (e do pai), à procura de indícios, de respostas para a sua curiosidade (cena IV);
. não pode cumprir as esperanças nela depositadas (cena IV);
. por isso, desejaria ter um irmão (cena IV);
- com Manuel de Sousa:
. duvida do patriotismo do pai (cena III), por causa das atitudes que ele toma, ao ouvir falar de D. Sebastião: “Ó minha mãe, pois ele não é por D. Filipe, não é, não?”;
. a hipótese não tem fundamento.
NOTA:
Este conflito de Maria com os pais, pois ambos não aceitam ouvir falar do regresso de D. Sebastião, tem razões óbvias: se o monarca não morreu, também não terá morrido D. João de Portugal; o segundo casamento de D. Madalena seria nulo.
- com D. João de Portugal (antes da mudança de palácio – cena IV):
. pressente intuitivamente que alguém, fazendo sofrer a mãe, também não a deixa ser feliz;
. por isso, procura uma resposta, com os meios ao seu dispor: “… leio… nas estrelas do céu também, e sei cousas…”; “… não quero sonhar, que me faz ver coisas… lindas às vezes, mas tão extraordinárias e confusas”.
NOTA:
É da essência do drama provocar situações e sentimentos incompatíveis no interior das personagens:
. Maria não consegue explicar a perturbação dos pais;
. D. Madalena não pode revelar a causa das suas preocupações, o que se passa no foro da sua consciência.

▪ D. Madalena parece caída nas garras de um destino inexorável: a última fala de Maria da cena IV lança nela a dúvida se teria valido a pena ter casado uma segunda vez.

▪ A constatação de algo misterioso que paira sobre a ação e as personagens.

Presságios:
. as flores murchas e os sonhos deixam antever a tragédia com que encerra a obra: a morte progressiva de Maria (ela colheu papoilas para pôr debaixo do travesseiro, por estas estarem associadas ao sono e ao sonho, acreditando que, assim, terá uma noite descansada; no entanto, as flores, que representam, entre outras coisas, a beleza efémera, murcharam rapidamente, indiciando a proximidade da morte;
. a contemplação do retrato do pai remete para a intuição do malogro do casamento dos pais.


Características românticas

▪ O sebastianismo de Telmo e Maria.

▪ O nacionalismo e patriotismo de Maria, visível na resistência aos governadores castelhanos.

▪ Linguagem: exclamações, interrogações, reticências, frases curtas, adequação ao íntimo e ao estado de espírito das personagens, etc.

▪ Caracterização de Maria:
. o modelo da mulher-anjo;
. os ideais de liberdade;
. exaltação de valores de feição popular;
. atração pelo mistério;
. intuição;
. tuberculose, a doença dos românticos.

▪ Crenças: agouros, superstições, sonhos, visões de Madalena, Telmo e Maria (cenas II e IV).



terça-feira, 9 de abril de 2019

Vida de Sá de Miranda

            Filho de um cónego de Coimbra de cepa fidalga, Francisco de Sá de Miranda nasceu nesta cidade, em 1481(?). Estudou Gramática, Retórica e Humanidades na Escola de Santa Cruz e frequentou depois a Universidade, ao tempo estabelecida em Lisboa, onde fez o curso de Leis, passando de aluno aplicado a professor considerado.
            Frequentou nessa altura a Corte, datando-se de então a sua amizade com Bernardim Ribeiro. Para o Paço, compôs cantigas, vilancetes e esparsas, ao gosto dos poetas do século XV.
            Tendo-lhe falecido o pai, empreendeu, em 1521, uma viagem a Itália. Graças a uma suposta parente abastada, Vitória Colona, marquesa de Pescara e amiga de Miguel Ângelo, teve o ensejo de conhecer e conviver com algumas personalidades do Renascimento italiano – Bembo, Sannazzaro, Sadoletto, Ariosto –, apreciando muito a estética literária que todos os humanistas cultivavam com entusiasmo.
            No regresso a Portugal, em 1526, de passagem por Espanha, terá conhecido os poetas em voga, Boscán e Garcilaso, afadigados em introduzir a estética clássica no seu país.
            Em 1627, lançou-se na composição de uma comédia em prosa, à imitação de Plauto, Os Estrangeiros, numa época em que Gil Vicente estava no auge da sua actividade e prestígio. A Fábula do Mondego, a écloga Alexo e alguns sonetos são talvez as primeiras expressões portuguesas conhecidas do novo estilo.
            Casado antes de maio de 1530 com D. Briolanja de Azevedo, da melhor fidalguia minhota, beneficiou da Comenda das Duas Igrejas, que o rei lhe concedeu. É na Quinta das Duas Igrejas, junto ao rio Neiva, que compõe quase toda a sua obra, em novos moldes, por influência da estética italiana.
            O resto da sua vida passou-a na Quinta da Tapada, entregue ao amanho da terra e ao cultivo das letras, alheado da corte, mas mantendo convivência epistolar com uma roda de admiradores, entre eles Pêro de Andrade Caminha, D. Francisco de Sá de Meneses, D. Manuel de Portugal e mais tarde Diogo Bernardes, Jorge de Montemor e António Ferreira. Aí lhe chegaram os pedidos insistentes da Corte, sobretudo do príncipe D. João, pai de D. Sebastião, para que lhe enviasse as suas composições, o que o levou a refundi-las.
            Os últimos anos foram amargurados por vários lutos: primeiro, a morte do filho em 1553; depois, a do príncipe D. João, a da sua mulher e a de D. João III.
            Muito atento ao que se passava no seu país, as últimas composições estão repletas de comentários sociais e moralistas, bem amargos e pessimistas.
            Sabe-se que em maio de 1558 ainda era vivo, mas já então bastante enfermo, e deve ter falecido pouco depois.
            Nos séculos XVI e XVII foi o poeta mais admirado depois de Luís de Camões. A consagração do novo estilo em Portugal ficou a dever-se em grande parte a Sá de Miranda, secundado por uma plêiade de discípulos.
            Todavia, a consagração das suas inovações teve de vencer grandes resistências, de que se queixou, mas foi animado nessa campanha pelos jovens admiradores e pelo conhecimento da obra de Garcilaso.


A. J. Saraiva & Óscar Lopes, História da Literatura Portuguesa

sábado, 19 de janeiro de 2013

A Contra-Reforma e a união com a Espanha

         Cerca de 1550 ocorreram alguns acontecimentos decisivos, que coincidem com a crise geral então vivida. Em 1547, é definitivamente estabelecida a Inquisição em Portugal, após esforços que datavam de 1531. Naquele mesmo, ano sai o primeiro rol de livros proibidos, sucessivamente acrescentado em 1551, 1561, 1564, 1581, 1624. Em 1550, o grupo de professores trazido a Portugal por André de Gouveia (já falecido em 1548) é posto à margem após um processo movido por inimigos do Colégio. Em 1555, o rei entrega este colégio, rebatizado como Colégio das Artes, à Companhia de Jesus, que domina os Estudos Menores (hoje diríamos secundários) em Lisboa e Évora, e que no mesmo ano funda uma universidade sua nesta última cidade. A partir de 1557, ano da morte de D. João III, a principal personagem do reino é o cardeal-infante D. Henrique, inquisidor-geral, que alterna a regência com a rainha-viúva. Em 1564, as decisões do Concílio de Trento são promulgadas em Portugal sem restrições, caso único entre os reinos da Europa Ocidental. Desde cerca de 1550, foram silenciados mesmo os mais estrénuos erasmistas, como André de Resende, Damião de Góis e Diogo de Teive, e por 1580 está extinta a geração dos letrados e gramáticos antiescolásticos que tinham campeado por altura das grandes reformas escolares do início do reinado de D. João III.
         Entre os autores proibidos ou amputados pela Censura contam-se Gil Vicente, Bernardim Ribeiro, Sá de Miranda, João de Barros, Jorge Ferreira de Vasconcelos, Jorge de Montemor, António Ferreira. Nenhum livro podia sair, na segunda metade do século XVI, sem três licenças: a do Santo Ofício, a do Ordinário eclesiástico na diocese respetiva e a do Paço. O relator do Santo Ofício examinava o livro em manuscrito e obrigava o autor a alterá-lo, amputá-lo ou acrescentá-lo, antes de lhe conceder a fórmula «nada contém contra a nossa Santa Fé e bons costumes». E, assim, desde a segunda metade do século XVI até à reforma pombalina da censura, não podemos afirmar que conhecemos o texto original de uma obra impressa, mas somente um texto ao qual os censores anuíram. A impressão, a venda, a herança e a entrada de livros vindos do estrangeiro estavam sujeitas a apertada vigilância, incluindo inspeções domiciliárias, declarações periódicas obrigatórias e as mais graves penalidades, com recompensa de denúncias secretas à custa dos bens confiscados.
         Aos efeitos da Contra-Reforma vieram juntar-se, a partir de 1581, os da união com Espanha. Do primeiro resultou murcharem as promessas do Humanismo. O segundo teve como consequência o desaparecimento da corte de Lisboa, o foco literário mais estimulante do País. Os homens de letras e artistas, que até então viviam sobretudo da munificência régia, procuraram a proteção da corte de Madrid, ou acolheram-se ao mecenato das maiores casas senhoriais, como as dos condes de Vila Real e dos duques de Bragança. Outros viveram à sombra das ordens religiosas a que pertenciam, tratando uma temática predominantemente devota. O teatro, o grande género das cortes monárquicas do século XVII, decaiu após as criações de Gil Vicente e António Ferreira. Na lírica e na épica, os padrões renascentistas mal se renovaram. Na prosa, o primeiro plano da cena é ocupado pelos cronistas das diversas ordens religiosas, quer se ocupem da história do Reino, quer da dos conventos e santos respetivos. Tirante os discípulos dos quinhentistas refugiados em várias «cortes na aldeia», o clero reforça a posição predominante na produção literária.
         A Universidade de Coimbra é dominada pelos Jesuítas, embora as outras principais ordens religiosas tenham acesso às suas cátedras. Durante o século XVII atinge o seu apogeu a «escola conimbricense», que é uma tentativa para adaptar a Escolástica e o Aristóteles dos Escolásticos à problemática mais recente. A universidade jesuíta de Évora é outro foco importante de Teologia escolástica.
         O ensino universitário jesuíta, de início razoavelmente actualizado e eficiente, decai à medida que se aproxima e avança o século XVII, convertendo-se os tratados universitários em manuais, e estes em postilas sem autoria responsável, equivalente às sebentas no nosso tempo.
         Além do ensino universitário, os Jesuítas dominam, em geral, com os seus colégios de Artes, os Estudos Menores, ou preparatórios, em toda a extensão do império da Casa da Áustria, através de numerosas escolas onde se educam tanto a aristocracia de sangue como a burguesia. Nesses colégios, entre os quais se destacam o Colégio das Artes de Coimbra e o de Santo Antão de Lisboa, além de noções de Matemáticas e Geometria necessárias à construção ou manobra naval, à vida militar, etc., ministra-se principalmente uma cultura geral que, embora adoptando as formas da erudição humanística, era escolástica na sua inspiração mais profunda. A Ratio Studiorum, regulamento pedagógico de todas as escolas jesuítas (1599), tem em vista desenvolver a expressão oral e escrita em latim, a capacidade de disputa e de exibição literária em público, através de sabatinas, concursos de emulação escolar, récitas, representações teatrais, proscrevendo expressamente todo o magistério ou prática escolar que favoreça a curiosidade intelectual, o gosto da novidade, o espírito crítico. Aristóteles, base de todo o ensino, deve ser interpretado segundo os comentadores consagrados, especialmente S. Tomás.
         Diferentemente do que sucede em Espanha, o papel cultural das outras ordens religiosas é em Portugal, nesta época, modesto em comparação com o dos Jesuítas. Devem-se no entanto aos Cistercienses de Alcobaça, aos Dominicanos, aos Franciscanos e a outros, numerosas hagiografias, histórias monásticas, histórias nacionais, que constituem o grosso da produção impressa em língua portuguesa no século XVI.
         Convém ter bem presente que sob o governo dos Filipes são, mais do que nunca, bilingues não só os autores como o público português. Significativo é que o Quijote de Cervantes tenha duas edições em Lisboa no próprio ano da sua primeira edição; e que a primeira edição do Guzmán de Alfarache, 2.ª parte, de Mateo Alemán, seja igualmente lisboeta. Esboça-se desta forma uma tendência a dar ao castelhano, língua geral da Península, preponderância no teatro e nos géneros de grande circulação, como o romance, ficando o português reduzido à condição de língua regional. Tendência passageira, resultante da ausência de uma corte régia em Lisboa, e que pode ter contribuído para a decadência ou falta de continuidade do romance e do teatro em língua portuguesa.

A. J. Saraiva, Óscar Lopes, História da Literatura Portuguesa (adaptado)

domingo, 27 de novembro de 2011

Pathos

. De D. Madalena:
     - os terrores que se sente desde a cena I;
     - o sofrimento por causa do adultério;
     - o sofrimento pela incerteza da sorte do primeiro marido;
     - o sofrimento violento pela volta do primeiro marido;
     - o sofrimento cruel após conhecer a existência do primeiro marido (vivo):
          . pela perda do marido;
          . pela perda de Maria.

. De Manuel de Sousa Coutinho:
     - sofre a angústia pela situação presente e futura da filha (III, 1);
     - sofre a angústia pela situação da sua esposa (III, 8).

. De D. João de Portugal:
     - sofre o esquecimento a que foi votado;
     - sofre pelo casamento de sua mulher e pela família que constituiu;
     - sofre por não poder travar a marcha do destino (III, 2).

. De Maria de Noronha:
     - sofre fisicamente, acossada pela tuberculose;
     - sofre psicologicamente:
          . não obtém resposta a muitos agouros;
          . sofre a vergonha da ilegitimidade.

. De Telmo Pais:
      - sofre pela dúvida constante que o assalta acerca da morte de D. João de
         Portugal;
      - sofre, hesitando entre a fidelidade a D. João e a Manuel de Sousa;
      - sofre a situação de Maria.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

Retrato de D. João de Portugal

▪ Nobre: família dos Vimiosos (I, 2).
▪ Cavaleiro: combate com o seu rei (D. Sebastião) em Alcácer Quibir.
▪ Evoca o nome bíblico de João, o apóstolo de Jesus Cristo.
▪ Ama a Pátria e o seu Rei.
▪ Representante da época de ouro portuguesa.
▪ Imagem da Pátria cativa.
▪ Ligado à lenda de D. Sebastião.
▪ Nos dois atos iniciais, é uma personagem abstrata: existe somente nos pensamentos de D. Madalena, Maria e Telmo (e até de Manuel de Sousa Coutinho e Frei Jorge); torna-se uma personagem concreta no ato III na figura de romeiro.
▪ Personagem simbólica: espécie de personificação da fatalidade, do Destino que vai precipitar o desenlace trágico.
▪ No final da obra, ninguém se compadece dele como marido ultrajado, mas das outras personagens.
O Romeiro apresenta-se como um peregrino, mas é o próprio D. João de Portugal. Os vinte anos de cativeiro transformaram-no e já nem a mulher o reconhece. D. João, de espectro invisível na imaginação das personagens, vai lentamente adquirindo contornos até se tornar na figura do Romeiro que se identifica como Ninguém. O seu fantasma paira sobre a felicidade daquele lar como uma ameaça trágica. E o sonho torna-se realidade.

sábado, 20 de fevereiro de 2021

Análise da Dedicatória de Os Lusíadas

 
A Dedicatória não era um elemento obrigatório do género épico. Camões, contudo, faz questão de dedicar o poema a D. Sebastião, o rei que então governava Portugal e que o Poeta vê como garante da continuidade da grandeza de Portugal (dilatação da Fé do Império).

 
 
Estrutura interna
 
                A Dedicatória segue a estrutura típica do género oratório.

 
Exórdio (est. 6 a 8) – O Poeta dirige-se a D. Sebastião declarando-o:

- o enviado providencial para assegurar a independência de Portugal, continuando a sua grandeza através da dilatação da Fé e do Império (est. 6);

- o descendente de uma dinastia mais importante do que as mais importantes da Europa;

- o detentor de um império imenso e o baluarte contra os seus inimigos, os ismaelitas e os turcos.

 
▪ A transmissão da mensagem da 1.ª parte assente nos seguintes recursos estilísticos:

- o uso da segunda pessoa do plural «vós»;

- a utilização de apóstrofes e perífrases:

. “… ó bem nascida segurança, / Da lusitana antiga liberdade, / E não menos certíssima esperança / De aumento da pequena Cristandade…”;

. “… ó novo temor da maura lança, / Maravilha fatal da nossa idade…”;

- a metáfora: “Tenro e novo ramo” (I, 7, v. 1) – descendente muito jovem;

- a sinédoque:

. “maura lança” (I, 6, v. 5) – o exército dos mouros;

. “Do torpe Ismaelita” (I, 8, v. 6) – os mouros, descentes de Ismael, filho de Abraão e Agar, daí também o nome “agarenos”;

. “Do Turco oriental e do Gentio” (I, 8, v. 7) – os bárbaros, os infiéis

 
Exposição (est. 9 a 11) – O Poeta, recorrendo a verbos no imperativo (“inclinai”, “ponde”, “ouvi”), pede ao rei que atente na obra que, desinteressada e patrioticamente, elaborou e lhe dedica, na qual verá retratados os grandes feitos dos portugueses, reais e não fingidos, bem superiores aos narrados nas antigas epopeias (esses sim “façanhas, / Fantásticas, fingidas, mentirosas” – Orlando Enamorado, Orlando Furioso, Chanson de Roland), de tal forma que o rei se pode julgar mais feliz como rei de tal gente do que como rei do mundo inteiro.

 
▪ Da mensagem transmitida pelo Poeta a D. Sebastião, conclui-se que Os Lusíadas são fonte de glória tanto para Camões como para D. Sebastião. Por exemplo, nos primeiros quatro versos da estância 10, Camões afirma que foi levado a escrever a obra não pelo desejo de um prémio vil / material, mas de um prémio “alto e quase eterno”. Esse prémio é a fama de grande poeta entre os portugueses (“ser conhecido por um pregão do ninho meu paterno”). A obra é também fonte de glória para D. Sebastião, quando Camões afirma que aquele, ao ler nela os grandes feitos dos portugueses, poderá julgar que é melhor ser rei dos portugueses do que do mundo todo.

 
Confirmação (est. 12 a 14) – Camões concretiza o que disse anteriormente, contrapondo a cada herói antigo um herói português (est. 12 e 13), e elogia os mais conhecidos vice-reis da Índia e todos os que, pelos feitos cometidos “nos Reinos lá da Aurora” (Oriente), atingiram a imortalidade.

 
▪ A nível estilístico, é de salientar o recurso aos seguintes recursos:

- perífrase: “E aquele que a seu Reino a segurança / Deixou…” (I, 13 – vv. 5-6) – D. João I;

- hipérbole, prosopopeia e sinédoque: “… por quem sempre o Tejo chora” (I, 14 – v. 6).

 
Peroração (est. 15-17) – O Poeta elogia o novo rei (“Sublime Rei”) e incita-o a continuar a guerra contra os Mouros, na terra e no mar, na África e no Oriente, prevendo para ele tais vitórias que encherão de júbilo as almas dos seus avós (D. João III e Carlos V), ao verem as suas glórias renovadas.

 
Conclusão (est. 18) – Camões remova o pedido inicial de aceitação da sua obra (“novo atrevimento”), em que o Rei poderá observar a forma como os navegadores venceram os mares e imaginá-los como Argonautas e o que poderão vir a fazer sob o seu impulso.

 
 
NOTAS

 
1. Podemos concluir então que, nestas treze estâncias, o vocativo e a frequência do modo imperativo centrados na pessoa do destinatário (o rei D. Sebastião) condicionam o predomínio da função apelativa, sem dúvida a mais adequada à realização do principal desejo do emissor: a oferta dos seus préstimos para cantar os heróis do seu povo, isto é, que o jovem soberano aceite o seu canto heroico do “peito ilustre lusitano” como um contributo para a glória da Pátria e como um estímulo para, sob o seu impulso, novos grandes feitos virem a ser cometidos.

 
2. Por outro lado, novamente estabelece a comparação (a partir da estância 11) entre os Portugueses e os heróis da Antiguidade, com o objetivo de enaltecer e engrandecer os feitos lusos.

 
3. Também na estância 18 se pode constatar que a obra é fonte de glória para o poeta e para D. Sebastião, quando Camões imagina o rei a ver no seu poema os novos argonautas, como se fossem já os seus. Esta estância, assim como a última d’ Os Lusíadas (IX, 156), pressagiam uma grande glória para D. Sebastião e uma nova grande epopeia para cantar os seus feitos.

 
4. Nota-se uma estreita ligação entre o conteúdo das estâncias 11 a 14 e o conteúdo da Proposição. Com efeito, Camões afirma, nas três primeiras estâncias da obra, que os feitos dos portugueses suplantam os dos maiores heróis da Antiguidade (“Cesse tudo o que a musa antiga canta, / Que outro poder mais alto se alevanta”); também nas estâncias 11 a 14 da Dedicatória considera que os feitos dos lusitanos suplantam as antigas, ainda que fossem verdadeiras, contrapondo a cada herói antigo um herói português.

 
5. D. Sebastião é visto como monarca poderoso, como representante do povo predestinado pelo Fado ao cometimento de grandes feitos, num império já imenso, mas que ele acrescentaria ainda, dilatando a Fé e o Império.

      O louvor de D. Sebastião está, portanto, em ser apresentado como um jovem rei de quem o povo português tudo espera, rei que a providência faz surgir para retomar a grandeza dos feitos portugueses. A ideia do jovem rei como salvador da pátria reflete a crise em que a nação já se encontrava, mas estava tão arreigada no povo que não desapareceu da sua alma nem com a morte do rei. O sebastianismo é precisamente isso: a imagem de um rei fatalmente destinado a ser salvador de uma nação em crise.

 

sábado, 7 de setembro de 2019

Romeu e Julieta

I. Biografia de Shakespeare


II. Contexto

     A. Histórico

          1. Político

               1.1. O reinado de Isabel I (1558-1603)

               1.2. O reinado de Jaime I

          2. Religioso

               2.1. A Reforma

               2.2. A Bíblia inglesa

               2.3. A crença protestante

               2.4. Os católicos

               2.5. Os puritanos

          3. Teatral

               3.1. O teatro de Shakespeare

               3.2. A presença na corte

               3.3. Atores

               3.4. Fecho e censura

          4. Literário

               4.1. Contemporâneos

               4.2. Fontes

               4.3. Influências

     B. Social

          1. As mulheres na Inglaterra de Shakespeare

          2. As mulheres na obra de Shakespeare

          3. Os judeus na Inglaterra de Shakespeare

          4. Os mouros na Inglaterra de Shakespeare

          5. Shakespeare e o sexo

               5.1. A sexualidade na Inglaterra de Shakespeare

               5.2. A sexualidade nas peças de Shakespeare

               5.3. A sexualidade de Shakespeare e os Sonetos

               5.4. O sexo na escrita de Shakespeare

III. Obras

IV. Romeu e Julieta

     1. Ação

          1.1. Resumo

          1.2. Resumo em vídeo

          1.3. Análise do enredo

          1.5. Cinco questões-chave
                    1.ª) Romeu e Julieta têm relações sexuais?
                    2.ª) Julieta é demasiado jovem para se casar?
                    3.ª) Quem é Rosalina?
                    4.ª) Por que razão Mercúcio luta contra Tebaldo?
                    5.ª) Como é que Romeu convence o relutante farmacêutico
                           a vender-lhe veneno?

          1.6. Significado do final da peça

          1.7. Cenas

               . Prólogo
               . Cena I, Ato I
               . Cena II, Ato I
               . Cena III, Ato I
               . Cena IV, Ato I
               . Cena V, Ato I
               . Prólogo do Ato II
               . Cena I, Ato II
               . Cena II, Ato II
               . Cena III, Ato II
               . Cena IV, Ato II
               . Cena V, Ato II
               . Cena VI, Ato II
               . Cena I, Ato III
               . Cena II, Ato III
               . Cena III, Ato III
               . Cena IV, Ato III
               . Cena V, Ato III
               . Cena I, Ato IV
               . Cena II, Ato IV
               . Cena III, Ato IV
               . Cena IV e V, Ato IV
               . Cenas I e II do Ato V
               . Cena III, Ato V

     2. Personagens

          2.1. Caracterização

               a) Romeu
               b) Julieta
               c) Frei Lourenço
               d) Mercúcio
               e) Enfermeira
               f) Tebaldo
               g) Capuleto
               h) Lady Capuleto
               i) Montecchio
               j) Lady Montecchio
               k) Páris
               l) Benvólio
               m) Príncipe Della-Scala
               n) Frei João
               o) Baltasar
               p) Sansão e Gregório
               q) Abraão
               r) Farmacêutico
               s) Pedro
               t) Rosalina
               u) Coro

          2.2. Papel

               a) Protagonistas
               b) Antagonistas

     3. Espaço e Tempo

     4. Temas

          a) A força do amor
          b) O amor como causa de violência
          c) O indivíduo versus a sociedade
          d) O destino
          e) O amor
          f) O sexo
          g) A violência
          h) A juventude

     5. Símbolos

          a) Veneno
          b) Morder o polegar
          c) Rainha Mab
       
     6. Estilo

     7. Tom

     8. Motivos

     9. Classificação

     10. Ponto de vista

     11. Presságios

     12. Romeu e Julieta estão, realmente, apaixonados?

     13. Questionários

          a) Questionário global sobre a obra
              Correção
          b) Questionários por cenas:
               . Cena 1, Ato I
               . Correção
               . Cena 2, Ato I
               . Correção
               . Cena 3, Ato I
               . Correção
               . Cena 4, Ato I
               . Correção
               . Cena 5, Ato I
               . Correção
               . Prólogo e Cena 1, Ato II
               . Correção
´              . Cenas 2 e 3, Ato II
               . Correção
               . Cenas 4 e 5, Ato II
               . Correção
               . Cena 1, Ato III
               . Correção
               . Cenas 2 a 4, Ato III
               . Correção
               . Cena 5, Ato III
               . Correção
               . Cenas 3 e 4, Ato IV
               . Correção
               . Cenas 1 e 2, Ato V
               . Correção
               . Cena 3, Ato V
               . Correção
          c) Personagens
              Correção
          d)

     14.


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