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segunda-feira, 12 de setembro de 2022

Análise de Macunaíma, de Mário de Andrade


     É a ideia de «olhar com olhos livres» que vamos encontrar nesta obra, não só ao nível do assunto, de caráter quotidiano, mas também no uso de palavras simples; as palavras eruditas têm um uso ridículo.
    Esta convivência do bacharelismo é que vai dar a ideia de herói «sem caráter», o que não significa mau caráter; «sem caráter» tem o sentido de incaracterístico: não é índio, europeu ou negro, não é bacharel nem iletrado, mas a confluência de tudo isto.
    Tudo começa no nome: Macunaíma não é um nome propriamente brasileiro, mas sul-americano.
    Nesta obra, já não se nota a influência futurista, como nos textos de Oswald de Andrade: foi escrita em 1928, quando já tinham corrido seis anos após a realização da Semana de Arte Moderna. Já tinha decorrido também, em 1926, o Encontro Regionalista do Recife, que pretendia afirmar a brasilidade.
    Mário de Andrade escreve este texto como uma espécie de rapsódia, uma mistura de vários elementos, o que vem reforçar a ideia de herói sem caráter; é uma rapsódia de várias lendas brasileiras ou não.
    Na base da composição do romance está o fragmento, que se nota em dois níveis: ao nível temático e ao nível da descontinuidade narrativa. Em Macunaíma, não há uma sequência na ação, embora haja um fio condutor: a busca da Muiraquitã. O herói varia de espaço com incrível facilidade; ora quer uma coisa, ora quer outra; ora luta, ora deixa de lutar; ora "brinca", ora sente preguiça, etc. Isto ajuda a conceber Macunaíma igualmente como ser fragmentário: ora é corajoso, ora é covarde; ora é trabalhador, ora preguiçoso. Não tem um caráter definido, nem a nível moral, nem a nível físico (nasce preto, torna-se branco, mas tem características de índio).
    Em suma, é um herói incaracterístico e neste aspeto vamos encontrar um lado muito nacional e muito universal.

    Algumas características universais de Macunaíma são as seguintes:

        a) Tal como Galaaz, Macunaíma revela uma grande capacidade de deslocação rápida. É a característica do maravilhoso universal que se encontra também nas lendas (ex.: "Gato das Botas").

        b) Outra característica de Macunaíma, que é comum às narrativas de cavalaria, é a reversibilidade, capacidade de transformação.

        c) Outra característica partilhada por Galaaz e Macunaíma é a excecionalidade, a sobre-humanidade.

        d) O anacronismo é outra característica, também da lenda: não se subscreve a um tempo.

        e) Outro aspeto que caracteriza Macunaíma é o facto de ser um herói do povo, ser o ídolo das massas e não de uma elite (universalidade).

    O romance também tem características sul-americanas:

        a) O nome: Macunaíma.

        b) Certas lendas.

    A obra manifesta ainda dados de brasilidade:

        a) O caráter de miscelânea da obra faz-se sentir no próprio aspeto físico do herói: nasce preto, torna-se branco e tem características de índio.

        b) É raquítico, situação típica de fome, tão abundante no Brasil na época.

        c) Miscigenação cultural e religiosa: a religião de Macunaíma é uma religião de fachada, feita por imitação. Aqui faz-se uma crítica não só à literatura, mas à própria maneira de ser brasileira, que imita as coisas sem as interiorizar.

        d) É típico do brasileiro viver ao sabor do acaso, a sua falta de persistência.

        e) A luxúria: Macunaíma vive para "brincar".

        f) Caracterização típica do brasileiro: Macunaíma, por exemplo, quer trabalhar mas não sozinho, não tem persistência.

        g) Individualismo: é típico do brasileiro fazer o que quer sem pensar nas consequências sociais. Nota-se a falta de espírito coletivo.

        h) Macunaíma não se preocupa com os outros e faz o que lhe apetece, mesmo no momento mais inoportuno.

    Apesar de ser um livro «muito brasileiro», contém uma caricatura, uma crítica à maneira de ser brasileira. Não analisa o brasileiro do ponto de vista europeu, mas brasileiro. A obra contém uma forte crítica ao falso brilho: as personagens, quando se cansam, transformam-se em estrelas e o brilho alcançado é falso, alcançado sem esforço. É uma censura aos estilos anteriores, uma crítica ao artista ornamental (ex.: parnasiano); uma censura aos exageros sexuais e à linguagem balofa).

    Macunaíma nasce "no fundo do mato virgem", o que faz supor que era índio; mas, pelo contrário, era "preto retinto". Podia ser filho de índio, mas ter saído preto: caráter mestiço de Macunaíma.
    Ele é caracterizado como herói lendário (nasceu num momento de silêncio); é dotado de excecionalidade ("Já na meninice fez coisas de sarapantar"), mas também de uma grande preguiça, que vai caracterizar o povo brasileiro.
    No romance, temos um nítido dado do Modernismo brasileiro: o herói não é o índio como em Alencar, nem o negro como em Castro Alves, nem o branco, mas o herói mestiço. Tempos, por isso, uma linguagem igualmente mestiça: termos de origem tupi não para enfeitar, mas para afirmar a brasilidade; convivência do tupi com o português ("dandava para ganhar vintém"). Além de preguiçoso, Macunaíma gostava muito de "brincar".
    O facto de o herói respeitar os velhos e frequentar as danças religiosas da tribo caracterizam-no como índio. À dança vão-se juntando outros aspetos que corroboram o facto de ele gostar do ornamental. Ele gosta do brilho inútil que critica nas "cartas pra icamiabas". Ele é o símbolo do brasileiro na sua complexidade paradoxal. As suas contradições são resultado da mestiçagem.
    Até aos seis anos, Macunaíma não falou; depois passou a falar de repente e por um facto excecional. Outro tópico do Modernismo é o uso de uma linguagem do dia a dia, onde convivem o português literário com o popular ou vulgar. Está dentro daquilo que o Manifesto Pau Brasil chama "convivência de todos os erros".
    A natureza em Macunaíma não é idealizada como em Iracema, mas também participa dos sentimentos do herói como a jandaia. É uma natureza brejeira, que gosta de brincadeira. Há apenas a constatação de uma beleza natural.
    A nível linguístico, notamos um certo conservadorismo, mais comum no português do Brasil que no português de Portugal (ex.: "avoando").
    Desde pequeno, Macunaíma é visto como luxurioso, como tendo a capacidade de se transformar. Este facto vai repetir-se algumas vezes ao longo do capítulo, mas a repetição dos factos faz parte da estruturação lendária de Macunaíma; a repetição tem uma função fática na lenda.
    Temos um outro tipo de transformação em relação aos pássaros, que se transformam em pedra com o berreiro do herói.

    No capítulo II, temos o aproveitamento de várias lendas indígenas.
    Convém ainda referir o facto de ele matar a mãe e nada lhe acontecer (lenda americana), indício da falta de padrão, dado da brasilidade, o que não quer dizer falta de moral. Macunaíma vai ter um padrão de branco, pois aprecia as coisas da civilização, o que mostra uma colagem de elementos da selva e elementos da civilização.
    A transformação não é apenas apanágio de Macunaíma, mas no fim acontece com todas as personagens da história, ele é o "herói da nossa gente". Isto está bem patente na cena da lagoa, onde a personagem fica branca, ao contrário dos irmãos.
    Há uma tentativa de procurar um herói índio e nisto existe uma espécie de aceitação do olhar do branco sobre o negro, que sempre valorizou o índio. O padre António Vieira pedia aos negros que trabalhassem, pois os índios eram muito fraquinhos.

    A "Carta pras Icamiabas" é um elemento importante do romance. Se toda a obra realiza as propostas da Semana de Arte Moderna, valorizando o que há de brasileiro em termos temáticos e linguísticos, esta carta pode considerar-se uma espécie de antimanifesto; uma manifesto do que não se quer que aconteça. Toda a carta é uma grande paródia, não só da linguagem parnasiana, mas de toda a literatura anterior.
    Ao contrário de toda a obra, onde temos um discurso na 3.ª pessoa, aqui é Macunaíma que tem voz. O narrador do romance usa sempre uma linguagem moderna, em que convivem todos os erros; Macunaíma, que é o protótipo do herói brasileiro, vai usar uma linguagem que critica no resto do romance.
    Logo no início, "As mui queridas súbditas nossas, Senhoras Amazonas", critica o caráter de imitação do brasileiro, porque, ao invés de olhar para as icamiabas como icamiabas que são, as vê como as amazonas do mito clássico, marca claramente parnasiana. Usa a ironia para desmascarar a realidade brasileira.
    Macunaíma critica ainda abertamente as reflexões filosóficas de fim de século, quando fala da muiraquitã, palavra de origem indígena e que os sábios discutem por causa da grafia. O absurdo está em discutir a grafia de uma palavra que não se destinava a ser grafada. Tudo o que Macunaíma faz é colocar a ridículo a situação urbana, numa constante oposição entre floresta e escola.
    Ao usar expressões latinas como "sub tegmine faci", tece mais uma crítica ao Parnasianismo e, neste caso, a Bilac, que tem um poema em torno desta expressão. A correspondente brasileira é "ficar à sombra da bananeira". Macunaíma usa o brilho inútil da linguagem parnasiana.
    Ao dizer "Assim a palavra miraquitã, que fere já os ouvidos latinos do vosso Imperador..." mostra que já está imbuído de elementos da civilização. O Frei Luís de Sousa aqui referido não é a personagem da peça de Garrett, mas a personalidade verdadeiramente existente, um classicista do século XVI. Aqui é apontado como exemplo da linguagem clássica. Rui Barbosa foi não só um defensor da pátria, mas também um sábio que falava todas as línguas, como diz a lenda. Era um clássico da língua portuguesa, um cultor do português, que segue os padrões de Portugal e não do português importado, onde convivem "todos os erros", como querem os modernistas. É o símbolo do conservadorismo de valores culturais e nacionais. O seu conservadorismo está bem patente na crítica à citação, exemplo do brilho inútil.
    Ao falar de Freud, brinca com o saber de fim de século das descobertas psicanalistas. Mas será que está a aludir ao cientificismo do fim de século ou por aqui passa uma alusão já presente no Manifesto Pau Brasil em relação aos estilos de época anteriores? No Manifesto, afirma-se que quadro que não tivesse carneiro com lã virgem não prestava, uma clara crítica ao Realismo/Naturalismo, estilos vigentes na prosa, quando na poesia tínhamos o Parnasianismo.
    Por outro lado, tece uma crítica feroz à ancestralidade, pretendida nobre, das famílias brasileiras, à semelhança do que fizera Gregório de Matos em relação aos Caramurus da Baía. Aqui, Macunaíma critica os Cavalcantis de Pernambuco, que advogam ser descendentes de italianos (florentinos).
    Em vez de muiraquitã, usa agora uma palavra clássica, "velocino roubado", a que se referem a Medeia e os Argonautas. Toda a paródia se estrutura na linguagem clássica. Usa expressões clássicas para criticar não só o Parnasianismo, mas toda a importação de poesia que foi feita no Brasil até ao Modernismo. A paródia resulta ainda do uso da segunda pessoa do plural, que no Brasil é algo absurdo, bem como do uso da inversão ("Imperator vosso").
    A "Carta pras Icamiabas" mostra Macunaíma como um ser mestiço, biológica e culturalmente. É a junção de um comportamento civilizado com um selvagem.

    Na parte XVII, "Ursa Maior", Macunaíma, agora cansado e doente, vive sozinho, só acompanhado pelos papagaios, que se transformavam em periquitos para irem roubar o milho aos ingleses.
    Temos ainda uma postura de Macunaíma, que é uma postura típica do brasileiro: gosto pelo brilho inútil, como comportamento importado (pelo Parnasianismo), mas também assumido por ele. Até ao Modernismo, toda a literatura brasileira fora de importação: começou no Barroco e foi até ao Parnasianismo. O grande símbolo do brilho inútil será a última transformação de Macunaíma, que, não tendo conseguido os seus intentos, se transforma em estrela.
    Este capítulo tem ainda outra recusa do que é importado: troca-se o saber do cientista alemão pelo saber popular. A ideia do cientista dizer que a Ursa Maior tem relação com o saci mostra o engano da investigação de quem é de fora. Mas o facto de se referir a Ursa Maior, que tem uma configuração que lembra o Brasil, mostra que Macunaíma é o símbolo do brasileiro.
    Além da junção de elementos da civilização com elementos da selva ("com todo o estenderete dele, galo galinha gaiola revolver relógio numa constelação"), que mostra o perfil de Macunaíma, temos também a recuperação de lendas nacionais com uso de uma linguagem popular. Macunaíma aponta para muitas ideias do Manifesto Pau Brasil: "Bárbaro e nosso"; "contribuição de todos os erros".

    Como elementos modernistas temos:
        👉 crítica à importação: ninguém mais conhece as lendas pátrias;
        👉 recurso ao lendário nacional, aos elementos da selva, à linguagem universal.
    O caráter de inverosimilhança do romance tem um objetivo: não é dar-lhe um tom mítico, porque o mito é algo que não aceita discussão, mas um tom mitológico, porque gira em torno de lendas. Só é um mito na medida em que explica as lendas, mas afasta-se dele por causa da crítica ao brasileiro e à importação.
    Macunaíma é um herói doente, que vive rodeado de saúva; é o símbolo que usa a feitiçaria, que vive rodeado, mas não pensa nela. É um herói que tanto usa as coisas da civilização, como as renega. As atitudes paradoxais da personagem têm, no romance, um sentido crítico.
    O romance, embora difícil de entender, insere-se perfeitamente no ideário do Modernismo; embora pareça desestruturado, tem uma estrutura lógica interna: impossibilidade de ver o Brasil com olhos de fora.

Análise do poema "O Capoeira", de Oswald de Andrade


  
– Qué apanhá sordado?
– O quê?
– Qué apanhá?
Pernas e cabeças na calçada.
 
            Este poema de Oswald de Andrade traz para a poesia um facto quotidiano: nos quatro versos, o «eu» poético sugere um confronto entre um capoeirista e um soldado. Esse confronto sucede, porque o capoeirista provoca o soldado (“Qué apanhá sordado?”) e o chama para a luta.
            Durante muito tempo, os capoeiristas foram vistos de forma preconceituosa, isto é, como arruaceiros, e muitas vezes eram presos por praticar a sua arte. No caso desta composição, o «eu» propõe uma inversão: em vez de o capoeirista ser vítima da arbitrariedade da polícia, é ele quem provoca o soldado.
            O último verso indicia a concretização da luta: o capoeirista investe contra o soldado, derruba-o, provavelmente com um golpe de capoeira. Note-se que o conflito é descrito à maneira cubista, isto é, em partes, como um mosaico de imagens.
            O registo de língua predominante no diálogo é o popular: “qué”, “apanhá”, “sordado”, vocábulos repetidos anaforicamente no terceiro verso, à exceção do último. Qual é o objetivo do poeta ao colocar na boca do capoeirista a linguagem popular? Deste modo, ele reproduz a fala de um indivíduo simplório, uma linguagem dinâmica que traduz a visão da briga, semelhante à capoeira. No último verso, chave de ouro do texto, terminado o diálogo, a sintaxe está correta, isto é, de acordo com a norma gramatical.
            O diálogo e a linguagem quotidiana são características do Modernismo. Temos então a anulação das fronteiras que encontramos no Manifesto. Outra coisa que é típica do Modernismo, mas principalmente de Oswald de Andrade, é a ideia de progresso, de rapidez; é a poesia feita rapidamente. Por outro lado, no poema está presente a visão da literatura nacionalista, fundamentada nas características naturais do povo brasileiro.

Análise do poema "Canto do regresso", de Oswald de Andrade


             Este poema foi escrito por Oswald de Andrade em 1924, quando o poeta regressou ao Brasil após a sua estadia na Europa, e publicado pela primeira vez na revista “Pau Brasil”, aparecendo posteriormente no livro homónimo, de 1925.

            Por outro lado, a composição constitui uma paródia de “Canção do Exílio”, da autoria de Gonçalves Dias, de 1843, uma paródia forte e profundamente crítica contra a alienação social, marcada pelo humor. Dito de outra forma, estamos perante um diálogo entre um modernista do século XX (Oswald de Andrade) e um romântico do século XIX (Gonçalves Dias). O poema deste último, de cariz romântico, foi publicado na obra Primeiros Cantos, de 1857, e apresenta um sujeito lírico que, distante da sua terra natal, expressa a saudade da sua pátria através da lembrança da fauna e da flora características do Brasil. O título é diferente; possuem praticamente as mesmas palavras, mas, em vez de idealizar, ele exagera. Além disso, ambos os textos abordam o nacionalismo ao citarem a saudade da terra natal, paisagens brasileiras e riquezas do país.

            A intenção de Oswald de Andrade ao parodiar o poema de Gonçalves Dias passa por romper com as estruturas do passado, fazer uma revisão crítica histórico e cultural e evidenciar uma nova identidade brasileira, tudo características do Modernismo.

            O tema da composição prende-se com o nacionalismo, outro traço modernista, mas, apesar disso, o poema não deixa de evidenciar os aspetos negativos que fizeram parte da história brasileira ao mencionar o termo «palmares», que constitui uma alusão ao Quilombo dos Palmares, símbolo da resistência à escravidão. De facto, ao referir-se-lhes, em vez de «palmeiras», faz uma alusão a Zumbi dos Palmares, um escravo fugido, símbolo da abolição, configurando, pois, uma referência crítica à escravidão no Brasil. De forma sintética, a referida substituição vocabular não foi aleatória, visto que «palmares” se refere ao local de resistência em que os negros escravizados se refugiavam, liderados por Zumbi dos Palmares. Assim sendo, este poema aponta para algo que é ignorado na poesia de Gonçalves Dias: o período da escravatura, que marca a identidade nacional (do Brasil). Por outro lado, quando o poeta usa o diminutivo «passarinhos», em vez de «aves», usado por Gonçalves Dias, rompe com a estética do Romantismo, uma forma de aproximar a linguagem da forma mais simples e livre possível, característica do Modernismo.

            Oswald de Andrade joga, logo nos versos iniciais, com os advérbios de lugar «aqui»/«lá», que sugere a distância espacial que separa o «eu» da sua terra, sendo que, no caso deste poema, a sua saudade é delimitada a São Paulo, à Rua 15, ao progresso de São Paulo. Ainda na primeira estrofe regista-se a quebra do canto do sabiá, na palmeira. A “terra” do «eu» “tem palmares”, onde quem gorjeia é o mar, facto geograficamente correto. No terceiro verso, o sujeito poético refere o canto dos passarinhos, desvinculando-os do espaço-referência da canção matriz (o sabiá a cantar na palmeira).

            A segunda estrofe gira em torno de uma ideia nacionalista, visto que o «eu» relaciona as virtudes da sua terra (“mais rosas, mais ouro, mais terra”).

            A terceira estrofe é uma sequência que confirma a ideia da anterior e nela o sujeito poético dirige uma súplica a Deus: que não o deixe morrer sem voltar à sua terra (“Não permita Deus que eu morra / Sem que volte para lá”). O último verso desta estrofe é retomado / repetido no primeiro da quarta e, no seguinte, em sequência, o «eu» especifica e delimita o «lá»: “Não permita Deus que eu morra / Sem que volte para lá”. Assim, a sua terra é São Paulo e o que lhe causa saudade é a Rua 15 (“Sem que veja a Rua 15”), símbolo do progresso e da pujança económica do Estado.

            Este poema expressa a saudade da sua terra, mas de modo menos idealizado do que os românticos faziam, já que, por exemplo, os elementos naturais, muitos valorizados pelos poetas românticos, como as “rosas” e os “passarinhos”, são referidos ao lado de elementos característicos do século XX, época em que esta composição foi dada à estampa, como a referência ao “progresso de São Paulo”, a qual sugere a ideia de um país que se industrializava. Por outro lado, São Paulo sintetiza toda a pátria brasileira.

            Outro traço modernista presente no poema prende-se com o uso da forma reduzida da preposição «para» no antepenúltimo do verso do poema, muito comum na oralidade e que se afasta da norma gramatical, em razão de os modernistas subvertem os padrões gramaticais com o intuito de aproximar a literatura da oralidade do português do Brasil.

Análise do "Manifesto Antropófago", de Oswald de Andrade


             O Manifesto Antropófago (ou Manifesto Antropofágico) foi escrito por Oswald de Andrade e publicado na primeira edição da Revista de Antropofagia, lançada em 1928, constituindo o principal texto do movimento modernista brasileiro.

            Este manifesto tem como vertentes a recusa da importação literária e a ideia de uma poesia e literatura realmente brasileiras: “olhar com olhos livres” foi a ideia que ficou como grande marca, pois significa que não se deve seguir nenhuma escola, mas usar as coisas como elas são. De facto, antes a cultura brasileira em geral limitava-se a reproduzir o que era feito no estrangeiro; agora, este texto clama aos artistas brasileiros por originalidade e criatividade, pretendendo celebrar o multiculturalismo, a miscigenação.

            A intenção passava por não negar a cultura estrangeira, mas absorvê-la, processá-la e misturá-la com os elementos da cultura brasileira, visando a promoção de uma independência cultural, a partir da intertextualidade e do beber em diversas fontes.

            O manifesto foi buscar a designação ao grego «Anthropos» (antropo), termo que significava “homem” e que está na origem de múltiplas palavras da língua portuguesa (antropologia, antropólogo, etc.). Por seu turno, “fagia” (fago) advém do grego «phagein», que queria dizer “comer”. Assim sendo, “antropófago” remete para a ideia de canibalismo, que, no manifesto, ganha um sentido simbólico e metafórico. Logo no início, o autor afirma o seguinte: “Só a antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente.” Ora, estas frases sintetizam a ideia central do documento. Já no título encontrávamos uma palavra que remetia para o mesmo campo semântico. Neste caso, a ideia é a de que a cultura brasileira deve «comer», «deglutir» a cultura do «outro» (estrangeira) e incorporá-la na brasileira, expandindo-se para outros setores: social, económico e filosófico. Por outro lado, estamos na presença de outro dado simbólico: o canibalismo do índio tinha como objetivo incorporar as características positivas da sua vítima.

            Em sentido semelhante vai a apropriação adulterada de um extrato de Hamlet, peça de Shakespeare (“To be or not to be”): «Tupi, or not tupi that is the question». Trata-se de intertextualidade, da apropriação da cultura de outro povo para a adaptar à realidade local. Por outro lado, estamos na presença de uma forma de homenagem ao autor britânico e um gesto de criatividade ao proceder-se à reinterpretação de uma frase clássica.

            Por outro lado, o termo «manifesto» remete para uma “declaração pública em que se expõem os motivos que levaram à prática de certos atos que interessam a uma comunidade” ou para um “texto programático de uma escola literária ou de um movimento literário” (in Infopédia). Assim sendo, a escrita de um manifesto possui um viés político e ideológico e visa a persuasão.

            A ideia do manifesto surgiu quando Tarsila do Amaral, casada com Oswald de Andrade, lhe deu como presente de aniversário o quadro “Abaporu” (aba = homem; poru = que come), pintado em 1928. Ao ver a pintura, o poeta Raul Bopp questionou Oswald: “Vamos fazer um movimento em torno desse quadro?”


domingo, 11 de setembro de 2022

Análise do Manifesto modernista brasileiro


     O Manifesto é escrito de uma forma parodística. A paródia é uma composição paralela, podendo ser corrosiva ou não. Pode, então, ser só mera paráfrase ou corrosiva; normalmente, teve o sentido corrosivo. É o que acontece aqui.
    O primeiro poema que vai abrir o Manifesto Pau-Brasil intitula-se "escapulário". Foi escrito em minúsculas, porque os autores não pretendiam valorizar coisa alguma; apenas igualar. O poema é o seguinte:
                No Pão de Açúcar
                De cada dia
                Dai-nos senhor
                A Poesia
                De cada dia.
    Escapulário é um saco com algo bento para proteger o seu usuário. O texto reitera o título, pedindo proteção. Em vez da poesia ser elaborada, ela já está pronta. A paródia é evidentemente ao Pai Nosso, escapulário e à religião. O Modernismo entra nesse tipo de paródia para mostrar que a poesia está em tudo.
    O primeiro nome do Brasil foi Ilha de Vera Cruz; nasce, portanto, sob o signo da religião católica. Os autores iniciais da literatura brasileira mostram a sua preocupação em salvar as almas e no lucro da terra. Temos a associação entre a fé e o império.
    O Pão de Açúcar é um tipo de forma de montanha da idade terciária. O escapulário dá a ideia de proteção. A ideia de usar a paródia serve para mostrar que a poesia está em tudo e não vem do trabalho de elaboração nem de exploração.
    As correntes anteriores baseavam-se na elaboração no trabalho. A grande crítica que tecem é dirigida ao Parnasianismo: veem este movimento como uma importação descabida.

            Análise do Manifesto

    1. Não vai atrás se coisas elevadas. Em nenhum momento procura coisas poéticas; vai acabar com a distinção entre factos poéticos e não poéticos, palavra poética e palavra não poética.
    Também é evidente o gosto pela cor forte ("acre", "verde", "azul"), que vai ser acatado também pelo Cubismo, que defende a geometria da forma.
    O Modernismo brasileiro vão aceitar a mestiçagem. Na poesia barroca, temos a recusa da ancestralidade da mestiçagem indígena. Temos também uma crítica à componente negra do Brasil. Por seu lado, no Romantismo valoriza-se o índio, mas não é colocado em papéis principais. O Parnasianismo não fala nela. Cruz e Sousa, casado com uma negra, quando fala dela, é como se a visse como uma deusa.
    Aqui as coisas são aceites como elas são. O Carnaval é uma festa, tão importante como qualquer outra festa religiosa, apesar de pagã.
    Temos também a desvalorização da música de elite: "Wagner submerge ante os cordões do Botafogo".
    O Pau-Brasil é constituído por uma mistura de tudo, aceitando a miscigenação, Apagam-se as fronteiras entre a fé e o pagão, entre música de composição erudita e a popular: vatapá / o ouro / dança - coisas díspares.
    N.B.
        - Rompe as fronteiras entre arte e não arte.
        - Usa elementos considerados poéticos e não poéticos.
        - Vale-se da paródia.

    2. Nesta parte, começa a falar de um aspeto importante da cultura do Brasil.
    Rui Barbosa, autor da viragem do século, foi um grande orador baiano: defendeu o Brasil na questão das fronteiras, nos tribunais de Haia na Holanda, conseguindo ganhar a causa. O mito que o rodeia fez dele um homem mais inteligente do que o que é na realidade.
    É um representante daquela linha de Parnasianismo/Positivismo que inspira a Academia Brasileira de Letras.

    3. Alusão à saudade de Coimbra. A ideia que a poesia do Brasil vem sempre da Europa, tinha de ser importada.

    4. Alusão à especialização.

    5. Crítica às correntes anteriores. O teatro é algo mais popular; a invenção e a imaginação pertencem a uma visão algo romântica.

    6. O Modernismo inspira-se mesmo na "língua sem arcaísmos, sem erudição. Natural e neo- / lógica. A contribuição milionária de todos os erros. / Como falamos. Como somos."

    7. Critica a advocacia: desde a colonização que temos estudantes de Direito; a primeira faculdade criada foi precisamente a de Direito.

    8. "Houve um fenómeno de democratização estética nas cinco partes sábias do mundo". A obra de arte única cai por terra e todas as pessoas podem ser artistas.
    A escultura como obra única também cai por terra: "Só não se inventou uma máquina de fazer versos - já havia o poeta parnasiano." Temos a paródia dos parnasianos.
    Fica a ideia de que o progresso faz cair a ideia da obra de arte única.

O Modernismo no Brasil


     Como reação à poesia de viragem do século XIX (Simbolismo, Parnasianismo...), vai aparecer, já em pleno século XX, um movimento que teve os seus antecedentes, mas cujo marco foi uma semana de três dias: a "Semana de Arte Moderna", que decorreu nos dias 20, 21 e 22 de fevereiro de 1922, no Teatro Municipal de São Paulo.
    Porquê São Paulo? É que, no final do século, houve um facto que provocou uma grande alteração na economia brasileira: a abolição da escravatura e a consequente falta de mão de obra nas grandes fazendas. Isto fez surgir a necessidade de importar mão de obra barata e estrangeira. Esta imigração tem várias precedências: Portugal (temos como exemplo de emigrantes portugueses o bem sucedido representado por Miranda, o razoavelmente sucedido - Romão, e o que tenta ganhar o pão do dia a dia, de que são exemplo Jerónimo e Piedade); Itália e Alemanha, depois da guerra. Esta imigração vai trazer o desenvolvimento económico de S. Paulo e o consequente desenvolvimento cultural.
    Mas a Semana de Arte Moderna congrega também artistas do Rio de Janeiro e vai projetar-se noutros estados, que não apenas São Paulo.
    Os modernistas eram vistos como pessoas doidas; na Semana de Arte Moderna, recusaram com fundamento as estéticas anteriores, aludindo que eram importadas. As estéticas podem ser construtivistas e não construtivistas. As primeiras são aquelas que dizem como deve ser a nova estética; as segundas só dizem como não deve ser. O Futurismo e o Cubismo são movimentos construtivistas.
    O movimento Dada, que teve origem em Berlim no início do século XX, não deixa coisas escritas, porque não é construtivista. As suas ideias consistem em acabar com toda a perenidade da arte; assim, insurgem-se contra os museus, porque estes são vistos como elementos de consagração.
    As suas primeiras exposições de arte plástica continham objetos que não eram dignos de serem expostos: esta era uma forma de dizer que cada um consagra aquilo que quer. Criam uma forma de arte designada «ready-made» - já pronto. Passou-se do conceito de arte elaborada para o já feito; a poesia é o que se diz a qualquer momento.
    Este movimento teve por chefe Tzvetan Tzara. A palavra «dada» tem várias interpretações: não quer dizer coisa nenhuma; cavalo. Ao que parece, não queria dizer nada. Quando os elementos que pertencem a este movimento tentaram escrever algo, o «Dada» desapareceu porque ele pretendia a desconstrução.
    O Futurismo tenta consagrar o progresso, a máquina, o movimento, etc. É isto que vamos encontrar no movimento Pau-Brasil e nos poemas de Oswald de Andrade. Este movimento também tem o seu lado Dada, porque rompe com as correntes anteriores. Tem como objetivo voltar às origens do Brasil.

HM Queen Elizabeth II (VIII)


Ruben Oppenheimer

 

Análise do poema "Crê"


    O uso do soneto serve para o desenvolvimento racional do tema, mas serve também para sugerir. O «crê» é uma exortação, um incentivo que já estava presente no poema anterior. O clima de exortação vai conferir ao poema um tom de idealização, que é próprio do Romantismo, usando uma forma do Parnasianismo. É um poema herdeiro do idealismo romântico: "Toda a alma necessita / De uma esfera de cânticos, bendita, / Para andar crendo e para andar gemendo!" Assim, neste poema temos ideias e tópicos de escolas diferentes: a exortação remete-nos para o idealismo romântico; o partir do particular para o genérico é uma técnica parnasiana e a ideia de transcendência aproxima-o do Simbolismo.
    A ideia de transcendência também aparece em Antero, mas neste o alcance do «êxtase bendito» é feito por uma depuração do espírito; é muito racionalista, ao contrário de Cruz e Sousa, que é mais emocional: é a dor que transcendentaliza. Há quase um certo gozo na dor.
    O último terceto envolve o poema num certo clima etéreo, clima este que nos vai ser proporcionado pelo Simbolismo.

sábado, 10 de setembro de 2022

Análise do poema "Acrobata da dor"


     Este poema está mais próximo do Parnasianismo. O tema - o contraste entre o interior e o exterior - é desenvolvido de forma racional, sem apelo à sugestão. É um soneto com todos os requisitos que esta forma impõe:
        . colocação
        . desenvolvimento
        . síntese do tema
    O tema fala da superação da dor pelo palhaço, designado por quatro diferentes: "palhaço", "clown", "gravoche" e "acrobata da dor".
    Enquanto o Parnasianismo preferia paisagens físicas, aqui temos alguém que fala do sentimento de um palhaço, mas mascarado pelo riso. Há um distanciamento do «eu» lírico. Esta forma racional de abordar o tema é já parnasiana.
    Mas quem é o palhaço? O palhaço é o coração: "Ri! coração, tristíssimo palhaço." Ao usar a terceira pessoa, há um distanciamento relativamente ao objeto: o coração pode ser o dele ou o de outro qualquer.
    Esta forma de abordar o interior sem cair no lirismo derramado do Romantismo, mas abordando-o de forma racionalista é o que vamos encontrar em Antero de Quental, que procurou um Romantismo racionalista. Ora, também o soneto era uma forma cara a Antero, que foi apreciado por Cruz e Sousa.

Análise do poema "Arte", de Cruz e Sousa


     "Arte" é um poema claro, conciso e com certa objetividade. A maneira de expor é parnasiana, mas a busca de palavras raras, velhas mostra já um certo simbolismo. Está numa confluência de estilos. Há a ideia simbolista do conteúdo se sobrepor à forma. Daí a ideia de que o verso deve ser certeiros, mas ter um grande alcance. Não há o submeter da ideia à forma, como em Bilac.
    Neste poema, temos ainda presentes as ideias de sugestão e de apelo a todos os sentidos, o que é típico do Simbolismo. Mas ao longo de todo o texto, assistimos a uma tenção entre o Parnasianismo e o Simbolismo, alternando estrofe a estrofe, ora ideias parnasianas, ora simbolistas.

    No Brasil, foram os poetas parnasianos que tiveram projeção; os simbolistas eram vistos como poetas de subúrbio. Isto acontece por aspetos variados. Por exemplo, quando Bilac era rico e médico, Cruz e Sousa era negro e filho de escravos e um autodidata. É a imagem do poeta marginal. Isto é importante inclusive para ver como a cultura brasileira se organiza nesta época. Daí o Modernismo ir contra o Parnasianismo.

HM Queen Elizabeth II (VII)


Dave Whamond

 

Análise do poema "In Extremis"


     Não é um soneto, que é a forma privilegiada do Parnasianismo, mas possui algo característico desse movimento: gosto pelos títulos em latim. O Parnasianismo volta-se para as formas clássicas em busca do seu equilíbrio. A própria ideia do escultório tem a ver não com a grandiosidade, mas com o equilíbrio. O título está por conta desse gosto pelos clássicos.
    Este poema, pelo contrário, não mostra equilíbrio, mas o desenrolar de diversas emoções. Bilac não se consegue conter nos limites do equilíbrio parnasiano. As emoções são traduzidas através do contraste entre o exterior da paisagem e o seu interior.
    A morte é fruto da imaginação e daí advém a grande proposta que contraria o Parnasianismo: a paisagem suscita uma emoção no poeta: "Nunca morrer num dia / Assim de um sol assim". A paisagem interior é imaginada a partir do exterior.
    Além do contraste, há outras formas de mostrar a emoção: pontuação, repetição de vocábulos, gradação. Apesar disso, há o gosto parnasiano pela descrição objetiva da paisagem. Apesar deste descritivismo, o poeta emociona-se e imagina algo que pudesse acontecer.
    Bilac, embora muito parnasiano, é um parnasiano onde o sentimento e uma certa sensualidade começam a aflorar. Mas é uma sensualidade deslocada e mórbida: "Tu, desgrenhada e fria...". Mas o que escolhe para falar do mórbido é o beijo, o que é uma valorização sensual do mórbido. Isto acontece, porque a estética parnasiana no Brasil convive já com a estética do Decadentismo simbolista. Daí encontrarmos no Parnasianismo penetração do Simbolismo decadentista e neste, com em Cruz e Sousa, penetração do Parnasianismo.
    Bilac convive, assim, com o movimento de fim de século, que é o Simbolismo decadentista. Este movimento procura uma exacerbação do Parnasianismo, a palavra rara. O Parnasianismo procurava a melhor palavra, enquanto o Simbolismo busca a palavra rara, não pela sua precisão, mas pela sua imprecisão, pois é aquela que não é muito conhecida e, por isso, apenas sugere algo das pessoas. Os simbolistas vão entrar nesta inexatidão e sugestão através das palavras raras.
    Usam outras formas que não o soneto, pois não pretendem que os seus poemas caibam numa forma. Usam também as reticências, exclamações, pois serão a base da sugestão. Procurando contrariar o espírito parnasiano, vão gostar muito das paisagens interiores e exteriores, mas em vez de descrevê-las, vão sugeri-las. Daí a frase sem verbo.
    O Simbolismo decadentista vai ser o reflexo de toda a deceção, do esvaziamento da euforia para com a ciência (visível no Fradique de Eça). Abel Botelho, Teixeira Queiroz fazem romances como teses científicas, mas neles deixam perpassar um certo desencanto. A poesia do fim de século caracteriza-se pela inércia.

O Parnasianismo brasileiro


     Paralelamente ao Realismo, mais no final do século XIX (década de 80) surge uma nova corrente de poesia, que convive ainda com a poesia romântica, que é o Parnasianismo.
    O Parnasianismo, que em Portugal não teve grande repercussão (o representante do Parnasianismo português foi "importado" do Brasil: Gonçalves Crespo) obteve no Brasil uma larga aceitação: tão larga que, até hoje, ainda encontramos pessoas a escrever sob a forma parnasianista e estarem dentro destes cânones. Mas este movimento literário acabou por perder, exagerado que foi com a forma e sem cuidado com o conteúdo.
    Os maiores representantes do Parnasianismo (século XIX) no Brasil foram os seguintes:
        - Olavo Bilac;
        - Raimundo Correia;
        - Alberto de Oliveira.
    Destes três autores, o que teve maior público e mais popularidade foi Olavo Bilac, embora o mais ortodoxo fosse Alberto de Oliveira. Bilac foi eleito por uma revista feminina chamada "Fon-Fon" (revista que buzina notícias) o príncipe dos poetas. Bilac era interessado por problemas cívicos, tendo criado no Brasil o serviço militar obrigatório.
    Escreveu um livro de poesias infantis e, juntamente com outro escritor da viragem do século, Manuel Bonfim, escreve também o livro intitulado Contos Pátrios, destinado às escolas. Isto revela-nos a dimensão de Bilac na cultura brasileira do final do século XIX.
    Dentro do espírito cívico e parnasianista, Bilac foi um grande cultor da língua. Tem um poema importante chamado "Língua Portuguesa". Talvez por este e outros poemas louvarem a língua e os cânones parnasianos, é que tiveram uma grande importância e repercussão na língua portuguesa. Bilac pertenceu ao Parnasianismo.

    Mas o que é o Parnasianismo? De onde provém o nome?

    O poema máximo do Parnasianismo brasileiro é de Bilac. Nele, expõe tudo o que pensa que vai ser a poesia: intitula-se "Profissão de Fé".
    O nome Parnasianismo vem de uma revista francesa chamada "Parnasse Contemporaine", editada entre 1866 e 1876 e que congregava vários poetas franceses, como: Heredia, Sully Prudhome e Coppé, três dos principais poetas parnasianos. Tentaram fazer uma poesia objetiva, nada intimista, onde a forma fosse bem trabalhada e o vocabulário usado fosse bastante rico, mesmo difícil. A objetividade pretendida começou a tender para o ornamental e a poesia foi ficando esvaziada do seu conteúdo, acabando por ser uma poesia do tipo "arte pela arte".
    Isto é importante para ver o que o que acontece no Brasil. Muitos poetas vão inclusive pensar numa poesia descritiva, pois identificam objetividade com descritivismo. Havia também o gosto pelo uso da mitologia clássica, numa tentativa de distanciação do «eu» lírico com o sujeito.
    Os parnasianos dão preferência ao uso do soneto, que é uma forma fixa e rígida, o que faz com que o poeta tenha de dominar muito bem o assunto para escrever nuns parcos versos tudo o que quer. O soneto é uma forma racionalista por excelência.
    No Brasil, o Parnasianismo só entra mais ou menos nos anos 80. Há quem aponte a data de 79, pois foi quando surgiu um soneto de António Carvalho Júnior, onde diz que odeia as "virgens pálidas", numa reação nítida ao Romantismo. Mas só nos anos 80 o Parnasianismo entra em vigor. O primeiro grande poeta deste movimento publica em 1822 - Raimundo Correia; Olavo Bilac só vai publicar em 1888.

Análise do poema "Uraguai", de Basílio da Gama


     Este poema, enquanto épico, é constituído por:
        👉 Invocação ("musa");
        👉 Proposição ("honremos o herói que o povo rude/Subjugou do Uraguai");
        👉 Dedicatória;
        👉 Invocação: pede proteção ao Marquês;
        👉 Início da narração de uma ação, onde vai falar do homem já referido por Cláudio e onde mostra a luta entre os portugueses e os espanhóis pela província cisplatina.
    Gama lança mão de elementos indígenas como:
        - Sepê - figura da mitologia indígena (canto III);
        - O herói é um índio do Paraguai, o que antecede o que vai acontecer no Romantismo com Alencar e G. Dias (ex.: "Juca Pirama"). Mas este é o único momento (canto III) em que B. Gama explora esta situação. Nos outros casos, fala do índio como um europeu, sem verdadeira noção dessa realidade.
        - Morte de Lindóia (canto IV): é o único episódio de amor (entre índios) do poema. Posteriormente, "Vila Rica" já apresenta episódios de amor entre branco e índia, passo em frente para o que vai acontecer no Romantismo.

HM Queen Elizabeth II (VI)


Mike Luckovich

 

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