Este manifesto tem como vertentes a
recusa da importação literária e a ideia de uma poesia e literatura realmente
brasileiras: “olhar com olhos livres” foi a ideia que ficou como grande marca,
pois significa que não se deve seguir nenhuma escola, mas usar as coisas como
elas são. De facto, antes a cultura brasileira em geral limitava-se a
reproduzir o que era feito no estrangeiro; agora, este texto clama aos artistas
brasileiros por originalidade e criatividade, pretendendo celebrar o
multiculturalismo, a miscigenação.
A intenção passava por não negar a
cultura estrangeira, mas absorvê-la, processá-la e misturá-la com os elementos
da cultura brasileira, visando a promoção de uma independência cultural, a
partir da intertextualidade e do beber em diversas fontes.
O manifesto foi buscar a designação
ao grego «Anthropos» (antropo), termo que significava “homem” e que está
na origem de múltiplas palavras da língua portuguesa (antropologia, antropólogo,
etc.). Por seu turno, “fagia” (fago) advém do grego «phagein», que
queria dizer “comer”. Assim sendo, “antropófago” remete para a ideia de
canibalismo, que, no manifesto, ganha um sentido simbólico e metafórico. Logo
no início, o autor afirma o seguinte: “Só a antropofagia nos une.
Socialmente. Economicamente. Filosoficamente.” Ora, estas frases sintetizam
a ideia central do documento. Já no título encontrávamos uma palavra que remetia
para o mesmo campo semântico. Neste caso, a ideia é a de que a cultura
brasileira deve «comer», «deglutir» a cultura do «outro» (estrangeira) e
incorporá-la na brasileira, expandindo-se para outros setores: social,
económico e filosófico. Por outro lado, estamos na presença de outro dado
simbólico: o canibalismo do índio tinha como objetivo incorporar as
características positivas da sua vítima.
Em sentido semelhante vai a
apropriação adulterada de um extrato de Hamlet, peça de Shakespeare (“To
be or not to be”): «Tupi, or not tupi that is the question». Trata-se de
intertextualidade, da apropriação da cultura de outro povo para a adaptar à
realidade local. Por outro lado, estamos na presença de uma forma de homenagem
ao autor britânico e um gesto de criatividade ao proceder-se à reinterpretação
de uma frase clássica.
Por outro lado, o termo «manifesto»
remete para uma “declaração pública em que se expõem os motivos que levaram à
prática de certos atos que interessam a uma comunidade” ou para um “texto
programático de uma escola literária ou de um movimento literário” (in
Infopédia). Assim sendo, a escrita de um manifesto possui um viés político e
ideológico e visa a persuasão.
A ideia do manifesto surgiu quando
Tarsila do Amaral, casada com Oswald de Andrade, lhe deu como presente de
aniversário o quadro “Abaporu” (aba = homem; poru = que come), pintado em 1928.
Ao ver a pintura, o poeta Raul Bopp questionou Oswald: “Vamos fazer um
movimento em torno desse quadro?”
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