terça-feira, 28 de fevereiro de 2012
O Acordo Ortográfico em cartune (IV)
segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012
Exame intermédio de Português - 12.º ano - Correção
Grupo I
1. O sujeito poético vive, de facto, um drama que deriva dos seguintes aspetos:
- a sensação de incompletude, de ficar a meio do «percurso» (v. 2);
- a incapacidade de se realizar totalmente, de atingir a plenitude (v. 1);
- a incapacidade para viver o sonho (v. 8);
- a consciência do falhanço pessoal.
2. No verso 15, o sujeito poético revela a sua frustração e o falhanço que caracterizou a sua existência, resultantes da incapacidade de realizar os seus sonhos, de cumprir os seus objetivos.
No verso 16, exemplifica-se o conteúdo do verso 15, isto é, tal como a ave que se esforça e lança no ar, mas não consegue voar, também o sujeito poético desenvolveu o seu esforço no sentido de alcançar o seu sonho, os seus objetivos, mas não conseguiu «voar» também.
3. Nos dois versos iniciais da primeira estrofe, é usado o pretérito imperfeito do indicativo, enquanto, nos dois primeiros da última, é usado o pretérito mais-que-perfeito, também do modo indicativo.
A alteração de tempo verbal traduz a falência e a desistência do sujeito poético. De facto, o pretérito imperfeito remete para um tempo em que ainda havia a possibilidade de realização do seu sonho, de atingir a plenitude. Por seu turno, o pretérito mais-que-perfeito evidencia a impossibilidade de o «eu» atingir tal desiderato. Relembre-se que este tempo verbal traduz um facto passado relativamente a outro.
4. O ritmo do poema é marcado pelos seguintes aspetos:
No verso 16, exemplifica-se o conteúdo do verso 15, isto é, tal como a ave que se esforça e lança no ar, mas não consegue voar, também o sujeito poético desenvolveu o seu esforço no sentido de alcançar o seu sonho, os seus objetivos, mas não conseguiu «voar» também.
3. Nos dois versos iniciais da primeira estrofe, é usado o pretérito imperfeito do indicativo, enquanto, nos dois primeiros da última, é usado o pretérito mais-que-perfeito, também do modo indicativo.
A alteração de tempo verbal traduz a falência e a desistência do sujeito poético. De facto, o pretérito imperfeito remete para um tempo em que ainda havia a possibilidade de realização do seu sonho, de atingir a plenitude. Por seu turno, o pretérito mais-que-perfeito evidencia a impossibilidade de o «eu» atingir tal desiderato. Relembre-se que este tempo verbal traduz um facto passado relativamente a outro.
4. O ritmo do poema é marcado pelos seguintes aspetos:
- a rima (cruzada e interpolada);
- a métrica (o verso decasssílabo;
- a pontuação - travessão e reticências -, que assinala pausas prolongadas;
- as repetições de vocábulos («quási»);
- as anáforas («Um pouco» / «Um pouco»);
- o predomínio do ritmo binário (vv. 1, 2, 3), alternando com o ternário (vv. 5, 8, 23...);
- a enumeração (vv. 17 a 20);
- ...
Grupo II
Versão 1 Versão 2
1.1. A D
1.1. A D
1.2. D B
1.3. C A
2.1. "os efeitos espaciais da arquitetura"
2.2. Oração subordinada substantiva completiva
2.2. Oração subordinada substantiva completiva
domingo, 26 de fevereiro de 2012
O circo e os palhaços
Não, o árbitro não considerou penalty. Marcou falta de Pablo Aimar. Pior do que esta decisão? A de Jorge Jesus, ao retirar o mesmo Aimar e fazer entrar... Djaló.
Hugo Miguel (o árbitro) e Jorge Jesus: dois pândegos!
sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012
Doença de TARGARDT
Exmo(a) Senhor(a),
Vivo nos arredores de Lisboa e sou pai de uma menina, agora com 7 anos, que é portadora da doença de TARGARDT (degeneração da mácula), o que faz com que perca a visão central, doença essa que é actualmente incurável, mesmo no estrangeiro.
Como não é fácil obter informações a nível nacional, resta-me a Internet para adquirir um conhecimento mais profundo que me ajude a lidar com esta doença, pois mesmo em Lisboa a única ajuda que me foi facultada foi de uma associação (mais concretamente a Associação de Retinopatias de Portugal), associação essa que também padece do problema de falta de apoio, pois é uma entidade privada.
O grande objectivo deste mail é tentar arranjar maneira de contactar pessoalmente, familiares ou amigos de pessoas que sofram da mesma ou semelhante doença, para fazer um rastreio, com um único pensamento: difundir e trocar informações acerca desta doença. POR FAVOR, divulguem este mail pelos vossos contactos e/ou se tiverem conhecimento pessoal de um caso semelhante, agradecia que me contactassem:
MUITO E MUITO OBRIGADO!
Rui Gonçalves
P.F., não ignorem a mensagem. Ler e reencaminhar não custa nada.
Obrigado.
quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012
IRS 2011
Via blogue ADDUO.
Carlos da Maia
Carlos da Maia surge no romance a propósito da remodelação do Ramalhete, tendo sido o responsável pela escolha de um arquiteto inglês para executar a obra. Através do processo de caracterização indireta, encontramos aqui os primeiros traços definidores do caráter da personagem: o requinte, a sofisticação, o bom gosto, o diletantismo, o gosto pelo luxo e pelos ambientes sofisticados e elegantes.
No início do cap. III, somos confrontados com a descrição da educação a que a personagem é sujeita, contrastante com a de seu pai e de Eusebiozinho e que se carateriza pelos seguintes traços:
No início do cap. III, somos confrontados com a descrição da educação a que a personagem é sujeita, contrastante com a de seu pai e de Eusebiozinho e que se carateriza pelos seguintes traços:
- rigor nos princípios, tolerância nas ideias: «O Carlos necessita ter um regime. De madrugada já está na quinta: almoça às sete e janta à uma hora.»; «... tinha sido educado com uma vara de ferro!»; «Não tinha a criança cinco anos já dormia num quarto só, sem lamparina; e todas as manhãs, zás, para dentro de uma tina de água fria, às vezes a gear lá fora (...). E depois o rigor com as comidas! Só a certas horas e de certas coisas...»;
- rigor, método, ordem, disciplina;
- contacto com a Natureza;
- exercício físico: ginástica, ar livre, remo, trapézio;
- aprendizagem de línguas vivas: inglês;
- aprendizagem de coisas práticas e das ciências experimentais: «... saber o que é a chuva que o molha, como se faz o pão que come...»; «A instrução (...) É saber factos, noções, coisas úteis, coisas práticas...»;
- educação agnóstica: «E Vilaça, que tinha crenças religiosas, não gostou de ver Carlos, sem se importar com as graças...»; «... e pediu-lhe que lhe disse o Ato de Contrição. E que respondeu o menino? Que nunca em tal ouvira falar!»; «... não soubesse a sua doutrina.»;
- valorização da criatividade e do juízo crítico: «Eu quero que o rapaz seja virtuoso por amor da virtude e honrado por amor da honra; mas não por medo às caldeiras de Pêro Botelho, nem com o engodo de ir para o Reino do Céu...» - esta noção contrasta com a conceção que a avó e o pai de carlos tinham da religião e da forma de agir, isto é, estamos perante o contraste entre a ideia de agir por acreditar que é a forma correta de o fazer e o agir por medo (de um castigo divino, por exemplo);
- submissão da vontade ao dever;
- convivência com as crianças da aldeia.
E assim, na esteira do equilíbrio clássico, se procurava construir uma alma são num corpo são.
O capítulo IV começa pela informação acerca da iminente formatura de Carlos em Medicina, logo seguida de uma analepse que retrospetiva as circunstâncias do despertar da sua vocação. Essa analepse sugere uma fuga de Eça às diretrizes naturalistas em termos de caraterização de personagens. De facto, com Carlos da Maia «não dispomos (...) de um retrato integral debruçado sobre as suas facetas psicológicas, sociais e morais; do mesmo modo, o narrador não adota (como fez com Pedro) uma atitude de transcendência que lhe permite dissecar exaustivamente e num fragmento concentrado do discurso a influência do meio sobre a personagem, o programa educativo a que é submetido, etc.». Assim, a vocação de Carlos para a Medicina não é explicada pelo narrador em função de uma qualquer causa hereditária ou ambiencial; ela percebe-se quando nos é revelada a sua súbita atração pelas estampas anatómicas descobertas no sótão.
Observemos, esquematicamente, o conteúdo da analepse:
Em atualização...Observemos, esquematicamente, o conteúdo da analepse:
- em criança:
- a descoberta de um rolo antigo de estampas anatómicas;
- os recortes das mesmas a sua afixação nas paredes do quarto;
- o escandalizar das Silveiras com a imagem de um feto;
- o apoio de Afonso («Se escolhe uma profissão é para a exercer com sinceridade e com ambição, como os outros. Eu não o educo para vadio, muito menos para amador; educo-o para ser útil ao seu país...»;
- em Coimbra, no Liceu, Carlos abandona os compêndios de lógica e retórica e troca-os pela anatomia;
- em Santa Olávia, faz diagnósticos aos criados doentes;
- em Coimbra, na Universidade, Carlos revela-se um estudante brioso e entusiasta, embora com tendência para o diletantismo.
Em Coimbra, já estudante universitário, Carlos mantém o entusiasmo inicial e a atração pela Medicina, pela «vida "a sério", prática e útil» («atraíam-no agora estes lados militantes e heróicos da ciência.»). No entanto, aos poucos outras ocupações vão-no «distraindo» dos seus deveres enquanto estudante. Leva uma vida de luxo, torna-se leitor de Proudhon, Comte, Spencer (autores que marcaram a Geração de 70), considera o país uma «choldra ignóbil», factos que lhe granjeiam a simpatia dos «mais rígidos revolucionários». Relaciona-se, entretanto, com dândis e filósofos, fidalgotes e revolucionários; faz ginástica científica, esgrima e whist sério. Nos serões que patrocina, lê-se o Figaro, o Times e as revistas de Paris e Londres, toca-se ao piano Chopin e Mozart; «... havia ruidosos e ardentes cavacos» em que amigos de diferentes tendências discutiam Arte, Literatura, Democracia, o Positivismo, o Realismo, Metafísica.
Revela, pois, Carlos os primeiros traços de diletantismo e dandismo. Repare-se: o interesse pela medicina esmorece («... não tardou a deixar pelas mesas, com as folhas intactas, os seus expositores de medicina.»); interessa-se por diferentes formas de arte: publica sonetos no «Instituto» e um artigo sobre o Parténon, tentou a pintura a óleo, «compôs contos arqueológicos», anda a cavalo; a iminência de uma reprovação fá-lo moderar os hábitos de dispersão cultural; vive duas aventuras sentimentais, uma com Hermengarda, a mulher de um empregado do Governo Civil (que abandona por sentir compaixão do marido e do filho), e outra com uma prostituta espanhola, a quem monta casa.
Revela, pois, Carlos os primeiros traços de diletantismo e dandismo. Repare-se: o interesse pela medicina esmorece («... não tardou a deixar pelas mesas, com as folhas intactas, os seus expositores de medicina.»); interessa-se por diferentes formas de arte: publica sonetos no «Instituto» e um artigo sobre o Parténon, tentou a pintura a óleo, «compôs contos arqueológicos», anda a cavalo; a iminência de uma reprovação fá-lo moderar os hábitos de dispersão cultural; vive duas aventuras sentimentais, uma com Hermengarda, a mulher de um empregado do Governo Civil (que abandona por sentir compaixão do marido e do filho), e outra com uma prostituta espanhola, a quem monta casa.
quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012
O Ramalhete
Logo nas páginas inicias do romance, o narrador procede a uma descrição pormenorizada do Ramalhete. Essa descrição, de acordo com a estética naturalista, tem um objetivo bem definido: permitir o enquadramento das personagens e a definição dos carateres, enquanto espaço de convergência e harmonia entre o ambiente e os seus anfitriões e frequentadores habituais.
Na atualidade (outono de 1875), o Ramalhete, situado na Rua de São Francisco, às Janelas Verdes, é a residência da família Maia em Lisboa. O seu nome tivera origem num painel de azulejos representando um ramo de girassóis e substituindo o escudo heráldico da família. Atente-se, desde já, no simbolismo destas referências. Por um lado, o nome da habitação evidencia a ligação da família à terra e à província. Por outro lado, o emblema (o ramo de girassóis) associa-se ao simbolismo do girassol, planta que representa a atitude daquele que ama e que se vira continuamente para contemplar o seu amado e a incapacidade de dominar a paixão. No entanto, esta atitude de submissão e de fidelidade com o ser amado associa (o girassol) à incapacidade de ultrapassar a paixão amorosa e a eventual não correspondência da pessoa amada. Aplicando estas ideias à relação de Pedro da Maia e Maria Monforte, constatamos que aquele assume uma postura de absoluta fidelidade e submissão relativamente ao objeto do seu amor, o que o torna incapaz de enfrentar e prosseguir a vida após a traição e fuga da mulher, optando pelo suicídio. É como se tivesse perdido a vontade própria e se tivesse tornado num duplo dela, sem cuja presença se sente incompleto, incapaz de reagir à perda e de viver. Algo de semelhante parece acontecer com seus filhos. Com efeito, no início, após a primeira visão fugaz de Maria Eduarda, Carlos parece viver apenas para a (voltar a) olhar e contemplar. Após a consumação da paixão, ambos a vivem inebriados e eufóricos até ao seu desenlace, ou seja, até ao momento em que ele, tardiamente, revela a sua repulsa por aquela relação incestuosa e decide afastar-se da irmã.
No início, o Ramalhete é descrito de forma disfórica: «sombrio casarão de paredes severas», «com um renque de estreitas varandas de ferro», «uma tímida fila de janelinhas», «o aspeto tristonho de residência eclesiástica». Ora, o vocabulário utilizado conota-o com o fechamento, o isolamento e a tristeza, a que se acrescentam as aproximações aos espaços religiosos, que, por um lado, evidenciam a importância e a influência do clero e da mentalidade clerical no passado da família e, por extensão metafórica, em Portugal, e, por outro, reenviam também para a ideia de clausura e pressão. Desabitado durante largos anos, ganhara tons de degradação e ruína; no entanto, o seu interior manifesta o bom gosto, o requinte e a riqueza da família: «disposição apalaçada», «tetos apainelados», «paredes cobertas de 'frescos'», etc. Note-se que a sua arquitetura evoca o último reinado absolutista, o de D. Maria I. Além disso, é de registar a referência de Vilaça à crença/lenda funesta, segundo a qual «eram sempre fatais aos Maias as paredes do Ramalhete.», o que constitui o primeiro indício trágico da obra.
Subitamente, Afonso decide retornar ao Ramalhete, sacrificando-se pelo neto, Carlos, que, culto, viajado e «com propósitos de trabalho», não gostaria de se «enterrar» na aldeia, decisão em que sofre a oposição de Vilaça, que argumenta com a necessidade de muitas obras e despesas, a falta de um jardim e a lenda funesta. E assim se inicia o seu restauro. Inicialmente, fica encarregado das obras Esteves, «arquiteto, político e compadre de Vilaça», de cuja ação se destaca o aparato grosseiro dos ornatos, que acaba substituído por um «arquiteto londrino» trazido por Carlos, que introduz na residência o conforto, o «luxo inteligente», o bom gosto, a sobriedade e a elegância (traços do protagonista) e que contrastam com a vulgaridade e a ostentação tão apreciadas pela sociedade lisboeta (representada, ironicamente, pelo dito Esteves, entretanto promovido a governador civil). E, assim, o espaço é transformado de acordo com o gosto europeu: introduzindo inovações nos hábitos portugueses (sala de música, bilhar, fumoir), em analogia com os intuitos de renovação da mentalidade portuguesa, empreendidos pela Geração de 70 (característica comum a Eça e a Carlos da Maia).
Vejamos, em pormenor, a reformulação operada no interior da casa. Desde logo destaca-se o pátio de mármore quadrilhado e com plantas e vasos decorativos e bancos de talha; segue-se a antecâmara com estofos do Oriente, divãs cobertos de tapetes persas e largos pratos mouriscos de cobre; o amplo corredor transformado em rica galeria com arcas góticas, jarrões da Índia, quadros devotos para onde abriam várias salas do Ramalhete - o salão nobre, a sala de música com o seu ar rico de século XVIII, o bilhar defronte, o fumoir, a sala mais cómoda com a fofa vastidão das otomanas. No escritório de Afonso, destacam-se os damascos vermelhos, a mesa de pau-preto, as estantes, as encadernações luxuosas, um quadro de Rubens representando um Cristo na cruz (presságio de tragédia: Jesus morreu para expiar os pecados dos homens <-> Afonso morre por causa dos pecados do neto), o biombo japonês bordado a ouro, a pele de urso e uma venerável cadeira de braços «cuja tapeçaria mostrava ainda as armas dos Maias no desmaio da trama de seda» (novo indício trágico). Os quartos de Afonso , no segundo andar, dão para o corredor guarnecido com os retratos da família, enquanto os de Carlos merecem a apreciação de Vilaça de «aposentos não de médico mas de dançarina», pelo seu luxo e requinte. Não obstante a modernização do espaço, note-se que a imagem do passado perdura na «fachada tristonha».
Esta descrição representa, simbolicamente, uma nova oportunidade de modernização ou reforma da habitação (metaforicamente, do país) para uma nova etapa de ressurgimento e abertura; o reflexo do ideal reformista da geração de Carlos; um reflexo da reforma e europeização do país; o dandismo, o gosto pelo luxo, o dandismo e a formação britânica de Carlos. Por outro lado, é clara a intenção crítica de Eça de Queirós: por um lado, critica a importação de modelos estrangeiros e, por outro, caricaturalmente, a mentalidade portuguesa, caracterizada pelo seu atraso, incultura, megalomania e compadrio (o episódio da escolha de Esteves por ser compadre de Vilaça).
Ao longo do romance, o Ramalhete constitui um marco de referência e acompanha o percurso da família. Símbolo desse percurso é o quintal / jardim, que é apresentado em três momentos diferentes, coincidentes com três momentos vividos pelos Maias.
Num primeiro momento (cap. I, pág. 6), o jardim tem um aspeto de abandono, degradação, ruína e morte (pobre, inculto e abandonado, cheio de ervas bravas, a cascatazinha seca, o tanque cheio de entulho e a estátua de Vénus enferrujada), que se poderá associar ao desgosto e sofrimento de Afonso, resultantes do suicídio de Pedro (relembre-se o estado da estátua de Vénus, deusa do amor). Sobressaem, nesta primeira descrição, a estátua, «enegrecendo a um canto», sugerindo a indiferença pela estética clássica, repudiada pelo Romantismo, o cipreste, símbolo da imortalidade, e o cedro, símbolo da nobreza e da força, que permanecem eretos, contrariando o abandono e a decadência a que fora votado o Ramalhete.
Num segundo momento (cap. I, pág. 10), o jardim fica irreconhecível, após as obras de remodelação do Ramalhete. De facto, a estátua reaparece em todo o seu esplendor, simbolizando a ressurreição da família para uma vida feliz e harmónica. Atente-se na sua ligação às personagens femininas do romance: Maria Monforte surge quase sempre como uma estátua, de face «grave e pura como um mármore grego», enquanto Maria Eduarda é apresentada como uma deusa pisando a terra. Porém, após o incesto e o desenlace trágico, a estátua cobre-se de ferrugem. Por seu turno, a cascata, símbolo de regeneração e purificação na tradição judaico-cristã, surge associada ao choro («... esfiado gota a gota na bacia de mármore...»), numa imagem marcada pela água que flui gota a gota, marcando a passagem inexorável do tempo e acentuando, melancolicamente, o destino inexorável da família, condenada ao desaparecimento após um breve momento de ilusão. No entanto, até neste momento se encontram notas dissonantes. Por um lado, o encanto que Afonso encontra no terraço é perturbado pelos prédios de cinco andares que lhe cortam a visão e os horizontes vastos e lhe permitem apenas vislumbrar pormenores que lobriga por entre as filas das ruas. Por outro lado, a tela marinha» que a referida personagem avista de sua casa parece refletir algum desencanto e pessimismo: o movimento dos barcos acentua, por contraste, a quietação e tristeza do moinho e das raras casas, como imagem do isolamento e estagnação da vida portuguesa: «durante dias... o vulto negro de um couraçado inglês» evoca as crises do Constitucionalismo e a dependência do poder da Inglaterra.
Num terceiro momento
Em atualização...
No início, o Ramalhete é descrito de forma disfórica: «sombrio casarão de paredes severas», «com um renque de estreitas varandas de ferro», «uma tímida fila de janelinhas», «o aspeto tristonho de residência eclesiástica». Ora, o vocabulário utilizado conota-o com o fechamento, o isolamento e a tristeza, a que se acrescentam as aproximações aos espaços religiosos, que, por um lado, evidenciam a importância e a influência do clero e da mentalidade clerical no passado da família e, por extensão metafórica, em Portugal, e, por outro, reenviam também para a ideia de clausura e pressão. Desabitado durante largos anos, ganhara tons de degradação e ruína; no entanto, o seu interior manifesta o bom gosto, o requinte e a riqueza da família: «disposição apalaçada», «tetos apainelados», «paredes cobertas de 'frescos'», etc. Note-se que a sua arquitetura evoca o último reinado absolutista, o de D. Maria I. Além disso, é de registar a referência de Vilaça à crença/lenda funesta, segundo a qual «eram sempre fatais aos Maias as paredes do Ramalhete.», o que constitui o primeiro indício trágico da obra.
Subitamente, Afonso decide retornar ao Ramalhete, sacrificando-se pelo neto, Carlos, que, culto, viajado e «com propósitos de trabalho», não gostaria de se «enterrar» na aldeia, decisão em que sofre a oposição de Vilaça, que argumenta com a necessidade de muitas obras e despesas, a falta de um jardim e a lenda funesta. E assim se inicia o seu restauro. Inicialmente, fica encarregado das obras Esteves, «arquiteto, político e compadre de Vilaça», de cuja ação se destaca o aparato grosseiro dos ornatos, que acaba substituído por um «arquiteto londrino» trazido por Carlos, que introduz na residência o conforto, o «luxo inteligente», o bom gosto, a sobriedade e a elegância (traços do protagonista) e que contrastam com a vulgaridade e a ostentação tão apreciadas pela sociedade lisboeta (representada, ironicamente, pelo dito Esteves, entretanto promovido a governador civil). E, assim, o espaço é transformado de acordo com o gosto europeu: introduzindo inovações nos hábitos portugueses (sala de música, bilhar, fumoir), em analogia com os intuitos de renovação da mentalidade portuguesa, empreendidos pela Geração de 70 (característica comum a Eça e a Carlos da Maia).
Vejamos, em pormenor, a reformulação operada no interior da casa. Desde logo destaca-se o pátio de mármore quadrilhado e com plantas e vasos decorativos e bancos de talha; segue-se a antecâmara com estofos do Oriente, divãs cobertos de tapetes persas e largos pratos mouriscos de cobre; o amplo corredor transformado em rica galeria com arcas góticas, jarrões da Índia, quadros devotos para onde abriam várias salas do Ramalhete - o salão nobre, a sala de música com o seu ar rico de século XVIII, o bilhar defronte, o fumoir, a sala mais cómoda com a fofa vastidão das otomanas. No escritório de Afonso, destacam-se os damascos vermelhos, a mesa de pau-preto, as estantes, as encadernações luxuosas, um quadro de Rubens representando um Cristo na cruz (presságio de tragédia: Jesus morreu para expiar os pecados dos homens <-> Afonso morre por causa dos pecados do neto), o biombo japonês bordado a ouro, a pele de urso e uma venerável cadeira de braços «cuja tapeçaria mostrava ainda as armas dos Maias no desmaio da trama de seda» (novo indício trágico). Os quartos de Afonso , no segundo andar, dão para o corredor guarnecido com os retratos da família, enquanto os de Carlos merecem a apreciação de Vilaça de «aposentos não de médico mas de dançarina», pelo seu luxo e requinte. Não obstante a modernização do espaço, note-se que a imagem do passado perdura na «fachada tristonha».
Esta descrição representa, simbolicamente, uma nova oportunidade de modernização ou reforma da habitação (metaforicamente, do país) para uma nova etapa de ressurgimento e abertura; o reflexo do ideal reformista da geração de Carlos; um reflexo da reforma e europeização do país; o dandismo, o gosto pelo luxo, o dandismo e a formação britânica de Carlos. Por outro lado, é clara a intenção crítica de Eça de Queirós: por um lado, critica a importação de modelos estrangeiros e, por outro, caricaturalmente, a mentalidade portuguesa, caracterizada pelo seu atraso, incultura, megalomania e compadrio (o episódio da escolha de Esteves por ser compadre de Vilaça).
Ao longo do romance, o Ramalhete constitui um marco de referência e acompanha o percurso da família. Símbolo desse percurso é o quintal / jardim, que é apresentado em três momentos diferentes, coincidentes com três momentos vividos pelos Maias.
Num primeiro momento (cap. I, pág. 6), o jardim tem um aspeto de abandono, degradação, ruína e morte (pobre, inculto e abandonado, cheio de ervas bravas, a cascatazinha seca, o tanque cheio de entulho e a estátua de Vénus enferrujada), que se poderá associar ao desgosto e sofrimento de Afonso, resultantes do suicídio de Pedro (relembre-se o estado da estátua de Vénus, deusa do amor). Sobressaem, nesta primeira descrição, a estátua, «enegrecendo a um canto», sugerindo a indiferença pela estética clássica, repudiada pelo Romantismo, o cipreste, símbolo da imortalidade, e o cedro, símbolo da nobreza e da força, que permanecem eretos, contrariando o abandono e a decadência a que fora votado o Ramalhete.
Num segundo momento (cap. I, pág. 10), o jardim fica irreconhecível, após as obras de remodelação do Ramalhete. De facto, a estátua reaparece em todo o seu esplendor, simbolizando a ressurreição da família para uma vida feliz e harmónica. Atente-se na sua ligação às personagens femininas do romance: Maria Monforte surge quase sempre como uma estátua, de face «grave e pura como um mármore grego», enquanto Maria Eduarda é apresentada como uma deusa pisando a terra. Porém, após o incesto e o desenlace trágico, a estátua cobre-se de ferrugem. Por seu turno, a cascata, símbolo de regeneração e purificação na tradição judaico-cristã, surge associada ao choro («... esfiado gota a gota na bacia de mármore...»), numa imagem marcada pela água que flui gota a gota, marcando a passagem inexorável do tempo e acentuando, melancolicamente, o destino inexorável da família, condenada ao desaparecimento após um breve momento de ilusão. No entanto, até neste momento se encontram notas dissonantes. Por um lado, o encanto que Afonso encontra no terraço é perturbado pelos prédios de cinco andares que lhe cortam a visão e os horizontes vastos e lhe permitem apenas vislumbrar pormenores que lobriga por entre as filas das ruas. Por outro lado, a tela marinha» que a referida personagem avista de sua casa parece refletir algum desencanto e pessimismo: o movimento dos barcos acentua, por contraste, a quietação e tristeza do moinho e das raras casas, como imagem do isolamento e estagnação da vida portuguesa: «durante dias... o vulto negro de um couraçado inglês» evoca as crises do Constitucionalismo e a dependência do poder da Inglaterra.
Num terceiro momento
Em atualização...
Subtítulo: «Episódios da Vida Romântica»
O subtítulo de Os Maias aponta para uma descrição / pintura de um estilo de vida - o romântico (daí a designação de «Vida Romântica» -, feita através da crónica de costumes da alta sociedade lisboeta da década de 70 do século XIX, sobretudo da aristocracia e da alta burguesia.
Estamos perante uma visão fortemente crítica e uma sátira social que revela os defeitos sociais que impedem o progresso e a renovação das mentalidades e, por extensão, do país.
A crónica de costumes é concretizada a partir da sátira, da crítica, da ironia, das personagens-tipo e da descrição de ambientes - os episódios - e constitui uma ação aberta:
Manual Página Seguinte (p. 235) |
Por outro lado, note-se que os dois níveis narrativos - a história da família Maia e a crónica de costumes - se articulam, funcionando os ambientes descritos como pano de fundo para a atuação de algumas das personagens da intriga principal que, pelo seu caráter, comportamento e postura, se destacam da mediocridade geral que pauta a sociedade portuguesa:
Título - «Os Maias»
O romance Os Maias narra a história de uma família lisboeta - a família Maia -, representante da alta burguesia, através de três personagens masculinas que representam três gerações, correspondentes a momentos histórico-políticos e culturais diferentes:
De facto, Eça «serve-se» da história da família Maia para caracterizar três gerações:
- a geração das lutas entre liberais e absolutistas (que opuseram D. Pedro a D. Miguel) e que corresponde, no romance, à juventude de Afonso da Maia;
- a geração do Ultrarromantismo, em que se inclui Pedro da Maia e que sobreviverá na figura de Tomás de Alencar;
- a geração do Portugal da Regeneração, a que Carlos pertence e que continua, no fundo, os ideais da primeira geração romântica.
Por outro lado, a história da família inclui a ação / intriga central, que se constrói como uma ação fechada.
terça-feira, 21 de fevereiro de 2012
A génese de Os Maias
«Em 1878, em carta ao editor Ernesto Chardron, Eça de Queirós menciona «Os Maias» como título do volume XII, e último, de um conjunto de «pequenos romances» sob a designação de «Cenas da Vida Portuguesa», em substituição de «Cenas da Vida Real», referida um ano antes. Todavia, a génese concreta da novela deverá situar-se pouco antes de 1880, pois, neste ano, Eça, de licença em Lisboa, promete ao diretor do Diário de Portugal uma narrativa com este título para ser publicada em folhetins, conforme anuncia o jornal em maio. E apesar de ter enviado, em sua substituição, O Mandarim, a publicidade a Os Maias continua, sendo prometidos «para breve».
Entretanto, Eça resolvera transformar a «novela breve» num romance, como confessa a Ramalho Ortigão, em carta de 20 de fevereiro de 1881: «Apenas o trabalho ia em meio, reconheci que tinha diante de mim um assunto rico em carateres e incidentes e que necessitava um desenvolvimento mais largo de romance.» Neste ano, é publicado Portugal Contemporâneo, de Oliveira Martins, cuja visão pessimista do Constitucionalismo teria influenciado Eça de Queirós n'Os Maias.
Decidido, portanto, a publicar a obra em livro, e não num jornal, Eça, em Bristol, aceita as propostas de uma editora de Lisboa prometendo-lhe uma «edição rica», perspetiva que o estimula a fazer «um romance em que pusesse tudo o que [tinha] no saco», transformando a novela num «robusto e nédio livro, em dois volumes, um verdadeiro éclat para o burguês», conforme acrescenta na carta citada.
Desiludido com o serviço prestado pela editora, e sem contrato de edição, Eça, em 12 de julho de 1883, no Porto, onde se encontrava de férias, vende ao editor Ernesto Chardron a primeira edição d'Os Maias. Em 10 de maio de 1884, informa Oliveira Martins, meio a sério, meio irónico: «Eu continuo com Os Maias, essa vasta machine, com proporções enfadonhamente monumentais de pintura a fresco, toda trabalhada em tons pardos, pomposa e vã, e que me há de talvez valer o nome de Miguel Ângelo da sensaboria.»
A morte de Chardron em 1885 não interrompeu a impressão, mas Eça continuou a retocar e a ampliar o romance, de acordo com a exigência de perfeição estética que sempre o caracterizou: no fim de dezembro de 1887, ainda não corrigira as últimas provas tipográficas, exigindo reescrever outras já impressas. Finalmente, em junho de 1888, conseguem arrancar-lhe as últimas folhas e, no fim desse mês, depois de quase dez anos de elaboração, Os Maias, o romance mais extenso de Eça de Queirós (o único em dois volumes), e de realização mais cuidada, é posto à venda numa edição de 5000 exemplares, embora contendo lapsos na numeração de alguns capítulos.
Em 12 de junho, ao anunciar a Oliveira Martins a próxima publicação do romance, pedindo-lhe publicidade no jornal que dirigia (Repórter), e substituindo-se aos editores, a quem censura o desinteresse, Eça indica os episódios do romance que considerava melhor realizados e, portanto, merecedores de mais atenção e apreço: «Recomendo-te as cem primeiras páginas; certa ida a Sintra; as corridas; o desafio; a cena no jornal A Tarde; e, sobretudo, o sarau literário.»
Em 26 de outubro, a agradecer a Luís de Magalhães a sua crónica sobre Os Maias, Eça escrevia: «Foi - de todos os artigos sobre este cartapácio - aquele que viu com mais finura e mais altura os lados importantes do romance, como a desnacionalização dos carateres.»
Decidido, portanto, a publicar a obra em livro, e não num jornal, Eça, em Bristol, aceita as propostas de uma editora de Lisboa prometendo-lhe uma «edição rica», perspetiva que o estimula a fazer «um romance em que pusesse tudo o que [tinha] no saco», transformando a novela num «robusto e nédio livro, em dois volumes, um verdadeiro éclat para o burguês», conforme acrescenta na carta citada.
Desiludido com o serviço prestado pela editora, e sem contrato de edição, Eça, em 12 de julho de 1883, no Porto, onde se encontrava de férias, vende ao editor Ernesto Chardron a primeira edição d'Os Maias. Em 10 de maio de 1884, informa Oliveira Martins, meio a sério, meio irónico: «Eu continuo com Os Maias, essa vasta machine, com proporções enfadonhamente monumentais de pintura a fresco, toda trabalhada em tons pardos, pomposa e vã, e que me há de talvez valer o nome de Miguel Ângelo da sensaboria.»
A morte de Chardron em 1885 não interrompeu a impressão, mas Eça continuou a retocar e a ampliar o romance, de acordo com a exigência de perfeição estética que sempre o caracterizou: no fim de dezembro de 1887, ainda não corrigira as últimas provas tipográficas, exigindo reescrever outras já impressas. Finalmente, em junho de 1888, conseguem arrancar-lhe as últimas folhas e, no fim desse mês, depois de quase dez anos de elaboração, Os Maias, o romance mais extenso de Eça de Queirós (o único em dois volumes), e de realização mais cuidada, é posto à venda numa edição de 5000 exemplares, embora contendo lapsos na numeração de alguns capítulos.
Em 12 de junho, ao anunciar a Oliveira Martins a próxima publicação do romance, pedindo-lhe publicidade no jornal que dirigia (Repórter), e substituindo-se aos editores, a quem censura o desinteresse, Eça indica os episódios do romance que considerava melhor realizados e, portanto, merecedores de mais atenção e apreço: «Recomendo-te as cem primeiras páginas; certa ida a Sintra; as corridas; o desafio; a cena no jornal A Tarde; e, sobretudo, o sarau literário.»
Em 26 de outubro, a agradecer a Luís de Magalhães a sua crónica sobre Os Maias, Eça escrevia: «Foi - de todos os artigos sobre este cartapácio - aquele que viu com mais finura e mais altura os lados importantes do romance, como a desnacionalização dos carateres.»
Orientações para a leitura d'Os Maias, Maria Ema Tarracha Ferreira
O romance português antes de Eça de Queirós
«O romance surge em Portugal na primeira metade do século XIX com as obras de Almeida Garrett e de Alexandre Herculano, introdutores do Romantismo na literatura portuguesa, exprimindo o nacionalismo e o individualismo dos seus autores, assim como a sua experiência de liberais emigrados em França e Inglaterra.
Alexandre Herculano cria o romance histórico e medievalista, caracterizado pelo conceito espiritual do amor, aliado à conceção angelical da mulher, tópicos inerentes à mentalidade romântica. Embora Eça de Queirós, em obediência à Escola realista, repudie o romance histórico, pode considerar-se herdeiro de Herculano pelo anticlericalismo que marca grande parte da sua obra.
Em Viagens na Minha Terra, Almeida Garrett atualiza a ação do romance, situando-se na sua época, e cria o primeiro herói romântico, Carlos, que, pela complexidade psicológica, pode considerar-se o protótipo do herói moderno, cuja influência, como modelo, se faz sentir na ficção oitocentista. Todavia, a inovação do romance de Garrett é, sobretudo, introduzida a nível da linguagem - viva, coloquial e penetrada de ironia, características que reaparecem, talentosamente cultivadas, na ficção queirosiana, e especialmente n'Os Maias.
No período que corresponde à segunda geração romântica, ou dos Ultrarromânticos (1840 a 1865), a conceção da vida e da literatura, de acordo com os costumes do tempo, está expressa na obra de Camilo Castelo Branco, o criador da novela passional, género que inclui já a observação imparcial e espontânea da realidade. Narrativa movimentada, em que sobressai o conflito amoroso de desenlace trágico, e marcado de lances inesperados - fugas, raptos, adultérios, duelos, suicídios, incluindo também, pela primeira vez, o tema do incesto -, a novela passional exalta a paixão avassaladora que se abate como uma fatalidade sobre as personagens. N'Os Maias, apesar da intenção crítica e da visão irónica, perdura a paixão fatal, mas apresentada sem enaltecimento sentimental e desenvolvendo-se como uma verdadeira tragédia.
Júlio Dinis, introdutor do romance de observação filiado na tradição realista inglesa (sem relação com o Realismo francês), estabelece nova temática, atenta à vida quotidiana e, descrevendo as personagens com simpatia e humorismo, mas sem as ridicularizar, cria tipos inolvidáveis, a exemplo de Jane Austen e Dickens, autores que Eça lerá em Inglaterra, conforme testemunha a sua evolução. A técnica narrativa adotada por Júlio Dinis é também de inspiração inglesa: baseada na valorização do tempo narrativo ou diegético, proporciona ao leitor, através do desenvolvimento da ação, longo convívio com as personagens. Esta inovação, admiravelmente explorada por Eça de Queirós n'Os Maias, permite-nos reconstituir as cenas em pormenor, recordando-as como se as tivéssemos vivido.»
Em Viagens na Minha Terra, Almeida Garrett atualiza a ação do romance, situando-se na sua época, e cria o primeiro herói romântico, Carlos, que, pela complexidade psicológica, pode considerar-se o protótipo do herói moderno, cuja influência, como modelo, se faz sentir na ficção oitocentista. Todavia, a inovação do romance de Garrett é, sobretudo, introduzida a nível da linguagem - viva, coloquial e penetrada de ironia, características que reaparecem, talentosamente cultivadas, na ficção queirosiana, e especialmente n'Os Maias.
No período que corresponde à segunda geração romântica, ou dos Ultrarromânticos (1840 a 1865), a conceção da vida e da literatura, de acordo com os costumes do tempo, está expressa na obra de Camilo Castelo Branco, o criador da novela passional, género que inclui já a observação imparcial e espontânea da realidade. Narrativa movimentada, em que sobressai o conflito amoroso de desenlace trágico, e marcado de lances inesperados - fugas, raptos, adultérios, duelos, suicídios, incluindo também, pela primeira vez, o tema do incesto -, a novela passional exalta a paixão avassaladora que se abate como uma fatalidade sobre as personagens. N'Os Maias, apesar da intenção crítica e da visão irónica, perdura a paixão fatal, mas apresentada sem enaltecimento sentimental e desenvolvendo-se como uma verdadeira tragédia.
Júlio Dinis, introdutor do romance de observação filiado na tradição realista inglesa (sem relação com o Realismo francês), estabelece nova temática, atenta à vida quotidiana e, descrevendo as personagens com simpatia e humorismo, mas sem as ridicularizar, cria tipos inolvidáveis, a exemplo de Jane Austen e Dickens, autores que Eça lerá em Inglaterra, conforme testemunha a sua evolução. A técnica narrativa adotada por Júlio Dinis é também de inspiração inglesa: baseada na valorização do tempo narrativo ou diegético, proporciona ao leitor, através do desenvolvimento da ação, longo convívio com as personagens. Esta inovação, admiravelmente explorada por Eça de Queirós n'Os Maias, permite-nos reconstituir as cenas em pormenor, recordando-as como se as tivéssemos vivido.»
Orientações para a leitura d' Os Maias, Maria Ema Tarracha Ferreira
O Acordo Ortográfico em cartune (III)
segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012
Coesão referencial
A coesão referencial obtém através de cadeias de referência, isto é, um conjunto de termos ou expressões (correferentes) que remetem para a mesma entidade (referente).
O referente é o termo que designa a entidade ou situação (do mundo real ou imaginário) a que o falante se refere:
- O Benfica venceu...
Os correferentes são os elementos ou ocorrências textuais sem referência autónoma que remetem para o mesmo referente:
- O homem que observava as estrelas viu o seu telescópio roubado por dois
meliantes.
- A Joana mudou de curso. Os pais apoiaram-na nessa sua decisão e estão ao lado
dela incondicionalmente. ([A Joana] + [na] + [sua] + [dela] = cadeia de
referência)
Podem integrar as cadeias de referência as anáforas, as catáforas, as elipses e a correferência não anafórica.
1. Anáfora
A anáfora ou termo anafórico consiste na retoma - total ou parcial - do referente de palavras anteriormente inseridas no texto. Ou seja, o referente antecede, na frase, os seus correferentes ou termos anafóricos.
. Na semana passada, visitei a minha antiga escola primária. Há muito tempo que
não a visitava. Guardo belas memórias dos quatro anos que lá estudei.
O antecedente «a minha antiga escola primária» é retomado através dos
termos anafóricos «a» e «lá». Estes dois termos só são interpretáveis por
referência à expressão «a minha antiga escola primária». Por outro lado, os
três elementos sublinhados constituem uma cadeia de referência porque
remetem para a mesma entidade.
A anáfora pode ser:
. nominal: «A casa que Os Maias vieram habitar em Lisboa, no outono de 1875,
era conhecida (...) Apesar deste fresco nome de vivenda campestre, o
Ramalhete, sombrio casarão de paredes severas, com um renque de estreitas
varandas de ferro no primeiro andar, e por cima uma tímida fila de janelinhas
abrigadas à beira do telhado (...)».
A anáfora concretiza-se pelo uso de merónimos do termo antecedente «casa».
Os referentes dos termos anafóricos, neste caso, não coincidem totalmente com a
repetição do termo antecedente, estabelecendo com ele uma relação de implicação
do tipo parte-todo.
Nestes casos, a anáfora é não co-referencial, sendo designada por anáfora
associativa.
. verbal: «Jorge Jesus afirmou que o Benfica jogou bem. Disse também que a pior
equipa fora a de arbitragem.»
O verbo «dizer» retoma o antecedente «afirmar».
. pronominal: «Em casa havia um tambor. Tinham-lho oferecido pelo Natal.»
Neste caso, estamos perante uma anáfora pronominal , uma vez que o
pronome «o» substitui o nome («tambor») que o precede.
. adverbial: «Ao longe, no alto mar, há ainda o exercício da pesca. Há
lá homens.
Não os vejo.» (Vergílio Ferreira, Até ao Fim)
O advérbio «lá» remete para a expressão «no alto mar», que surge antes no
discurso. Note-se que, no exemplo, ocorre ainda uma anáfora pronominal, visto
que o pronome «os» («Não os vejo.») retoma o antecedente «homens».
Outros exemplos:
4. Correferência não anafórica
O referente é o termo que designa a entidade ou situação (do mundo real ou imaginário) a que o falante se refere:
- O Benfica venceu...
Os correferentes são os elementos ou ocorrências textuais sem referência autónoma que remetem para o mesmo referente:
- O homem que observava as estrelas viu o seu telescópio roubado por dois
meliantes.
- A Joana mudou de curso. Os pais apoiaram-na nessa sua decisão e estão ao lado
dela incondicionalmente. ([A Joana] + [na] + [sua] + [dela] = cadeia de
referência)
Podem integrar as cadeias de referência as anáforas, as catáforas, as elipses e a correferência não anafórica.
1. Anáfora
A anáfora ou termo anafórico consiste na retoma - total ou parcial - do referente de palavras anteriormente inseridas no texto. Ou seja, o referente antecede, na frase, os seus correferentes ou termos anafóricos.
. Na semana passada, visitei a minha antiga escola primária. Há muito tempo que
não a visitava. Guardo belas memórias dos quatro anos que lá estudei.
O antecedente «a minha antiga escola primária» é retomado através dos
termos anafóricos «a» e «lá». Estes dois termos só são interpretáveis por
referência à expressão «a minha antiga escola primária». Por outro lado, os
três elementos sublinhados constituem uma cadeia de referência porque
remetem para a mesma entidade.
A anáfora pode ser:
. nominal: «A casa que Os Maias vieram habitar em Lisboa, no outono de 1875,
era conhecida (...) Apesar deste fresco nome de vivenda campestre, o
Ramalhete, sombrio casarão de paredes severas, com um renque de estreitas
varandas de ferro no primeiro andar, e por cima uma tímida fila de janelinhas
abrigadas à beira do telhado (...)».
A anáfora concretiza-se pelo uso de merónimos do termo antecedente «casa».
Os referentes dos termos anafóricos, neste caso, não coincidem totalmente com a
repetição do termo antecedente, estabelecendo com ele uma relação de implicação
do tipo parte-todo.
Nestes casos, a anáfora é não co-referencial, sendo designada por anáfora
associativa.
. verbal: «Jorge Jesus afirmou que o Benfica jogou bem. Disse também que a pior
equipa fora a de arbitragem.»
O verbo «dizer» retoma o antecedente «afirmar».
. pronominal: «Em casa havia um tambor. Tinham-lho oferecido pelo Natal.»
Neste caso, estamos perante uma anáfora pronominal , uma vez que o
pronome «o» substitui o nome («tambor») que o precede.
. adverbial: «Ao longe, no alto mar, há ainda o exercício da pesca. Há
lá homens.
Não os vejo.» (Vergílio Ferreira, Até ao Fim)
O advérbio «lá» remete para a expressão «no alto mar», que surge antes no
discurso. Note-se que, no exemplo, ocorre ainda uma anáfora pronominal, visto
que o pronome «os» («Não os vejo.») retoma o antecedente «homens».
Outros exemplos:
- «Quando cheguei a casa, o meu filho tinha saído.» («Tinha saído» é um termo anafórico porque a sua interpretação depende de «cheguei», a forma verbal que identifica o ponto de referência temporal do locutor.)
- «A guerra não poupa velhos, mulheres e crianças. Todos sofrem.» («Todos» é um termo anafórico dos nomes antecedentes: «velhos», «mulheres« e «crianças».)
- «A Maria foi ao cinema e a Sofia, sua prima, também.» («Também» é uma forma de retoma anafórica de «foi ao cinema».)
- «A residência dos Caetano transpira bom gosto. A decoração é luxuosíssima.» («A decoração» funciona como anáfora contextual = «A decoração da residência dos Caetano».)
- «A Miquelina comprou um gato há dias, mas o animal já conhece os cantos à casa.» (a anáfora nasce de uma relação de hiponímia / hiperonímia: «o animal» - hiperónimo - retoma o antecedente «um gato» - hipónimo)
- «A sala de aulas está degradada. As carteiras estão todas sujas.» (neste caso, a anáfora decorre da relação holonímia / meronímia: «as carteiras» - merónimo - são parte do todo «a sala de aulas» - holónimo);
- «A Joana penteou-se cuidadosamente.».
2. Catáfora
A catáfora consiste na retoma do referente de palavras posteriormente inseridas no texto. Dito de forma mais simples, os correferentes antecedem, na frase, o seu referente.
- «João Gadunha fala de Lisboa onde nunca foi. Tudo nele, os gestos e o modo de falar, é uma imitação mal pronta dos homens que ouviu quando novo.» (o vocábulo «tudo» remete para elementos que surgem adiante, na frase: «os gestos», «o modo de falar».);
- «Com o meu irmão tudo foi diferente, sabe, as mulheres preferem-nos, aos filhos.» - Ana Paula Inácio, Os Invisíveis (o pronome pessoal «nos» remete para uma expressão - «os filhos» - que surge posteriormente na frase.);
- «Todos os rapazes se tinham apaixonado por ela. Todos a amavam secretamente. A minha prima era lindíssima.» (os termos anafóricos - os pronomes «ela» e «a» - surgem antes da expressão nominal com que se relacionam - «a minha prima».);
- «Em casa havia um tambor. Tinham-lho oferecido pelo Natal. Mas o garoto não soubera regrar o entusiasmo...» (o pronome «lhe» antecede a expressão nominal a que se reporta - «o garoto».);
- «Se soubesse o que o destino lhe reservava nos próximos tempos, talvez Luís Bernardo Valença nunca tivesse apanhado o comboio...» - Miguel Sousa Tavares, Equador [só a posterior referência a «Luís Barnardo Valença» possibilita esclarecer a elipse (omissão) do sujeito da forma verbal «soubesse» e identificar o pronome «lhe» como correferente do nome próprio];
- «A mãe olhou-o e disse: - Pedro estás mais magro.»;
- «A minha mãe teve dois netos: o Miguel e o Ricardo.»;
- «O motivo do crime foi o seguinte: ciúme.».
3. Elipse
A elipse consiste na omissão de certos elementos na frase, dado que os mesmos são facilmente identificáveis a partir do contexto linguístico (1) ou extralinguístico (2) e a sua repetição é desnecessária:
- «O João caiu e [] foi parar ao hospital.»;
- «A gotinha de água era muito infeliz; porém, [] não estava só.».
4. Correferência não anafórica
Neste caso, duas ou mais expressões linguísticas (grupos nominais, adverbiais ou preposicionais) remetem para o mesmo referente, sem que exista dependência referencial entre si. Assim, a relação de correferência entre elas é estabelecida a partir do saber compartilhado dos falantes e do contexto extralinguísticos.
. «O Francisco foi estudar para a Suíça. O filho da Cristina realizou o seu
desejo.»
As expressões «O Francisco» e «O filho da Cristina» remetem para o mesmo
referente. No entanto, ambas as expressões têm referência autónoma, pelo que só
quem conhece a Cristina é que sabe que ela tem um filho chamado Francisco.
. «O Rui foi trabalhar para África. O marido da Margarida está feliz.»
. «A minha prima ganhou um prémio. Sempre acreditei que a Liliana seria uma
advogada de sucesso.»
As expressões «A minha prima» e «a Liliana» identificam a mesma entidade,
sem que nenhuma delas funcione como termo anafórico. A interpretação dos dois
termos como remetendo para o mesmo referente exige que os interlocutores parti-
lhem esse conhecimento, isto é, que o interlocutor saiba que o locutor tem uma
prima chamada Liliana.
. «O primeiro-ministro demitiu-se. O chefe do Governo sucumbiu à contestação.
Atente-se, agora, no exemplo seguinte:
.
. «Camões viveu no século XVI. O autor de Os Lusíadas é um dos maiores es-
critores portugueses.»
Neste caso, «Camões» e «O autor de Os Lusíadas» são correferentes, o que
quer dizer que:
- ambas as expressões remetem para a mesma realidade, têm o mesmo
referente (um escritor);
- nenhuma delas depende da outra para que esse referente (esse escritor)
seja identificado: ao falar de «o autor de Os Lusíadas», facilmente depre-
endemos que se trata de «Camões» (desde que conheçamos a sua auto-
ria da obra em questão).
O mesmo não sucede, porém, no enunciado que se segue:
. «Sancho Pança é um criado bonacheirão. Só ele teria paciência para aguen-
tar a imaginação delirante de D. Quixote.»
Neste exemplo, «Sancho Pança» e «ele» possuem o mesmo referente, isto é,
representam a mesma realidade - são, portanto, correferentes. No entanto, o pro-
nome «ele», sem o seu antecedente, «Sancho Pança», não identifica a realidade
que pretende representar.
Assim, podemos concluir que:
. «O Francisco foi estudar para a Suíça. O filho da Cristina realizou o seu
desejo.»
As expressões «O Francisco» e «O filho da Cristina» remetem para o mesmo
referente. No entanto, ambas as expressões têm referência autónoma, pelo que só
quem conhece a Cristina é que sabe que ela tem um filho chamado Francisco.
. «O Rui foi trabalhar para África. O marido da Margarida está feliz.»
. «A minha prima ganhou um prémio. Sempre acreditei que a Liliana seria uma
advogada de sucesso.»
As expressões «A minha prima» e «a Liliana» identificam a mesma entidade,
sem que nenhuma delas funcione como termo anafórico. A interpretação dos dois
termos como remetendo para o mesmo referente exige que os interlocutores parti-
lhem esse conhecimento, isto é, que o interlocutor saiba que o locutor tem uma
prima chamada Liliana.
. «O primeiro-ministro demitiu-se. O chefe do Governo sucumbiu à contestação.
Atente-se, agora, no exemplo seguinte:
.
. «Camões viveu no século XVI. O autor de Os Lusíadas é um dos maiores es-
critores portugueses.»
Neste caso, «Camões» e «O autor de Os Lusíadas» são correferentes, o que
quer dizer que:
- ambas as expressões remetem para a mesma realidade, têm o mesmo
referente (um escritor);
- nenhuma delas depende da outra para que esse referente (esse escritor)
seja identificado: ao falar de «o autor de Os Lusíadas», facilmente depre-
endemos que se trata de «Camões» (desde que conheçamos a sua auto-
ria da obra em questão).
O mesmo não sucede, porém, no enunciado que se segue:
. «Sancho Pança é um criado bonacheirão. Só ele teria paciência para aguen-
tar a imaginação delirante de D. Quixote.»
Neste exemplo, «Sancho Pança» e «ele» possuem o mesmo referente, isto é,
representam a mesma realidade - são, portanto, correferentes. No entanto, o pro-
nome «ele», sem o seu antecedente, «Sancho Pança», não identifica a realidade
que pretende representar.
Assim, podemos concluir que:
- «Camões» e «o autor de Os Lusíadas» representam a mesma realidade; são, por isso, correferentes. Como nenhum destes elementos depende do outro para que tal realidade seja identificada, a correferência, neste caso, é não anafórica.
- Com a expressão nominal «Sancho Pança» e o pronome «ele», a situação é diferente: os dois elementos são correferentes no contexto em que surgem, pois representam a mesma realidade. No entanto, neste caso, o pronome «ele» constitui uma anáfora - só através de um elemento anteriormente introduzido («Sancho Pança»), para que remete, identifica um segmento da realidade. Nesta circunstância, a correferência é anafórica.
Bibliografia:
- Domínios, de Zacrias Nascimento e Maria do Céu Vieira Lopes (Plátano Editora);
- Gramática da Língua Portuguesa, de Clara Amorim e Catarina Sousa (Areal Editores);
- http://area.dgidc.min-edu.pt/GramaTICa/OFigueiredo_DGIDC_formar_TL2008.pdf;
- http://www.esa.esaportugues.com/programa/Lingua/coesao.htm;
- http://www.google.pt/#q=coes%C3%A3o+textual&hl=pt-PT&cr=countryPT&tbs=ctr:countryPT&prmd=imvnsb&ei=QI1CT8aCL4iz8QPm6P2FCA&sqi=2&start=10&sa=N&bav=on.2,or.r_gc.r_pw.,cf.osb&fp=9f8b768929cbc0e2&biw=1366&bih=643.
Coesão lexical
· Reiteração lexical: repetição (ou reiteração) da mesma palavra ou expressão:
Ex.: «Elas são quatro milhões, o dia nasce, elas acendem o lume. Elas cortam o pão
e aquecem o café. Elas picam cebolas e descascam batatas. Elas migam sêmeas
e restos de comida azeda.» (Maria Velho da Costa, Cravo, pág. 133)
· Substituição lexical: substituição de uma unidade lexical por outras que com ela mantêm
relações de sentido:
· por sinonímia: substituição de palavras ou expressões por sinónimos:
Ex.: O teu gato é bonito. Onde arranjaste o felino?
· por antonímia: substituição de palavras ou expressões por antónimos:
Ex.: Carlos Cruz fala verdade? Ou terá optado pela mentira?
· por hiperonímia / hiponímia:
Exs.: Quero os teus brinquedos, sobretudo o palhaço e o comboio. (hiperónimo /
/ hipónimo)
Eu adoro ovelhas e vacas. Estes herbívoros são simpáticos. (hipónimo /
/ hiperónimo)
· por holonímia / meronímia:
Exs.: A minha casa é fria. Os quartos, a cozinha e a sala não têm isolamento.
Ex.: «Elas são quatro milhões, o dia nasce, elas acendem o lume. Elas cortam o pão
e aquecem o café. Elas picam cebolas e descascam batatas. Elas migam sêmeas
e restos de comida azeda.» (Maria Velho da Costa, Cravo, pág. 133)
· Substituição lexical: substituição de uma unidade lexical por outras que com ela mantêm
relações de sentido:
· por sinonímia: substituição de palavras ou expressões por sinónimos:
Ex.: O teu gato é bonito. Onde arranjaste o felino?
· por antonímia: substituição de palavras ou expressões por antónimos:
Ex.: Carlos Cruz fala verdade? Ou terá optado pela mentira?
· por hiperonímia / hiponímia:
Exs.: Quero os teus brinquedos, sobretudo o palhaço e o comboio. (hiperónimo /
/ hipónimo)
Eu adoro ovelhas e vacas. Estes herbívoros são simpáticos. (hipónimo /
/ hiperónimo)
· por holonímia / meronímia:
Exs.: A minha casa é fria. Os quartos, a cozinha e a sala não têm isolamento.
domingo, 19 de fevereiro de 2012
Coesão estrutural
Uma das formas de construir a coesão textual é o paralelismo estrutural - a repetição simétrica de construções - em frases, períodos ou parágrafos contíguos ou próximos.:
Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
[...]
Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
[...]
Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel
[...]
O paralelismo pode assumir diferentes categorias:
· Paralelismo sintático: repetição do modelo de construção de uma frase em frases
seguidas:
Ex.: «Ou é porque o sal não salga, ou porque a Terra se não deixa salgar.
Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a
verdadeira doutrina (...). Ou é porque o sal não salga, e os
pregadores dizem uma cousa (...).»
· Paralelismo lexical: repetição da mesma palavra ou expressão em frases
contíguas ou próximas:
Ex.: «Eu penso que a língua portuguesa em Timor-Leste é importante,
porque a língua portuguesa em Timor-Leste é uma língua oficial, e
e a língua portuguesa em Timor-leste não é nova mas é antiga
antiga quando os portugueseses descobriram Timor-Leste...».
· Paralelismo fónico: repetição de sons com o objetivo de ecoar, ampliar ou
repercutir o anteriormente dito:
Ex.: «Casei com o João por causa do pão. Comeram-me o pão, divorciei-
-me do João.»
· Paralelismo semântico: repetição do mesmo conteúdo, ou semelhante, em duas
ou mais frases:
Ex.: «Adoro fazer turismo: conhecer novos lugares e novas culturas, ouvir
línguas e sotaques diferentes, comer pratos típicos de diferentes
regiões...».
seguidas:
Ex.: «Ou é porque o sal não salga, ou porque a Terra se não deixa salgar.
Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a
verdadeira doutrina (...). Ou é porque o sal não salga, e os
pregadores dizem uma cousa (...).»
· Paralelismo lexical: repetição da mesma palavra ou expressão em frases
contíguas ou próximas:
Ex.: «Eu penso que a língua portuguesa em Timor-Leste é importante,
porque a língua portuguesa em Timor-Leste é uma língua oficial, e
e a língua portuguesa em Timor-leste não é nova mas é antiga
antiga quando os portugueseses descobriram Timor-Leste...».
· Paralelismo fónico: repetição de sons com o objetivo de ecoar, ampliar ou
repercutir o anteriormente dito:
Ex.: «Casei com o João por causa do pão. Comeram-me o pão, divorciei-
-me do João.»
· Paralelismo semântico: repetição do mesmo conteúdo, ou semelhante, em duas
ou mais frases:
Ex.: «Adoro fazer turismo: conhecer novos lugares e novas culturas, ouvir
línguas e sotaques diferentes, comer pratos típicos de diferentes
regiões...».
Coesão temporo-aspetual
A coesão temporo-aspetual é conseguida através da compatibilização entre a sequencialização dos enunciados, de acordo com uma lógica temporal, e a informação aspetual, isto é, o ponto de vista do enunciador relativamente à situação expressa pelo verbo, apresentando o modo como decorre essa situação.
Os mecanismos que asseguram este tipo de coesão são os seguintes:
• uso correlativo dos advérbios / expressões adverbiais de tempo e dos tempos
verbais:
verbais:
Ex.: Agora, vamos ler um extrato de Os Maias. Depois faremos um
exercício gramatical.
Amanhã é dia de folga. (* Amanhã foi dia de folga.)
• utilização de grupos nominais e preposicionais com valor temporal:
Ex.: O bebé chorou toda a noite. Só adormecemos de madrugada.
• uso compatível dos valores aspetuais dos verbos e do valor semântico dos
conetores temporais utilizados:
Ex.: Enquanto jantou, a Lucília viu televisão.
* Enquanto saiu, a Lucília viu televisão.
• uso correlativo dos tempos verbais:
Ex.: Quando a Maria chegou, já a filha tinha saído.
* Quando a Maria chegou, já a filha sairá.
Assim que o Benfica marcou golo, brindámos com champanhe.
* Assim que o Benfica marcou golo, brindaremos com
champanhe. (esta frase é agramatical, visto que é impossível conciliar o futuro
com o ponto de partida - o pretérito perfeito.)
• ordenação sequencial dos eventos / das situações apresentados no texto:
Ex.: A Maria acabou o teste e entregou-o ao professor.
* A Maria entregou o teste ao professor e acabou-o.
exercício gramatical.
Amanhã é dia de folga. (* Amanhã foi dia de folga.)
• utilização de grupos nominais e preposicionais com valor temporal:
Ex.: O bebé chorou toda a noite. Só adormecemos de madrugada.
• uso compatível dos valores aspetuais dos verbos e do valor semântico dos
conetores temporais utilizados:
Ex.: Enquanto jantou, a Lucília viu televisão.
* Enquanto saiu, a Lucília viu televisão.
• uso correlativo dos tempos verbais:
Ex.: Quando a Maria chegou, já a filha tinha saído.
* Quando a Maria chegou, já a filha sairá.
Assim que o Benfica marcou golo, brindámos com champanhe.
* Assim que o Benfica marcou golo, brindaremos com
champanhe. (esta frase é agramatical, visto que é impossível conciliar o futuro
com o ponto de partida - o pretérito perfeito.)
• ordenação sequencial dos eventos / das situações apresentados no texto:
Ex.: A Maria acabou o teste e entregou-o ao professor.
* A Maria entregou o teste ao professor e acabou-o.
Coesão interfrásica
A coesão interfrásica designa os mecanismos de sequencialização que permitem a ligação / articulação das frases ou dos parágrafos entre si.
Esses mecanismos são, genericamente, os marcadores discursivos, em que se incluem os conetores / articuladores do dircurso, com destaque para a coordenação e a subordinação:
Por vezes, a ligação entre as frases faz-se sem a presença de marcadores discursivos, configurando uma elipse:
- Ex.: Queria ir-se embora, mas o polícia não lho permitia, por isso resolveu carregar no botão de emergência. De imediato, os travões fizeram-se ouvir.
Por vezes, a ligação entre as frases faz-se sem a presença de marcadores discursivos, configurando uma elipse:
- Ex.: Vítor Pereira tinha preparado a equipa para aquele jogo. Tudo se gorou. O árbitro fez vista grossa à grande penalidade e ao golo irregular do adversário. («Tudo se gorou.» = «Porém, tudo se gorou.»)
Coesão frásica
O texto é uma unidade de comunicação / uma sequência de enunciados (oral ou escrita), de extensão variável - um texto pode ser constituído por um curto enunciado ou por uma variedade de enunciados -, com um princípio e um fim bem delimitados, produzida por um ou por vários autores, que deve obedecer, na sua construção, a um conjunto de regras que, articulando-se entre si, dão sentido ao discurso.
A palavra texto deriva do latim textum (com origem no verbo texto - "entrelaçar", "construir", "compor"), que significa «tecido, entrelaçamento». Tendo presente esta origem etimológica, o texto resulta da ação de tecer, de entrelaçar unidades que formam um todo interrelacionado, com determinadas propriedades que lhe conferem um sentido, sendo o seu objetivo comunicar algo.
A coesão frásica designa os mecanismos linguísticos que conferem unidade aos vários elementos que constituem a frase.
Esses mecanismos são os seguintes:
A palavra texto deriva do latim textum (com origem no verbo texto - "entrelaçar", "construir", "compor"), que significa «tecido, entrelaçamento». Tendo presente esta origem etimológica, o texto resulta da ação de tecer, de entrelaçar unidades que formam um todo interrelacionado, com determinadas propriedades que lhe conferem um sentido, sendo o seu objetivo comunicar algo.
A coesão frásica designa os mecanismos linguísticos que conferem unidade aos vários elementos que constituem a frase.
Esses mecanismos são os seguintes:
- ordem das palavras na frase (ordem direta: SUJEITO + VERBO + COMPLEMENTOS / MODIFICADORES):
- Ex.: A Ana aborrece as pessoas.
- concordância em género e número (entre o núcleo nominal e adjetivos, determinantes, quantificadores, modificadores):
- Ex.: O João é um bom menino.
- Ex.: A Joana e a Sofia são boas meninas.
- interligação entre o predicado verbal e o sujeito e seus complementos;
- princípio da regência verbal:
- Ex.: A mulher de quem eu gosto chama-se Maria. (o verbo «gostar» rege a preposição «de»).
H. II. 2. Coesão e coerência textuais
1. Coesão textual:
- Coesão frásica;
- Coesão interfrásica;
- Coesão lexical;
- Coesão referencial;
- Coesão estrutural;
- Coesão temporo-aspetual.
2. Coerência:
- Tema;
- Rema;
- Progressão temática;
- Tematização do texto;
- Coerência textual:
- Coerência lógico-concetual;
- Coerência pragmático-funcional;
- Isotopia;
- Configuração do texto.
sábado, 18 de fevereiro de 2012
Vida de Eça de Queirós
CONSULTAR: https://feq.pt/o-escritor/
Obras
- O Mistério da Estrada de Sintra (1870) - em colaboração com Ramalho Ortigão.
- As Farpas (1871).
- Singularidades de uma Rapariga Loira - conto (1874).
- O Crime do Padre Amaro (1876) - 2.ª versão.
- O Primo Basílio (1878).
- O Crime do Padre Amaro (1880) - 3.ª versão.
- O Mandarim (1880).
- A Relíquia (1887).
- Os Maias (1888) - 2 volumes.
- Uma Campanha Alegre - de As Farpas (1890-1891) - 2 volumes.
- As Minas de Salomão (tradução), de Rider Haggard (1891).
Obras póstumas:
- A Correspondência de Fradique Mendes (1900).
- A Ilustre Casa de Ramires (1900).
- A Cidade e as Serras (1901).
- Contos (1902).
- Prosas Bárbaras (1903).
- A Capital (1926).
- Cartas de Eça de Queirós (1949).
- A Tragédia da Rua das Flores (1983).
Bibliografia:
quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012
O Acordo Ortográfico em cartune (II)
quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012
Exame Intermédio de Português 2012 - Informações
Consultar aqui »»».
domingo, 12 de fevereiro de 2012
Whitney Houston: "One Moment in Time"
1963 - 2012
Mais uma que a morte reclamou ao mundo da droga. Teve tudo, menos o essencial: cabeça.
sábado, 11 de fevereiro de 2012
As figuras da Geração de 70
Antero de Quental (1842 - 1890) |
É considerado o líder da Geração de 70 e protagonista central da Questão Coimbrã. Foi também o responsável por ter conferido ao grupo a dimensão interventiva e reformista que culminou nas Conferências Democráticas do Casino. É um dos maiores portugueses do século XIX.
Eça de Queirós (1845 - 1900) |
É o maior escritor da Geração de 70. Conheceu Antero de Quental quando ambos estudavam na Universidade de Coimbra e com ele fez parte do grupo do Cenáculo. A sua ação em defesa do Realismo (é de sua autoria a 4.ª Conferência do Casino, uma espécie de teorização do movimento realista) foi um dos traços marcantes da Geração.
Além da sua atividade enquanto escritor (publicou Contos Tradicionais do Povo Português, História da Poesia Popular Portuguesa e O Povo Português nos seus Costumes, Crenças e Tradições), desenvolveu uma ação social e política que culminou com o exercício da função de Presidente da república nos anos de 1910 e 1915.
Inicialmente, no conflito que opôs Antero, enquanto líder da Geração de 70, a António Feliciano de Castilho, figura central do grupo ultrarromântico - conflito conhecido por Questão Coimbrã -, posicionou-se contra o poeta açoriano. No entanto, acabou por se tornar um dos mais activos membros da Geração de 70. Crítico sarcástico, publicou a obra As Farpas, inicialmente em conjunto com Eça de Queirós, e interessou-se pela defesa do património.
Poeta e deputado progressista, relacionou-se com o grupo do Cenáculo e, mais tarde, fez parte dos Vencidos da Vida. Defensor intransigente da causa republicana, foi ministro após o derrube da Monarquia e a implantação da República.
Teófilo Braga (1843 - 1924) |
Ramalho Ortigão (1836 - 1915) |
Guerra Junqueiro (1850 - 1923) |
sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012
quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012
Realismo e Naturalismo (1865-1890)
11.
Origem do vocábulo Realismo
• O vocábulo realismo é
constituído pelos vocábulos real (do latim “res”, que
significava «facto», «coisa») e ismo, que significava «partido»,
«escola», «doutrina».
2.
Definição de Realismo
• O Realismo é um movimento artístico que
surge, em Portugal, em meados do século XIX, contestando o idealismo romântico.
3.
Origem do movimento realista
• França: o termo realismo (de origem francesa)
foi usado pela primeira vez pelo pintor Gustave Coubert, em 1855, ao intitular
a sua exposição de arte, realizada em Paris, como Le Réalisme. Por outro
lado, a primeira obra realista foi Madame Bovary, publicada em 1857, da
autoria de Gustave Flaubert.
• Em Portugal, é comum considerar que o Realismo
nasceu com a Questão Coimbrã, em 1865.
4.
Definição de Naturalismo
• O Naturalismo é um movimento
estético-literário com origem na doutrina positivista, estreitamento ligado ao
Realismo e às transformações sociais, científicas, filosóficas e éticas,
ocorridas no século XIX, tendo-se manifestado nas artes e na literatura.
5.
Origem do Naturalismo
• Dentro do Realismo surgiu uma corrente literária motivada pela
intensificação das suas características: o Naturalismo.
• A primeira obra naturalista é Thérèse Raquin, datada de 1867
e da autoria de Émile Zola.
6.
O Realismo na Europa
• O Realismo é um movimento literário que
surgiu na Europa, na segunda metade do século XIX, influenciado pelas
transformações que ali se operavam no âmbito económico, político, social e
científico, em oposição ao Romantismo e aos excessos de lirismo e de
imaginação.
• As duas causas determinantes para a
transição do Romantismo para o Realismo foram o desgaste de temas e de formas
românticas e o desenvolvimento de novas correntes científicas e filosóficas na
Europa.
• Economicamente, vivia-se a segunda fase
da Revolução Industrial, período marcado pelo clima de euforia e
progresso material que a burguesia industrial experimentava em virtude das
inúmeras invenções possibilitadas pelas descobertas científicas e tecnológicas.
No entanto, apesar dos benefícios trazidos à burguesia, a condição social do
proletariado era cada vez pior. Motivados tanto pelas ideias do socialismo
utópico, principalmente as de Proudhon e Robert Owen, quanto pelas ideias do
socialismo científico, defendidas por Karl Marx e Friedrich Engels, os
operários procuram organizar-se politicamente. Fundam então associações
trabalhistas e passam a exigir melhores condições de trabalho e de vida.
• No âmbito científico e cultural, ocorre
uma verdadeira efervescência de ideias, dentre as quais, surgidas como
consequência do aparecimento de várias correntes científicas e filosóficas, têm
destaque:
▪ o Positivismo, de Augusto Comte,
para o qual o único conhecimento válido é o conhecimento positivo, ou
seja, provindo das ciências;
▪ o Determinismo, de Taine, que
defende que o comportamento humano é determinado por três fatores: o meio, a
raça e o momento histórico;
▪ a lei da seleção natural, de Charles Darwin,
segundo a qual a natureza ou o meio selecionam, entre os seres vivos, as
variações que estão destinadas a sobreviver e a perpetuar-se, sendo eliminados
os mais fracos.
Enquanto nos domínios da Física, da
Química, da Biologia e da Medicina ocorrem avanços significativos, são lançados
os fundamentos de três novas disciplinas: a Sociologia, a Antropologia e a
Psicologia.
▪ Mediante este quadro de ideias, os escritores sentem a necessidade
de criar uma literatura sintonizada com a nova realidade, capaz de abordá-la de
modo mais objetivo e realista do que até então vinha fazendo o Romantismo. As
descobertas científicas, as ideias de reformas políticas e de revolução social
exigiam dos escritores, por um lado, uma literatura de ação, comprometida com a
crítica e a reforma da sociedade, e de outro, uma abordagem mais profunda e
completa do ser humano, visto agora à luz dos conhecimentos das correntes
científico-filosóficas da época. Aparece então o Realismo, cujas principais
ações são o combate a toda a forma romântica e idealizada de ver a realidade; a
crítica à sociedade burguesa e à falsidade dos seus valores e instituições
(Estado, Igreja, casamento, família); o embasamento no materialismo, o emprego
de ideias científicas; a introspeção psicológica das personagens; as descrições
objetivas e minuciosas; a lentidão do ritmo narrativo ...).
▪ Os três movimentos (Realismo, Naturalismo e
Parnasianismo) surgiram na França, com a publicação do romance realista Madame
Bovary (1857), de Flaubert; do romance naturalista Thérèse Raquin
(1867), de Zola, e das antologias parnasianas Parnasse Contemporain (a
partir de 1866). Note-se que, também em 1867, Zola publicou a obra O romance
experimental, encarada como um manifesto do movimento naturalista.
7.
O Realismo em Portugal
▪ A Questão Coimbrã (1865) é apontada como o marco introdutório
do Realismo em Portugal. Nessa época haviam cessado finalmente as lutas entre
liberais e as fações que representavam a velha monarquia deposta pela revolução
de 1820. Consolidado o liberalismo, Portugal conheceu, a partir de 1850, um
período de estabilidade política, de progresso material e de intercâmbio com o
resto da Europa. Coimbra, importante centro cultural e universitário da época,
ligava-se em 1864 diretamente à comunidade europeia por meio do caminho de
ferro. Contudo, do ponto de vista literário, predominavam ainda velhas ideias
românticas.
▪ O primeiro romance realista português é O Crime do Padre Amaro,
de Eça de Queirós, cuja primeira versão (de três) foi publicada em 1875.
▪ Em França, ao lado do realismo surgem também as correntes literária
denominadas Naturalismo e Parnasianismo, de pequena penetração em Portugal. A
primeira procura provar, através do romance de tese, as teorias
científicas da época, particularmente o determinismo. O Parnasianismo, por sua
vez, é uma corrente que combate os exageros de sentimento e de imaginação do
Romantismo e tenta resgatar certos princípios clássicos de procedimento, como a
busca do equilíbrio, da perfeição formal e o emprego da razão e da
objetividade.
8.
Características do Realismo
1.ª) O Realismo é uma reação contra o Romantismo,
contra os excessos, contra o idealismo artificial e formalista e as atitudes
emocionais enfáticas e hiperbólicas dos românticos, defendendo a análise,
síntese e exposição da realidade com verdade e neutralidade do coração. Perante
o bem e o mal, o vício e a virtude, o belo e o feio, o escritor realista não
deixará transparecer qualquer emoção. É uma literatura anti-idealista e que
combate a evasão romântica, interessando-se pela realidade circundante, pela
análise social e pelo contemporâneo. Ao sentimento exacerbado opõe a análise do
caráter humano.
2.ª) O Realismo é a negação da "arte pela
arte".
3.ª) A obra de arte é vista como uma verdadeira tese
com intenção científica.
4.ª) É uma literatura engagé, isto é, comprometida ou empenhada, humana e/ou socialmente.
A arte realista mantém um compromisso com a sua época e com a observação do
mundo objetivo e exato. Como proclamará Antero nas Odes Modernas, “A
Poesia é a voz da Revolução”.
5.ª) Recurso à reflexão e análise: o Realismo visa
uma análise corajosa, mas exata, da vida, do mundo e dos seus vícios. Os
realistas desnudam e atacam a imoralidade, os vícios, os maus costumes, os
aspetos baixos da vida/sociedade contemporâneas.
6.ª) Preconiza uma atitude descritiva e crítica em
relação à sociedade.
7.ª) Defende a observação e análise de tipos humanos
e costumes sociais, tentando representar objetivamente a realidade.
8.ª) Observação do pormenor: na representação da
ação, quase sempre de implicações sociais, os espaços e as personagens são
descritos de forma pormenorizada, pois isso permite uma reflexão crítica sobre
o ser humano e os seus problemas concretos.
9.ª) Dá preferência ao presente contemporâneo do
escritor. Assim, a crítica social ficaria mais próxima e mais concreta. Nesse
sentido, a literatura ganha um papel de denúncia do que de mau existe na
sociedade.
10.ª) Reflete ideais republicanos e socialistas e
marcas da ideologia materialista e do reformismo liberal.
11.ª) Os temas mais cultivados pelos escritores
realistas são temas cosmopolitas e de incidência coletiva:
▪
a representação da vida burguesa, naquilo que ela possa ter de mais
desagradável ou negativo, em certos aspetos da sua existência económica (a
usura, a ambição, a avareza, a cobiça, a corrupção, etc.);
▪
a representação da vida urbana, porque é nos grandes meios sociais, nas
cidades, que as tensões sociais, políticas e económicas, resultantes ainda dum
comportamento condenável da burguesia, mais se agudizam;
▪
a análise das relações e dos conflitos sociais, resultantes de grandes
desníveis entre classes;
▪
a representação do sofrimento social e moral, da frustração, da opressão, da
corrupção e do vício, em consequência de erros e injustiças sociais, económicas
ou políticas;
▪
o adultério, a frivolidade;
▪
a educação, o jornalismo, a política, o parlamentarismo.
12.ª) A forma literária privilegiada pelo Realismo é
o romance.
13.ª) A narração articula-se com a descrição,
intercalando a representação de uma ação com a descrição de espaços sociais (Os
Maias).
14.ª) O Realismo procura a objetividade, a análise
impessoal e minuciosa/pormenorizada da realidade, que critica. É o gosto pelo
real.
15.ª) Procura o retrato fidelíssimo da Natureza.
16.ª) Faz uso da personagem-tipo, que permite a
reflexão crítica sobre o Homem e os seus problemas.
17.ª) Preconiza uma nova moral social: crítica de
costumes, de temperamento, de ações.
18.ª) Visa a regeneração de costumes.
19.ª) A construção da personagem está em conexão com
o mundo profissional, cultural, económico, social e psicológico.
9.
Características do Naturalismo
1.ª) A literatura naturalista é a expressão dos
progressos da ciência (Fisiologia, Sociologia, estudo dos caracteres, da
evolução, da influência do meio, etc.). O Naturalismo deve usar o método
fisiológico, ou seja, deve descrever as emoções através das suas manifestações
físicas, com base no estudo das fisiologias.
2.ª) O romance naturalista inspira-se na vida
quotidiana, comum, procurando a análise rigorosa do meio social e de aspetos
patológicos.
3.ª) É uma corrente influenciada pela ciência e pela
filosofia do século XIX, nomeadamente pelo Determinismo (o Homem está preso a
um destino que ele não consegue mudar) e pelo Positivismo de Comte.
4.ª) Traz a ciência para a obra de arte; tenta
aplicar à literatura as descobertas e métodos da ciência da época. A obra
literária surge como a ilustração das teses científicas.
5.ª) Os temas fundamentais do romance naturalista
("experimental") são:
▪ a opressão social e a miséria, como resultado
de conflitos de interesses, denunciando as suas causas económicas, políticas e
sociais;
▪ o adultério, como denúncia de determinado modo
de vida resultante duma errada educação romântica;
▪ o alcoolismo, como deformação social e dos
caracteres;
▪ o jogo, encarado como consequência de
determinadas situações de injustiça;
▪ a doença (por exemplo, a loucura), enquanto
manifestação de taras hereditárias.
6.ª) Procura explicar cientificamente o
comportamento do homem com base em três fatores: a hereditariedade, o meio
ambiente e a educação/momento histórico. Os fenómenos humanos são consequências
inevitáveis destas determinações.
7.ª) A forma literária adotada foi o chamado
"romance experimental" (seguido do conto), resultante da aplicação
dos princípios da observação e da experimentação, adotados inicialmente na
investigação científica.
8.ª) Procura a análise das circunstâncias sociais
que envolvem as personagens. Através da análise experimental (do meio social),
explica a decadência da sociedade.
9.ª) Manifesta preocupações socioculturais e
objetiva a crítica dos costumes, como o Realismo.
10.ª) Usa a indução e os métodos experimentais;
descreve, por exemplo, as emoções, justificando as manifestações físicas pelos
estudos fisiológicos e de caracteres. Procura a anatomia do carácter.
11.ª) Dá relevo à importância das leis da Natureza.
12.ª) A arte deve representar objetivamente a realidade.
10.
Semelhanças entre Realismo e Naturalismo
1.ª) A Arte é a representação mimética objetiva da
realidade exterior (em contraste com a transfiguração imaginativa, impregnada
de subjetivismo, praticada pelos românticos).
2.ª) A objetividade dos temas.
3.ª) A técnica impessoal de narrar.
4.ª) Servem-se dos mesmos preceitos científicos.
11.
Diferenças
1.ª) O Naturalismo procura aplicar à obra literária
as descobertas e métodos das ciências experimentais do século XIX (Biologia,
Positivismo, Psicopatologia). Assim, transporta a ciência para a obra
literária, fazendo desta um meio de demonstração de teses científicas,
especialmente de psicopatologia. O Homem era um simples produto biológico cujo
comportamento resultava da pressão do ambiente social e da hereditariedade
psicofisiológica. O Realismo ignora a Patologia ou qualquer outra ciência como
meio de explicar e ilustrar a obra de arte.
2.ª) O Naturalismo implica uma posição combativa, de
análise dos problemas que a decadência social evidenciava, fazendo da obra de
arte uma verdadeira tese com intenção científica. O Realismo limita-se a
"fotografar" com certa isenção a realidade circundante, sem trazer a
ciência para a obra de arte.
3.ª) O Realismo procura retratar o Homem interagindo
no seu meio social; o Naturalismo pretende mostrá-lo como produto de um
conjunto de forças “naturais”, instintivas, que, em determinado meio, raça e
momento, pode gerar comportamento e situações específicas.
4.ª) No romance experimental naturalista, o
indivíduo é mero produto da hereditariedade. Ao lado desta, o ambiente em que
vive, e sobre o qual também age, determina o seu comportamento pessoal. Assim,
predomina o elemento fisiológico, natural, instintivo: erotismo, agressividade
e violência são os componentes.
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