Blimunda Sete-Luas é filha de Sebastiana Maria de Jesus, condenada ao degredo, acusada de ser visionária e cristã-nova, num auto-de-fé, onde conhece Baltasar.
Fisicamente, poucos dados nos são transmitidos sobre a personagem, sendo todo o realce dirigido para os olhos, descritos diversas vezes - de facto, ela possui uns olhos misteriosos, extraordinários, de cor indefinida ("... olhos como estes nunca se viram, claros de cinzento, ou verde, ou azul, que com a luz de fora variam ou o pensamento de dentro, e às vezes tornam-se negros nocturnos ou brancos brilhantes como lascado carvão de pedra..." - pág. 55), e para o corpo, alto e delgado. O cabelo é "... russo, injusta palavra, que a cor dele é a do mel..." (pág. 103).
Tem 19 anos no momento em que conhece Baltasar e mantém intacta a sua virgindade, que entrega a Baltasar na sequência do seu encontro do auto-de-fé. Tem poderes mágicos: é vidente, pois possui a capacidade de, em jejum, "ver por dentro" das coisas e das pessoas (capacidade que só emprega em Baltasar no derradeiro momento da comunhão mística entre ambos); tem também o poder de recolher vontades, dois traços fundamentais e imprescindíveis na construção da passarola, que se tornará, igualmente, o seu projecto. Estes seus poderes são aplicados no mundo real, concreto, no entanto ela consegue ver para além das aparências, já que possui o dom da ecovisão, o dom de ver por dentro das pessoas e das coisas, afastando-se da materialidade e aproximando-se da espiritualidade adstrita à arte de Scarlatti e ao sonho de voar do padre Bartolomeu de Gusmão. O facto de o único ser que ela se recusa a ver ser Baltasar, o «seu homem», pode significar a dificuldade em «ver» quem se ama, talvez por medo do que possa encontrar.
É, portanto, uma personagem marcada pela excepcionalidade, revelada pela sua ascendência (é filha de uma feiticeira), pelo valor simbólico do nome que lhe é atribuído ("Sete-Luas") e pelos seus dotes particulares de vidência ("ver por dentro").
O seu único amor é Baltasar, com quem forma um só, por quem está disposta a realizar todos os sacrifícios e a quem dedica uma afeição verdadeira, espontânea e duradoura. Por outro lado, o amor dela por ele é também o símbolo da aceitação e renúncia, dado que nunca o olha por dentro, como vimos. Aos olhos de Scarlatti, Blimunda e Baltasar surgem, respectivamente, como Vénus e Vulcano (pág. 168). Com efeito, apaixonada pelo ex-soldado, mantém com ele uma relação de amor, de cumplicidade "que não é deste mundo", de igualdade de direitos e de companheirismo, a que não falta a atracção física revelada em jogos eróticos de prazer. Esta cumplicidade e partilha entre o casal traduzem a imagem de uma mulher desfasada e adiantada relativamente à época em que vive, pois ela afirma-se independentemente do homem com quem vive e que para ela olha de igual para igual, fazendo-a partilhar os seus sonhos, medos e vida, em suma. O amor que vivem é um amor fora das normas do seu tempo, um amor não-cristianizado, mas nem por isso menos (a seu modo) sagrado, e miticamente exemplar. Foram talhados um para o outro, como lembra o ditado popular ("O casamento e a mortalha no céu se talha"), convivendo em harmónica união ("Dormiram nessa noite os sóis e as luas abraçados, enquanto as estrelas giravam devagar no céu, Lua onde estás, Sol aonde vais..." - pág. 90), também sugerida pela simbologia do novo nome: o 7 simboliza o ciclo completo, uma dinâmica perfeita. Talvez por isso nunca tenham tido filhos. A união e a harmonia do casal são tais que este é perspectivado como se de uma personagem se tratasse: "... já sabemos que destes dois se amam as almas, os corpos e as vontades...". Entre as lides do campo, os trabalhos no convento, a construção da passarola e a recolha de vontades, Baltasar dispõe sempre de tempo e espaço para, do lado direito da enxerga, amparar Blimunda com a mão que lhe resta.
A relação entre ambos fica marcado, desde o início, por circunstâncias extraordinárias, desde o ritual de aceitação da colher até ao ritual de baptismo através do sangue virgem de Blimunda, passando pelo recurso ao silêncio enquanto forma primordial de comunicação: "não falou Blimunda, não lhe falou Baltasar, apenas se olharam, olharem-se era a casa de ambos.". As palavras são frias e desnecessárias no meio dos gestos. Um homem, uma mulher, dois corpos, duas almas, duas vontades. Por outro lado, amparam-se mutuamente, pois ele acalma-a na sua maldição de ver por dentro as pessoas e ela ajuda-a na falta da sua mão.
Como acima ficou dito, Blimunda, tal como Baltasar, colabora na construção da passarola, contribuindo com os seus poderes mágicos na recolha das duas mil vontades que a farão voar e com o seu poder de "ver por dentro", que lhe permite verificar os seus defeitos de construção e corrigi-los, evitando deficiências na construção. A recolha das vontades deixa Blimunda exausta e doente, "uma extrema magreza, uma palidez profunda que lhe tornava transparente a pele", e será apenas a música do cravo de Scarlatti a salvá-la e restituí-la à vida.
Por outro lado, o envelhecimento físico não deteriora a juventude interior da personagem e a relação que mantém com Baltasar, sobretudo porque, aos olhos deste, ela continua a mesma. O próprio cansaço e o esgotamento que a atinge a nível físico após a peregrinação por Lisboa em busca das vontades levam o narrador a associar às imagens dos sóis e das luas a perda de algum brilho e fulgor: "... cansados de tanta caminhada, de tanto subir e descer de escadas, recolheram-se Blimunda e Baltasar à quinta, sete mortiços sóis, sete pálidas luas..." (p. 181).
Com o decorrer da intriga, Blimunda revela uma sabedoria e uma postura muito próprias, apresentando-se como um elemento mágico não explicado, tendo aprendido coisas sobre a vida e a morte, sobre o pecado e o amor "na barriga da mãe", onde permaneceu "de olhos abertos" (cap. XXIII, p. 331). Daí que tenha uma presença bastante forte, sólida e afirmativa no romance. As restantes personagens (o padre Bartolomeu, Baltasar, Scarlatti e Marta Maria) reconhecem o mistério que subjaz ao seu olhar e ao seu extraordinário poder perceptivo, inexplicável até para a própria personagem.
Após o desaparecimento de Baltasar (ela própria tinha pressentido que não voltaria a estar com ele, daí que o tivesse conduzido para a barraca e o amasse com sofreguidão), secou as lágrimas e partiu à sua procura durante 9 anos. Esse percurso revela uma mulher corajosa, determinada, persistente, disposta a tudo para encontrar o seu amor. Durante essa demanda, acaba por matar um dominicano, sedento de um momento de prazer, com o espigão de Baltasar, que simbolicamente representa o marido em defesa da mulher: "Do outro lado do convento, num rebaixo (...) aonde tiver que ir, inferno ou paraíso." (cap. XXIV, pp. 344-346). Na sequência desse desaparecimento e durante a sua busca, os olhos de Blimunda adquirem novas características, além da indefinição da cor, pois neles se reflectem inquietações e preocupações: "... que segredos se escondiam no rosto impenetrável, nos olhos pardos, cujas pálpebras raramente batiam, e que a certas horas e certa luz pareciam lagos onde flutuavam sombras de nuvens, as sombras que dentro passavam, não as comuns do ar..." (p. 354). Na sua incansável procura, só à sétima vez que passou por Lisboa o encontrou a ser queimado num auto-de-fé, juntamente com António José da Silva, autor de comédias de bonifrates e conhecido por O Judeu.
É, portanto, uma personagem marcada pela excepcionalidade, revelada pela sua ascendência (é filha de uma feiticeira), pelo valor simbólico do nome que lhe é atribuído ("Sete-Luas") e pelos seus dotes particulares de vidência ("ver por dentro").
O seu único amor é Baltasar, com quem forma um só, por quem está disposta a realizar todos os sacrifícios e a quem dedica uma afeição verdadeira, espontânea e duradoura. Por outro lado, o amor dela por ele é também o símbolo da aceitação e renúncia, dado que nunca o olha por dentro, como vimos. Aos olhos de Scarlatti, Blimunda e Baltasar surgem, respectivamente, como Vénus e Vulcano (pág. 168). Com efeito, apaixonada pelo ex-soldado, mantém com ele uma relação de amor, de cumplicidade "que não é deste mundo", de igualdade de direitos e de companheirismo, a que não falta a atracção física revelada em jogos eróticos de prazer. Esta cumplicidade e partilha entre o casal traduzem a imagem de uma mulher desfasada e adiantada relativamente à época em que vive, pois ela afirma-se independentemente do homem com quem vive e que para ela olha de igual para igual, fazendo-a partilhar os seus sonhos, medos e vida, em suma. O amor que vivem é um amor fora das normas do seu tempo, um amor não-cristianizado, mas nem por isso menos (a seu modo) sagrado, e miticamente exemplar. Foram talhados um para o outro, como lembra o ditado popular ("O casamento e a mortalha no céu se talha"), convivendo em harmónica união ("Dormiram nessa noite os sóis e as luas abraçados, enquanto as estrelas giravam devagar no céu, Lua onde estás, Sol aonde vais..." - pág. 90), também sugerida pela simbologia do novo nome: o 7 simboliza o ciclo completo, uma dinâmica perfeita. Talvez por isso nunca tenham tido filhos. A união e a harmonia do casal são tais que este é perspectivado como se de uma personagem se tratasse: "... já sabemos que destes dois se amam as almas, os corpos e as vontades...". Entre as lides do campo, os trabalhos no convento, a construção da passarola e a recolha de vontades, Baltasar dispõe sempre de tempo e espaço para, do lado direito da enxerga, amparar Blimunda com a mão que lhe resta.
A relação entre ambos fica marcado, desde o início, por circunstâncias extraordinárias, desde o ritual de aceitação da colher até ao ritual de baptismo através do sangue virgem de Blimunda, passando pelo recurso ao silêncio enquanto forma primordial de comunicação: "não falou Blimunda, não lhe falou Baltasar, apenas se olharam, olharem-se era a casa de ambos.". As palavras são frias e desnecessárias no meio dos gestos. Um homem, uma mulher, dois corpos, duas almas, duas vontades. Por outro lado, amparam-se mutuamente, pois ele acalma-a na sua maldição de ver por dentro as pessoas e ela ajuda-a na falta da sua mão.
Como acima ficou dito, Blimunda, tal como Baltasar, colabora na construção da passarola, contribuindo com os seus poderes mágicos na recolha das duas mil vontades que a farão voar e com o seu poder de "ver por dentro", que lhe permite verificar os seus defeitos de construção e corrigi-los, evitando deficiências na construção. A recolha das vontades deixa Blimunda exausta e doente, "uma extrema magreza, uma palidez profunda que lhe tornava transparente a pele", e será apenas a música do cravo de Scarlatti a salvá-la e restituí-la à vida.
Por outro lado, o envelhecimento físico não deteriora a juventude interior da personagem e a relação que mantém com Baltasar, sobretudo porque, aos olhos deste, ela continua a mesma. O próprio cansaço e o esgotamento que a atinge a nível físico após a peregrinação por Lisboa em busca das vontades levam o narrador a associar às imagens dos sóis e das luas a perda de algum brilho e fulgor: "... cansados de tanta caminhada, de tanto subir e descer de escadas, recolheram-se Blimunda e Baltasar à quinta, sete mortiços sóis, sete pálidas luas..." (p. 181).
Com o decorrer da intriga, Blimunda revela uma sabedoria e uma postura muito próprias, apresentando-se como um elemento mágico não explicado, tendo aprendido coisas sobre a vida e a morte, sobre o pecado e o amor "na barriga da mãe", onde permaneceu "de olhos abertos" (cap. XXIII, p. 331). Daí que tenha uma presença bastante forte, sólida e afirmativa no romance. As restantes personagens (o padre Bartolomeu, Baltasar, Scarlatti e Marta Maria) reconhecem o mistério que subjaz ao seu olhar e ao seu extraordinário poder perceptivo, inexplicável até para a própria personagem.
Após o desaparecimento de Baltasar (ela própria tinha pressentido que não voltaria a estar com ele, daí que o tivesse conduzido para a barraca e o amasse com sofreguidão), secou as lágrimas e partiu à sua procura durante 9 anos. Esse percurso revela uma mulher corajosa, determinada, persistente, disposta a tudo para encontrar o seu amor. Durante essa demanda, acaba por matar um dominicano, sedento de um momento de prazer, com o espigão de Baltasar, que simbolicamente representa o marido em defesa da mulher: "Do outro lado do convento, num rebaixo (...) aonde tiver que ir, inferno ou paraíso." (cap. XXIV, pp. 344-346). Na sequência desse desaparecimento e durante a sua busca, os olhos de Blimunda adquirem novas características, além da indefinição da cor, pois neles se reflectem inquietações e preocupações: "... que segredos se escondiam no rosto impenetrável, nos olhos pardos, cujas pálpebras raramente batiam, e que a certas horas e certa luz pareciam lagos onde flutuavam sombras de nuvens, as sombras que dentro passavam, não as comuns do ar..." (p. 354). Na sua incansável procura, só à sétima vez que passou por Lisboa o encontrou a ser queimado num auto-de-fé, juntamente com António José da Silva, autor de comédias de bonifrates e conhecido por O Judeu.