sábado, 12 de junho de 2021
segunda-feira, 7 de junho de 2021
Análise de "Todas as cartas de amor são ridículas"
Ao longo da composição, o «eu»
repete uma ideia, como se quisesse provar uma tese: as cartas de amor são
ridículas. De facto, de acordo com a estrofe inicial, as cartas de amor são,
por natureza, ridículas. Trata-se de um facto, um dado adquirido, algo que é do
conhecimento geral.
Na terceira, clarifica que, quando
há amor verdadeiro e autêntico, as cartas de amor «têm de ser» ridículas, isto
é, caracterizadas por um tom exageradamente sentimental. É típico das missivas
amorosas repetir clichés e transbordar emoções.
A quarta estrofe clarifica o sentido
do poema. Se, nas anteriores, ressaltava a ideia de que estávamos na presença
de uma crítica ao sentimentalismo romântico, nesta o «eu» explica que, na
verdade, ridículas são as pessoas que nunca escreveram cartas de amor, isto é,
que nunca expressaram os seus sentimentos de forma tão simples, sincera e sem
barreiras. Deste modo, a crítica será dirigida àqueles que julgam os outros
porque nunca se apaixonaram, pelo menos daquela forma.
Na quinta, o «eu» assume que sente
saudades do passado inocente e esperançoso em que escrevia cartas de amor.
Nesse tempo, o sujeito lírico não teria pudor ou consciência de que escrever
cartas de amor seria algo ridículo aos olhos de outras pessoas.
Na penúltima estrofe, encontramos um
«eu» maduro e mais cínico que parece sentir vergonha das cartas de amor que
escreveu no passado, na sua juventude. Reconhece que aquilo que é realmente
ridículo é o modo como recorda esse momento e esse facto. Com o tempo, a forma
como encara e vive o sentimento amoroso mudou e ele mesmo foi-se tornando mais
fechado e incapaz de se expressar de um mondo tão intenso e genuíno.
A última estrofe está toda entre parênteses,
um sinal de pontuação que exprime, por vezes, uma explicação, o que nos faz
considerar que esta parte do texto constitui, de facto, uma explicação da
estrofe anterior ou até de todo o poema. Ela sugere que todas as palavras e os
sentimentos presentes numa carta de amor são ridículos, o que pode significar que
não é a pessoa que está apaixonada que é ridícula, ou as cartas, mas sim as
palavras e os sentimentos em si.
quarta-feira, 2 de junho de 2021
Episódio de Leonardo
Análise de "Cálice", de Chico Buarque e Gilberto Gil
Análise de "Eu cantei já, e agora vou chorando"
Introdução:
|
O soneto é da autoria de Luís
de Camões, poeta renascentista português que viveu, provavelmente, entre 1524
ou 1525 e 1580, sendo um dos cânones da literatura portuguesa e insigne na
cultura universal. Este poema insere-se na chamada corrente renascentista,
visto assumir a forma de um soneto, composição poética importada de Itália
por Sá de Miranda, após a sua passagem pelo país. É, portanto, um exemplo da
chamada medida nova.
|
Desenvolvimento:
. Tema
. Assunto
. Estrutura
externa
. Estrutura
interna – 1.ª parte – 2.ª
parte
. Contraste
passado / presente
. Estado de espírito do sujeito e suas causas
. Recursos expressivos
Conclusão
|
Neste texto,
é abordado o tema do infortúnio e o assunto compreende a saudade por um tempo
passado que, comparativamente ao presente, embora enganador, era preferível à
desolação que o rodeia e à implacabilidade e inexorabilidade do destino. O poema é constituído por duas
quadras e dois tercetos (um soneto), num total de catorze versos
decassilábicos heroicos, visto que são acentuados na sexta e décima sílabas (Eu/can/tei/já/e
a/go/ra/vou/cho/ran), com rima interpolada e emparelhada, de acordo com o
seguinte esquema rimático: ABBA / ABBA / CDE / CDE. Em todos os versos
encontra-se rima grave ou feminina (“chorando”/”confiando”), consoante e
incompleta (“confiado”/”passado”), à exceção dos versos 9 e 12, que possuem
rima completa. Nos grupos de versos 1 e 4, 2 e 3, 10 e 13, 11 e 14, a rima é
pobre, dado que as palavras rimantes pertencem à mesma classe gramatical
(“chorando”/”criando”), enquanto que nos restantes é rica, pois rimam
palavras de classes diferentes (“quando”/”julgando”). Por outro lado, nos
versos 11 e 14 existe rima imperfeita. O soneto pode dividir-se em
duas partes. Na primeira, correspondente às duas quadras e ao primeiro
terceto, o sujeito lírico lamenta o passado ilusório e enganador que o
destino o obrigou a viver, o que acentua a precariedade do momento presente.
No último terceto, a segunda parte, o sujeito poético, através do recurso a
duas interrogações retóricas nos versos 12 e 14, responsabiliza o destino
que, sendo inimigo e implacável, se sobrepõe aos erros de uns e/ou à
falsidade de outros, tornando inútil qualquer esperança. O sujeito poético começa por
estabelecer uma relação antitética entre o passado e o presente, salientando
a alegria experimentada em contraste com a tristeza do presente (“Eu cantei
já e agora vou chorando” – v. 1). Note-se a abundância de vocábulos de cariz
negativo, tais como “chorando” (v. 1), “lágrimas” (v. 4), “fui enganado” (v.
6), “triste” (v. 7), “som de ferros” (v. 11), “mente” (v. 12, “culpa” (v.
13), “injusta”, “erros” (v. 14), que exprimem a sua dor e desalento
presentes. Por outro lado, as diversas antíteses (“cantei”/”vou chorando” –
v. 1; “canto”/”lágrimas” – vv. 3 e 4; “triste (…) presente” – v. 7 / “passado
(…) ledo” – v. 8) confirmam o contraste existente entre a felicidade passada
e a tristeza presente vivido pelo sujeito lírico. Este chega mesmo a revelar
a consciencialização do fator que contribuiu para o seu desencanto e a sua
desilusão: a traição de que foi vítima por parte de alguém, como se pode
comprovar pelas expressões seguintes: “(…) fui nisso enganado” – v. 6;
“Fizeram-me cantar, manhosamente” – v. 9; “(…) tudo mente” – v. 12. Ao tomar
consciência disto, o sujeito põe em causa a aparente felicidade anterior,
considerando-a um prenúncio da desgraça que está a viver (“Parecer que no
canto já passado / Se estavam minhas lágrimas criando” – vv. 3-4),
acentuando, deste modo, o momento presente como muito negativo e infeliz (“É
tão triste este meu presente estado” – v. 7). O eu diz-se vítima da alegria
tranquila e ilusória que conheceu [“(…) cantei tão confiado” – v. 2;
“Fizeram-me cantar (…) / confianças” – vv. 9-10] de ter , a qual não era
senão um esboço, um indício do seu destino de desventura, que metaforicamente
identifica com prisão, com sofrimento, já que foi esse o resultado que
obteve: “Cantava, mas já era ao som dos ferros” – v. 11. O sujeito, tal como foi
anteriormente referido, realça o tempo passado, predominando as formas
verbais no pretérito perfeito (vv. 1, 2, 5, 6, 9) e imperfeito (vv. 4 e 11),
o advérbio de tempo “já” (vv. 1, 3, 11), a forma verbal repetida “cantei”
(vv. 1, 2, 5), bem como outras formas do mesmo verbo (vv. 9, 11) e outros
vocábulos pertencentes ao mesmo campo semântico (“canto” – v. 3), de modo a
salientar a existência de uma situação calma e tranquila que foi alterada
contra a sua vontade. Deste modo, o sujeito sente-se objeto de manipulação de
uma entidade superior [“(…) a Fortuna injusta (…)” – v. 14], que, para além
de ter modificado a sua vida e o seu estado de espírito, atuou de forma
camuflada, deixando-o viver na ilusão, até que fez desmoronar a encenação e
contribuiu para o estado presente do eu. Note-se a importância da conjunção
coordenativa adversativa “mas” (vv. 5, 10, 11), com o intuito de reforçar o
contraste entre o comportamento que o eu assumia e as suas causas reais: não
sabe concretizar a real época da sua felicidade, desconhecia a presença
nefasta do destino nos seus atos. É de salientar igualmente que o tempo
passado, a felicidade, ocorreu num momento pontual, concreto, definido, para
o que contribui o pretérito perfeito, reforçando o seu caráter efémero,
enquanto que o presente, marcado pelo sofrimento e pela dor, se reveste de um
cariz durativo, que é conseguido através da conjugação perifrástica, fazendo
pressupor que a infelicidade, a tristeza são sentidas com maior intensidade:
“vou chorando” (v. 1); “estavam (…) criando” (v. 4); “estou julgando” (v. 8).
O pessimismo e o dramatismo do momento presente vivido pelo sujeito,
resultado de um passado fictício, encontram-se sintetizados no verso 12
quando o eu afirma ”(…) tudo mente”, o que vem corroborara existência de uma
ilusão, de um engano vividos, fruto da atuação de uma força superior,
manipuladora. Temas como este, onde
sobressaem a fatalidade, a desgraça, a infelicidade, a desilusão, são
frequentes na lírica camoniana, quer se refiram à força do Destino sobre o
próprio sujeito poético, quer à influência exercida pela mulher amada. |