● Caracterização das personagens (a partir das cenas III e IV)
a. Maria:
. sebastianista fervorosa e nacionalista, crê que D.
Sebastião está vivo e vai regressar;
. é uma espécie de porta-voz da sabedoria popular: “Voz
do povo, voz de Deus”;
. lê muito (novelas de cavalaria e romances
populares);
. manifesta interesse por temas impróprios para a sua
idade: romances populares sobre D. Sebastião e a batalha de Alcácer Quibir;
. sofre ao observar o sofrimento da mãe, que não
compreende;
. é bondosa, carinhosa e terna com a mãe;
. muito precoce, possui uma imaginação e curiosidade
pouco próprias da sua idade: “Maria, que tu hás de estar sempre a imaginar
nessas coisas que são tão pouco para a tua idade”;
. pensa muito (“passo noites inteiras em claro a
lidar nisto”; “a pensar em tudo”): Maria passa as noites em claro, a rever as
suas atitudes e as dos pais, para tentar descobrir as razões da sua preocupação,
por considerar que há algo que não lhe é revelado;
. tem sonhos estranhos, em cuja interpretação revela
poderes de profecia: lê nos olhos e nas estrelas;
. é muito intuitiva;
. é alegre, mas sente-se subitamente invadida por
grande tristeza (“uma tristeza muito grande que eu tenho”): essa tristeza está
relacionada com a constante preocupação dos pais com ela; o seu poder intuitivo
e de observação permitem-lhe perceber a preocupação dos pais com a sua saúde e
crenças; quando pergunta à mãe por que razão o pai não tinha permanecido na
Ordem de Malta e deixara o hábito, parece expressar o desejo de que o pai nunca
o tivesse feito, o que corresponderia à sua inexistência; ela compreende que há
algo que lhe escondem;
. é visionária e muito sensível: “não quero sonhar,
que me faz ver coisas lindas às vezes, mas tão extraordinárias e confusas…”;
. possui um conhecimento íntimo de si própria que
escapa aos familiares: “O que eu sou… só eu o sei, minha mãe… E não sei, não:
não sei nada, senão que o que devia ser não sou…”;
. é corajosa, de personalidade forte, destemida e
idealista, dotado de caráter varonil, revelado no desejo de ter um irmão e de
resistência aos governadores: “um galhardo e valente mancebo capaz de comandar
os terços de meu pai”; “Tomara eu ver seja o que for que se pareça com uma batalha!”;
. insurge-se contra as injustiças sociais: “Coitado
do povo!”; “… onde a miséria fosse mais e o perigo maior, para atender com
remédios e amparo aos necessitados (cena V);
. Frei Jorge chama-lhe Teodora, nome que
significa sábia (cena V);
. é idealista e patriota, manifestando toda a sua
vontade de resistir aos governadores: “Fechamos-lhes as portas. Metemos a nossa
gente dentro e defendemo-nos.” (cena VI);
. fica entusiasmada com a notícia trazida pelo pai,
dando largas à sua imaginação, ao seu idealismo e ao seu patriotismo;
. sofre de tuberculose, a doença dos românticos –
sintomas:
- a febre
- as mãos a queimar
- as rosetas nas
facetas
-
a audição a grandes distâncias (cena VI)
modelo da heroína romântica:
. ideais de liberdade
. exaltação de valores de feição popular
. crença na independência nacional
. atração pelo mistério
. intuição
. doença da época (tuberculose)
. linguagem:
1.ª) A doença de Maria favorece ao longo da obra a sua
extraordinária fantasia e a morte no final.
2.ª) Maria tem duas atitudes contrastantes: uma de
crítica, outra de afeto para com sua mãe. A alteração deve-se à observação do
aspeto doloroso da sua mãe.
b. D.
Madalena:
. sofre (chora) com as palavras de Maria;
. evidencia uma grande tensão psicológica, agravada
pela menção inconsciente de Maria a aspetos que a aterrorizam;
. manifesta grande preocupação perante a precocidade
da filha.
c. Telmo Pais:
. tem uma presença silenciosa, mas identifica-se com
os ideais de Maria;
. contribui para o clima de opressão;
. aparenta resignação e convencimento;
. manifesta preocupação com a debilidade de Maria.
● Características
da tragédia
▪ Agón de D. Madalena:
- com Maria: para
esta, há um enigma que nem a mãe, nem o pai, nem mesmo Telmo se prontificam a
decifrar; são segredos e mistérios intuitivamente pressentidos que não consegue
desvendar:
. a razão por que nem a mãe nem o pai, apesar do seu
patriotismo (“… que ele não é por D. Filipe, não é, não?”) acreditavam no
regresso de D. Sebastião;
. a razão por que, quando em tal se falava, o pai
mudava de semblante, e a mãe se afligia e até chorava;
- com D. João de
Portugal, nas reações de aflição, sublinhadas pelas lágrimas, sempre que Maria
se refere à crença popular da sobrevivência e possível regresso de D. Sebastião
– cena III.
▪ Agón
de Maria:
- com D. Madalena:
. a propósito da sobrevivência e do regresso de D.
Sebastião (cena III) – D. Madalena não acredita, nem lhe convém acreditar nem
uma coisa nem outra. Maria acredita firmemente;
. desconfia que a mãe oculta alguma coisa muito
importante; por isso, está sempre atenta, a observar os sobressaltos, a
ansiedade da mãe a seu respeito; por isso, lê nas palavras, nas ações e nos
gestos da mãe (e do pai), à procura de indícios, de respostas para a sua
curiosidade (cena IV);
. não pode cumprir as esperanças nela depositadas
(cena IV);
. por isso, desejaria ter um irmão (cena IV);
- com Manuel de
Sousa:
. duvida do patriotismo do pai (cena III), por causa das
atitudes que ele toma, ao ouvir falar de D. Sebastião: “Ó minha mãe, pois ele
não é por D. Filipe, não é, não?”;
. a hipótese não tem fundamento.
Este conflito de Maria com os pais, pois ambos não
aceitam ouvir falar do regresso de D. Sebastião, tem razões óbvias: se o
monarca não morreu, também não terá morrido D. João de Portugal; o segundo
casamento de D. Madalena seria nulo.
- com D. João de
Portugal (antes da mudança de palácio – cena IV):
. pressente intuitivamente que alguém, fazendo
sofrer a mãe, também não a deixa ser feliz;
. por isso, procura uma resposta, com os meios ao seu
dispor: “… leio… nas estrelas do céu também, e sei cousas…”; “… não quero
sonhar, que me faz ver coisas… lindas às vezes, mas tão extraordinárias e
confusas”.
É da essência do drama provocar situações e sentimentos
incompatíveis no interior das personagens:
. Maria não consegue explicar a perturbação dos pais;
. D. Madalena não pode revelar a causa das suas
preocupações, o que se passa no foro da sua consciência.
▪ D. Madalena
parece caída nas garras de um destino inexorável: a última fala de Maria da cena IV lança
nela a dúvida se teria valido a pena ter casado uma segunda vez.
▪ A constatação de
algo misterioso que paira sobre a ação e as personagens.
▪ Presságios:
. as flores murchas e os sonhos deixam antever a
tragédia com que encerra a obra: a morte progressiva de Maria (ela colheu
papoilas para pôr debaixo do travesseiro, por estas estarem associadas ao sono
e ao sonho, acreditando que, assim, terá uma noite descansada; no entanto, as
flores, que representam, entre outras coisas, a beleza efémera, murcharam
rapidamente, indiciando a proximidade da morte;
. a contemplação do retrato do pai remete para a
intuição do malogro do casamento dos pais.
● Características
românticas
▪ O sebastianismo de Telmo e Maria.
▪ O nacionalismo e
patriotismo de Maria, visível na resistência aos governadores castelhanos.
▪ Linguagem:
exclamações, interrogações, reticências, frases curtas, adequação ao íntimo e
ao estado de espírito das personagens, etc.
▪ Caracterização de
Maria:
. o modelo da mulher-anjo;
. os ideais de liberdade;
. exaltação de valores de feição popular;
. atração pelo mistério;
. intuição;
. tuberculose, a doença dos românticos.
▪ Crenças: agouros,
superstições, sonhos, visões de Madalena, Telmo e Maria (cenas II e IV).