Português: Biografia de Camões: as origens dos Camões

quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Biografia de Camões: as origens dos Camões

Camões


1. As origens dos Camões


1.1. Contexto histórico e geográfico
 
Vale Miñor: localizado a oeste da Galiza, próximo da ria de Vigo, nele são visíveis vestígios históricos como castros, pontes, castelos e mosteiros.

Camos (Nigrán): neste lugar, existia, há cerca de oito séculos (séc. XIII), o solar dos Camões, residência da família ancestral de Luís de Camões.


1.2. Origem do nome Camões

O apelido Camões deriva do topónimo galego Camos, que evoluiu para forma portuguesa atual. «Camões», precedido de «de» (Luís de Camões), sugere a proveniência geográfico da pessoa, ou seja, fulano é o Luís, natural de Camos / Camões.

Esse topónimo, por sua vez, teve origem no nome de uma ave chamada camão (ou caimão), uma ave aquática de plumagem azul e bico vermelho, que ainda existe no estuário do rio Miñor.


1.3. A lenda do camão

Segundo Severim de Faria, o primeiro biógrafo de Camões, existia a seguinte antiga lenda galega:

Um nobre galego era dono de um pássaro camão que morreria se a sua esposa cometesse adultério.

Um pretendente dessa dama, tendo sido rejeitado por ela e cheio de despeito, resolveu caluniá-la, insinuando que teria cometido adultério, por isso o marido quis matá-la.

A esposa pediu ao cônjuge que consultasse a ave. Ao verificar que esta continuava viva, ele compreendeu que estava enganado, reconheceu o seu erro e uniu o seu nome de família ao da ave.

Luís de Camões mencionou esta lenda numa carta em verso que escreveu a uma dama, mostrando, assim, que conhecia as suas origens galegas.


1.4. Genealogia e identidade de Camões

O trisavô de Luís de Camões nasceu no solar de Camos e foi o primeiro da família a vir para Portugal.

Camões cresceu com a ideia de pertencer à nobreza, mesmo que empobrecida, ideia essa consubstanciada no seguinte:

O solar dos Camões, uma casa senhorial ou castelo feudal, que, por alturas dos séculos XII ou XIII, existia em Camos (Nigrán, Galiza), o local onde nasceu o trisavô do poeta (ter esse passado associado a um castelo fortalecia de linhagem aristocrática).

A lenda do camão, a qual dava prestígio simbólico à família, visto que a associava à virtude e à honra.

Antepassados ligados à guerra e à navegação, atividades valorizadas pela nobreza medieval, já que os feitos de armas e a expansão ultramarina eram sinal de honra.

 
1.5. Papel histórico de Vasco Pires de Camões

Em 1369, dá-se a Batalha de Montiel: D. Pedro I de Castela, o Cruel, filho da Formosíssima Maria retratada n’Os Lusíadas, é morto pelo irmão bastardo Henrique de Trastâmara, que assume o trono.

D. Fernando, o monarca português, reivindica a coroa de Castela por direito dinástico, invade a Galiza, mas recua.

Muitos nobres portugueses partidários de Pedro I refugiam-se em Portugal, nomeadamente o Conde Andeiro, Aires Pires de Camões (capitão de galés) e o seu primo Vasco Pires de Camões, provável fundador do ramo português da família.

Os motivos da vinda de Vasco Pires de Camões para Portugal são os seguintes: apoio político a Pedro I, como já foi referido, e desavença pessoal (teria assassinado um fidalgo).

D. Fernando recompensa-o com várias propriedades: Gestaçõ, Montemor-o-Novo, Sardoal, Constância, Marvão, Vila Nova de Anços, Estremoz, Avis, Évora e Santarém.

Após a morte de D. Fernando, em 22 de outubro de 1383, D. Leonor Teles, a regente do reino, mantém Vasco Pires de Camões próximo de si, conde-lhe funções e um casamento vantajoso com Maria Tenreiro.

Na batalha de Aljubarrota (1385), Vasco Pires de Camões luta ao lado das forças de Castela, é feito prisioneiro e posteriormente libertado, mas a sua atitude fá-lo perder prestígio.

Em 1391, ainda morava em Portugal, mas após esse ano desaparece dos registos das cortes.

Antes de se mudar para Portugal, era um trovador galego, tendo participado, por exemplo, em contendas poéticas no Cancioneiro de Baena. Este dado liga o talento literário de Camões a uma possível herança familiar.


1.6. Descendência de Vasco Pires de Camões
 
Vasco Pires de Camões casou com Maria Tenreiro e desse casamento resultaram três filhos:  Gonçalo Vaz de Camões, o primogénito, João Vaz de Camões e Constança Pires de Camões.

Lei do Morgadio: o filho mais velho herdava os bens e títulos, garantindo a continuidade da linhagem; os filhos segundos entregavam-se à vida eclesiástica ou à carreira militar.

Gonçalo Vaz de Camões:

enquanto primogénito e de acordo com a Lei do Morgadio, herdou os bens da família;

através de alianças vantajosas e do casamento com Constança da Fonseca, ligada a uma família importante, a dos Coutinho, prosperou;

no século XVI, António Vaz de Camões, um seu descendente, era morgado de Camoeira, rico e influente.

Constança Pires de Camões:

casou com Pierre Séverin, um fidalgo francês que participou na conquista de Ceuta, em 1415;

deu origem à família Severim de Faria, da qual brotou Manuel Severim de Faria, biógrafo de Camões.

João Vaz de Camões:

segundo filho de Simão, foi o bisavô do poeta;

entregou-se à carreira militar e judicial: serviu D. Afonso V em expedições contra Castela e no Norte de África e mais tarde tornou-se corregedor da comarca da Beira (cargo judicial);

casou com Inês Gomes da Silva, filha bastarda da família Silva;

desse casamento nasceram três filhos: João Vaz, Antão Vaz e Pero Vaz;

construiu um túmulo sumptuoso na Sé Velha de Coimbra.

Antão Vaz de Camões:

é o avô do poeta;

casou com D. Guiomar da Gama, que tinha ascendentes comuns a Vasco da Gama;

terá servido na Índia com Afonso de Albuquerque, em 1507, fazendo parte da esquadra do Mar Vermelho;

levou uma vida atribulada:

. fugiu para Vilar de Nantes, em Chaves, em 1504, por ter cometido um homicídio;

. viveu das rendas da abadia local;

. morreu cerca de 1528;

. filhos prováveis:

- Isidro Vaz (capelão do rei);

- Simão Vaz de Camões (pai do poeta);

- Bento de Camões (tio do poeta);

- outros, incluindo um Luís, possível inspiração para o nome do poeta).

Bento de Camões:

. tio do poeta;

. teve uma carreira eclesiástica brilhante:

-foi cônego regrante de Santo Agostinho no Mosteiro de Santa Cruz, em Coimbra;

- em 1539, foi eleito prior do Mosteiro de Santa Cruz e prior geral da congregação;

- em 1540, foi nomeado chanceler da Universidade de Coimbra, um cargo semelhante a reitor;

. manteve alguns conflitos com D. João III.

Simão Vaz de Camões:

. pai de Camões;

. nascimento: provavelmente em Coimbra ou Vilar de Nantes, em data incerta;

. estudou em Braga;

. trabalhou como tesoureiro na Casa da Índia e na Casa dos reis D. Manuel I e D. João III;

. foi agraciado com o título de cavaleiro (não hereditário) em 21 de junho de 1538, por D. João III, devido à participação numa perseguição em Safim (Marrocos) aos mouros;

. foi para a Índia como capitão de uma nau; segundo Pedro de Mariz, naufragou à vista de Goa e morreu no Oriente, em data incerta;

. casou, antes de 1524, com Ana de Sá:

- os primeiros biógrafos falam numa Ana Macedo, uma mulher nobre de Santarém, enquanto outros genealogistas confirmam essa ligação aos Macedo, uma linhagem nobre portuguesa com ramificações na cidade referida e possíveis ligações a figuras notáveis como a família de Damião de Góis (note-se que, na época, os apelidos variavam muito, daí a oscilação ente «de Sá» e «de Macedo»);

- alguns autores pensaram que havia duas mulheres (uma mãe, que teria morrido cedo, e outra madrasta), por causa da Canção X, mas trata-se de uma interpretação errada;

- nalguns documentos, Camões chegou a assinar Luís Sá de Camões, mostrando a ligação aos dois apelidos;

- a oscilação de apelidos era normal da época, não sendo fixos nem oficiais:

. não havia um nome de família obrigatório e as pessoas não tinham um apelido legal e permanente;

. os apelidos podiam vir do pai ou da mãe (por exemplo, uma filha podia usar o apelido da mãe ou de uma avó, e os irmãos nem sempre partilhavam o mesmo apelido);

. os apelidos mudavam ao longo da vida (com o casamento, serviço militar ou cargos, a pessoa podia adotar outro apelido, para reforçar status).


1.7. Árvore genealógica de Camões

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