A vida de Bocage foi muito agitada.
Manuel Maria Barbosa du Bocage nasceu em Setúbal, em 1765. Era filho de pais burgueses, sendo o pai advogado e poeta nas horas vagas e por certo o ambiente familiar terá favorecido a tendência literária de Bocage. A mãe era de origem francesa e faleceu quando ele tinha dez anos, facto que marcou a sua vida: toda a força paroxística da sua poesia centrada na morte advém da perda da mãe.
Desde cedo, Bocage manifesta um temperamento inquieto: aos catorze anos abandonou as aulas de latim preferiu seguir o curso da guarda marinha em Lisboa, onde passou a levar uma vida de boémia, pouco regrada. Participava em outeiros, uma espécie de serenatas que faziam nos conventos às freiras.
Também desde cedo começou a manifestar os seus talentos de improvisação. Ao mesmo tempo, devido ao seu caráter impulsivo, começou a ter problemas sociais com o poder político e religioso.
Em 1786, partiu para a Índia, tendo sempre presentes duas referências: Camões, com quem se acha identificado em muitos casos (destino); Getrúria, que terá sido o seu primeiro grande amor e que faz desabrochar alguns dos seus dotes de improvisador. A sua poesia é muito autobiográfica, o que é natural no texto lírico, fala muito do "eu", das suas vivências.
Após quatro anos, regressa a Lisboa, pois sentira-se desterrado. Depois de regressado a Lisboa, em 1790 ingressa na Nova Arcádia, mas cedo manifesta o seu espírito boémio e começa a aguçar a sua veia satírica. Aproveita o tom poético-satírico para pôr a ridículo alguns confrades da academia. Manifesta o seu espírito arruaceiro e conflituoso e escreve versos com alusões religiosas, mas impregnados de forte heterodoxia.
Em 1794, é expulso da arcádia, facto que terá várias repercussões: revela o seu individualismo de poeta que pretende impor a sua singularidade, que não se quer ligar a normas. Bocage evidencia uma sensibilidade romântica.
Por outro lado, a expulsão incita-lhe um tom satírico, do qual vai resultar uma poesia "orgulhosa", revisteira, brejeira, sem preocupações estéticas. Daqui resulta o prejuízo de uma exploração temática mais profunda. Augusto França afirma que, em Bocage, os valores instintivos prevaleceram sobre os culturais.
Em 1797, é denunciado como o "bota-fogo", "um fogo de ideias subversivas do trono e do altar". Era assim um crítico do poder político e religioso, o que o levou a ter problemas. Então, alguns amigos seus tentam fazer crer que não se tratava tanto de crime político, mas tinham a ver com sua impiedade em relação à Igreja; conseguem que o "crime político" seja convertido em acusação de "papéis ímpios, sediciosos e míticos". Deste modo, vai transitar da prisão do estado para a prisão da Inquisição, no convento das Necessidades, aproveitando para aí aprofundar os seus estudos de latim, retórica e francês na biblioteca do convento. Daí sai em 1799 e graças ao seu conhecimento de línguas, dedica-se à tradução, vivendo desse trabalho e sustentando também a irmã. No entanto, retorna à sua vida de boémia, caindo na improvisação brejeira até à morte.
Pressentindo a morte por causa de uma doença no sangue, Bocage abranda a sua combatividade interior e reconcilia-se com os seus inimigos: Filinto Elísio, António Macedo, contra quem escrevera uma sátira - "Pena de tabelião" - e também com Deus, numa atitude de humildade e de pungente arrependimento.
Bocage morre em 1805, com apenas quarenta anos.
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