Na França e
na Inglaterra, o capitalismo comercial e a cultura burguesa não dominam tão
livremente, mas, por vias mais sinuosas, impõem a sua influência.
Na
Inglaterra, o absolutismo dos Tudors elimina desde Henrique VIII a alta
aristocracia feudal e o clero regular, mas a nobreza que ascende com as
secularizações (gentry) e a burguesia
de Londres mantêm o controlo do fisco pelo Parlamento. Os filhos segundos da gentry, vedado o acesso à carreira do
clero regular, das armas ou do funcionalismo, em resultado das secularizações e
da moderação do fisco régio, ingressam por isso na burguesia. A Coroa garante o
monopólio, a que se associa, das companhias criadas para fazer o corso às
frotas hispânicas e conquista os entrepostos do Báltico, do Mediterrâneo e
depois do Índico e da América do Norte. O reinado de Isabel (1558-1603) e ainda
o do primeiro Stuart, Jaime I, correspondem por isso, não apenas ao
desenvolvimento de uma cultura amaneirada de corte, em que se salientam a
poesia para canto e o pastoralismo convencional (Sidney, Spenser, John Lily,
autor do romance Euphues, 1579-80,
donde derivou o nome de eufuísmo para
o estilo culto inglês), mas também ao
surto de uma riquíssima escola teatral em que se fundem o naturalismo
renascentista, a cultura universitária de muitos dramaturgos, a ânsia de
aventura e domínio, as inquietações ideológicas da burguesia, o estilo floreado
da corte (Marlowe, Shakespeare, Ben Jonson, Fletcher, etc.).
O
desenvolvimento posterior da burguesia e o endurecimento da sua ideologia puritana,
por um lado, a reação correspondente por parte dos monarcas Stuarts e da
aristocracia mais exclusivamente agrária, por outro lado, precipitam depois as
revoluções de 1648 e 1688, cujo saldo final é uma vitória sobre o absolutismo por
parte de uma coligação tácita entre a burguesia londrina menos puritana e a
aristocracia Whig, que lhe está
estreitamente ligada. Estas duas camadas vão realizar durante o século XVIII
uma dupla revolução: a revolução agrária da enclosure,
eliminação do pequeno campesinato feudal, já iniciada em começos do século XVI,
e a revolução industrial. Através das vicissitudes seiscentistas, o puritanismo
revolucionário exprime-se literariamente pela obra de Milton (Paraíso
Perdido, 1667) e Bunyan (Caminhada do Peregrino, 1678); a
aristocracia opõe ao zelo puritano um teatro e um lirismo profundamente cínicos
e intelectuais (Wycherly, Congreve, Lovelace, etc.).
Por meados do século XVII, a
Sociedade Real de Londres, ilustrada por figuras como Roberto Boyle e Newton,
torna-se o foco mundial da investigação científica, onde se lançam as bases de
uma nova disciplina da física, a dinâmica, articulada com o também recente cálculo
infinitesimal. No desenvolvimento do empirismo e sensualismo inglês, Hobbes e
Locke sucedem a Francisco Bacon, que em 1620, com o Novum Organum
Scientiarum, dera o primeiro tratado de metodologia científica
experimental. Locke, o filósofo da revolução de 1688, que escreve em inglês
para toda a gente, e não já em latim escolástico, é o pensador que mais
influência exerce na Europa por todo o século XVIII. Este conjunto de circunstâncias
sociais e culturais explicam que a Inglaterra, país onde a revolução burguesa,
embora menos radical e rematando num compromisso que dura até à época vitoriana
(reforma eleitoral de 1832), se antecipa de um século à da França e, em geral,
do Continente, seja no início do século XVIII a herdeira imediata das criações
holandesas de inícios do século XVII: jardins, conforto do lar, pintura de
paisagem, de retrato e de interiores, jornalismo, filosofia progressiva,
livre-cambismo, teoria dos direitos fundamentais do homem e da divisão dos
poderes do Estado.