O poema é constituído por três sétimas com rima emparelhada, cruzada e interpolada, de acordo com o esquema rimático ABCADDB, com um verso na primeira estrofe, e versos decassílabos.
O tema é o amor, tratado em três
partes distintas, mas de construção paralela: I: Tasso – Eleonora; II: Romeu –
Julieta; III: D. Juan – Júlia. Os nomes são exemplificativos, porque
personificam uma situação própria e simbólica. A mudança de personagens
condiciona a mudança de ambiente. A construção formal é a mesma nas três
estrofes; muda o motivo, os símbolos e o ambiente. Isto aponta para a divisão
do «eu» romântico abstrato concretizado em personagens reais. Se atentarmos na
data de escrita do poema (setembro de 1866), podemos especular que a composição
tenha sido escrita para a sua amada, a atriz portuguesa Eugénia Câmara. Nela, o
«eu» cita três diferentes situações vivíveis com a mulher amada, aludindo a
três obras importantes da literatura mundial para descrever esses momentos com
a mulher: a ópera Torquato Tasso, a peça Romeu e Julieta e El
Burlador de Sevilla o El Convidado de Piedra.
Assim, a primeira estrofe remete
para a mencionada ópera, da autoria de Gaetano Donizetti, que decorre na cidade
italiana de Ferrara e se baseia na vida do poeta Torquato Tasso, que vive um
romance cheio de desencontros e escândalos que termina com a perda da amada. O
sujeito poético encarna o poeta italiano e retrata o amor de forma idealizada,
um amor não realizado, embora sublime e sereno. Com efeito, há uma apropriação
da história dos amores de Tasso por Eleonora, nobre de Ferrara a quem ele dedicara
os seus versos e que acaba ensandecido pela ideia fixa de perseguição
religiosa. Tasso é o cantor do sofrimento amoroso, que chora (canta) a cidade
da sua amada, cuja visão risonha lhe afugenta o sofrimento e a solidão.
A segunda estrofe remete para a peça
Romeu e Julieta, também ela situada em Itália, concretamente na cidade
de Verona, onde decorrem os amores impossíveis e contrariados entre dois jovens
de famílias rivais, uma paixão que termina de forma trágica com a morte dos
dois apaixonados. O sujeito poético deixa de lado o plano espiritual e passa ao
terreno amoroso. Para isso, pede a ajuda dos ícones da literatura amorosa,
ainda que trágica: Romeu e Julieta. Ao encarnar o herói de Shakespeare, o «eu»
alude ao amor transcendental, isto é, ao amor que, apesar das barreiras sociais
que o obstaculizem, se concretiza. O recurso à conjunção coordenativa
copulativa «e» no último verso une as duas figuras femininas referidas no
poema: Eleonora é também Julieta, isto é, são duas mulheres numa (quando
concluída a terceira estrofe, serão três numa). Dito de outra forma, a mulher
amada pelo sujeito poético é Eleonora, mas também é Julieta e ainda Júlia, ou
seja, ele deseja as várias facetas da mulher. Para ele, o amor não possui
apenas uma face, mas várias, e a mulher é, ao mesmo tempo, pura e sensual.
Por sua vez, a terceira estrofe
contém referências à obra de Tirso de Molina, cujo protagonista é D. Juan, um
jovem belo que seduz Júlia, uma rapariga espanhola de origem nobre que
assassina o pai. Estamos na presença de um amor sensual, carnal e amaldiçoado,
cujo desenlace é igualmente trágico. O amor platónico cede lugar ao desejo
ardente, à volúpia e à paixão descontrolada: “Na volúpia das noites andaluzas /
O sangue ardente em minhas veias rola…”. Como não poderia deixar de ser, o
vocabulário traduz esse amor/paixão/desejo, através de uma linguagem repleta de
erotismo: ”sangue”, “ardente”, “leito”, “seio”, “desfaço-te”. Atente-se também
na expressão «Eu morro», que alude à petit mort, isto é, ao orgasmo, se,
por acaso, ele lhe desfizer a mantilha. Em suma, esta estrofe alude claramente
à iniciação amorosa de D. Juan por Júlia, a espanhola fogosa.
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