O poema “Presságio”
foi escrito por Fernando Pessoa em 24 de abril de 1928, já na fase final da sua
vida (13 de junho de 1888 – 30 de novembro de 1935).
O tema da
composição poética é o amor, mais concretamente a dificuldade em o revelar à
pessoa amada (em última análise a impossibilidade de viver um amor
correspondido), abordado em cinco quadras de redondilha maior (bem ao gosto
popular), com rima cruzada, segundo o esquema rimático ABAB.
Na primeira
quadra, o sujeito poético apresenta o mote do texto, isto é, o tema que vai ser
desenvolvido, bem como o seu posicionamento face ao mesmo: quando o sentimento
amoroso se revela, quando surge, não sabe como se revelar, como se confessar
(note-se a antítese construída em torno da repetição de formas do verbo “revelar”
nos dois versos iniciais: “revela” e “revelar”). Recorrendo à personificação,
ele representa o amor como uma entidade autónoma, que age independentemente da
vontade do sujeito. Assim, sem conseguir controlar aquilo que sente, apenas
pode olhar a mulher amada, mas não consegue conversar com ela, não sabe o que
dizer.
Na segunda
estrofe, o sujeito poético reforça a incapacidade de expressar devidamente o
seu amor, parecendo acreditar que o sentimento não pode ser traduzido por
palavras, pelo menos por ele: “Quem quer dizer o que sente / Não sabe o que há
de dizer.”. O «eu» é um inadequado relativamente ao «outro» e tem dificuldade em
comunicar com ele, a qual resulta na sensação de que está sempre fazendo algo
de errado.
A
observação e a opinião dos outros restringem os seus sentimentos. O sujeito
acredita que, se falar sobre eles, vai parecer que mente, mas, se os calar, vai
ser julgado por deixar (a amada? O amor?) cair no esquecimento. Assim sendo,
sente que não pode agir de nenhum modo.
Na terceira
estrofe, o sujeito lírico, triste e desalentado, lamenta-se e, socorrendo-se do
pretérito imperfeito do conjuntivo (modo verbal do desejo) e de uma oração
subordinada adverbial condicional, manifesta um desejo: que ela pudesse
compreender o amor que sente através do olhar. Atente-se na sinestesia dos
versos 9 e 10 (“Ah, mas se ela adivinhasse, / Se pudesse ouvir o olhar”),
que exprime a crença do sujeito, segundo a qual o modo como olha a amada
denuncia mais o seu sentimento do que qualquer declaração. O «eu» suspira (“Ah”),
imaginando como seria se ela percebesse, sem que ele tivesse de dizer por
palavras. Porém, a presença do conjuntivo (“adivinhasse”, “pudesse”) e da
oração condicional nega desde logo a possibilidade de se concretizar essa
vontade.
Na estrofe
seguinte, defende que “quem sente muito, cala”, ou seja, aqueles que estão
realmente apaixonados calam o seu sentimento. Para ele, quem tenta expressar o
seu amor “fica sem alma nem fala”, “fica só, inteiramente”. Falar do que sente
irá sempre levá-lo ao vazio e à solidão absoluta. Assim, é como se assumir um
amor fosse, automaticamente, uma sentença de morte para o sentimento, que
passaria a estar condenado.
A última
quadra é passível de diferentes leituras:
a) Se
o sujeito poético pudesse explicar à mulher a dificuldade que tem em exprimir o
seu amor, não mais seria necessário fazê-lo, porque já se estava a declarar,
mesmo que indiretamente. Porém, a realidade é que não consegue verbalizar o
sentimento nem discutir essa sua inabilidade. Assim sendo, o relacionamento
está condenado a não passar do plano platónico.
b) O
texto é, na verdade, uma declaração de amor. Neste caso, o «eu» usa a poesia
como forma de falar, de mostrar o que sente; o poema diz/fala aquilo que ele
não consegue. Porém, para que esta forma de comunicação se concretizasse, seria
necessário que ela lesse o poema e soubesse que lhe era dirigido. Como não o lê
não sabe, o relacionamento também não se concretiza deste modo.
c) O
verdadeiro amor é incomunicável, não pode ser expresso através de palavras,
caso contrário desaparece. O sujeito poético conclui que só conseguiria
declarar o seu amor, caso o sentimento não existisse mais.
A conjunção
coordenativa adversativa “mas” estabelece uma oposição entre aquilo que tinha
sido dito antes e a quadra que encerra o poema. Embora lamente não poder
expressar o seu sentimento, está conformado, pois sabe que não pode ser revelado,
sob pena de desaparecer.
Ao longo de
todo o poema, transparece a atitude derrotista do sujeito poético face ao amor.
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