1. Nível fónico
® Aliterações:
- em v:
"... o vento da serra levara vidraça e telha..." ® sugere a força do vento;
- em l e r: "... estalaram a rir, num riso de tão larga
rajada...";
- em t, b, d, p: "... com os olhos a flamejar, numa
desconfiança tão desabrida que Guanes e Rostabal apalpavam nos cintos os cabos
das grandes facas...";
- em r:
"... o outro rosnou surdamente e com furor dando um puxão às barbas
negras.".
2. Nível morfossintático
® Adjetivos: têm como função caracterizar
as personagens ou o cenário e, por vezes, anunciam a ação trágica, antecipando
os atos violentos dos três irmãos: "E de novo recuaram vivamente (...)
numa desconfiança tão desabrida que
Guanes e Rostabal..."; "Ali vieram sentar-se Rui e Rostabal, com os
seus tremendos espadões entre os
joelhos."
® Advérbios de modo:
- "Depois, mergulhando furiosamente as mãos no ouro..." ® caracteriza a brutalidade
do movimento, logo da personagem;
- "E de novo recuaram, bruscamente se encararam..." ® aponta para a súbita desconfiança
que se estabelece entre os três, motivada pela sua ambição;
- "Vivamente,
Rui agarrara o braço ao irmão..." ®
está relacionado com Rui e a sua astúcia;
- "Rui, atrás, puxava desesperadamente, os freios da égua,
que, de patas fincadas no chão pedregoso..." ® remete para o contraste
comportamental entre os três irmãos e a égua;
- "Então Rui tirou, lentamente, do cinto, a sua
larga navalha."; "E serenamente,
como se pregasse uma estaca num canteiro, enterrou a folha toda no largo dorso
dobrado, certeira sobre o coração." ®
remete para a frieza e para a crueldade da personagem;
- "E Rui, alargando os braços, respirou deliciosamente." ® traduz a satisfação de Rui
por o tesouro ser só seu;
- "Os seus braços torcidos batiam o ar desesperadamente." ® remete para o desespero que
a personagem sente;
- "... esbugalhando pavorosamente os
olhos..." ®
traduz o terror de Rui, ao perceber que tinha sido envenenado e que ia morrer.
® Verbos: algumas formas verbais
evidenciam o carácter das personagens através das referências às suas atitudes,
funcionando, assim, como uma forma de caracterização das mesmas.
Atentemos nos seguintes
exemplos:
1.º) "Ao
escurecer, devoravam uma côdea de pão
negro." ®
remete para a ideia de que o homem é um produto do meio, ou seja, a sociedade
em que se insere determina a formação da sua personalidade e, consequentemente,
o seu comportamento (característica realista);
2.º)
relativamente
a Rostabal, as formas verbais traduzem o seu instinto, o seu carácter
animalesco:
- "Também eu quero a minha, mil raios! -
rugiu logo Rostabal.";
-
"Pois que morra, e morra hoje - bradou
Rostabal.";
3.º) noutras
ocasiões, traduzem a brutalidade do movimento:
-
"Rostabal rompeu de entre a
sarça...";
-
"Então Rui (...) deslizou até Rostabal, que resfolgava.".
3.
Nível semântico
® Comparações:
- "... esfaimados como eles...": a
miséria em que viviam os três irmãos;
- "... mais bravios que lobos.": o
seu carácter animalesco;
- "... os três senhores ficaram mais
lívidos que círios.": a emoção dos três irmãos ao depararem com o tesouro;
- "Então Rui, (...) ergueu os braços,
como um árbitro...": a astúcia, a liderança que assume;
- "... Rostabal, homem mais alto que um
pinheiro" (hipérbole): a grande
envergadura / altura da personagem;
- "... onde fazia como um
tanque...";
- "... dominava o atalho, estreito e
pedregoso como um leito de torrente.": a estreiteza e rudeza do caminho;
- "... a espada, agarrada pela folha
como um punhal...";
- "... como se perseguisse um
mouro...";
- "E serenamente, como se pregasse uma
estaca num canteiro, enterrou a folha toda no largo dorso dobrado, certeira
sobre o coração.": o crime, a crueldade do assassínio de Rostabal pelo
próprio irmão;
- "... um suor horrendo que o regelava
como neve." E
- "... sentia os ossos a estalarem como
as traves de uma casa em fogo." E
- "... como se fosse um metal
derretido.": conferem os efeitos do veneno.
® Personificações:
-
"... silenciosa manhã de domingo...";
-
"Pela ramaria andava um melro a assobiar.";
-
"... a cantiga dolente e rouca...";
-
"A tarde descia, pensativa...": o fim do dia (= o fim da vida de
Rui);
-
"E a fonte cantava...": o ruído da água;
-
"... as folhas tenras dos olmos, em roda, tremiam...";
- "A fonte, cantando...": como se,
com a morte do último dos irmãos, a justiça tivesse sido reposta e tudo
regressasse à normalidade.
® Hipérboles:
-
"... estalaram a rir...";
- "... num riso de tão larga rajada que
as folhas dos olmos, em roda, tremiam...": esta e a anterior revelam a
reação, misto de nervosismo e alegre loucura, à descoberta do tesouro;
- "... Rostabal, homem mais alto que um
pinheiro..." (ver comparações).
® Gradação: "Já rasgara o gibão,
atirava os passos incertos e, a arquejar, com a língua pendente, limpava as
grossas bagas de um suor horrendo..." ® os
efeitos do veneno, gradualmente mais fortes e horríveis.
® Metáforas:
-
"... rugiu logo Rostabal.";
- "O outro rosnou surdamente e com furor...": ambas revelam o instinto, o
carácter animalesco das personagens;
- "... um fio de água...";
- "... tinha já a espada nua.";
- "Um vento leve arrepiou na encosta as folhas dos álamos...": uma ligeira
brisa fez ondular as folhas das árvores;
- "Mal a noite descesse...";
- "Era um lume, um lume vivo, que se lhe acendera,
lhe subia até às goelas.";
- "Outra vez o lume, mais forte, que alastrava,
roía.";
- "E a chama dentro galgava...";
- "... para apagar aquela labareda...":
estas últimas quatro metáforas traduzem os efeitos do veneno em Rui.
® Hipálage: "... e levou as duas
mãos aflitas ao peito.": a aflição face ao envenenamento.
® Antítese: "No terror e esplendor da emoção...".
® Sinédoque: "... a pelejar contra o Turco!" (= turcos).
® Sinestesias:
-
"Um cheiro errante de violetas adoçava o ar luminoso.";
-
"A tarde descia, pensativa e doce..." (ver personificações);
-
"Com aquela cor velha e quente...".
® Ironia:
-
"Grande pena!": o menosprezo para com Guanes;
- "Oh! D. Rui, o avisado, era
veneno!": afinal, o mais avisado dos três irmãos deixou-se enganar e vai
morrer em consequência disso.
® Exclamações:
- no início, traduzem a emoção dos irmãos
quando encontram o tesouro;
- na parte final, traduzem a angústia e o
desespero de Rui face ao envenenamento.
® Perífrase e eufemismo: "Não dura até às outras neves." (= Inverno).