● Assunto: O sujeito poético
afirma que Roi Queimado morreu por amor devido à indiferença da mulher amada e destaca,
de forma irónica, que ele só morreu poeticamente (portanto, trata-se de uma
morte fingida), pois ao terceiro dia «ressuscitou».
Depois de ter ressuscitado, continua a escrever cantigas que
crê serem de mestria, anunciando a sua morte por amor de cada vez que compõe
uma cantiga de amor.
Possuidor desta capacidade de ludibriar a morte, Roi Queimado
não a receia, o que origina a troça do sujeito poético, afirmando que Deus lhe
concedeu um poder extraordinário. O sujeito poético finge e inveja, na finda, Roi
Queimado pelo seu poder e afirma que, se possuísse semelhante poder, o de
ressuscitar, jamais temeria a morte.
● Tema: ridicularização do
artificialismo dos trovadores:
- crítica ao fingimento da "morte de amor";
- sátira ao amor cortês.
● Estrutura interna
▪ 1.ª parte (vv. 1-7) –
Apresentação da situação: Roi Queimado não era correspondido amorosamente, para
mostrar que era bom trovador, declarou que morria por amor, mas ressuscitou.
▪ 2.ª parte (vv. 8-21) –
Explicitação da situação / ridicularização do visado, devido à sua vaidade (v.
10) e à superficialidade das suas palavras (vv. 11-12): o trovador fingia
repetidamente a morte de amor nas suas cantigas, julgando que o fazia com
mestria, mas, afinal, fazia-o com pouca qualidade.
▪ 3.ª parte (vv. 22-24) –
Conclusão: formulação irónica de um desejo pelo sujeito poético – se pudesse
viver e morrer constantemente, não temeria a morte.
● Objeto da crítica: Roi Queimado.
Rui (Roi) Queimado foi um trovador português do século XIII,
conviva e amigo de João Garcia de Guilhade e Pedro Garcia Burgalês. A alcunha “Queimado”
remete para o seu aspeto físico, provavelmente a sua tez muito morena. Foi
autor de quatro cantigas de amigo, dezasseis cantigas de amor e quadro de
escárnio e maldizer,
● Crítica
• explícita: a ridicularização
/ denúncia da falta de dotes poéticos do trovador Roi Queimado;
• implícita:
» crítica à expressão convencional e
exagerada da coita de amor – crítica aos trovadores que afirmam morrer de amor
nos seus cantares (um cliché da cantiga de amor, comum a outros trovadores);
» paródia das regras do amor cortês
de cariz provençal (artificialismo / fingimento da coita de amor e da morte por
amor).
● Recursos da crítica
▪ Ironia:
- crítica ao convencionalismo da
coita amorosa nas cantigas de amor e do tópico da morte de amor: o sujeito põe
a nu o ridículo do trovador que ressuscita sucessivamente após anunciar a sua
morte em cada poema que escreve: anuncia a sua morte num poema, aparece vivo no
seguinte, para voltar a morrer de amor;
- ridicularizar a mestria de Roi
Queimado.
▪ Hipérbole.
▪ Irreverência: alusão a um
exemplo bíblico com intenção jocosa – a morte de Jesus Cristo e a sua
ressurreição, três dias depois.
▪ Comicidade: paródia do «cliché»
da morte de amor com recurso ao cómico – o trovador disse que morria e, afinal,
ressuscitou.
● Recursos poético-estilísticos
▪ Nível fónico
▪ Estrofes: três sétimas e um
terceto (finda) heterométricas.
▪ Metro: versos decassílabos e
eneassílabos (o primeiro e o último); refrão octossílabo.
▪ Rima: - abbaccb;
- interpolada e emparelhada;
- consoante ("amor"/"trobador");
- aguda ("amor"/"trobador")
e aguda ("Maria"/"queria");
- rica ("Maria"/"queria")
e pobre ("amor"/"trobador").
▪ Nível morfossintático
. Verbos no pretérito
perfeito: morreu, quis, fez, ressurgiu, porque foi algo testemunhado no
passado.
. Adjetivo queimado,
que é simultaneamente apelido do trovador e metonimicamente a própria metáfora
do "queimar-se por amor": Roi Queimado queimou-se e ficou
"queimado" na sociedade pelo ridículo dos seus cantares de amor.
. Paralelismo semântico e estrutural.
▪
Nível semântico
. Metáfora do «queimar-se» e do
«morrer por amor».
. Ironia.
. A imagem bíblica da ressurreição de Cristo ao terceiro dia.
. Comparação:
Roi Queimado é comparado a Cristo de forma irónica quando o sujeito
poético se finge surpreendido por o trovador afirmar que morre de amor, mas
ressuscitará ao terceiro dia. Tal como Cristo, Roi Queimado parece ter vencido
a morte.
. Hipérbole: a afirmação da
morte de amor (“Roi Queimado morreu com amor” – v. 1).
. Antítese: “de morrer i e des i
d’ar viver” (v. 12).
. Polissemia do verbo «morrer».
. Vocabulário religioso: acentua o
tom irónico do poema, aproximando Roi Queimado de Jesus Cristo, que também
morreu e ressuscitou ao terceiro dia.
. A imagem
bíblica da ressurreição de Cristo ao terceiro dia
● Classificação
1. Cantiga de maldizer:
. identificação
do destinatário.
1.1. Formal:
• cantiga de finda – remate da
cantiga, onde se destaca o ridículo do tópico da «morte de amor» das cantigas
de amor
• cantiga de mestria: cantiga
que não apresenta refrão.
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