Um acontecimento histórico trágico
serviu, portanto, de motivo a este quadro. Os exércitos de Napoleão Bonaparte
ocuparam a Espanha, mas no dia 2 de maio de 1808 os cidadãos de Madrid revoltaram-se
contra essa ocupação das tropas napoleónicas. Na sequência dessa revolta, os
franceses concretizaram uma terrível vingança, levando a cabo um massacre,
fuzilando centenas de patriotas espanhóis e muitas outras pessoas que eram meras
espectadoras. Goya só conseguiu registar estes factos alguns anos depois,
quando o rei D. Fernando VII foi reconduzido ao trono espanhol.
Numa poça de sangue, jazem três
cadáveres no chão, enquanto um frade e alguns camponeses esperam receber a
descarga, dos quais se aproxima outra fila de condenados que vão ser mortos.
O grupo das vítimas tem no centro um
homem que abre os braços, um condenado de camisa branca, um Cristo simbólico e
inocente, cujo gesto se repete na figura caída em primeiro plano, que desafia
os soldados sem rosto, curvados e fixos no ponto de mira. Este grupo de
militares, situado à direita, significativamente de costas, empunha com
violência as armas que dispara à queima-roupa. Os restantes elementos do grupo
das vítimas caminham aterrorizados para a morte. Um frade reza e as restantes
pessoas fazem gestos de desespero (cabeças baixas, mãos cobrindo o rosto).
Assim sendo, pode concluir-se que a
pintura constitui a denúncia da arbitrariedade do poder e da guerra que escolhe
as suas vítimas entre os menores poderosos: o povo inocente. Por outro lado,
configura um grito silencioso de revolta contra a opressão, em defesa do
patriotismo e da liberdade, princípios muito caros aos românticos.
No que diz respeito às cores e à
luz, predominam os ocres da terra violada da Pátria e dos fatos pobres do povo.
O negro representa a noite, tempo em que a ação se localiza; contra o céu
escuro recorta-se o perfil da cidade-capital e, em primeiro plano, rodeado de
luzes e sombras projetadas de encontro ao muro por uma lanterna, dá-se a
execução brutal e impiedosa. O branco (símbolo da pureza e da paz) da camisa
contrasta com o vermelho do sangue brutal e injustamente derramado, aqui e ali
salpicados por leves tonalidades de azul, verde e amarelo. A luz, por sua vez,
nasce da grande lanterna, no entanto, na verdade, é do homem da camisa branca
que ela irradia, transformando o seu sacrifício anónimo um poderoso e digno
foco dramático.
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