Pelo
exposto, a obra constitui uma reflexão sobre os amores impossíveis, uma
temática intemporal. Assim, retrata de forma simples os preconceitos existentes
na sociedade que impedem determinadas relações amorosas. Continua a não ser
incomum, em pleno século XXI, a crítica e a obstaculização de romances entre
pessoas de etnias diferentes, de cor de pele distinta, de classe social
diversa, etc., e que envolvem a oposição de várias pessoas, nomeadamente das
próprias famílias. Por exemplo, os infaustos amores narrados em Romeu e
Julieta e Amor de Perdição prendem-se com preconceitos sociais e com
os ódios entre as famílias dos protagonistas.
Por
outro lado, o texto suscita o confronto entre o amor espontâneo e livre e os
casamentos arranjados. O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá conhecem-se, dialogam
e apaixonam-se, mas não se podem casar, pois as leis do reino animal não o
permitem. Mais do que isso, Sinhá acaba por se casar, contrariada, com o
Rouxinol, a quem estava prometida. Recordando novamente Amor de Perdição,
Tadeu Albuquerque queria casar, à força, a sua filha Teresa com o primo
Baltasar Coutinho, intuito que só não se concretizou graças à rebeldia e
determinação da jovem, embora tenha pago um preço elevado pela sua coragem: a
reclusão num convento e a morte. Na dita vida real, durante muitos séculos, os
casamentos eram arranjados pelas famílias dos noivos, que dessa forma
procuravam a perpetuação de alianças políticas ou militares ou a manutenção do
poder económico e do estatuto social familiar. O consentimento só passou a ser
possível a partir de 1140 com o Decreto de Graciano e apenas a seguir a 1670 a
indissolubilidade do casamento começou a ser contestada. Na atualidade, a
realidade do casamento arranjado e forçado está bem viva. É o que sucede entre
nós, por exemplo, com a etnia cigana, onde continua a ter grande prevalência,
porém não se esgota aí. De acordo com um relatório da OIT, o número de pessoas
obrigadas a casar passou de 15,4 milhões em 2016 para 22 em 2021. Deste total,
dois terços das pessoas são mulheres, isto é, cerca de 14,9 milhões. Além disso,
o relatório aponta para que a prevalência dos casamentos forçados se faça
sentir mais nos países árabes, seguidos da Ásia e dos países do Pacífico,
ocorrendo dois terços dos mesmos (envolvendo cerca de 14,2 milhões de pessoas)
na Ásia e no Pacífico, 14,5% na África (3,2 milhões) e 10,4% na Europa e Ásia
Central (2,3 milhões).
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