Hamlet
é uma tragédia, por isso exibe algumas características desse género de peça de
teatro. Se atentarmos no final da peça, deparamos com a catástrofe, claramente
traduzida pela morte sucessiva de todas as personagens centrais da obra:
Polónio, Ofélia, Laertes,, Gertrudes, Cláudio e Hamlet. Por outro lado, o jovem
príncipe comporta alguns dos traços característicos do protagonista trágico: é
de estirpe nobre, elevada; as suas ações impactam toda a Dinamarca; é uma
personagem rica interiormente (é pautado pelo cumprimento do desejo de vingança
do pai, pelas hesitações e questionamentos morais acerca da execução da
vingança, finge e age como um louco); desafia as leis da sociedade, que
esperava que agisse em nome da honra familiar. Enquanto herói trágico, mostra a
sua tristeza e melancolia pela morte prematura do pai; é um jovem inteligente e
de enorme potencial, que acaba por não realizar por razões óbvias; ao longo da
peça, vai-se isolando progressivamente.
Não
obstante, e peça foge ocasionalmente às convenções da tragédia. Em muitas das
obras de índole trágica, o herói escolhe perseguir algo que não deveria – no caso
de uma peça cujo foco é a vingança, ele sucumbe a um desejo de vingança
assassina. Concretamente, com Hamlet, estanos na presença de uma personagem que
possui todas as razões para se vingar de outrem, pois o tio, Cláudio,
assassinou o seu pai e usurpou o seu lugar no trono, porém hesita e protela a
sua concretização, pois, antes de tudo, pretende conhecer a verdade e
certificar-se que o fantasma é mesmo quem diz ser e que o rei matou
efetivamente o rei Hamlet. Além disso, ele escolhe isolar-se das restantes
personagens, comportar-se de forma errática e finge estar louco, o que acarreta
várias consequências trágicas, como, por exemplo, o enlouquecimento e a morte
de Ofélia.
Outro traço
ambíguo prende-se com a falha trágica de Hamlet: a sua indecisão. Essa
característica leva-o a repreender-se mesmo a si próprio por não concretizar a
vingança. Nesse contexto, contrasta fortemente com Laertes e Fortinbras,
personagens decididas, atuantes e determinadas a agir. Esse caráter indeciso
não explica a razão por que Hamlet rejeita Ofélia, manipula psicologicamente
Gertrudes, se isola e mata Polónio. Na realidade, a sua indecisão é o motivo
por que tende a evitar agir.
Por último,
Shakespeare parece usar Hamlet para satirizar o género trágico. Nas
tragédias tradicionais, o herói é uma figura ativa e decidida que persegue
obstinadamente um antagonista, um vilão, superando diversos obstáculos colocados
no seu caminho, até executar a vingança. No caso de Hamlet, este luta
essencialmente consigo mesmo e os seus obstáculos são a sua própria indecisão e
hesitação, obstáculos esses que o levam a deixar passar várias oportunidades
para se vingar, como, por exemplo, quando encontra Cláudio a rezar e decide não
o matar. Além disso, Hamlet só liquida o tio quando a sua própria morte é
certa, o que quer dizer que retira pouca ou nenhuma satisfação com a vingança.
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