Estamos
na presença de uma ode de Ricardo Reis, publicada originalmente na revista “Athena”,
em outubro de 1924 e incluída posteriormente na obra Odes, um projeto
que Fernando Pessoa planeou publicar em cinco volumes, porém o poeta apenas concluiu
o primeiro.
Nesta
ode, o «eu poético», socorrendo-se da metáfora, associa os seus versos a uma
coluna firme, os quais lhe proporcionam um lugar firme (sinónimo) e duradouro
no mundo, mesmo confrontado com as questões da passagem do tempo e do
esquecimento. Assim, o sujeito não receia o futuro (“Nem temo o influxo inúmero
futuro” – v. 3) nem o esquecimento (“o olvido”), pois a sua mente cria uma
realidade que não está dependente dos reflexos do mundo, mas, sim, da arte. Os “reflexos
do mundo” são as imagens que a sua mente capta das coisas externas ao «eu», mas
que não correspondem à essência das coisas. A mente, quando se fixa na sua
própria atividade criadora, transforma os reflexos exteriores em matéria para a
sua criação, para a sua arte. Posteriormente, essa mesma arte cria o mundo,
isto é, dá forma e sentido ao que é caótico e transitório. A arte não é uma
criação ou projeção da mente, mas algo independente e superior.
Nos dois
últimos versos da ode, introduzidos pelo advérbio «assim», em jeito de
conclusão, através de nova metáfora («placa», isto é, a sua poesia), o «eu»
lírico sugere que os seus versos, a sua arte, lhe garantirão um lugar firme e
duradouro no mundo. Ele grava o seu ser na placa, ou seja, os seus versos, que
duram mais que o “instante externo”, quer dizer, o que sucede em seu redor, o
que ocorre no exterior da sua mente, no mundo sensível e transitório, que se
opõe ao seu ser, isto é, à sua essência, à sua personalidade, ao seu modo de
ver e sentir as coisas. O seu ser permanecerá na placa, ou seja, na sua obra,
mesmo depois de o poeta ter morrido ou esquecido. A poesia confere-lhe
imortalidade.
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