No capítulo final, muito breve, uma espécie de confissão, é já o narrador Zezé-adulto que se dirige a Manuel Valadares, mais de quarente anos depois dos acontecimentos, e lhe confessa o impacto que ele teve na sua vida.
De facto, Zezé relembra, com ternura e saudade, o vínculo afetivo que manteve com o Portuga durante aquele breve período da infância. Em simultâneo, confessa que, apesar de tantos anos volvidos, por vezes ainda parece sentir-se criança e espera que ele reapareça com presentes simples, como figurinhas ou bolas de gude, os quais simbolizavam o afeto, o cuidado e a atenção que recebia de Valadares. Além disso, reconhece que foi o português quem lhe ensinou a ternura da vida, um sentimento que tenta manter vivo até ao presente, compartilhando afeto com os outros, mesmo quando erra ou se engana, porque, afinal, “a vida sem ternura não é lá grande coisa”.
Por outro lado, num tom melancólico, admite que foi precocemente atingido por detalhes da realidade dura e cruel que chocam com a inocência e a esperança que devem ser preservadas no decurso da infância. É com essa reflexão sobre a dureza de ter conhecido as dores da vida demasiado cedo, relembrando uma frase de Dostoiévsky para expressar a tragédia de uma infância interrompida pela dor e pela perda.
A obra termina, pois, de forma poética e dolorosa, mostrando que as marcas da infância permanecem vivas na memória e no coração de Zezé. É um adeus simbólico ao Portuga e à criança que um dia foi, uma criança que conheceu o peso da vida antes do tempo, mas que também conheceu o valor do amor verdadeiro.
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