A
família muda para a nova casa. O trajeto é simples, mas cheio de pequenos
momentos de alegria: a carroça desliza suavemente quando entra na estrada
principal, passa por um carro bonito, o de Manuel Valadares, e Zezé reconhece
ao longe o apito do Mangaratiba. Quando chegam à casa, a criança oferece ajuda,
mas é dispensado com delicadeza para brincar. Assim, vai falar com Minguinho, o
pé de laranja lima, e fala-lhe da viagem, promete enfeitá-lo e imagina o
«valão» próximo, a que deram o nome Amazonas, cheio de canoas indígenas.
Nos
primeiros tempos após a mudança de casa, Zezé opta por não incomodar a nova
vizinhança, mas certa tarde não resiste a construir uma figura semelhante a uma
cobra, usando uma meia preta e linha de papagaio, com o objetivo de assustar
alguém que passasse na rua. Ele põe o plano em prática e acaba por assustar uma
mulher grávida, que entra em pânico e se sente tão mal que receia perder o
filho. O alvoroço causado faz com que os vizinhos saiam de casa para procurar a
cobra com paus e machados, mas logo descobrem que se trata de uma brincadeira.
Ao perceberem que a «cobra» vem do quintal, a família desconfia da criança, que
se esconde no cesto de roupa suja. Descoberto, leva uma valente tareia da mãe.
Na
manhã seguinte, vai procurar a «cobra», pois quer reutilizá-la, mas não a
encontra, o que o deixa frustrado. De seguida, desloca-se até casa de Dindinha
à procura de Tio Edmundo, convicto de que, por ser cedo, ainda não teria saído
para as suas atividades quotidianas habituais: bicho e jornais. Encontra-o na
sala a fazer paciências. Durante a conversa que entabulam, Zezé tenta explicar
que recentemente se apercebeu de que não precisa de verbalizar em voz alta, por
exemplo, uma cantiga, para que esta exista dentro de si, e quer saber se o
homem é capaz de cantar por dentro, sem emitir som. Zezé acredita que dentro
dele vivia um passarinho que cantava. Tio Edmundo compreende a metáfora e
explica-lhe que esse passarinho simboliza a infância e a imaginação,
acrescentando que, à medida que for crescendo, a ave se vai embora e dá lugar
ao pensamento – um processo natural do amadurecimento. Deus, então, recolhe o
passarinho e entrega-o a outra criança especial. O tio explica-lhe, assim, que
está a desenvolver a sua capacidade para pensar, e a criança percebe,
emocionado, que esses «pensamentos» fazem parte do crescimento e anunciam a
chegada da “idade da razão”.
Ao sair
da casa de Dindinha, Zezé recorda um episódio triste: o dia em que Totoca se
esqueceu do seu coleirinha – um passarinho real – ao sol e, por isso, ele morreu.
Desde esse episódio, prometeram mutuamente nunca mais prender passarinhos.
Dominado por essa recordação e pela conversa com o tio, a criança decide
despedir-se do seu passarinho interior, vai falar com Minguinho e pede-lhe que
esperem por uma nuvem que atravessa o céu. Ao avistá-la, abre a camisa como se
soltasse o passarinho do seu peito, pedindo que voe até Deus e vá cantar para
outra criança. Essa despedida representa a transição de Zezé da infância para o
início da maturidade, que o deixa vazio por dentro e com uma grande tristeza
com a partida do passarinho – a sua inocência, imaginação e infância.
Acompanhado
pela irmã Glória, Zezé matricula-se na escola, fingindo ter seis anos, e inicia
uma nova etapa de descobertas. A irmã do protagonista explica à diretora que a
mãe de ambos não pôde comparecer porque estava a trabalhar, e Zezé, orgulhoso,
afirma que o nome completo da progenitora inclui «Pinagé», destacando, deste
modo, as suas origens indígenas. A diretora apercebe-se da pobreza da família
ao reparar nos remendos das roupas da criança e encaminha-o para receber dois
uniformes, que o deixam muito feliz. Ele passa a viver com grande entusiasmo os
seus dias, mantendo sempre Minguinho a par das novidades. É um bom aluno,
atento e respeitador, muito valorizado pela professora, D. Cecília Paim. Certo
dia, fica curioso ao ver uma menina a levar flores à docente e descobre que
esse é um gesto comum entre alunos aplicados, por isso decide levar-lhe também
uma flor. Apesar de não ser bonita, é a única que demonstra carinho por ele,
oferecendo-lhe um tostão para comprar doces.
Em nova
conversa com o pé de laranja lima, Zezé conta-lhe uma nova «aventura»: apanhar
boleia nos carros, agarrando-se ao pneu traseiro enquanto andam devagar perto
da escola, uma brincadeira que ele apelida de “morcego de andar”. Por outro
lado, revela igualmente o seu orgulho por ter sido elogiado pela professora,
que o considerou o melhor leitor da turma, embora tenha dúvidas sobre a palavra
«leitureiro». Na sequência, menciona um veículo especial que ninguém teve
coragem de «morcegar»: o de Manuel Valadares.
Zezé
está cada vez mais envolvido com a escola e muito feliz com o carinho da
professora, que presenteia com uma flor, o que a leva a chamar-lhe
«cavalheiro». Ele tem um bom comportamento durante as aulas. Certo dia, aguarda
ansiosamente o regresso da mãe do trabalho, pois tem um segredo para lhe contar.
Quando ela chega, a criança pede-lhe para comprar um fato usado de um colega, Nardinho,
pois já não lhe serve e Zezé quer ter uma “roupa de poeta”. Apesar das
dificuldades financeiras da família, a mãe comove-se e promete-lhe fazer horas
extraordinárias para comprar o fato. A criança fica emocionada e, mais tarde,
veste a roupa nova (de poeta) com tanto orgulho que o Tio Edmundo o leva a
tirar uma fotografia.
No
final do capítulo, Zezé é confrontado pela professora, após um colega,
Godofredo, lhe contar que roubava flores do jardim de um vizinho para enfeitar
a sala de aula. O menino admite o furto, alegando que queria que D. Cecília
Paim tivesse flores como as outras. Como, em sua casa, não há nenhum jardim nem
dinheiro para as comprar, teve de as «roubar». Além disso, acrescenta que,
sendo as flores de Deus, elas pertencem a todos. A totalidade do diálogo revela
a ingenuidade, a generosidade e a sensibilidade da criança: ele recusa receber
o lanche da professora diariamente para que outros colegas também tenham a
possibilidade – nomeadamente Dorotília, uma menina negra e muito pobre, com
quem divide o lanche. Ele aprendeu com a mãe que deve compartilhar a pouca riqueza
que possui com quem tem menos ainda. Sensibilizada pelas palavras e gestos de
Zezé, a professora fica emocionada, pede-lhe que não volte a levar flores
roubadas e garante-lhe que o copo nunca mais voltará a ficar vazio, pois, ao
olhar para ele, imaginará sempre a flor mais bonita, dada pelo seu melhor aluno.
Sem comentários :
Enviar um comentário