O presidente da Associação
Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), Filinto
Lima, tem vindo a defender a “semestralidade” na organização do calendário
escolar, tendo apresentado recentemente, em artigo no JN de 10 de agosto, as vantagens
da organização semestral do ano letivo. Segundo ele, a organização semestral é
preferível à trimestral porque: i) – dois períodos de duração equivalente
motivam mais os alunos para a aprendizagem até ao final do ano; ii) -
aumentaria o sucesso escolar uma vez que, no final do primeiro semestre, nenhum
aluno estava condenado à retenção, como acontece agora a alguns alunos com
negativa no primeiro e no final do segundo período; iii) - diminuiria o
trabalho burocrático dos professores que deixariam de ter três reuniões de
avaliação anual para passarem a ter duas e, finalmente, apresentou uma vantagem
colateral: iv) - diminuir-se-ia a despesa da educação por força da redução do
número de retenções (!).
São estas as vantagens que
Filinto Lima vê no modelo de organização do ano letivo por semestres.
Curiosamente, Filinto Lima só vê vantagens e não consegue vislumbrar nenhuma
desvantagem. Nem sequer a desvantagem óbvia de querer aplicar o modelo de
avaliação dos alunos do Ensino Superior aos alunos dos Ensinos Básico e
Secundário, como se os objetivos da avaliação e a maturidade dos alunos fossem
semelhantes.
Vamos por partes.
Desde logo, discordo que se
queira associar a motivação e a avaliação dos alunos à duração de cada período
letivo. De facto sendo a avaliação sumativa dos alunos uma avaliação contínua,
tendo as avaliações do 1.º e 2.º períodos caráter informativo e sendo que,
apenas, no final do 3.º período a avaliação se consubstancia em decisão
definitiva sobre o percurso escolar do aluno em cada disciplina e no ano
letivo, não se percebe de que forma a divisão administrativa do ano letivo em
períodos ou semestres pode influenciar a avaliação final dos alunos.
Do ponto de vista da avaliação
dos alunos, é absolutamente irrelevante o ano letivo ser dividido em dois, em
três, quatro ou mais períodos. Será sempre a última avaliação do ano letivo a
ajuizar do percurso do aluno em cada disciplina e no ano de escolaridade
frequentado.
Pela mesma ordem de razões, não
se alcança qualquer relação entre o número de momentos de avaliação existentes
ao longo do ano e a avaliação que os professores fazem dos seus alunos. A
avaliação final dos alunos resulta sempre do respetivo trabalho, empenho e
desempenho ao longo do ano, independentemente das divisões administrativas ou
pausas letivas definidas pelo calendário escolar. Defender que as taxas de
sucesso escolar aumentam se diminuirmos os momentos de avaliação (dos três que
existem atualmente para dois) leva-nos à conclusão óbvia de que se existisse
apenas um momento de avaliação, as taxas de sucesso seriam ainda mais elevadas.
Nesta linha de argumentação, estranha-se que não se defenda a eliminação de
todos os momentos de avaliação, para que o sucesso seja de 100%.
O argumento de que a organização
do ano letivo em dois semestres reduziria o trabalho burocrático dos
professores também não colhe. Desde logo, porque a avaliação dos alunos não é
um trabalho burocrático, antes pelo contrário, é um trabalho eminentemente
pedagógico, da competência exclusiva dos professores. Portanto, libertar os
professores das reuniões de avaliação é libertá-los de tarefas pedagógicas e
não de tarefas burocráticas.
Quanto à redução da despesa de
Educação e dos danos causados aos alunos pela diminuição do número de
retenções, também me parece que Filinto Lima atira ao lado do alvo. Se a
retenção é uma despesa a evitar e se provoca danos (psicológicos!?) aos alunos
então – haja coragem – não se permita reprovar alunos.
Embora Filinto Lima não refira
nenhuma, também existem desvantagens que convém identificar. A divisão do ano
letivo em semestres exigirá, apenas, uma presença mínima dos pais nas escolas,
uma ou duas vezes por ano. Poder-se-á objetar que pais vão à escola sempre que
entenderem, tal como hoje, mas com tantas críticas à persistente ausência dos
pais das escolas, não posso deixar de notar que a semestralidade terá o efeito
negativo de os afastar ainda mais.
Acresce que uma avaliação
realizada apenas no final de um semestre de aulas, reduzirá fatalmente a
perceção que os alunos, os pais e os próprios professores terão da qualidade das
aprendizagens realizadas, dasdificuldades evidenciadas e das medidas que será
necessário adotar para as ultrapassar. Será tarde demais para qualquer ação
corretiva consequente.
A tenra idade e ainda pouca
maturidade dos alunos dos Ensinos Básico e Secundário e o previsível maior
afastamento dos pais da escola desaconselham a aplicação de um modelo de
avaliação semestral dos alunos, tal como é defendido por Filinto Lima.
(c) José Eduardo Lemos
Público on-line de 29 de agosto de 2017