Este post é da autoria de Beatriz, uma professora de Filosofia de Setúbal, que possui um blogue onde escreve sobre diversos assuntos da atualidade e/ou do seu interesse: IP azul.
Neste caso, trata-se da divulgação de um nome da pintura ucraniana desconhecido para o comum dos mortais: Zinaida Serebriakova. O post original é este: Serebriakova - uma vida, uma obra.
Zinaida Lanceray nasceu em 1884, no Império Russo, perto de Kharhov, na atual Ucrânia, numa família artística.
O seu pai era escultor, o seu avô um famoso arquiteto e o seu tio um pintor, o que significa que era originária de uma família de artistas. Ela seguiu os seus passos e estudou arte desde muito jovem.
Foi pupila do mestre Ilya Repin (1844 - 1930), com quem aprendeu sobre o Realismo, e mais tarde viajou para a Europa, onde estudou em França e na Itália.
Nos seus quadros de Paris desta época, podemos ver que Serebriakova foi influenciada também pelo Pós-Impressionismo.
Desde tenra idade, interessou-se pela vida das pessoas comuns, dos camponeses, dos pastores e pescadores e do mundo agrícola. Este era um tema ao qual voltaria vezes sem conta ao longo da sua vida.
Em 1905, Zinaida casou com Boris Serebriakov e, durante a década seguinte, teve quatro filhos.
Este acontecimento marcou o início dos seus chamados "Anos Felizes", caracterizados por outro tema que dominaria a sua carreira: a família.
Serebriakova também pintou autorretratos. Com toda a sua vivacidade e autenticidade, constituem provavelmente o seu melhor trabalho.
Porém, acima de tudo, pintava os filhos, fosse ao pequeno-almoço, de manhã, ou todos juntos a jantar.
Serebriakova enviou o seu Autorretrato na Mesa de Toilette para uma exposição em 1909,tendo sido recebido com aclamação pela crítica. Mesmo nessa altura, a sua expressão surpreendentemente moderna foi um sucesso.
A partir de 1914, Serebriakova começou a atingit a plena maturidade artística e gozou dos anos mais bem sucedidos da sua carreira, com pinturas como Harvest (1915) e Bleaching Linen (1917).
Estava pronta para se tornar parte da Academia de São Petersburgo.
Porém, tudo mudou com a Revolução Russa de 1917.
O primeiro problema foi artístico: o seu estilo pessoal já não era bem-vindo no mundo da arte vanguardista, suprematista e construtivista favorecido pela Rússia soviética.
Em cima disso, ocorreu uma tragédia pessoal: o seu amado marido Boris foi preso em 1919 e morreu de tifo na prisão.
Sem os seus rendimentos e com as comissões a diminuir no novo regime, as coisas tomaram um rumo descendente.
Deixaram a propriedade familiar - que tinha sido saqueada - e mudaram-se para um apartamento em Petrogrado.
Ela já não tinha dinheiro para comprar tintas a óleo, mas continuou a pintar, interessando-se também pelo ballet e pelo teatro, que a sua filha Ekaterina tinha começado a frequentar.
Continuou igualmente a pintar os seus filhos, agora com uma certa melancolia, em vez da alegria mais pura anterior.
Em 1924, viajou para Paris, na esperança de conseguir lá comissões e, assim, angariar dinheiro suficiente para sustentar a sua família.
Mal sabia Serebriakova que as viagens seriam, em breve, restringidas pelo governo soviético.
Deste modo, foi-lhe recusada a reentrada na Rússia e tornou-se uma exilada.
No entanto, Serebriakova encontrou trabalho e comunidade em Paris com um grupo de emigrados russos e enviava os seus proventos para casa.
Em 1926, o seu filho mais novo, Alexandre, foi autorizado a juntar-se a ela e, em 1928, Ekaterina.
Aqui a vemos num autorretrato de 1930, com um ar algo mais cansado do que nos seus retratos anteriores.
Visitou Marrocos várias vezes, países que lhe deixou uma grande impressão.
Lá, encontrou um grande prazer em pintar o povo comum, como outrora tinha feito na Rússia.
De regresso a França, Serebriakova continuou a pintar as pessoas comuns, fossem pescadores ou padeiros, em paralelo com retratos para clientes endinheirados.
Nesta era do seu exílio parisiense, vemos um outro tema emergir mais plenamente na obra de Serebriakova: a mulher nua.
A temática já lá estava há muito tempo, como com Bather (1911), mas durante as décadas de 1920e 1930 trabalhou nela com mais frequência e de forma muito diferente daquela de que os homens se socorrem para pintar o mesmo tema.
Durante a Segunda Guerra Mundial, devido à sua nacionalidade e ao contacto frequente com a sua família na União Soviética, Serebriakova tornou-se suspeita na Paris ocupada pelos nazis.
Foi forçada a renunciar à cidadania soviética e, aparentemente, a qualquer esperança de ver a restante família novamente.
A vida e a carreira de Zinaida Serebriakova foram longas e voláteis, afetadas quer pelas Guerras Mundiais quer pela tragédia pessoal. No entanto, também se tornou uma artista de sucesso e aclamada pela crítica.
Nesta pintura, vemo-la em novo autorretrato, este bastante mais feliz, datado de 1956.
Quando a pintora caminhava já para o final da vida, graças a Khrushchev, a sua filha Tatiana recebeu autorização para visitar a mãe em Paris, em 1960. Deste modo, reuniram-se ao fim de trinta e seis anos de separação. Zinaida contava 76 anos e a filha 50.
Em 1966, realizou-se em Moscovo uma vasta exposição do trabalho de Serebriakova que foi um sucesso crítico e comercial. A pintora viajou até lá, regressando a solo russo pela primeira vez em quase quatro décadas.
Zinaida Serebriakova regressou a Paris e morreu lá no ano seguinte, em 1967, com 82 anos.
Seja nas representações da sua família, do povo comum, ou de si própria, poucos pintores conseguiram alguma vez tal ternura, intimidade, vivacidade e honestidade.