● Tema: o destino humano.
● 1.ª estrofe
• O plural «nós» representa
todos os seres humanos.
• Os arvoredos configuram
um elemento intemporal: antes de o ser humano existir, eles já existiam. E
antes dessa existência, o vento passava e criava ruído nas folhas, ruído esse
que é personificado na fala das mesmas folhas.
• A Natureza, representada
pelos arvoredos, assiste impassível à passagem dos homens, havendo como que uma
permanência que se opõe à transitoriedade da vida humana. Aquela é permanente,
enquanto o ser humano é transitório (verso 1).
• Em suma, o sujeito
poético esclarece que, antes de o ser humano existir, a Natureza comportava-se
da mesma forma que se comporta no presente: os arvoredos são os mesmos, o vento
passou neles e as falhas falavam do mesmo modo que hoje. As leis da Natureza e
do Universo são sempre constantes.
● 2.ª estrofe
• O sujeito poético afirma
que o Homem passa pelo mundo e se agita em vão. Ele tem consciência da passagem
do tempo, bem como da inutilidade (v. 5) do seu esforço, enquanto os elementos
naturais permanecem passivos e sem esta consciência.
• A ação do ser humano não
deixa qualquer marca no mundo e é tão insignificante como o ruído das folhas e
da passagem do vento. Ou seja, as marcas deixadas pelo Homem e a sua agitação
são tão insignificantes e inúteis como o barulho das folhas das árvores e da
passagem do vento. Note-se que este representa a instabilidade e a inconstância
(ora sopra, ora não sopra; ora sopra da esquerda, ora sopra da direita, etc.).
• Nas duas primeiras
estrofes:
- a Natureza
e o «nós» fazem parte da mesma realidade perene e estão sujeitos às mesmas
condições, neste caso, à passagem do tempo e do vento (vv. 1 a 4);
- neste caso,
há uma relação de semelhança entre o Homem e a Natureza (vv. 6 a 8);
- no entanto,
há uma diferença: a passagem do tempo faz parte do ciclo habitual da Natureza,
que dela não tem consciência; já para o Homem, porque é consciente da passagem
do tempo, é motivo de agitação e perturbação – ou seja, ele é caracterizado pela
constatação da finitude e da transitoriedade, bem como pela consciência do
tempo (“Passamos” – v. 5) e da inutilidade do esforço humano (“agitamo-nos
debalde” – v. 5).
● 3.ª estrofe
• O sujeito poético exorta
à fruição calma do momento («carpe diem») e à serenidade epicurista do
contacto com a Natureza (“Tentemos pois com abandono assíduo / Entregar nosso
esforço à Natureza” – vv. 9-10).
• Por outro lado, exprime o
desejo único de identificação e comunhão com a Natureza (“E não querer mais
vida / Que a das árvores verdes.” – vv. 11-12).
• Além disso, aconselha a
aceitação voluntária (“abandono assíduo” – v. 9) do tempo de vida que nos é concedido
e a aceitação passiva da ordem das coisas, das leis que regem o Universo (“Tentemos
pois com abandono assíduo / Entregar nosso esforço à Natureza”); ou seja,
sugere que abandonemos definitivamente (“assíduo” = constante, que não acaba) o
que nos agita / perturba e que passemos a apreciar a Natureza, a desfrutar
calmamente o que ela tem para nos oferecer.
• O sujeito poético aspira
à indiferença (próxima da da Natureza) face à perturbação causada pela ameaça
do Destino, não querendo “mais vida / Que a das árvores verdes” (vv. 11-12),
alheio à agitação do mundo, e à tranquilidade (ataraxia).
● 4.ª estrofe
• O sujeito lírico defende
uma atitude de abnegação face ao fatalismo da vida: “Inutilmente parecemos
grandes”.
• A ideia de grandeza que o
Homem tem de si é inútil. O advérbio «inutilmente» sugere que, apesar dos seus
feitos e da imagem que tem de si mesmo, ele estará sempre sujeito às leis do
Destino.
• Além disso, nada na
Natureza está submetido ao ser humano, mesmo que este assim pense: “(…) nada
pelo mundo fora / Nos saúda a grandeza / Nem sem querer nos serve.”.
● 5.ª estrofe
• Na quinta estrofe, é
usada a primeira pessoa do singular, enquanto nas quatro anteriores fora usada
a primeira do plural. A que se deve esta mudança?
• Em primeiro lugar, nas
primeiras quatro estrofes, o sujeito poético apresenta uma reflexão filosófica
sobre o tempo e os efeitos da sua passagem, sobre um Destino comum a todos os
seres humanos. Assim sendo, o recurso à primeira pessoa do plural justifica-se,
pois as conclusões e as recomendações que o sujeito poético rira e faz são globais
e aplicam-se a todos os seres humanos, incluindo o sujeito poético (“nós”, “Passamos”,
“agitamo-nos”, etc.).
• Em segundo lugar, na
última estrofe, o sujeito poético volta.se para si mesmo, dando o seu exemplo pessoal
e refletindo sobre a fugacidade da vida, a passagem inexorável do Tempo e a
pequenez dos atos humanos (vv. 17-18), reforçando a ideia de que o Homem é
débil perante forças maiores (vv. 19-20).
• Esta estrofe é toda ela
uma interrogação retórica, através da qual o sujeito lírico reflete sobre o
valor da vida humana perante o poder do Tempo.
• Assim, tal como as
pegadas deixadas (pelo sujeito poético) na areia são facilmente apagadas pelas
ondas (“Se aqui, à beira-mar, o meu indício / Na areia o mar com ondas três o
apaga” – vv. 19-20), a existência humana será sempre apagada pela passagem do
Tempo (“Que fará na alta praia / em que o mar é o Tempo?” – vv. 19-20). Por
outro lado, quer as pegadas quer a existência humana se revelam transitórias e
sujeitas ao poder de forças que lhes são superiores.
• Desta forma, a
interrogação retórica estabelece um contraste entre a pequenez do Homem e a
força grandiosa e inexorável que é o Tempo.
• A presença do número 3
é bastante expressiva:
- associa-se
ao destino do Homem e ao mito das três parcas, as irmãs que determinam o
destino dos deuses e dos seres humanos: Cloto segura e tece o fio da vida – é a
deusa dos partos e nascimentos; Láquesis fia (a vida do Homem na Terra);
Átropos corta o fio da vida (momento que equivale à morte);
- relaciona-se
também às nereidas, deusas filhas do Oceano, que personificavam as ondas e que
fiavam, teciam e cantavam;
- liga-se,
igualmente, às três fases da vida do Homem: nascimento, vida e morte.
• Em suma, na última
estrofe, o sujeito poético reflete sobre:
- a brevidade
da vida;
- a passagem
do Tempo;
- a
consciência da morte;
- o contraste
entre a fragilidade do ser humano e a grandiosidade do Tempo.
• Resumindo: ao longo do
poema, o sujeito lírico propõe uma visão pagã da existência e defende a
comunhão do Homem com a Natureza, ao constatar a brevidade e a efemeridade da
vida humana. A única atitude a adotar no sentido de tudo isto encarar de forma
tranquila, sem perturbação, passa pela renúncia à ação, ao esforço, pelo
reconhecimento da sua inutilidade. Por outro lado, o ser humano é inserido num
mundo uno, situando-se ao mesmo nível que os elementos da Natureza, aparecendo
como parcela finita do infinito que é o Ser – Deus ter-se-ia materializado nos
diferentes objetos criados e não apenas no ser humano.
● Recursos expressivos
• Nomes:
- “ruído”
e “vento” sintetizam a ideia central do poema: o Homem não constrói o
seu destino, antes cumpre um que lhe é imposto;
- “ruído”
representa a palavra humana, por oposição à do Fado / Destino;
- “vento”:
por um lado, associa-se ao Homem, remetendo para a efemeridade que caracteriza
a sua vida; por outro, remete para o sopro divino, com significado oposto;
- “areia”:
representa o mundo da aparência, que é uma cópia do mundo da Essência;
- “[alta]
praia”: representa o mundo da Essência. Estes elementos (areia e praia)
remetem para a conceção platónica da existência humana, através da oposição
entre a “areia” que o sujeito poético vê e a “alta praia”.
• Verbos
nos modos imperativo e conjuntivo (com valor de imperativo):
traduzem a assunção de uma atitude filosófica como forma de obter a tranquilidade
e o bem-estar.
• Advérbios
de modo:
- “debalde”:
traduz a inutilidade do desejo humano, pois o Destino é inexorável e nada
escapa à sua lei;
- “inutilmente”:
traduz a oposição entre a imagem que o Homem criou de si mesmo e a função real
que ele desempenha no Todo universal, pois terá sempre de se submeter a uma
vontade que lhe é superior, daí a inutilidade do seu esforço.
bom
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